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Teoria da Norma Jurídica - Norberto Bobbio

Resumo do livro

Teoria da Norma Jurídica - Norberto Bobbio. Resumo do livro

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BOBBIO, Norberto. Teoria Geral do Direito. Tradução Denise Agostinetti; 3ª ed. - São Paulo: Martins Fontes, 2010.

Capítulo I – O direito como regra de conduta

O autor inicia o capítulo informando ao leitor sobre a perspectiva da sua obra, que é a perspectiva normativista, de inspiração kelseniana. Isto significa reconhecer o caráter normativo da própria existência humana, coletiva e individualmente. Ao reconhecê-lo, a perspectiva normativista elege como objeto de sua análise as regras de conduta de uma determinada sociedade, isto é, suas normas.

Importante destacar que a atividade normativa humana não se restringe à norma jurídica estatal. Aliás, ressalta o autor que a concepção estrita do direito como o direito estatal está vinculada a um movimento histórico específico. Trata-se do “processo de centralização do poder normativo e coativo que caracterizou o surgimento do Estado nacional moderno” (BOBBIO, p. 23). Neste sentido, quando identificamos restritivamente o direito como o sistema jurídico estatal, estamos reproduzindo o ponto de vista que o próprio Estado tem de si mesmo e da experiência normativa humana.

Para ilustrar melhor este ponto, é proveitoso comparar a sociedade medieval à sociedade moderna (p. 23):

  • Sociedade medieval: Tem como característica o pluralismo jurídico, de modo que ela era “formada por vários ordenamentos jurídicos, que se opunham ou se integravam: havia ordenamentos jurídicos universais [...] como a Igreja ou o Império; e havia ordenamentos particulares abaixo da sociedade nacional, como os feudos, as corporações e as comunas. Mesmo a família, considerada na tradição do pensamento cristão como uma societas naturalis, era um ordenamento à parte”.
  • Sociedade moderna: Tendo como ente político principal o Estado, a sociedade moderna “formou-se por meio da eliminação ou da absorção dos ordenamentos jurídicos superiores e inferiores à sociedade nacional, mediante um processo que poderia ser chamado de monopolização da produção jurídica”.

Em tempo, salienta o autor, a polêmica entre as teorias monistas e pluralistas é um problema de semântica e não de ideologia. Enquanto a corrente monista emprega o termo “direito” em seu significado mais restrito (“direito = lei”), a pluralista empresta ao significante “direito” um significado mais amplo, tratando como “direito” as manifestações normativas produzidas por outros grupos sociais que não o Estado (p. 25).

                          

Capítulo II – Justiça, validade e eficácia

O título do capítulo faz menção aos três critérios de valoração da norma jurídica. Tais critérios são independentes entre si, e representam três ângulos, i. e. três perspectivas pelas quais é possível atribuir valor à norma jurídica.

Assim, diante de uma norma jurídica qualquer, podemos nos perguntar:

  1. Se ela é justa ou injusta = “O problema da justiça é o problema da correspondência ou não da norma aos valores últimos que inspiram determinado ordenamento jurídico” (p. 37). Com isso, Bobbio se afasta do afã de eleger quais são esses valores últimos, atendo-se ao fato de que “todo ordenamento jurídico persegue determinados fins”, e concluindo que o problema da justiça/injustiça da norma é um problema moral, deontológico (Deontologia = ciência do dever, ou seja, tem ligação com a filosofia moral [obs: este termo foi usado pela primeira vez por Bentham]). O problema moral, como se sabe, é do plano do dever-ser.

  1. Se é válida ou inválida = Enquanto o binômio justiça/injustiça diz respeito a um juízo moral, de valor, a questão da validade da norma jurídica faz um juízo de fato (pode-se dizer que faz um juízo empírico-racional), buscando descobrir se determinada regra se constitui como regra jurídica “de verdade”. O juízo que determina a validade/invalidade da norma se dá em três eixos:

2.1.) Investigar se a autoridade que criou a regra tinha o poder legítimo para emanar normas jurídicas, ou seja, se essa autoridade tinha legitimidade para legislar.

2.2.) Verificar a compatibilidade da norma com o ordenamento (seguindo a teoria da hierarquia das leis de Kelsen);

2.3.) Verificar se ela não foi ab-rogada posteriormente, ou seja, se ela não perdeu sua validade por força de uma nova lei hierarquicamente superior.

