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A Súmula Vinculante nº 11 do STF: uma visão à luz da teoria da justiça de Rawls

A Súmula Vinculante nº 11 do STF: uma visão à luz da teoria da justiça de Rawls

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A decisão sobre algemas careceu de critérios claros e de fundamentação coerente com alguma concepção de justiça, tendo decorrido de um intuicionismo com prevalência absoluta de direitos fundamentais individuais, em prejuízo de outras liberdades e valores.

Resumo: O presente trabalho tem como objetivo descrever os precedentes e debates que marcaram a edição da Súmula Vinculante n.º11, analisando-os a luz de alguns dos principais termos da Teoria da Justiça de Rawls, conferindo ênfase na questão da concepção de justiça adotada pelos Ministros do Supremo Tribunal Federal, sendo feito, ainda, um cotejo com a crítica comunitarista acerca da excessiva judicialização dos direitos fundamentais nos estados ditos liberais. A conclusão aponta para a falta de uma efetiva concepção de justiça nas decisões que tratam de direitos fundamentais, as quais se baseiam muito mais no intuicionismo, não balizando devidamente as igualdades e liberdades, levando a uma excessiva prevalência dos direitos fundamentais individuais em detrimento de valores da própria sociedade.

Palavra-chave: Súmula Vinculante n.º11; Teoria da Justiça; concepção de Justiça; intuicionismo; igualdades e liberdades.

Sumário: I. Introdução; II. A Súmula vinculante n.º11: Precedentes e Debates; III. A Teoria da Justiça De Rawls; IV. A Súmula Vinculante n.º11, A Teoria da Justiça de Rawls e a Crítica Comunitarista da Excessiva Judicialização dos Direitos Fundamentais; V. Conclusão.


I – INTRODUÇÃO

As decisões do judiciário brasileiro muitas vezes geram no cidadão comum uma perplexidade, uma sensação de que a justiça é algo completamente afastado de sua realidade cotidiana, sendo de difícil compreensão o exato alcance de seus termos e principalmente entender, dentro de um senso comum, como se chegou a tal decisão. Isto ocorre por vezes ante o desconhecimento da maioria das pessoas acerca das leis e dos meandros legais, dos procedimentos e princípios que norteiam nosso direito. Noutras vezes é nítido o conteúdo político de determinadas decisões, uma vez que o judiciário, enquanto Poder, principalmente nas decisões das cortes superiores tem inevitavelmente parcela de responsabilidade política em suas decisões, especialmente quando se trata de decisões que afetam o coletivo, políticas e finanças públicas, com impactos que transcendem e muito a estreita visão de um embate entre duas partes no processo defendendo seus interesses ou direitos.  

Porém, chama realmente a atenção o fato de que muitas decisões conflitam com nossas intuições de justiça, com o senso de justiça de cada um e também da sociedade como um todo, demonstrando uma dissociação entre as razões do juiz e do jurisdicionado, muito embora eles façam parte da mesma sociedade, portanto deveriam compartilhar boa parte dos valores e do próprio senso de justiça. E não se trata absolutamente das hipóteses de simplesmente ver insatisfeita uma pretensão pessoal proposta ao judiciário, a exemplo de não ter acolhida pretensão proposta ante o judiciário, mas sim o conteúdo de decisões que afetam a todos, individualmente e coletivamente, no próprio senso de justiça.

Uma dessas recentes decisões que gerou grande polêmica e reações de parcelas da sociedade foi a edição da Súmula Vinculante n.º11, que limitou sensivelmente a aplicação de algemas em presos por parte de policiais.  E neste caso a discussão foi desde a necessidade de uma regulamentação por parte do judiciário quanto ao tema, o que gerou uma reação do próprio legislativo, que em sua visão teve usurpada as suas funções de regulação geral de temas através das leis, passando pela crítica geral de boa parte da sociedade ao argumento de que algemas somente caberiam para pobres enquanto criminosos de colarinho branco ou “amigos da corte” não poderiam ser algemados, chegando inevitavelmente a uma reação muito forte das instituições policiais por entenderem que a aplicação dos termos desta súmula, na prática, seria  inviável ante as circunstâncias que permeiam normalmente uma prisão[2]. Noutro extremo, aplaudindo a decisão tomada, advogados, considerável parcela dos juristas que se dedicam as ciências criminais, pessoas investigadas em crimes de colarinho branco e parte dos magistrados, especialmente integrantes de cortes superiores de justiça, entenderam que tal medida vai ao encontro dos direitos e garantias fundamentais, controlando o que na visão deles estava se convertendo num estado policialesco, com excesso por parte da polícia na aplicação de algemas[3].

O objetivo deste trabalho é analisar essa decisão do STF, especialmente os termos dos debates que levaram a edição desta súmula, buscando identificar a concepção de justiça adotada pelos ministros do STF que fundamentaram esta decisão, comparando-os com a Teoria de Justiça de John Rawls, além de traçar um paralelo com alguns dos principais termos desta teoria, essencialmente a questão da igualdade. 

Conforme se demonstrará desta análise, assim como boa parte das decisões judiciais brasileiras, neste caso a fundamentação conferida por cada ministro foi baseada essencialmente num intuicionismo, levando a uma conclusão que não encontra respaldo na teoria da justiça como equidade, sendo difícil mesmo compreender as concepções lançadas no debate desta súmula.

Cumpre asseverar que esta análise não objetiva levar em conta determinados argumentos de cunho político e ideológico, muitas vezes levantados em casos desta natureza, que invariavelmente concluem pela proteção das classes dominantes ou elites políticas, mas sim realizar uma análise frente ao método e termos da teoria de Rawls.

Para tanto, será feita uma descrição dos debates que levaram a edição da Súmula Vinculante n.11, para em seguida serem descritos os principais termos da teoria de Rawls, especialmente os que interessam a esta análise. Somente então será procedido o diálogo entre os argumentos do STF e as proposições Rawlsianas, sendo realizadas breves considerações acerca de algumas críticas comunitaristas sobre o tema, julgadas pertinentes, apresentando-se, finalmente, as conclusões a respeito.


II - A SÚMULA VINCULANTE N. 11: PRECEDENTES E DEBATES

Há algum tempo que o STF, lastreado em parcela da doutrina criminalista, vinha analisando causas em que o uso de algemas nos presos vinha sendo contestado. Como precedentes dos debates que levaram a edição da Súmula Vinculante n.11 foram invocados quatro casos: o Recurso em Habeas Corpus n.56465, e os Habeas Corpus n. 71195, 89429 e 91952 (BRASIL, STF, 2008).

Desses precedentes, três versavam sobre uso de algemas em réu durante sessão planária de tribunal do júri e um sobre operação da Polícia Federal[4]. Este último precedente continha pedido para que investigado preso em operação da Polícia Federal, que seria ouvido no Superior Tribunal de Justiça, não fosse conduzido algemado até aquela corte, o que, segundo os advogados do preso, somente implicaria humilhação pública, sendo tal medida acatada pelo ministro do STJ responsável pelo caso. Já os outros três precedentes tratavam de casos em que os advogados alegaram que o fato de o réu estar algemado durante sessão do tribunal do júri implicava constrangimento ilegal, portanto desnecessário, além de influenciar na decisão dos jurados[5], o que também foi acatado pelo STF.

