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Dos excessos no uso do instrumento de averbação premonitória

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Resumo:


  • O Código de Processo Civil de 2015 (CPC/2015) trouxe mudanças significativas quanto ao uso da certidão de averbação premonitória, estabelecendo limites claros para o exercício dessa faculdade pelo exequente, a fim de evitar abusos e garantir o equilíbrio entre as partes no processo de execução.

  • A averbação premonitória serve para dar publicidade à existência de uma execução e é efetuada no registro de bens passíveis de penhora ou arresto. No entanto, o exequente deve comunicar ao juízo as averbações realizadas e cancelar as que excedam os bens penhorados, sob pena de indenizar a parte contrária por eventuais prejuízos causados pelo excesso.

  • As decisões judiciais recentes refletem a tendência de responsabilizar o exequente que excede os limites do uso da certidão de averbação premonitória, reconhecendo o direito à indenização por parte do executado e reforçando os princípios de boa-fé e lealdade processual.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

7. O Direito Objetivo a Ser Invocado

Sabe-se que, para que haja o dever de indenizar, impõe-se ocorrência de ato ilícito, nexo causal e dano, nos termos estatuídos nos arts. 927, 186 e 187 do Código Civil, ex positis:

"Art. 927 -Aquele que, por ato ilícito (art. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo."

"Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito."

Art. 187. Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes."

Ao perfazer uma exegese acerca do direito de indenização, leciona Fredie Didier Junior:

"A averbação indevida gera direito de indenização para o devedor - aplicando-se as regras de litigância de má-fé (art. 615-A, § 4º), constituindo infração ao artigo 14, IV, CPC. (...) São exemplos de averbações indevidas: i) averbação em excesso; II) SE JÁ HÁ BEM SOBRE O QUAL O CREDOR EXERCE DIREITO DE RETENÇÃO OU GARANTIA REAL, SALVO SE FLAGRANTEMENTE INSUFICIENTE; iii) AVERBAÇÃO NÃO COMUNICADA NO PRAZO ETC."

Há ainda que se considerar para a precificação da indenização o a teoria da perda de um chance adotada em boa parte dos países de tradição romano-germânica. Infelizmente no Brasil há uma visão muito restrita quanto a fixação de indenização quase um clientelismo que torna o dano algo não indenizável sob a pecha de mero aborrecimento.

No caso da fixação da indenização é necessário distinguir no caso concreto a perda de uma chance de venda de determinado bem indevidamente gravado e a probabilidade da ocorrência desse resultado final, imputado a atuação do exequente. Notório termos em mente que o executado comumente encontra-se em situação financeira difícil na qual seria necessário a venda da parte disponível do seu acervo patrimonial para o pagamento da execução, que é uma faculdade do exequente.

A crise patrimonial pode adquirir diversos vieses: patrimonial, econômica ou financeira. Em momentos de crise a situação pode ser a necessidade da venda de determinados bens para a superação da crise financeira. Contudo, se o exequente averba a existência da execução em todos os bens do executado ou não realiza o levantamento no prazo previsto de dez dias do atual código, como pode o executado ainda fazer frente a sua dívida e ainda responder a mora?

O Tribunal de Justiça do Pará[7] ainda sob a égide do Código de Processo Civil de 1973 manteve a sentença de primeira instância que julgou procedente ação incidental indenizatória relativa ao uso arbitrário da certidão premonitória antes mesmo da entrada em vigor do art. 828 do Código de Processo Civil de 2015 cabendo transcrevermos o relatório:

Com efeito, no presente caso não se pode cogitar que tenha o requerido exercido seu direito dentro dos limites legais, pois evidente o excesso praticado na hora de exercer sua cautela. Cediço que para que se possa verificar eventual excesso na medida levada a cabo pelo exequente, indispensável prova contundente do abuso do exercício do direito conferido pelo art. 615-A, o que restou comprovado nos autos pelas comprovações da efetivação do registro nas seis matriculas acima citadas. Destaco que, as avaliações dos imóveis foram realizadas de forma unilateral pela requerente, não servindo para comprovar de plano o alegado excesso perpetrado pelo requerido, todavia, pela quantidade de imóveis e de matrículas averbadas, além dos valores de compra e venda dos mesmos, não é forçoso concluir que de fato houve excesso (...). Assim sendo, entendo que se encontram presentes os requisitos autorizadores do dever de indenizar, devendo o requerido ressarcir a requerente dos prejuízos causados à mesma. Por fim, cabe a análise do pedido de dano moral. No presente caso, entendo que o excesso das averbações inscritas nas matriculas dos imóveis da requerente, causou-lhe prejuízos que vão além do mero aborrecimento, isto porque se tratando de empresa em constante atividade comercial, deve a mesma primar pelo seu bom nome, fato este que deve sempre está aferível ao controle de crédito das demais instituições financeiras, o que não deve ser prejudicado por conduta de terceiros. Além do mais, o fato de ser a autora devedora na ação de execução não faz presumir que o requerido possa, conforme seu próprio entendimento, averbar gravame em todo o patrimônio da devedora, como de fato ocorreu.