  1. Se ela é eficaz ou ineficaz = A exemplo do que ocorre no Brasil, onde se tem leis “que pegam” e leis “que não pegam”, sabe-se que o fato de uma norma jurídica existir não é suficiente para afirmar que ela é seguida. Logo, o problema da eficácia da norma também é um problema empírico, do plano do ser, uma vez que é verificável factualmente, ou melhor dizendo: fenomenologicamente. Ainda, pode-se dizer que se trata de um problema sociológico, já que cabe indagar-se sobre a dinâmica social que faz com que certas normas sejam seguidas universal e espontaneamente, enquanto outras são seguidas apenas quando acompanhadas de coação, e enquanto outras são burladas apesar da coação (ou sem ela).

Ora, a maneira pela qual o jurista procura equilibrar esses três binômios é capaz de revelar a sua posição jusfilosófica, senão vejamos:

  • Jusnaturalismo: As correntes jusnaturalistas têm em comum a intenção de priorizar o problema da justiça/injustiça em detrimento da validade/invalidade e da eficácia/ineficácia. Os defensores do direito natural insistem no caráter universal de determinados direitos, subordinando a validade e a eficácia da norma jurídica a algum valor ético/moral considerado “natural[1]”, universal.  

  • Positivismo jurídico: Sabendo que esta corrente tem na norma jurídica estatal o núcleo do seu objeto de estudo, é fácil perceber que o juspositivismo confere primazia ao binômio validade/invalidade. No entanto, é importante destacar algumas nuances no interior desta escola de pensamento:

  • : “quando Kelsen afirma que o que constitui o direito como tal é a validade, ele não quer absolutamente afirmar, ao mesmo tempo, que o direito válido também é justo” (p. 51). O que Kelsen quer, ao dar primazia ao problema da validade da norma, é justamente separar o problema estritamente jurídico do problema do valor “justiça”, de ordem ética/moral.

Thomas Hobbes: Pode ser considerado um juspositivista estrito, já que, para ele, o direito válido é necessariamente justo. Ou seja, o valor “justiça” de uma norma, para Hobbes, deriva da sua validade. Em outras palavras: se uma autoridade baixar uma lei, ela é necessariamente justa. Para entender o radicalismo hobbesiano, é necessário observar que ele propõe uma ruptura com o jusnaturalismo em alguns pontos fundamentais: embora ele não rejeite a existência de Deus - e, portanto, de valores naturais ou universais-, ele trabalha o direito, a ética e a moral humanas enquanto mera convenção. Em outras palavras, Hobbes concebe a norma jurídica a partir do critério da validade, exclusivamente. Ao reduzir a norma jurídica a uma convenção, é possível concluir que, se o justo é uma mera arbitrariedade, basta alguém convencionar algo para que esse algo se torne justo, ou, melhor dizendo, é até necessário que haja um Leviatã que imponha à força certas convenções, com o fim de garantir a ordem e a paz social. Em suma, Hobbes equipara o valor JUSTIÇA = FORÇA BRUTA do monarca, a partir da seguinte causalidade: O Leviatã prescreve uma conduta (força / vontade arbitrária / poder) à ela se torna válida, já que emanada por autoridade competente (validade) à Sendo válida, ela também será justa, já que o problema justiça/injustiça, em Hobbes, está subordinado apenas à validade.

  • : Embora a doutrina política de Thomas Hobbes caminhe para o positivismo estrito (como afirmado por Bobbio), pode-se dizer que ele parte de um certo jusnaturalismo que pressupõe Deus, mas aparentemente essa ideia é deixada de lado em nome da defesa ferrenha do absolutismo, que é uma expressão do positivismo estrito. (vide KELSEN. O que é justiça. São Paulo: Martins Fontes, 2001, p. 138). Ou seja, seria equivocado afirmar que Hobbes rejeita completamente as premissas do jusnaturalismo (aparentemente, ele não as rejeita a priori, mas de fato ele as deixa de lado ao elaborar o seu juspositivismo).