Cabe aqui explicitar que o debate sobre o uso de algemas estava acirrado nesta época, primeiro semestre do ano 2008, fundamentalmente em razão das chamadas "mega-operações" levadas a cabo pela Polícia Federal[6], e uma parcela do judiciário, cuja voz mais marcante nas críticas era a do Ministro Gilmar Mendes, do STF, engrossada por alguns políticos, criminalistas e pela Ordem dos Advogados do Brasil - OAB, acusavam a polícia de realizar operações midiáticas, ferindo direitos e garantias constitucionais.  

Tendo sido o relator do HC 91952, Ministro Marco Aurélio, apresentou então proposta de súmula vinculante sobre o uso de algemas, partindo da premissa de que a utilização de algemas é sempre excepcional, cabendo somente no caso de possibilidade real de fuga e periculosidade do agente. Aduzindo que se tratava da posição dominante na corte, o Ministro Marco Aurélio afirmou que a regra era a condução do cidadão com a cautela própria, respeitando-se sua integridade física e moral, conforme a Constituição Federal. Fundamentou tal assertiva na Constituição Federal, essencialmente na dignidade da pessoa humana (art.1º) e no respeito a integridade física e moral, dos cidadãos em geral e dos presos especificamente (art.5ºXLIX). Afirmou também que esta era a interpretação teleológica do Código de Processo Penal e também o que se denota do Código de Processo Penal Militar e da Lei de Abuso de Autoridade.

O Ministro Cezar Peluso observou que não bastaria o mero receio de fuga, mas deveria haver um fundamento, ou seja, um receio fundamentado de fuga ou a integridade física do custodiado ou de terceiros, o que englobaria a resistência a prisão. Chamou a atenção que este mesmo ministro alerta sobre o STF determinar as conseqüências da inobservância desta regra, evitando-se o arbítrio das autoridades em cumpri-la ou não.

Já o Ministro Menezes Direito fez alusão ao fato de um delegado federal ter desqualificado a decisão do STF e entendido que é normal o uso de algemas[7], no que é complementado pelo Min. Marco Aurélio de que nos últimos anos o país estava vivendo uma perda de parâmetros e abandonos de princípios caros a uma sociedade democrática . Em seguida os ministros trataram de toda sorte de responsabilidade ao agente que descumprisse tal regra.

O Ministro Carlos Brito fundamentou ainda tal excepcionalidade com a proibição constitucional de tortura, tratamento desumano ou degradante (art.5º, III). Fez ainda menção ao fato do preso ser exibido como um troféu ao público. Afirmou que o uso de algemas exacerbava o estado de privação de liberdade com conseqüências físicas e morais, entretanto fala do “prudente arbítrio” que os policiais deveriam ter para saber se a situação exigiria ou não algemas, sempre dentro de uma excepcionalidade. O Ministro Carlos Brito falou em prudente discrição, e ainda complementou asseverando que o juiz, fora dos casos de prisão em flagrante, deveria sempre fundamentar o uso das algemas.

O Ministro Cezar Peluso afirmou que qualquer policial em início de carreira saberia em que situação deveria usar as algemas, tendo ele, na condição de juiz de direito, nunca se deparado com caso em que o policial não soubesse, ante uma situação concreta, quando utilizar ou não um par de algemas. O Ministro Eros Grau, diante disso, observou que não se trata de ato discricionário, mas de ato vinculado, no sentido de que desejava ver excluída qualquer subjetividade do policial no caso concreto.

Diante da proposta de redação da súmula, o MinistroCezar Peluso falou do perigo a integridade física própria ou alheia, explicando que esse perigo pode resultar de circunstâncias objetivas ou subjetivas, exemplificando que no caso de crime violento haveria sempre a presunção de risco.

O Ministro Marco Aurélio sugeriu que se excluísse a possibilidade de se algemar o preso para preservar sua integridade física, pois isto representaria um pretexto para as autoridades policiais algemarem os presos de forma genérica . Rebatendo tal argumento o Minisitro Cezar Peluso afirmou que qualquer que fosse a redação dada a súmula, se os policiais não quisessem cumpri-la não seria a redação que os iria impedir, ao que retrucou o Ministro Marco Aurélio que não se poderia raciocinar com a exceção.

Partiram então os Ministros para a discussão da periculosidade do local, entendendo que ela estava incluída implicitamente, além de tratarem do aspecto temporal da fundamentação, que no caso de ordens judiciais se daria sempre previamente, ao contrário de prisões sem ordem judicial, como no flagrante delito, hipótese em que o policial fundamentaria posteriormente o uso das algemas.

O Procurador-Geral da República, Antônio Fernando de Souza, fez observações diferenciando casos de prática de atos processuais, como sessões do Tribunal do Júri, onde seria sempre possível tomar antecipadamente todas as providências para garantir a segurança do local e de todos que participarão do ato, de situações de prisões efetivadas por policiais no dia-a-dia, o que geraria uma situação sempre potencialmente conflituosa e perigosa. Alertou o Procurador-Geral sobre a observação dessa regra em face desses casos concretos de prisão, sob pena de se colocar os policiais numa situação de presunção de violação da súmula. O Ministro Cezar Peluso, concordando com essas observações, admitiu que o ato de prender e conduzir um preso é sempre perigoso, e portanto a interpretação dos casos concretos deveria ser sempre em prol dos agentes do Estado, salvo flagrante violação do dispositivo.

Diante destas questões o Ministro Gilmar Mendes observou que a questão das algemas era somente um dos aspectos das violações de direitos e que na verdade o que se estava discutindo era a aposição das algemas para exposição pública, no sentido de que prender estava significando algemar e colocar alguém na televisão.

Assim, a versão final da Súmula Vinculante n.º11 acabou ficando nos termos abaixo:

Só é lícito o uso de algemas em caso de resistência e de fundado receio de fuga ou de perigo à integridade física própria ou alheia, por parte do preso ou de terceiros, justificada a excepcionalidade por escrito, sob pena de responsabilidade disciplinar civil e penal do agente ou da autoridade e de nulidade da prisão ou do ato processual a que se refere, sem prejuízo da responsabilidade civil do Estado.

É possível notar, de plano, que os debates foram extremamente estéreis, pobres em argumentos e justificativas, limitando-se a enunciação genérica de postulados constitucionais. Isso talvez revele que tal tema não necessitaria ter sido tratado em um nível tão elevado como o de uma Corte Suprema de um país, quanto mais ter sido objeto de súmula vinculante, que significa submeter todo o judiciário e as autoridades do executivo a um regramento sobre o tema.

Por outro lado, os principais argumentos dos ministros por vezes são colidentes, havendo mesmo confusão sobre questões como a subjetividade, arbitrariedade e discricionariedade na aplicação de algemas, assim como sobre uma presunção de periculosidade de qualquer prisão e até mesmo do local influenciando na sua aplicação, o que tenderia, na verdade, a se aplicar sempre as algemas.

Tudo isso revela, conforme se demonstrará, uma concepção de justiça equivocada, baseada em intuicionismo, distante de se visualizar, inclusive, como se formou o conceito de justiça neste caso. 


