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O início das concessões portuárias no Brasil

O início das concessões portuárias no Brasil

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Estuda-se o início do movimento de concessões portuárias no Brasil, com enfoque nos primeiros leilões do setor realizados para terminais do Porto Organizado de Santos/SP.

Introdução

Historicamente os portos se apresentam como fator relevante para o desenvolvimento econômico dos países, na medida em que desempenham função estratégica nas relações comerciais internas e internacionais.[1]

Aproximadamente 90% (noventa por cento) das exportações brasileiras são realizadas por meio marítimo, o que denota a importância de estruturação jurídica para o crescimento do setor nacional.[2]

O presente texto aborda, em detalhes, o início do movimento de concessões portuárias no Brasil, com enfoque nos primeiros leilões do setor realizados para terminais do Porto Organizado de Santos/SP.

Será conferida ênfase ao novo arcabouço jurídico do Setor Portuário Nacional, à fiscalização concomitante pelo Tribunal de Contas da União, ao acompanhamento dos primeiros leilões, aos valores de investimentos e resultados para o Brasil, assim como ao cenário de segurança jurídica para os investidores.


1. Do novo arcabouço jurídico do Setor Portuário Nacional

Em junho de 2013 foi instituído o novo marco regulatório do Setor Portuário Nacional, com a edição da Lei nº 12.815, de 5 de junho de 2013, assim como de seu regulamento, o Decreto nº 8.033, de 27 de junho de 2013.

Esse modelo institucional do setor portuário, ao transferir a titularidade de Poder Concedente da Agência Nacional de Transportes Aquaviários – ANTAQ para a Secretaria de Portos da Presidência da República – SEP/PR, promoveu equilíbrio entre as atribuições técnicas – que devem ser exercidas por entidade regulatória setorial – e as atribuições políticas – a serem desempenhadas por órgão de governo.[3]

O ingresso desse arcabouço jurídico no ordenamento introduziu novas regras para a exploração de arrendamentos portuários, com o primado de expansão e modernização da infraestrutura portuária brasileira mediante ampliação na movimentação de cargas e redução de custos logísticos.


2. Da fiscalização concomitante pelo Tribunal de Contas da União

Conforme dispõe a Instrução Normativa nº 27/1998[4], do Tribunal de Contas da União – TCU, o processo de outorga das concessões portuárias deve ser fiscalizado pela Corte prévia e concomitantemente, em quatro estágios.

O primeiro é relativo aos Estudos de Viabilidade Técnica, Econômica e Ambiental. O segundo estágio é concernente à realização de pré-qualificação, análise das minutas dos editais de licitação e contratos, considerando, inclusive, as impugnações e devidas respostas.

O terceiro visa acompanhar a abertura, o julgamento e o encerramento dos certames, ao passo que o quarto e último cuida da fiscalização do ato de outorga e da assinatura do contrato.

Por meio do Acórdão nº 2.413/2015 – Plenário, o mais recente, a Corte de Contas considerou que não foram detectadas irregularidades ou impropriedades que obstassem o prosseguimento do processo concessório do Bloco 1, Fase 1, avaliando como cumpridas as determinações dos acórdãos anteriores.[5]


3. dos primeiros leilões de arrendamentos portuários no Brasil

Equipe de Jacoby Fernandes & Reolon Advogados acompanhou os primeiros leilões de terminais portuários realizados em 09.12.2015.

As licitações foram promovidas em conjunto pela Secretaria de Portos, pelo Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão e pela ANTAQ, com o auxílio da BM&FBOVESPA.

Foram ofertadas três áreas e infraestruturas componentes do Bloco 1, 1ª Fase, do Programa de Arrendamentos Portuários, no Porto de Santos/SP:

  1. arrendamento de área localizada no corredor de exportação do Porto de Santos, no bairro Ponta da Praia (STS04), para granéis sólidos vegetais;
  2. arrendamento de novo terminal na região de Macuco (STS07), para papel e celulose; e
  3. arrendamento de novo terminal a ser instalado no bairro de Paquetá (STS 36), para papel e celulose.

Os interessados em participar dos leilões tiveram que entregar previamente documentos em três volumes, com declarações preliminares, documentos de representação, garantia de proposta, proposta de arrendamento e documentos de habilitação.

A participação dos licitantes na sessão pública dos leilões foi realizada mediante corretora credenciada, para intermediação entre a BM&FBOVESPA e os representantes legais de cada proponente.