  • Realismo jurídico ou Escola Histórica: Para Savigny e seu seguidor Friedrich Puchta, a fonte primária do direito não é nem o direito natural metafísico, nem a norma positiva válida. O fundamento do direito seria, então, o próprio povo, ou melhor, o espírito do povo (Volksgeist). A partir dessa premissa, a Escola Histórica irá alçar o direito consuetudinário à condição de fonte primária, dando maior importância a esta fonte. Sabe-se que a Escola histórica de Savigny irá influenciar os países anglo-saxões, os quais irão adotar o sistema da common law ao invés de abraçar o positivismo mais prolixo dos países latinos, estes afeitos das codificações. Ainda sobre a Escola Histórica, foi inspirada nela o Realismo Jurídico (ou Concepção Realista do Direito), fortemente inclinado às interpretações sociológicas do direito. Nos EUA a jurisprudência sociológica teve como seus maiores defensores o juiz Oliver Wendel Holmes e o filósofo Roscoe Pound. Obs: apenas para efeito didático sobre os três critérios de valoração da norma, podemos dizer que a Escola Histórica e seus rebentos elegem o problema da eficácia como problema principal, uma vez que a eficácia, como mencionado acima, é um problema sociológico, o que não significa dizer que seus adeptos eram defensores radicais do costume, como se o costume reiterado (eficácia) necessariamente se tornasse válido.

                          

Capítulo III – As proposições prescritivas

No início do capítulo, o autor reitera o ponto de vista que adotou para analisar o direito, que é o ponto de vista formal. Esta escolha implica em considerar a norma jurídica não no que concerne o seu conteúdo, mas no que diz respeito a sua estrutura. Assim, o objeto de estudo adotado será “a norma jurídica na sua estrutura lógico-linguística” (p. 61).

A partir daí, é necessário tecer algumas considerações sobre o que são proposições, seus tipos e o que (ou quais) desses tipos dizem respeito ao direito ou, mais precisamente, à norma jurídica.

à Proposição: termo que não é originário do direito, e sim da lógica. “Por proposição entendemos um conjunto de palavras que possuem um significado no seu todo” (p. 64). Outra maneira de dizê-lo: Proposição é todo conjunto de palavras ou símbolos que exprimem um pensamento de sentido completo. Portanto, se a frase não tem sentido lógico, não será proposição (p. ex., dizer “Lula é um número primo” não é proposição pois não faz sentido).

As proposições podem se dividir com base em 2 critérios distintos: 1) a forma gramatical e 2) a função (esta última mais importante ao estudo do direito).

A partir da forma gramatical, teremos proposições: a. Declarativas; b. Interrogativas; c. Imperativas; d. exclamativas.

De forma semelhante, temos, com base na função que assumem, as proposições:

  1. Asserções.                                Ex: Está chovendo.
  2. Perguntas.                                Ex: Está chovendo?
  3. Comandos.                               Ex: Leva o guarda-chuva.
  4. Exclamações.                            Ex: Como você está ensopado!

           

Atenção: embora sejam assaz semelhantes, os critérios funcional e gramatical não se confundem. São inúmeros os exemplos, como: x) Boa parte das normas jurídicas é escrita na forma gramatical de proposição declarativa. No entanto, em relação à sua função, trata-se de uma proposição de comando; y) Um pai, dirigindo-se ao filho, pode enunciar uma proposição interrogativa, como “você não acha que é hora de arrumar o seu quarto?”, a qual certamente será funcionalmente um comando.

Em paralelo às considerações sobre o que é uma proposição, que é uma questão do campo da lógica, é necessário passar para os fundamentos da linguística, antes de se analisar as “proposições prescritivas” que dão nome ao capítulo.

  • As três funções da linguagem:

  1. Função descritiva: consiste em dar informações, comunicar saberes ou notícias etc. É, por excelência, a função adotada pela linguagem científica, a qual busca descrever fenômenos, basicamente.
  2. Expressiva: Essa função visa a evidenciar sentimentos e a evocá-los nos outros. É a função predominante na linguagem poética.
  3. Prescritiva: É a função que enseja a linguagem normativa. A função prescritiva consiste em dar comandos, conselhos, recomendações, admoestações, pedidos ou súplicas, de modo a levar alguém a fazer algo.