III - A TEORIA DA JUSTIÇA DE RAWLS

Em sua Teoria da Justiça John Rawls oferece uma visão alternativa ao utilitarismo e ao intuicionismo. Ele elabora uma teoria fundada na igualdade e na qual a noção de distribuição é essencial, tendo um forte viés contratualista, que não funda a sociedade, mas lhe fornece uma conjuntura através de escolha de princípios. Rawls não tem a pretensão de oferecer respostas a situações concretas, mas sim de demonstrar um meio, um procedimento de se chegar a resultados equitativos ou justos. Nesse sentido sua teoria é argumentativa e não tem aplicação direta, mas permite a discussão de questões com base nela. Sua importância se revela pelo grande número de comentadores, críticos e seguidores que escrevem a seu respeito. 

Parte Rawls de um primado da justiça, considerando que as instituições tem que ser justas, afirmando que a justiça é a primeira virtude das instituições sociais (RAWLS, 2008, p.04). A justiça preconizada por Rawls é aquela em que os princípios de justiça regerão suas estruturas básicas. Assim, ele elabora uma teoria que é uma alternativa ao utilitarismo, concepção prevalente até a edição de sua obra, além de conter crítica as doutrinas intuicionistas.

No intuicionismo se admite a possibilidade de vários princípios em conflito uns com os outros, e neste caso se utiliza da intuição para aplicar o princípio que nos parece mais adequado, ante a inexistência de regras objetivas de prioridade entre os princípios, o que justamente consiste a crítica de Rawls (RAWLS, 2008, p.41). Para ele o intuicionismo tem validade no equilíbrio reflexivo, no exercício de adequação ou conformação entre princípios e intuições pessoais (RAWLS, 2008, p.25 e 58-60), levando a uma coincidência desses princípios com nossas intuições, adequando os princípios as nossas intuições ou estas aos princípios.

Já no utilitarismo se considera um ato como correto quando maximiza a felicidade geral, possuindo dessa forma um método para organizar diferentes princípios ou alternativas ante um caso concreto, que é a felicidade geral ou um saldo líquido de satisfação calculado na satisfação de todos os indivíduos (RAWLS, 2008, p.27). A correção moral do ato está em seu resultado, no atingimento desse máximo de felicidade. São considerados os interesses de todos os indivíduos, não prejulgando seus interesses ou preferências, sejam elas quais forem, considerando, em princípio, todos em pé de igualdade em seus interesses e preferências, calculando o custo e benefício de cada ato. Assim, o utilitarismo aceita sacrifícios em prol dessa relação custo X benefício e da maximização da felicidade geral. Rawls critica tal postura, pois acredita que a correção moral do ato esta em seu conteúdo (postura deontológica) e não são admissíveis certos sacrifícios coletivos, como o sacrifício de certas parcelas da sociedade em prol de outra parcela, sendo que cada indivíduo deve ser respeitado como um ser autônomo e distinto dos demais (independência e indissociabilidade entre as pessoas), o que torna ilegítimo o sacrifício de alguns nos termos utilitaristas (GARGARELLA, 2008, p.6-8). Além disso, para Rawls o bem estar humano não deveria ter atenção normativa, defendendo uma medida objetiva (bens primários) contra a postura de satisfação de cada um segundo seus desejos proposta pelo utilitarismo. Finalmente Rawls critica a possibilidade de se considerar determinados gostos, chamados por ele de ofensivos, os quais mesmo que numa perspectiva igualitária não poderiam ser aceitos, a exemplo de se defender o racismo. A aceitação de preferências externas pelo utilitarismo também é criticada, pois deveriam ser aceitas somente as preferências pessoais, relativas ao bem que reivindico. Finalmente Rawls critica a impossibilidade de se aceitar o utilitarismo dentro de uma postura contratual como a que ele propõe, pois como pessoas livres e iguais dificilmente aceitaríamos sacrifícios a direitos fundamentais como os permitidos pelo utilitarismo (GARGARELLA, 2008, p.8-14).

A visão contratual de Rawls não diz respeito a um acordo real. Para ele o contrato original não tem a finalidade de estabelecer o governo ou fundar a sociedade, mas sim estabelecer princípios de justiça para a estrutura básica da sociedade (RAWLS, 2008, p.13). Neste acordo hipotético a justificativa é substituída pela escolha na qual as pessoas são livres, racionais e estão em situação de igualdade. Assim, há uma igualdade moral entre as pessoas, não uma igualdade física, ou seja, o destino de cada um tem a mesma importância. A escolha, nessas circunstâncias, justifica a teoria da justiça.

No contrato hipotético são estabelecidos princípios de justiça que organizam a sociedade, a sua estrutura básica, o modo como são organizadas suas instituições sociais mais importantes (constituição política e disposições econômicas e sociais), distribuição de direitos e deveres e divisão de vantagens da cooperação social. Esses princípios são aplicados a sociedades bem organizadas (RAWLS, 2008, p.10), onde vigoram as circunstâncias de justiça, em que as pessoas sabem e aceitam os mesmos princípios aceitos pelos demais membros desta sociedade, e onde as instituições aplicam os princípios de justiça sabendo que o fazem. Nesta sociedade há um equilíbrio, não ocorrendo extrema escassez ou abundancia de bens, havendo igualdade e vulnerabilidades também.

A escolha dos princípios de justiça, em condições imparciais, leva a justiça como equidade. Esses princípios de justiça imparciais resultariam de escolhas feitas por pessoas livres, em posição de igualdade, interessadas em si mesmas e racionais. Essas condições surgem então, no que Rawls denomina de "posição original'".

Na “posição original” se determinará o tipo de princípios de justiça escolhidos, assim, os indivíduos devem estar sob um "véu de ignorância", que lhes impede de conhecer sua classe, posição social e as capacidades naturais que lhes foram dotadas, assim como as concepções de bem e suas propensões psicológicas, o que faz com que a análise das alternativas dos princípios se dê apenas com ponderações gerais (RAWLS, 2008, p.166). Este "véu da ignorância" não lhes retira o reconhecimento de certas proposições, tais como conhecimentos básicos da teoria econômica, base da organização social e leis da psicologia humana (RAWLS, 2008, p.167). Deste modo, não há como orientar a decisão em favor próprio. Sobre as motivações próprias, as pessoas precisariam estar motivadas a obter certos tipos de bens, chamados de primários, assim considerados os básicos e indispensáveis para satisfazer o plano de vida, os quais são oferecidos pelas instituições sociais, como direitos e oportunidades, e pela natureza, como talento e saúde (GARGARELLA, 2008, p.23).

Quanto ao critério de racionalidade dos sujeitos na “posição original”, Rawls traça a regra maximin, onde diante de várias alternativas possíveis na escolha deverá ser escolhida a alternativa cujo pior resultado seja melhor que o pior resultado das outras. Isto porque na posição original e sob o “véu da ignorância” ninguém pretende almejar benefícios maiores que o mínimo além de não saberem as probabilidades a seu alcance (GARGARELLA, p.23-24).