A sessão pública foi procedida de forma individualizada por leilão, tendo início com a abertura dos envelopes que continham as propostas escritas. Havendo mais de duas propostas iniciais, passou-se à fase de propostas à viva voz.

Após encerramento da fase de lances, foram consideradas vencedoras as proponentes que apresentaram o maior valor de outorga. Declarado o resultado da sessão, serão examinados os documentos de habilitação das proponentes vencedoras pela Comissão Especial de Licitação. Cumpridos todos os requisitos editalícios, poderão ser firmados os contratos correspondentes.

3.1. Do Leilão nº 01/2015 – Ponta da Praia (STS 04)

Duas licitantes participaram do Leilão nº 03/2015, referente ao terminal localizado na Ponta da Praia (STS 04).

O Consórcio LDC Brasil-BSL[6], representado pela corretora Ágora, ofereceu valor inicial de outorga de R$ 303.069.333,18 (trezentos e três milhões, sessenta e nove mil, trezentos e trinta e três reais e dezoito centavos).

Já a empresa Agrovia S/A, representada pela corretora Fator, apresentou proposta inicial no valor de R$ 5.000.000,00 (cinco milhões de reais).

Em razão de existirem duas propostas iniciais, foi aberta a fase de propostas à viva voz. Como a empresa Agrovia não ofereceu lance, o Consórcio LDC Brasil-BSL sagrou-se vencedor pelo maior valor de outorga – R$ 303.069.333,18 (trezentos e três milhões, sessenta e nove mil, trezentos e trinta e três reais e dezoito centavos).

3.2. Do Leilão nº 03/2015 – Macuco (STS 07)

O Leilão nº 03/2015 foi realizado simultaneamente para os terminais de Macuco (STS 07) e Paquetá (STS 36).

Em relação ao terminal de Macuco (STS 07), duas empresas apresentaram propostas iniciais. A empresa Eldorado Brasil Celulose S/A, representada pela corretora Bradesco, ofereceu valor inicial de outorga de R$ 95.000.000,00 (noventa e cinco milhões de reais).

A empresa Fibria Celulose S/A, representada pela corretora Votorantim, ofereceu valor inicial da outorga de R$ 110.047.000,00 (cento e dez milhões e quarente e sete mil reais).

Em seguida, foi aberta a fase de propostas à viva voz. Após acirrada disputa de lances entre as licitantes, que perdurou dez rodadas, a empresa Fibria sagrou-se vencedora pelo maior valor de outorga de R$ 115.047.000,00 (cento e quinze milhões e quarenta e sete mil reais).

3.3. Do Leilão nº 03/2015 – Paquetá (STS 36)

Em relação ao terminal de Paquetá (STS36), somente a empresa Marimex Despachos, Transportes e Serviços Ltda. apresentou proposta inicial no valor de R$ 12.500.000,00 (doze milhões e quinhentos mil reais). Como somente houve uma oferta, não ocorreu fase de lances e a empresa foi declarada vencedora.

4. Dos valores de investimentos nos leilões e dos resultados para o Brasil

Os primeiros leilões de concessões portuárias no Brasil vão gerar investimentos para o setor na ordem de R$ 2,066 bilhões, distribuídos entre os cofres públicos, futuros arrendatários, a Companhia de Docas do Estado de São Paulo – CODESP e investimentos em infraestrutura.[7] Observe-se, em números, o resultado global dos leilões:

  1. Terminal Ponta da Praia (STS 04)

VALOR DO ARRECADAMENTO (pgto à Codesp) R$

INVESTIMENTO R$

VALOR DA OUTORGA R$

TOTAL

VENCEDOR

810.721.500

206.000.000

303.069.333,18

1.319.790.833,18

Consórcio LDC

  1. Terminal Macuco (STS 07):

VALOR DO ARRECADAMENTO (pgto à Codesp) R$

INVESTIMENTO R$

VALOR DA OUTORGA R$

TOTAL

VENCEDOR

169.083.300

155.000.000

115.047.000

439.130.300

Fibria Celulose

  1. Terminal Paquetá (STS 36)

VALOR DO ARRECADAMENTO (pgto à Codesp) R$

INVESTIMENTO R$

VALOR DA OUTORGA R$

TOTAL

VENCEDOR

47.976.600

247.000.000

12.500.000

307.476.600

Marimex Despachos

Atualmente existem 93 (noventa e três) áreas passíveis de arrendamento, que foram divididas em vários blocos. O Bloco 1 congrega 29 (vinte e nove) áreas, das quais 20 (vinte) no Pará e 9 (nove) em Santos. A expectativa é que esses terminais ensejem investimentos no patamar de R$ 4,7 bilhões.[8]