  • : existem tipos de discurso que combinam duas ou mais dessas funções. Exemplos: a) Discurso comemorativo = função descritiva + função expressiva; b) Sermão = função prescritiva + expressiva; c) Contestação em ação judicial = Prescritiva (pede absolvição), descritiva (narra fatos) e expressiva (apela aos afetos do magistrado);

Obs 2: Enquanto as proposições descritivas são consideradas enquanto Verdadeiras ou Falsas – ou seja, são aceitas/rejeitadas conforme a correspondência aos fatos ou a uma demonstração lógica-, o critério para aceitar proposições prescritivas é de valor (moral/ético [justas] ou formal [válidas]). Nesta mesma esteira:

Para marcar essa diferença, diz-se que a verdade de uma proposição científica pode ser demonstrada, ao passo que se pode apenas tentar persuadir os outros sobre a justiça de uma norma (daí a diferença, que atualmente vem surgindo, entre lógica ou teoria da demonstração e retórica ou teoria da persuasão). (p. 74)

Obs 3: Conquanto óbvio, é importante lembrar que não se aplica o juízo de verdadeiro ou falso às proposições prescritivas. Por exemplo, não é possível afirmar se uma placa escrito “proibido pisar na grama” ou “pare” é V ou F.

Por fim, note-se que, agora, temos elementos para definir o que é uma “proposição prescritiva”: trata-se de um conjunto de palavras que exprime um sentido completo, sendo esse sentido uma prescrição, seja esta prescrição um comando (ordem), conselho, advertência ou um pedido.

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Imperativos autônomos e heterônomos

Dando sequência ao estudo das proposições prescritivas – e de sua relação com o direito -, Bobbio irá inventariar alguns binômios propostos por Kant, relativos às proposições prescritivas (as quais serão chamadas neste momento de “imperativos”, consoante a terminologia kantiana). Assim temos:

  1. Imperativos autônomos: São as prescrições que fazemos a nós mesmos, ou seja, são os imperativos morais. Para ser mais preciso, são aqueles imperativos em que a figura que estabelece a norma e a que a executa se confundem na mesma pessoa.
  2. Imperativos heterônomos: Inversamente, são aqueles imperativos criados por uma pessoa, para que sejam seguidos por outra pessoa. Kant afirma, em suma, que o direito se resolve em imperativos heterônomos, enquanto a moral se realiza a partir de imperativos autônomos.

Considera-se teoricamente que o Estado Democrático se funda no princípio da autonomia, uma vez que as leis seriam criadas – e deveriam ser cumpridas – pelos próprios cidadãos.

Empiricamente, considero mais seguro dizer que o Estado Democrático combina ambos os princípios, já que é cediço que a representatividade popular no interior do Estado se dá indiretamente, através da escolha de representantes.

    No entanto, Hans Kelsen, no compasso de Kant, estabelece uma relação menos empírica e mais conceitual sobre autonomia/heteronomia e política:

Estado autocrático = heteronomia.

Estado democrático = autonomia.

Imperativos categóricos e hipotéticos

Outro binômio que remonta a Kant é o dos imperativos categóricos e dos imperativos hipotéticos:

  1. Imperativos categóricos: são as normas éticas. Como elas são um fim em si mesmo – e não almejam um fim externo-, sua fórmula é: “Você deve X”. São, portanto, aqueles imperativos que prescrevem algo que é bom (valor) em si mesmo, que deve ser realizada incondicionalmente. Exemplo clássico: “Você não deve mentir”.
  2. Imperativos hipotéticos: são aqueles que prescrevem uma ação para alcançar um fim. Pode-se dizer que prescreve uma ação que não é boa em si mesma, que não tem dentro de si um valor, mas que tem valor se se quer alcançar um determinado fim. Ou seja, imperativos hipotéticos são realizados com a condição de se obter um certo fim. Fórmula: “Se você quer Y, deve X” (para norma técnica. Ex: “se você quer aprender a tocar piano, deve praticar regularmente”), ou “Uma vez que você deve Y, também deve X” (para norma pragmática. Ex: Uma vez que você quer atravessar a rua sem ser atropelado, deve olhar para os dois lados antes de atravessá-la).

Comandos e conselhos

Ao final do capítulo, o autor afirma que “nem todas as prescrições [...] dão lugar às obrigações. Existem modos mais brandos [...] de influir no comportamento alheio” (p. 88). Assim, o autor nos apresenta outros dois tipos de proposições prescritivas que são relevantes ao direito e que não se confundem com o comando: os conselhos e os pedidos.

O importante sobre eles é compreendê-los em comparação com o comando. Como se sabe, o comando é vinculante, ou seja, impõe uma obrigação a alguém. Os conselhos e os pedidos, no entanto, não são obrigatórios.