Comentando este tema, Jonathan Wolff apresenta exemplo em que em jogo de pôquer um dos jogadores, ao distribuir as cartas, antes de ver suas cartas observa um ás caído e propõe anular a jogada. O outro jogador discorda, uma vez que estava com uma mão privilegiada. Não chegam a acordo a respeito. Poderiam, então, fazer um acordo hipotético, analisando o fato mentalmente como se eles tivessem feito um acordo que previsse tal fato antes de iniciar o jogo. Neste caso os jogadores estariam abstraídos das circunstâncias concretas que ocorreram, ou seja, pressuporiam certa ignorância, não sabendo o que o jogo lhes proporcionará, o que afastaria a influência de interesses particulares pelo prévio conhecimento das cartas que receberiam (WOLFF, 2004, p.220-224). É possível desdobrar o raciocínio deste exemplo sobre outros pontos importantes da teoria de Rawls, como a aplicação da regra maximin na escolha prévia dos princípios, ou ainda alguns conhecimentos básicos exigidos para a escolha. Conclui ainda este autor que a proposta de Rawls esta calcada fundamentalmente em três pontos: as circunstâncias em que o acordo hipotético irá se realizar, os princípios que seriam escolhidos nessas circunstâncias, e a comprovação de que esses são os princípios corretos em estados democráticos.

Dentro desses critérios apontados na “posição original”, sob o “véu da ignorância”, Rawls afirma que os sujeitos escolheriam dois princípios básicos de justiça. O primeiro declararia que cada pessoa deve ter um direito igual de liberdades básicas compatível com as mesmas liberdades básicas para as demais pessoas. Trata-se do princípio da liberdade igual, que trata das liberdades civis e políticas próprias das democracias modernas. Já o segundo princípio estabeleceria que as desigualdades sociais e econômicas somente são válidas se estiverem vinculadas a cargos e posições acessíveis a todos e também que se possa razoavelmente esperar que sejam estabelecidas em benefícios de todos, o que pode ser desdobrado no princípio da igualdade de oportunidades e no princípio da diferença. E por este princípio da diferença se admite a existência de diferenças na sociedade, mas somente nessas condições (RAWLS, 2008, p.73). Esquematicamente:

“Primeiro: cada pessoa deve ter um direito igual ao sistema mais extenso de iguais liberdades fundamentais que seja compatível com um sistema similar de liberdade para as outras pessoas.

Segundo: as desigualdades sociais e econômicas devem estar dispostas de tal modo que tanto (a) se possa razoavelmente esperar que se estabeleçam em benefício de todos como(b)estejam vinculadas a cargos e posições acessíveis a todos.”

Rawls justifica a escolha desses princípios no terceiro capítulo de sua obra. Segundo ele, em síntese, o princípio da liberdade confere proteção aqueles que estão estabelecendo os princípios de justiça, pois sejam quais forem as concepções de bens que for adotada há o natural interesse de que as instituições básicas não os prejudiquem ou discriminem (RAWLS, 2008, p.182 e segs.). O mesmo pode ser dito quanto a igualdade que ele preconiza. Quanto ao princípio da diferença, para Rawls a escolha racional seria utilizar o princípio maximin, isto porque num contrato hipotético a pessoa esta sujeita a sua publicidade a todas as partes interessadas, além de ser peremptório no sentido de ter de ser cumprido mesmo que prejudique a parte, logo, o princípio maximin, em que se analisa os piores resultados possíveis dentre as escolhas e se escolhe aquele melhor entre os piores, é a escolha mais racional, com o menor risco (WOLFF, 2004, 231-242).

Cabe destacar que o princípio da diferença, estabelecida a concepção de bem, regula a distribuição de recursos na sociedade. Este princípio não se considera satisfeito com a igualdade de oportunidades, pois os talentos e capacidades, o mérito, não é, para Rawls, um critério justo de distribuição de recursos. Em Rawls somente há justiça se as pessoas foram beneficiadas ou prejudicas por suas escolha, e não por circunstâncias alheias a estas. Assim, uma sociedade justa deve tender a igualar as pessoas em suas circunstâncias. A loteria natural não deve influir no destino das pessoas, cabendo a uma sociedade justa reduzir ao máximo tal situação (RAWLS, 2008, p. 120-130). Essas maiores vantagens naturais somente se justificam se melhorarem as expectativas dos menos favorecidos.

Rawls estabelece que o princípio das liberdades tem primazia sobre o da igualdade, que tem primazia, por sua vez, sobre o princípio da diferença (RAWLS, 2008, p.74). A liberdade não pode ser limitada em favor de se alcançar maiores vantagens sociais e econômicas em sociedades que alcançaram um nível mínimo de desenvolvimento econômico, mas somente em caso de conflito com outras liberdades. Assim Rawls reconhece que não existem liberdades absolutas, mas todas estão dentro de um mesmo sistema, que é único (RAWLS, 2008, p.75).

Finalmente Rawls propõe o que ele chama de sequência de quatro estágios, como sistema que simplifique a aplicação dos princípios de justiça. Nesse sistema, após a escolha dos princípios de justiça as partes formam uma convenção constituinte, já com um conhecimento genérico acerca de fatos da sociedade, ou seja, um pouco maior do que aquele da “posição original”, uma vez que o “véu da ignorância” vai sendo levantado. Essa constituição, que deve atender aos princípios de justiça, orientará a produção legislativa eficaz e justa, que deve atender não somente os princípios de justiça, mas também a constituição, levantando-se mais ainda o “véu da ignorância”. O último estágio seria o da aplicação das normas em casos concretos por juízes e administradores, além dos cidadãos em geral, estágio em que não há mais limites ao conhecimento, não havendo mais o “véu da ignorância”. Rawls ainda coloca que em cada estágio se trabalha com tipos diferentes de questões sociais, sendo a liberdade o padrão da convenção constituinte, essencialmente as liberdades fundamentais individuais e o processo político como um procedimento justo, enquanto que no estágio da legislatura entraria o segundo princípio, maximizando as expectativas dos menos favorecidos e garantindo a igualdade de oportunidades (RAWLS, 2008, p.239-244). Distinguem-se, segundo Rawls, entre os princípios fundamentais da teoria social, os fatos genéricos acerca da sociedade e os fatos específicos acerca dos indivíduos, nesta ordem.

Esta apertada síntese da estrutura básica da Teoria da Justiça de Rawls não visa esgotar todos os seus termos e conceitos, por demais complexos, muito menos interpretá-la, tarefa que filósofos e pensadores ainda realizarão por muito tempo. Para o objeto deste trabalho, dentro de uma necessária sequência lógica de exposição das idéias e argumentos, bastam os conceitos expostos para balizar a análise pretendida.

É interessante destacar que a toda a proposta de Rawls de uma justiça como equidade está calcada na idéia de igualdade. A igualdade inspira seu método hipotético de escolha dos princípios de justiça, pois é a base da “posição original”, conferindo o caráter justo dos princípios escolhidos. Os princípios escolhidos dentro desta concepção estão, da mesma forma, nela baseados, pois as liberdades enunciadas pelo primeiro princípio são incondicionalmente distribuídas de forma igualitária, não se podendo limitá-las nem mesmo por maiores vantagens sociais e econômicas, mas tão somente por conflitos entre liberdades. A desigualdade, no segundo princípio e seus desdobramentos, somente se admite se gerar uma vantagem para todos, o que levaria, segundo Rawls, a uma diminuição da desigualdade ou tendência a igualdade. Mesmo os atributos da loteria natural são alvo do princípio da diferença, representando, em certos aspectos, como um bem comum, no sentido de partilha de benefícios econômicos e sociais maiores (RAWLS, 2008, p.121).