5. Da segurança jurídica para investidores

A questão da insegurança jurídica nos investimentos se afigura como um dos principais entraves para o desenvolvimento da atividade econômica no País, sobretudo nos setores de infraestrutura que demandam aportes financeiros de grande monta, com retorno de longo prazo.[9]

O novo marco regulatório do Setor Portuário Nacional foi projetado para conferir maior estabilidade e segurança jurídica para novos investimentos. Com a atuação conjunta da SEP/PR – política – e da ANTAQ – técnica –, preserva-se o equilíbrio de interesses dos agentes do setor portuário.[10]

Em confluência com o novo arcabouço jurídico, é importante evidenciar que a fiscalização prévia e concomitante do TCU sobre as variadas etapas dos arrendamentos portuários proporciona ainda maior segurança jurídica para os leilões. Com o aval da Corte de Contas, o risco de insucesso das licitações se mostra bastante reduzido.


Da conclusão

O procedimento dos leilões foi realizado com muita solidez pela Secretaria de Portos, pela ANTAQ e pelo Ministério do Planejamento, com o auxílio da BM&F Bovespa.

O resultado pode ser considerado bastante positivo para os primeiros leilões de arrendamento de terminais portuários na história do Brasil, com a projeção de investimentos no valor de R$ 2,066 bilhões.

Certamente está se formando um cenário de segurança e estabilidade com o condão de atrair, cada vez mais, investimentos para o setor portuário brasileiro.

A tendência é que nos próximos leilões haja aumento progressivo da competitividade e, por conseguinte, do grau de investimentos. Está sendo trilhado o caminho de fortalecimento do setor portuário, como fator relevante para o desenvolvimento econômico nacional.


Notas

[1] CASTRO JUNIOR, Osvaldo Agripino de; PASOLD, Cesar Luiz (Coord.). Direito Portuário, regulatório e desenvolvimento. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2011, p. 38.

[2] JUNIOR, Osvaldo Agripino de Castro; CAPRARO, Milene Corrêa Zerek. Comentários acerca do novo marco regulatório dos portos brasileiros. Revista Eletrônica Direito e Política, Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu em Ciência Jurídica da UNIVALI, Itajaí, v.9, n.1, 1º quadrimestre de 2014. Disponível em: <www.univali.br/direitoepolitica>. Acesso em: 11 dez. 2015.

[3] MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo; FREITAS, Rafael Vérias de; A nova regulação portuária. Belo Horizonte: Fórum, 2015. p. 34.

[4] BRASIL. Tribunal de Contas da União. Instrução Normativa nº 27, de 02 de dezembro de 1998. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 07 dez. 1998. Art. 7.

[5] BRASIL. Tribunal de Contas da União. Processo nº 029.083/2013-3. Acórdão nº 3.661/2013 – Plenário. Relatora: Ministra Ana Arraes. Brasília, 10 de dezembro de 2013. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 13 dez. 2013; BRASIL. Tribunal de Contas da União. Processo nº 004.440/2014-5. Acórdão nº 1.555/2014 – Plenário. Relatora: Ministra Ana Arraes. Brasília, 11 de junho de 2014. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 25 jun. 2014; BRASIL. Tribunal de Contas da União. Processo nº 029.083/2013-3. Acórdão nº 1.077/2015 – Plenário. Relator: Ministro Aroldo Cedraz. Brasília, 06 de maio de 2015. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 15 maio 2015.

[6] Consórcio LDC Brasil, formado pelas tradings Louis Dreyfus e Cargill.

[7]  Disponível em: <http://www.portosdobrasil.gov.br/home-1/noticias/leilao-garante-r-2-066-bilhoes-para-o-setor-portuario>. Acesso em: 09 dez. 2015.

[8] Disponível em: <http://www.portosdobrasil.gov.br/home-1/noticias/governo-comeca-processo-de-concessao-de-areas-portuarias>. Acesso em: 08 dez. 2015.

[9] AGRIPINO, OSVALDO. Direito regulatório e inovação na regulação de transportes e portos nos Estados Unidos e no Brasil. Florianópolis: Conceito Editoria, 2009, p. 39.

[10] MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo; FREITAS, Rafael Vérias de; A nova regulação portuária. Belo Horizonte: Fórum, 2015, p. 35.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SCHOLZE, Victor. O início das concessões portuárias no Brasil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4551, 17 dez. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/45372. Acesso em: 25 abr. 2024.