Neste sentido, o comando, por ser obrigatório, é capaz de eximir o comandado da responsabilidade, como no caso do “estrito cumprimento de um dever legal” – que é uma excludente de ilicitude-, ou da “obediência hierárquica” (excludente de culpabilidade), ambos presentes no direito penal brasileiro. Inversamente, “ninguém poderia se furtar às consequências da própria ação alegando como pretexto o fato de ter seguido um conselho” (p. 91), podendo-se dizer o mesmo a respeito de um conselho, um rogo ou uma súplica.

Obs: Os pareceres jurídicos, no que diz respeito à espécie de proposição prescritiva da qual se constituem, podem ser considerados como conselhos.

Capítulo IV - As prescrições e o direito

O presente capítulo expõe algumas das principais discussões jusfilosóficas acerca do caráter prescritivo/imperativo da norma jurídica.

Em suma, muito embora a teoria da imperatividade do direito tenha sido questionada sob diversos ângulos, é ponto pacífico que sim, a norma jurídica é ontologicamente uma prescrição, um imperativo.

Sobre as teorias críticas à imperatividade da norma, é possível separá-las em 2 grandes grupos: 1) as teorias negativas e 2) as teorias mistas.

As teorias negativas procuraram negar a natureza prescritiva da norma jurídica, buscando encontrar a especificidade da norma jurídica sob outras bases. Segundo Bobbio, todos falharam neste objetivo, embora tenham contribuído de alguma forma com a discussão.

As teorias mistas são aquelas que admitem a existência de proposições prescritivas em todo e qualquer ordenamento jurídico, mas negam que todas as normas sejam imperativos.

A mais antiga teoria mista estabeleceu a dicotomia normas imperativas x normas permissivas. Os ordenamentos jurídicos seriam compostos por esses 2 tipos distintos de normas, e não apenas por imperativos.

Para Bobbio, esta é uma falsa dicotomia, ou seja, tal distinção não procede. Ela é insustentável na medida em que, para o autor, direito (permissão) e dever (prescrição) são duas faces de uma mesma moeda.

Basta observar que a atribuição de um direito (subjetivo) e a imposição de um dever são momentos correlatos do mesmo processo: uma norma que impõe um dever a uma pessoa atribui ao mesmo tempo a outra pessoa o direito de exigir o seu cumprimento, assim como uma norma que atribui um direito impõe ao mesmo tempo a outros o dever de respeitar o seu livre exercício ou de permitir a sua execução. Em outras palavras, direito e dever são as duas faces da relação jurídica, sendo que uma não pode existir sem a outra. Dizer que o direito permite e não comanda significa [...] não se dar conta de que o direito só permite, uma vez que, ao mesmo tempo, também comanda. (BOBBIO, 2010, p. 117/118)

O autor prossegue na mesma linha de raciocínio, refutando a distinção mencionada:

Ora, a função das normas permissivas é a de fazer com que um imperativo deixe de existir em determinadas circunstâncias ou com referência a determinadas pessoas e, portanto, as normas permissivas pressupõem as normas imperativas. Se não se partisse do pressuposto da imperatividade, não haveria necessidade, em determinadas circunstâncias e em relação a determinadas pessoas, de fazer com que não existisse o imperativo, ou seja, de permitir. Onde não se pressupõe um sistema normativo imperativo, as ações permitidas são aquelas que não requerem nenhuma norma para ser reconhecidas, uma vez que vale o postulado de que “tudo o que não é proibido ou comandado é permitido”. (p. 118)

Sobre imperativos e permissões

Essa discussão acerca das normas permissivas x normas imperativas, ainda que refutada no que diz respeito à natureza da norma jurídica, redundou numa série de discussões posteriores, algumas das quais ainda têm relevo nos sistemas jurídicos hodiernos.

Pode-se estabelecer 3 esferas conceituais que decorrem desta relação entre permissão e obrigação: 1) esfera do proibido; 2) esfera do lícito; 3) esfera do comandado (obrigatório).

O estado de natureza corresponderia ao nº 2, à esfera do lícito, que é o mesmo que dizer: tudo é lícito. A passagem da natureza para a civilização dar-se-ia com a limitação da esfera do lícito, primeiro com o 1 (com proibições, ou normas negativas) e subsequentemente com o 3 (normas positivas).