Ao longo do desenvolvimento de sua tese Rawls toca constantemente no tema da igualdade, mesmo admitindo a desigualdade, conferindo resposta e critérios para se aceitar as desigualdades, sempre com o intuito de se alcançar a igualdade.

A idéia de igualdade, portanto, é um dos conceitos fundamentais que inevitavelmente conduzirá e qualquer diálogo dos termos da teoria de Rawls e aplicações práticas da mesma.


  IV  - A SÚMULA VINCULANTE N.º11, A TEORIA DE JUSTIÇA DE RAWLS E A CRÍTICA COMUNITARISTA DA EXCESSIVA JUDICIALIZAÇÃO DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Visto os principais argumentos que fundamentaram o debate sobre a aprovação da Súmula Vinculante n.º11, bem como revisitados os principais termos de Uma Teoria da Justiça de Rawls, cabe agora proceder a uma análise dos principais argumentos daquela decisão comparando-a com alguns termos da teoria proposta por Rawls.

A proposta do Ministro Marco Aurélio, conforme visto, foi inteiramente calcada na Constituição Federal, ao entendimento de que a utilização de algemas em presos violaria, em regra, a dignidade da pessoa humana, assim como o respeito a integridade física e moral dos cidadãos e dos presos, fazendo menção ainda a uma interpretação teleológica do Código de Processo Penal. Somente se legitimaria o uso de algemas em caso de tentativa de fuga ou risco a integridade física de terceiros ou do preso. O Ministro Carlos Brito acrescentou também a proibição constitucional de tortura e tratamento desumano ou degradante, além do fato de que a utilização de algemas seria uma exacerbação do estado de privação de liberdade, com conseqüências físicas e morais.

Esses fundamentos colocados pelos ministros se limitaram a repetir enunciados constantes na Constituição Federal. Falar em dignidade da pessoa humana implica em tratar de um conceito que embora pareça básico e até mesmo intuitivo, é de tal amplitude que acaba equiparando-o a classe dos conceitos jurídicos indeterminados. Basta questionar: o que é a dignidade da pessoa humana? Existe certamente uma quantidade infinita de respostas possíveis e viáveis, porém nenhuma delas foi explorada pelos ministros. Além de se balizar os termos deste conceito, havia a necessidade de contextualizá-lo na questão da aplicação das algemas, o que também não foi feito.

Da mesma forma a questão do respeito a integridade física e moral e da vedação da tortura e tratamento desumano degradante, que embora constituam conceitos mais claros e com maior grau de especificidade, foram lançados de forma genérica e sem uma contextualização acerca dos fatos que estavam sendo debatidos, transparecendo que o simples fato de se aplicar as algemas, salvo em casos de tentativa de fuga ou risco a integridade física de terceiros ou do preso, por si só implicaria a violação desses conceitos. Em momento algum os ministros fundamentaram o motivo dessas supostas violações genéricas de tais conceitos, o que constituiria a regra em praticamente todos os casos de aplicação de algemas.

É importante esclarecer que a conceituação mais exata e a contextualização requerida são genéricas, para regulação abstrata de situações de aplicação de algemas, ou seja, regras balizadoras que poderiam informar decisões posteriores.

Se adotássemos a concepção de justiça proposta por Rawls, de uma justiça baseada na equidade, com o primado das liberdades e da igualdade, admitidas as desigualdades nos termos por ele propugnados, evidentemente que conceitos como a dignidade da pessoa humana, direito a integridade física e moral, vedação a tortura e tratamento desumano ou degradante, constariam na constituição. Isto porque tais direitos fundamentais estão acordes com os princípios de justiça que Rawls propõe, e certamente seriam escolhidos como estruturantes da sociedade por pessoas que, após a escolha daqueles princípios na posição original, sob um véu de ignorância, os declarariam numa convenção constituinte. Especificamente no que diz respeito ao princípio da liberdade de Rawls, tais direitos fundamentais estariam constante na constituição de qualquer Estado que tenha atingido um grau mínimo requerido de democracia, conforme requisitado por Rawls.

Ocorre, por outro lado, que nessas mesmas circunstâncias e na constituição desse mesmo Estado as pessoas que o compusessem certamente declarariam a segurança pública no mesmo patamar de outras liberdades. Tratar-se-ia do direito fundamental de todos de conviver com segurança e paz social, de ir e vir livremente e sem medo a qualquer local e em qualquer hora, além de declarar valores como a probidade, moralidade, impessoalidade e eficiência do Estado e seus agentes públicos e políticos no trato com a coisa pública. E muito embora tais valores possam não ser enunciados explicitamente como liberdades civis básicas, se considerados sistematicamente afetam essas mesmas liberdades civis, além de atingir frontalmente o aspecto da distribuição de direitos e oportunidades. A título de exemplo, os vultosos desvios de dinheiro público em crimes de colarinho branco e lavagem de dinheiro inviabilizam investimentos sociais, causando prejuízos incalculáveis às políticas sociais, interferindo na concretização distributiva da riqueza, e assim afetando a dignidade da pessoa humana. Tais situações geram prejuízos incomensuráveis a sociedade, haja vista as fraudes que envolvem a saúde pública e previdência social, as quais geram direta e indiretamente graves conseqüências para todos os membros da sociedade.

Rawls oferece em sua teoria a possibilidade de se limitar uma liberdade civil somente nos casos em que esta conflita com outras liberdades. Nos próprios debates os ministros colocam, por mais de uma vez, situações contraditórias a conclusão obtida. Exemplificam que no caso de crimes violentos há presunção de risco, o que é questionável, por exemplo, nos casos de crimes passionais, que existe a periculosidade presumida do local, certamente uma favela ou bairro de periferia, enquanto que criminosos que moram nos bairros nobres dificilmente teriam a periculosidade presumida. Chega o Ministro Cézar Peluso a afirmar que prender e conduzir um preso é sempre perigoso e que a interpretação, portanto, de casos concretos, seria em regra em prol dos agentes do Estado. Para muito além da incoerência lógica com a decisão tomada, por esse contexto colocado pelos ministros, de uma presunção de perigo em praticamente todas as situações, se justificaria limitar direitos fundamentais do preso em prol dos direitos fundamentais de terceiros, ou seja, ante a presunção de risco, a regra deveria ser algemar, e não o contrário.

Convém ressaltar que Rawls não admite que se transija com as liberdades, não permitindo sua limitação para nenhum grupo ou situação, mesmo no caso de um benefício ou vantagens sociais ou econômicas. Então cabe o questionamento: não teriam os policiais, os agentes públicos que efetuam as prisões, direito a dignidade humana, a não ter um tratamento humano degradante, a não terem um risco permanente maximizado por não algemarem todo e qualquer preso? Em momento algum tal questão foi levantada nos debates, salvo as observações do Procurador-Geral da República demonstrando preocupação com as situações concretas, diante das quais o Ministro César Peluso concorda com a presunção de risco em toda e qualquer prisão. Seria razoável, numa visão Rawlsiana, exigir dos policiais tal risco? Isto não estaria ferindo suas liberdades básicas, seus direitos fundamentais e sua dignidade humana?