O magistrado ainda abordou de forma percuciente a necessidade de indenizar a parte prejudicada:

Por fim, cabe a análise do pedido de dano moral. No presente caso, entendo que o excesso das averbações inscritas nas matriculas dos imóveis da requerente, causou-lhe prejuízos que vão além do mero aborrecimento, isto porque se tratando de empresa em constante atividade comercial, deve a mesma primar pelo seu bom nome, fato este que deve sempre está aferível ao controle de crédito das demais instituições financeiras, o que não deve ser prejudicado por conduta de terceiros. Além do mais, o fato de ser a autora devedora na ação de execução não faz presumir que o requerido possa, conforme seu próprio entendimento, averbar gravame em todo o patrimônio da devedora, como de fato ocorreu. Às fls. 37/46, restou comprovada as averbações, e às fls. 57/61 comprova-se o prejuízo decorrente das averbações efetuadas em excesso. Desta forma, verifico que o requerido, ao exercer seu direito insculpido no art. 615-A do CPC, agiu com excesso provocando prejuízos à requerente de ordem moral, pelo que deve este dano também ser reparado

Em agosto de 2017 o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul também se posicionou sobre a matéria:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO PRIVADO NÃO ESPECIFICADO. AÇÃO DE EXECUÇÃO. AVERBAÇÃO PREMONITÓRIA. EXCESSO. Ainda que a averbação premonitória encontre previsão legal no artigo 828, do CPC, a conduta do exeqüente que registra a ação em todos os imóveis do executado, os quais superam significativamente o valor da execução, é abusiva, impondo-se o cancelamento das averbações registradas em excesso. Inteligência do artigo 828, § 2º, do CPC. AGRAVO DE INSTRUMENTO DESPROVIDO. UNÂNIME. (Agravo de Instrumento Nº 70072881634, Décima Primeira Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Antônio Maria Rodrigues de Freitas Iserhard, Julgado em 23/08/2017).

No julgamento do Agravo de Instrumento do TJRS, o Relator Des. Antônio Maria Rodrigues Iserhard afastou ainda alegação comumente aduzida nas defesas, relativa a impossibilidade de se alegar desconhecimento dos bens objeto da averbação, cabendo parafrasear o relatório: Consigno, por fim, que a alegação da exeqüente ventilada em razões recursais, de que não houve avaliação dos imóveis dados em garantias (o que motivou este juízo a atribuir efeito suspensivo ao recurso) não procede, pois os executados trouxeram três avaliações dos bens (duas do ano de 2013 e uma de 2016, conforme já exposto acima), de modo que se a exequente não concorda com as avaliações, deveria tê-las impugnado.

EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL - Liberação de gravame que recai sobre imóveis - Artigo 615-A do CPC - Alegação de valor superior ao da dívida- Ausência de pretensão para liquidação do débito - Avaliação - Elementos nos autos insuficientes para esclarecer o valor dos imóveis -Eventuais excessos ou averbações indevidas - Possibilidade de punição - Artigo 615-A,§ 4º do CPC - Decisão mantida - Recurso improvido. (TJ-SP - AI: 757737120118260000 SP 0075773-71.2011.8.26.0000, Relator: Candido Alem, Data de Julgamento: 09/08/2011, 16ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 31/08/2011)

O processo de execução providencia-se as operações práticas necessárias para o conteúdo daquela regra, para modificar os fatos da realidade, de modo que se realize a coincidência entre o direito postulado e a realidade jurídica posta em juízo.

A satisfação pública do credor deve ser enxergada de forma peculiar quando a causa envolver prosseguimento de execução em causa a qual, na fase de conhecimento, já se encontrava garantida. Não pode utilizar o credor do processo judicial para fins que ultrapassam seus propósitos e se demonstram eivados de nulidade e rasteira má-fé.

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8. Conclusão

O binômio possibilidade e necessidade não encontram distinção no viés prático adotado pelo exequente que averba, congela inúmeros, mutila os direitos de propriedade e de disposição de todos os bens de outrem, sobretudo, sob a alegação de que o levantamento dos excessos seria ato privativo do juízo.

O atual Código de Processo Civil foi fruto de um longo processo histórico ligado diretamente a experiência forense e a ideologia da necessidade de um sistema mais célere e justo.

Confiamos que o Poder Judiciário confira máxima eficácia a reformulação do instituto ligado ao uso da certidão de averbação premonitória fazendo com que as partes se portem de forma ética e nos limites do direito posto em juízo.