É imprescindível destacar que a distinção entre a legalidade no direito público e no direito privado deriva da reflexão em torno dessas três esferas. Ou seja, vem daí o consenso atual de que, no direito público “só é legal o que for permitido” e no direito privado “tudo é legal, exceto o que for proibido”. Embora soe como uma distinção meramente didática, esses dois postulados têm incidência no direito positivo, já que, em caso de lacuna na lei, a exegese é feita com base neles (p. ex., se estamos falando de um ato praticado por funcionário público, devemos ponderar conforme o postulado sobre direito público, de modo que seu ato só será lícito se estiver previsto em alguma norma). àObs: Curioso que essa distinção foi feita, originalmente, para diferenciar o estado liberal - onde o legal = tudo o que não for proibido- do estado socialista (legal = só o que for permitido). Vide p. 123.

           

Capítulo V – As prescrições jurídicas

A partir da ideia da lei como proposição prescritiva, houve quem buscasse encontrar a especificidade da norma jurídica em sua forma. Ou seja, várias teorias tentaram encaixar a norma jurídica dentro de uma categoria sui generis de prescrição, uma definição que a distinguisse de outros imperativos como as normas morais, os costumes de uma sociedade etc.

Para Norberto Bobbio, o importante deste debate é conhecer os critérios que permitiram definir a norma jurídica sob múltiplos ângulos – bem como a crítica a esses critérios-, e não procurar eleger este ou aquele critério como absoluto. Em suas palavras, “O mundo jurídico pareceu-nos até agora muito mais articulado e complexo do que revelaram as várias tentativas de redução a esta ou àquela fórmula” (p. 138). Ainda,

O que aqui pretendemos evidenciar é: 1) os critérios [...] mencionados não são exclusivos, mas sim integrativos em relação um ao outro e, portanto, toda disputa no tocante à superioridade de um ou do outro é estéril; 2) em se tratando de dar uma definição de norma jurídica, e não de descobrir a essência do direito, cada um dos critérios não deve ser valorado como verdadeiro ou falso, mas como mais oportuno e menos oportuno, dependendo do contexto de problemas em que nos encontramos para dar essa definição e das finalidades que com essa definição são propostas. (p. 144)

Observadas essas considerações do autor, são 5 os critérios formais elencados:

  1. A especificidade da norma jurídica estaria no seu conteúdo, qual seja: regular relações entre duas ou mais pessoas, i. e. relações intersubjetivas. Embora soe correta, é difícil, a partir desta definição, distinguir as normas jurídicas das normas sociais (os costumes), uma vez que ambas têm por conteúdo relações intersubjetivas;
  2. Em resposta ao critério do conteúdo, temos o critério do fim, ou seja, do objetivo pretendido. Este objetivo seria a conservação da sociedade (em outras palavras, a manutenção da ordem social). Embora este critério sirva para enxergarmos que normas tornadas jurídicas são consideradas essenciais para a conservação da sociedade, ele não é capaz de definir a especificidade da norma jurídica, pois não é possível saber de modo unívoco as características que tornam uma lei essencial para a ordem social, dada a diversidade das experiências jurídicas de cada sociedade.
  3. Diante da insuficiência do critério do fim, estabelece-se o critério do sujeito que cria a norma, o poder soberano. A norma jurídica seria, em última instância, uma expressão de poder. É uma perspectiva aparentemente inspirada no Leviatã de Thomas Hobbes, podendo-se tecer sobre ela a mesma crítica ao positivismo estrito deste filósofo. Obs: esta tese sobre o direito será retomada no livro Teoria do ordenamento jurídico (BOBBIO, 2010, p. 191), como ponto de partida não sobre a norma considerada isoladamente, mas sobre o ordenamento jurídico enquanto sistema normativo dotado de eficácia reforçada (reforçada em função desse poder soberano).
  4. A reação oposta ao juspositivismo radical é a do jusnaturalismo, que associa a essência da norma jurídica aos valores em que o legislador se inspira para criá-la. O valor ‘justiça’ seria a especificidade da norma jurídica, portanto. O problema da concepção jusnaturalista é uma certa falta de rigor teórico, visto que os valores em geral e o próprio valor ‘justiça’ variam em cada localidade e em cada época histórica, bem como há divergências sobre o que é justo/injusto dentro de uma mesma sociedade.
  5. O quinto critério é de inspiração kantiana, e se baseia na natureza da obrigação. Ou seja, enquanto a moral se caracterizaria como imperativo categórico e autônomo, a especificidade da norma jurídica residiria em ser ela um imperativo hipotético e heterônomo. Ora, se é a heteronomia que define a norma jurídica, então ela confundir-se-ia com qualquer norma social, e se é a noção de ‘imperativo hipotético’, então seria impossível criar uma lei baseada num imperativo categórico, o que não condiz com a realidade empírica.