Examinando sobre outro aspecto, no confronto entre liberdades básicas, tal como admitido por Rawls, há a possibilidade de um indivíduo ser privado de seus bens e de sua própria liberdade. Não existe um estado democrático que não admita o sistema de repressão criminal, justamente para salvaguardar as liberdades de todos que compõem a sociedade. As algemas são aplicadas numa pessoa presa, que se vê privada daquele que é o direito fundamental mais importante depois da vida: o direito de ir e vir livremente. E isto porque feriu, transgrediu o ordenamento jurídico, violando outras liberdades básicas e o direito a paz social e segurança pública que todos têm. Esta privação é legítima, admitida mesmo na sistemática proposta por Rawls quando do confronto entre duas liberdades. E nesta situação, em que alguém se vê privado de sua liberdade de ir e vir legitimamente pelo Estado, através de seus agentes, a aplicação das algemas visa tão somente a prisão e o transporte deste preso a uma unidade policial ou prisional. A evidência que não se trata de uma exacerbação de seu estado de privação de liberdade, mesmo porque após estes breves momentos de prisão e transporte a pessoa estará literalmente “atrás das grades”, e não parece razoável que alguém nesta situação vá ser afetado com conseqüências físicas e morais pelas algemas, mas sim pelo seu status de preso, que é legítimo nessas circunstâncias.

Na mesma linha de raciocínio, não há como se entender pura e simplesmente como uma situação degradante, de tortura, de tratamento desumano, de desrespeito a integridade física e moral, a aplicação das algemas por si só. O que se falar então do status de preso e das prisões? Fato é que no cotejo de liberdades básicas um indivíduo, pela sua transgressão ao ordenamento jurídico, ele estará legitimamente privado de sua liberdade básica de ir e vir a fim de que sejam garantidas outras liberdades civis individuais e da sociedade e a manter a segurança pública. E como visto, o próprio Rawls admite esta hipótese de limitação de uma liberdade básica.  

Ainda no aspecto do respeito a liberdades básicas, no caso de não serem aplicadas algemas, uma vez que a decisão tomada foi pela sua não aplicação como regra, se o risco existente se torna real e terceiros ou os próprios policiais são feridos, tendo violadas suas liberdades básicas, com ficaria a questão? Se resumiria a uma responsabilização dos policiais? E se em defesa eles provam que não agiram com culpa ou que a situação era dúbia e portanto não algemaram, conforme orientação do STF? Tal sistemática não oferece segurança a direitos fundamentais dos policiais e terceiros, estando, portanto, centrada somente no preso, que, nunca é demais reprisar, tem legitimamente seu direito fundamental de ir e vir cerceado.

Trazendo a questão para o campo da igualdade, a luz do princípio da diferença, Rawls admite o tratamento desigual somente se houver um benefício de todos. Embora Rawls trate deste assunto muito mais centrado no viés de distribuição de recursos na sociedade, a idéia central é a da igualdade, permitindo-se uma desigualdade somente em benefício geral. Ao estabelecer regra que permite aqueles que vão efetuar uma prisão algemar ou não o preso o STF abriu precedente grave em prol da desigualdade, pois, ainda que o julgamento daqueles que executam uma prisão não esteja contaminado por outros interesses, se abre espaço para a discricionariedade, algemando-se alguns e outros não. Cabe questionar: qual o benefício geral que seria alcançado nesta sistemática? Absolutamente nenhum, pelo contrário, abrir-se-ia espaço para questões externas, a exemplo da influência do nível econômico e social do preso sobre os executores da medida, além de erros de julgamento.

Quando trataram da questão da periculosidade exigida para se algemar alguém os ministros do STF incorreram em incongruências graves. Ao se presumir a periculosidade de um local, independentemente do tipo de crime ou criminoso, que pode ser desde um homicida em série ou narcotraficante, ou até mesmo alguém que cometeu crime de trânsito ou crime movido por “violenta paixão ou emoção”, temos o fato de se rotular toda a população de favelas e bairros menos favorecidos e toda sorte de crime, grave ou não, cometido por essas pessoas. Já aqueles que vivem em locais mais nobres, independentemente do tipo ou gravidade de crime cometido partiriam, de plano, de uma ausência de periculosidade de local. Estaria estabelecida uma desigualdade injustificada sob a ótica de Rawls.

Na mesma linha de raciocínio a ausência de se tratar da proteção do policial, que segundo consta reconhecido nos debates esta sempre e sempre em situação de risco ao efetuar uma prisão. E quanto a proteção de terceiros, ao se permitir que um preso não utilize algemas, em se considerando que há sempre uma periculosidade, se gerará um risco para esses terceiros, que passam a não ter um direito igual de proteção.

Sem a pretensão de esgotar o tema, certamente ao se fazer um breve exercício mental e tratar tal questão a luz da Teoria da Justiça de Rawls, na “posição original” e sob o “véu da ignorância” seriam escolhidos os dois princípios de justiça por ele propostos. Vale dizer: liberdade e igualdade norteariam a nossa sociedade, admitido o princípio da diferença nos termos vistos, com base no interesse de não ser prejudicado ou discriminado pelas instituições básicas, para a liberdade, e com base no princípio maximin, para a igualdade e diferença. Os princípios fundamentais utilizados na fundamentação do STF seriam certamente colocados numa constituição, porém em sua aplicação, no levantamento do “véu da ignorância”, a fundamentação da decisão seriam um pouco diferente, levando a uma conclusão diversa.

Nesta ótica, a dignidade da pessoa humana seria melhor balizada e contextualizada, considerando-se primeiramente que houve, por parte da pessoa que será presa, uma violação de outros direitos ou liberdades, sendo ferida a segurança pública e outros valores, o que autorizaria neste caso, ante o conflito entre liberdades e direitos fundamentais, restrições ou violações justas e legítimas a determinados direitos fundamentais da pessoa que será presa. Segundo, se consideraria que nas situações de prisão há sempre uma presunção de risco, logo a dignidade da pessoa humana de todos os envolvidos estaria sempre em risco. A única maneira de se assegurar todas as liberdades, e consequentemente a dignidade de todas as pessoas envolvidas seria a aplicação de algemas. Desta forma, a questão de o preso ter ferida a sua dignidade seria examinada no cotejo com as demais liberdades feridas ao se praticar um crime, sendo portanto legítima esta violação de seu direito de ir e vir para assegurar tantas outras liberdades e a dignidade de outros tantos. E ao se considerar legítima esta violação do direito de ir e vir dos presos temos que as algemas são um minus em relação a este status, e não um  plus, servindo para assegurar a todos que não terão riscos a sua integridade física e assegurar ao Estado que a prisão e o transporte do preso será realmente efetivada sem percalços.