Referências

ALVIM, Arruda; ASSIS, Araken de; ALVIM, Eduardo Arruda. Comentários ao código de processo civil. Rio de Janeiro: GZ Editora, 2012.

ASSIS, Araken de. Cumprimento da sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2006.

ASSIS, Araken de. Manual da execução. 14. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2012.

DIDIER JUNIOR, Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da; BRAGA, Paula Sarno;

FILHO, José Maria Rocha. Curso de Direito Comercial. 3ª ed., Belo Horizonte: Del Rey, 2004.

KERN, Marinho Dembinski. A Lei 13.097/2015 adotou o princípio da fé pública registral? Revista de Direito Imobiliário, vol. 78/2015, jan-jun/2015, p. 15-58. Disponível em: <http://www.revistadostribunais.com.br/maf/app/>. Acesso em: 28/11/2015.

LEI Nº 11.382, DE 6 DE DEZEMBRO DE 2006. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11382.htm

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MENDES, Lucas Rocha. Averbação Premoonitória: alterações impostas pelo CPC/2015 e questões controvertidas. UNIVERSIDADE FEDERAL DE SANTA CATARINA, 2015.

OLIVEIRA, Rafael Alexandria. Curso de direito processual civil. Execução, v. V. 6ª ed. Salvador: Juspodivm, 2014.

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STJ, REsp 136.565/RS , Rel. Ministro RUY ROSADO DE AGUIAR, QUARTA TURMA, julgado em 23/02/1999, DJ 14/06/1999

TAVARES, André Ramos. Perplexidades do novo instituto da súmula vinculante no direito brasileiro. Revista Eletrônica de Direito do Estado (REDE), Salvador, Instituto Brasileiro de Direito Público, n. 11, jul.-ago.-set. 2007, p. 1-2. Disponível em: < http://www.direitodoestado.com/revista/REDE-11-JULHO-2007-ANDRE%20RAMOS.pdf> Acesso em: 02 ago. 2010.

TOMAZETTE, Marlon. Curso de Direito Empresarial - Teoria Geral e Direito Societário. Vol. 1. São Paulo: Atlas, 2008.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SANTA CATARINA. Agravo de Instrumento nº 2013.025981-6, Relator Desembargador Lédio Rosa de Andrade, 4ª Câmara de Direito Comercial. Julgado em 7, out. 2014.

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO PARÁ. Agravo de Instrumento nº 2013.025981-6, Relator Desembargador Lédio Rosa de Andrade, 4ª Câmara de Direito Comercial. Julgado em 7, out. 014.https://consultas.tjpa.jus.br/consultaprocessoportal/consulta/principal?detalhada=true#

WAMBIER, Luiz Rodrigues; ARRUDA ALVIM WAMBIER, Teresa; MEDINA, José Miguel Garcia. Breves comentários à nova sistemática processual civil, v. 3, p. 76. apud


1. Lei 11.382/06

2. O Código anterior previa exceção a regra geral:

Art. 816. O juiz concederá o arresto independentemente de justificação prévia:

I - quando for requerido pela União, Estado ou Município, nos casos previstos em lei;

II - se o credor prestar caução (art. 804).

3. http://www2.camara.leg.br/legin/fed/lei/1970-1979/lei-5869-11-janeiro-1973-357991-publicacaooriginal-1-pl.html

4. ASSIS, Araken de. op. cit., loc. cit.

5. ZIEBARTH, Luciano Santhiago. Lei n. 11.382/06 - a necessidade ou não da averbação da penhora no sistema registral, quando já tivermos ali lançada averbação da existência da ação de onde foi extraída tal penhora, como previsto no caput, do art. 615-A do CPC. Clubjus. Brasília-DF: 05 dez. 2007. Disponível em: http://www.clubjus.com.br/?artigos&ver=2.11930&hl=no> acesso em 09/05/2017.

6. WAMBIER, Luiz Rodrigues; ARRUDA ALVIM WAMBIER, Teresa; MEDINA, José Miguel Garcia. Breves comentários à nova sistemática processual civil, v. 3, p. 76. apud ASSIS, Araken de. op. cit. p. 523. No mesmo sentido: MEDINA, José Miguel Garcia. op. cit. p. 729.

7. TJPA, 0012539-16.2014.8.14.0301, Rel. Juiz. Roberto Cézar Oliveira Monteiro

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Sobre o autor
Matheus dos Santos Buarque Eichler

Graduado em Direito pela Universidade Cândido Mendes Centro. Sócio Fundador do escritório Eichler e Eichler. Diretor Jurídico de Empresas de Energia. E-mail: [email protected]

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

EICHLER, Matheus Santos Buarque. Dos excessos no uso do instrumento de averbação premonitória. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 27, n. 6770, 13 jan. 2022. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/95865. Acesso em: 22 dez. 2024.

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