Um novo critério: a resposta à violação (= sanção)

Paralelamente à discussão de natureza formal, o autor apresenta este critério de caráter mais empírico, ao considerar a especificidade da norma jurídica a partir da natureza das sanções que a acompanham. Aqui também não se busca alçar este critério a critério absoluto ou definitivo.

Para estabelecer o que é uma sanção jurídica, Bobbio apresenta três definições:

  1. Sanção moral: É interna ao indivíduo (culpa, arrependimento etc). Baixíssima eficácia;
  2. Sanção social: Externa ao indivíduo. Porém, peca pela desorganização e desproporcionalidade. Além de ser facilmente evitável valendo-se do expediente da hipocrisia, é totalmente assistemática e dá azo a grandes injustiças em virtude da sua desproporcionalidade: um mesmo fato pode ser reprovado socialmente por meio de a) reprovação; b) isolamento/banimento/expulsão do grupo ou até mesmo c) linchamento.
  3. A sanção jurídica: resolveria o problema entre autonomia/heteronomia presente na sanção moral, e também das injustiças decorrentes da sanção social, por ser  institucionalizada. Ou seja, podemos definir a sanção jurídica como uma resposta externa e institucionalizada à violação da norma.

3.1.) São três as características da institucionalização da sanção:

3.1.1.) Para toda violação há uma respectiva sanção;

3.1.2.) A medida sanção é estabelecida dentro de certos limites.

3.1.3.) São definidas as pessoas encarregadas de executá-la (ou seja, não é qualquer um que tem o poder aplicar sanções, em regra nem mesmo próprio ofendido).

Atenção: Tutela é o nome que se dá para “o complicado processo da sanção organizada” (p. 154). Dentro disso, nota-se que a sanção jurídica, que é institucionalizada, é baseada na noção de heterotutela (o oposto de autotutela). Ao que o autor pontua:

O reconhecimento da vingança privada como sanção [...] instituto da autotutela; à medida que se reforça o poder central em um ordenamento [...] o sistema de heterotutela substitui pouco a pouco o da autotutela. Só o sistema de heterotutela garante, além da maior eficácia, também maior proporção entre o mal e a reparação e, portanto, satisfaz melhor algumas exigências fundamentais da vida em sociedade, dentre as quais a ordem [...] e sobretudo a igualdade de tratamento. (2010, p. 154, grifo nosso)

A adesão espontânea

Neste trecho, Bobbio vai analisar e refutar a tese da adesão espontânea. Esta tese se dá no seio da discussão ente jusfilósofos sancionistas x não sancionistas.

Os sancionistas são aqueles que consideram a coerção uma característica intrínseca ao direito, ao passo que os não sancionistas veem na coerção um mero elemento secundário ao direito, elemento este que só lhe diz respeito eventualmente, e não constitutivamente.

Uma das principais teses dos não sancionistas é a da adesão espontânea, segundo a qual o direito de uma sociedade, antes de ser ou de constituir um aparato sancionador, conta com a adesão tácita dos seus membros. Assim, a própria criação do aparato coercitivo é um ato de consenso e/ou de hábito entre esses indivíduos.

Um argumento mais metafísico é apresentado por Benedetto Croce, para quem o espírito humano é necessariamente livre, por definição incapaz de ser obrigado a algo com a qual não concorde. Neste sentido, se uma pessoa é ameaçada com uma faca a entregar seu dinheiro, o ato de entregar o dinheiro corresponde à própria liberdade dela – considerando que isto lhe é mais vantajoso. Ademais, diante da ameaça, a pessoa também seria livre para fugir ou reagir ao roubo.