Nesses termos, os demais direitos fundamentais dos presos não seriam violados, ou seja, o preso não seria vítima de tortura, de tratamento desumano ou cruel, muito menos de uma injusta violação de sua integridade física e moral e nem teria exacerbada sua condição de preso com conseqüências físicas e mentais. A sua dignidade passaria a ser dentro de uma condição de preso, de não ser indevidamente exposto a mídia, de não ser agredido física ou verbalmente, de ter instalações prisionais adequadas e assim por diante.

Quanto ao aspecto da igualdade, numa ótica essencialmente equitativa as algemas deveriam ser para todos, indistintamente. Dentro da perspectiva do princípio da diferença, uma desigualdade somente será legítima se levar a um benefício de todos. E não há como se vislumbrar um benefício de todos ao se permitir uma utilização seletiva das algemas, seja com que critério for. A distribuição aqui passa a ser injusta e leva ao que se presencia diariamente nos jornais escritos ou televisivos, que é o fato de se algemar presos das camadas sociais mais pobres enquanto presos de colarinho branco são “conduzidos” sem algemas.

Mantendo-se a linha adotada neste trabalho de não se discutir aspectos políticos desta decisão, mas sim sua fundamentação e conclusão ante a teoria de Rawls, parece certo que os ministros do STF se utilizaram do intuicionismo para justificar seus votos. Ou seja, ante a inexistência de regras objetivas para aplicação e priorização de princípios foi utilizada a intuição para fundamentar e decidir essa questão. Não há nem que se falar em utilitarismo, pois não se enxerga uma maximização de felicidade geral na decisão tomada. Certamente se o caminho levado a cabo para decidir tal tema fosse dentro da concepção ralwsiana o resultado seria outro, mais coerente e devidamente fundamentado.

Outro aspecto interessante revelado por esta decisão reside justamente na crítica comunitarista sobre a defesa liberal dos direitos individuais, que tem forte prevalência sobre outros interesses fundamentais universais e incondicionais, levando a uma excessiva judicialização e prevalência dos direitos individuais fundamentais.

A proposta liberal, fundada principalmente na autonomia da vontade do indivíduo, um indivíduo com capacidade de escolha, onde o eu antecede os fins, recebeu diversas críticas de autores comunitaristas. Charles Taylor, em texto datado de 1975 e posteriormente em livro editado em 1979, contrapôs as idéias de Kant, base de boa parte da teoria liberal, inspirado em Hegel, para quem o indivíduo só existe em sociedade, diferenciando o conceito de sittlichkeit, que seria o lugar onde fato e valor estão juntos, na comunidade, sendo possível avaliar o valor do fato, de moralität, que é algo que esta no vir a ser, baseado na vontade do indivíduo, universalizável (TAYLOR, 1975, p.177-178). E se se admite que o ser humano é um ser social, a sociedade não é uma criação dele, mas antes ele é criação da sociedade.

Michael Sandel também elabora forte crítica contra o pressuposto liberal de Rawls de que as pessoas escolhem seus fins. Esta crítica não é formulada diretamente contra os pressupostos da teoria de Rawls, mas sim contra o sujeito que Rawls propõe, com capacidade de eleger seus fins embora sem uma concepção de bem. Na visão de Sandel a justiça não é independente do bem, mas decorre dele (SANDEL, 2005, 09-15). Dessa forma os fins, considerados teleológicos, pois os sujeitos estão necessariamente no mundo, são essenciais aos sujeitos, e não acessórios. A visão liberal, dentro desta crítica de Sandel, está minada, pois pressupõe uma sociedade com a qual ela não consegue lidar, o que de certa forma explica a multiplicação de direitos individuais e o controle sobre o Estado, que resta enfraquecido frente ao indivíduo e sua proteção.

Voltando a Taylor, a concepção liberal levaria ao que foi caracterizado como atomismo, descrito como algumas doutrinas contratuais do século XVIII, segundo as quais a sociedade seria um agregado de indivíduos cada qual se guiando por sua concepção e objetivos pessoais. Há nesta doutrina uma prioridade dos indivíduos e seus direitos sobre questões sociais e a própria comunidade (TAYLOR, 1979, p.29-50), havendo forte prevalência dos direitos fundamentais sobre os princípios de obrigações e pertencimento a uma sociedade e sobre a obediência a autoridade.

Interessante o registro da avaliação das principais críticas comunitaristas aos liberais feita pelo autor liberal Allen E. Buchanan, que cita a negligência da comunidade na vida humana, a não valorização de uma efetiva vida política na comunidade, a incapacidade de narrar certos compromissos ou obrigações que não escolhidas, mas sim derivadas da comunidade, uma defeituosa concepção do ser ao negar que parte de sua concepção derivam de compromissos e valores da comunidade, e finalmente a exaltação da justiça como a primeira virtude, uma vez que ela é na verdade um remédio necessário quando as mais altas virtudes da comunidade são rompidas (BUCHANAN, 1989, p.853). Segundo a descrição deste autor acerca das críticas comunitaristas, o liberalismo não consegue escapar da necessidade de justificação, tendo como principal tese política a imposição de direitos fundamentais individuais, permitindo aos indivíduos buscar sua própria concepção de bem e virtude (BUCHANAN, p.854). Embora tais críticas sejam rebatidas dentro de sua ótica liberal, após minuciosa análise do tema sua conclusão acaba sendo no sentido de que o liberalismo pode encampar parte das críticas comunitaristas, especialmente da importância da comunidade e o seu bem-estar e fins comuns.

Esta faceta da concepção liberal, dentro dessas críticas comunitaristas, leva inevitavelmente ao extremo a defesa dos direitos fundamentais, com sacrifício de outros direitos e valores da própria sociedade. As próprias constituições dos Estados liberais, estejam elas contidas em documentos formais ou não, contendo extenso rol de direitos fundamentais enunciados ou simples previsão genérica dos mesmos, tem sido, especialmente no Brasil, levadas a interpretações amplas, limitando e tolindo de diversas maneiras o Estado e a sua autoridade. Evidentemente que não se podem negar os avanços e conquistas da própria concepção liberal em limitar um Estado absolutista e acima da lei, especialmente estabelecendo as liberdades civis e a afirmação dos direitos fundamentais individuais tão caros a qualquer democracia, quanto mais aquelas que estão em processo de afirmação e solidificação. Trata-se na verdade de fazer uma análise e interpretação que considere os valores advindos da sociedade e determinados direitos da coletividade num mesmo patamar que os direitos individuais. Esta sociedade clama, no nosso caso, por uma justiça eficiente, célere e fundamentalmente igualitária no aspecto distributivo de todos seus institutos.     

No caso da decisão examinada fica patente uma visão muito próxima do atomismo, exacerbando a concepção liberal de proteção aos direitos fundamentais individuais, desprezando valores e liberdades que afetam a comunidade/sociedade como um todo. E o mais interessante é que se utilizada uma concepção rawlsiana de justiça o resultado seria outro, muito mais próximo de se observar esta crítica comunitarista.


V – CONCLUSÃO

O processo natural de acomodação de uma democracia jovem como a nossa implica certamente amplos debates e questionamentos sobre instituições, política e as relações Estado X instituições X direitos fundamentais, e desses com a sociedade. As decisões judiciais, especialmente aquelas que transcendem das relações intra-partes, são essenciais nesse processo, assim como levar em consideração a própria sociedade.

Se na concepção liberal que pretensamente é adotada no Brasil há uma prevalência dos direitos fundamentais, é necessário balizá-los dentro de uma concepção de justiça que considere, com critérios, as liberdades e a igualdade. Rawls oferece tais critérios, que podem não ser os melhores e não são os únicos, mas certamente são melhores que critérios puramente intuicionistas, largamente utilizados nas fundamentações de decisões importantes.

Essencialmente é preciso considerar que a sociedade tem valores que coincidem com as liberdades expressas na Constituição, a exemplo da segurança pública e paz social. E tais valores não podem ser desprezados em nome dos direitos fundamentais individuais pura e simplesmente, mas devem sim ser objeto de criterioso cotejo e diálogo, uma vez que fazem parte de um sistema, de um todo composto por Estado, sociedade e indivíduos.

A decisão examinada careceu de critérios claros e de fundamentação coerente com alguma concepção de justiça, tendo de fato decorrido de um intuicionismo com prevalência absoluta de direitos fundamentais individuais, com prejuízo de outras liberdades e valores que não mereciam, nesta hipótese, terem sido desprezados sem sequer serem analisados. Talvez se tais valores fossem efetivamente considerados uma situação desta natureza não teria sido levada ao judiciário, ou pelo menos seria tratada em algum caso específico, dentro de outras circunstâncias.

Ao se exarcebar e conceder uma interpretação extremamente elástica e sem a devida fundamentação a direitos individuais fundamentais o STF abre precedente perigoso para o próprio Estado, que se enfraquece a cada dia, confundindo-se as liberdades originais contra o Estado tirano, formidável conquista iluminista e liberal, com o império do indivíduo lastreado em direitos fundamentais individuais. Tal fato pode levar a uma judicialização sem precedentes de questões, colocando em risco a estrutura estatal e valores coletivos.

Permanece mais atual que nunca o alerta feito por MacIntyre em sua obra After Virtue, de que a justiça como primeira virtude tal como proposto por Aristóteles carece de que haja acordo prático quanto a uma concepção de justiça e uma necessária base em termos de comunidade política, sem o que fica ameaçada a própria sociedade (MACINTYRE, 2001, p.409).


BIBLIOGRAFIA

BRASIL. (2008), Supremo Tribunal Federal. DJe n.º214/2008. Disponível em http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/jurisprudenciaSumulaVinculante/anexo/DJE_11.11.2008.pdf, acessado em 15.06.2011.

BUCHANAN. Allen E. (1989), “Assessing the Communitarian Critique of Liberalism.” Ethics 99, n.º 4: 852-82.

GARGARELLA. Roberto. (2008), As Teorias da Justiça Depois de Rawls: Um Breve Manual de Filosofia Política. Martins Fontes, São Paulo, 1ª Edição.

MACINTYRE. Alasdair. (2001), Depois da Virtude. EDUSC, Bauru/SP, 2ª Edição.

RAWLS. John. (2008) Uma Teoria da Justiça. Martins Fontes, São Paulo, 3ª Edição.

SANDEL. Michael J. (2005), O Liberalismo e os Limites da Justiça. Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, 2ª Edição.

TAYLOR, Charles. (1992)"Atomism." In Communitarianism and Individualism, edited by Shlomo Avineri and Avner De-Shalit, 29-50. Oxford [England] ; New York: Oxford University Press._______________. (1984), "Hegel: History and Politics." In Liberalism and Its Critics, edited by Michael J. Sandel, 177-99. New York: New York University Press. 

WOLFF. Jonathan. (2004), Introdução a Filosofia Política. Gradiva, Lisboa, 1ª Edição.


Notas

[2] Vide http://www.conjur.com.br/2008-ago-21/sumula_vinculante_11_supremo_inconstitucional,  http://jus.com.br/revista/texto/11615/sumula-vinculante-no-11 e http://www.polmil.sp.gov.br/unidades/apmbb/pdf/artigo_7.pdf

[3] Vide http://www.conjur.com.br/2008-out-07/advogados_sp_criticam_abusos_operacoes_policiais e http://www.migalhas.com.br/Quentes/17,MI104137,91041-Entrevista+de+Gilmar+Mendes+a+Folha+de+S.Paulo+gera+polemica+e+reacao

[4] Em 2006 o um dos Conselheiros do Tribunal de Contas do Estado de Rondônia foi preso durante a denominada Operação “Dominó” da Polícia Federal e trazido para Brasília a fim de ser ouvido no Superior Tribunal de Justiça. O habeas corpus impetrado visava impedir que este preso fosse conduzido algemado da Superintendência da Polícia Federal no Distrito Federal até a sede do STJ, ao argumento de que o uso de algemas é excepcional e somente caberia nos casos de risco de fuga ou risco a integridade física do preso, dos policiais ou terceiros. 

[5] Sobre esta questão do uso de algemas em presos durante a sessão do Tribunal do Júri, já há muito tempo que se discutia essa necessidade das algemas, refutada pelo STF ante os mesmos direitos e garantias fundamentais invocados para a questão genérica da aplicação das algemas, e com base também no argumento de que o fato de o réu estar algemado passaria a impressão para o juiz leigo, no caso o jurado, de culpa do acusado, com prejuízo ao seu direito de defesa.

[6] Entre os anos de 2002 e 2009 a Polícia Federal, adotando novas tecnologias, métodos, equipamentos e estratégia de atuação, realizou mais de 1.000 operações de grande porte, segundo a própria PF (fonte: http://www7.pf.gov.br/DCS/). A grande maioria dessas operações foi direcionada a combate a corrupção, fraudes em licitações, lavagem de dinheiro, crimes financeiros, e outros correlatos, atingindo agentes públicos e políticos, além de grandes empresários e personalidades conhecidas do grande público. A repercussão foi imensa, gerando apoio e críticas contundentes e acaloradas.

[7] Esta crítica do Ministro Menezes Direito foi feita em diretamente em relação a denominada Operação Satiagraha, deflagrada em julho de 2008 na cidade de São Paulo/SP, tendo sido presos banqueiros, diretores de bancos e investidores. O então presidente do STF, Ministro Gilmar Mendes, expediu habeas corpus para os presos, o que gerou nova ordem de prisão pelo juiz de primeira instância a pedido do Delegado Protógenes Queiroz. Tal fato, aliado a aplicação de algemas e exposição na mídia dos presos desta operação, acelerou os debates no STF, que logo em seguida expediu a Súmula Vinculante n.º11.


Autor

  • Disney Rosseti

    Disney Rosseti

    Mestrando em Direito e Política Públicas pelo UniCEUB, foi Diretor da Academia Nacional de Polícia e Superintende da Polícia Federal no Distrito Federal. É professor de Inteligência Policial na Escola Superior de Polícia da Academia Nacional de Polícia. Delegado de Polícia Federal

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROSSETI, Disney. A Súmula Vinculante nº 11 do STF: uma visão à luz da teoria da justiça de Rawls. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3398, 20 out. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22836. Acesso em: 28 mar. 2024.