Bobbio rechaça essa indistinção metafísica entre adesão espontânea (de verdade) e adesão forçada, na medida em que esta distinção está mais calcada na empiria, na experiência humana:

Se a adesão dada por consenso e aquela dada por força podem parecer indistintas para quem olha o problema preocupado com a liberdade do Espírito, parecem distintas, e claramente distintas, para quem se propõe o objetivo de estudar os meios com que o consenso é obtido e dele extrair elementos indicativos para caracterizar diversos tipos de ordenamentos normativos. (p. 158)

Por fim, o autor recorre a Kelsen para reafirmar a tese sancionista:

[...] a adesão espontânea acompanha a formação e a permanência de um ordenamento jurídico, mas não o caracteriza. A esse respeito Kelsen observa que: “Se o ordenamento social deixasse de ter no futuro o caráter de ordenamento coercitivo, se a sociedade existisse sem ‘direito’, então a diferença entre essa sociedade do futuro e aquela presente seria incomensuravelmente maior do que a diferença entre os Estados Unidos e a antiga Babilônia, ou entre a Suíça e a tribo dos Ashante”. (BOBBIO, 2010, p. 156, grifo nosso).

Normas sem sanção

A existência de normas sem sanção não é motivo suficiente para negar a natureza sancionadora/coercitiva do direito.

[...] quando falamos de uma sanção organizada como elemento constitutivo do direito, referimo-nos não às normas singulares, mas ao ordenamento normativo considerado no seu todo, razão pela qual dizer que a sanção organizada distingue o ordenamento jurídico de qualquer outro tipo de ordenamento não implica que todas as normas desse sistema sejam sancionadas, mas apenas que a maior parte o seja. Quando me coloco diante de uma norma singular e me pergunto se é ou não uma norma jurídica, o critério da juridicidade certamente não é a sanção, mas a pertinência ao sistema, ou seja, a validade [...]. A sanção diz respeito não à validade, mas à eficácia, e já vimos que uma norma individual pode ser válida sem ser eficaz (ver pp. 39 ss). (p. 159)

Ordenamentos sem sanção

Resolvida a controvérsia sobre as normas sem sanção, há o problema dos ordenamentos considerados sem sanção. O exemplo clássico dado pelos não sancionistas é o do direito internacional.

Bobbio discorda diametralmente deste modo de ver o direito internacional. Para demonstrar o caráter sancionador/coercitivo do direito internacional, o autor demonstra a sua origem (a guerra) e ao modo como se dá a sanção neste âmbito (se dá pela autotutela = represália, guerra declarada).

[...] o direito internacional nasceu junto com a regulamentação da guerra, isto é, com a consciência, por parte dos membros da comunidade estatal, da natureza sancionadora da guerra e, por conseguinte, da necessidade de demarcar seus limites com regras aceitas em comum acordo, ou seja, nasceu junto com a institucionalização da guerra enquanto sanção. [...] A violação de uma norma internacional por parte de um Estado constitui um ilícito. Acaso no ordenamento internacional um ilícito não implica alguma consequência? O que são a represália e, nos casos extremos, a guerra senão uma resposta à violação, ou seja, aquela resposta à violação que é possível e legítima naquela sociedade específica que é a sociedade dos Estados? (p. 164)

Concluindo:

Se existe uma diferença entre ordenamento internacional e outros ordenamentos, como, por exemplo, o ordenamento estatal, ela não reside na ausência de uma sanção regulada, mas, quando muito, apenas no modo com que é regulada. Então não se trata de uma diferença principal, mas secundária. Para compreender essa diferença quanto ao modo de exercício dessa sanção, temos de retomar a distinção feita na seção 42 entre autotutela e heterotutela [...]. Se consideramos, por exemplo, a represália como o exercício de uma sanção, não resta dúvida de que se trata de resposta à violação dada pelo mesmo Estado que sofreu as consequências de um ato ilícito por parte de outro Estado, ou seja, um ato de autotutela. Portanto, podemos dizer que em geral todo o ordenamento internacional, diferentemente daquele estatal, fundamenta-se no princípio da autotutela. (p. 165)

As normas em cadeia e o processo ao infinito

Esta é o último argumento não sancionista elencado no capítulo. Trata-se da seguinte objeção: se é verdade que uma norma só é jurídica se houver uma sanção prevista para ela (para o descumprimento dela), e se essa norma sancionadora também só existir em função de outra norma sancionadora, perceberemos que, na ponta dessa teia de leis, haverá alguma norma sem sanção, e será justamente uma norma fundamental, predecessora.

A essa objeção Bobbio faz duas considerações: 1) a tese sancionista diz respeito ao ordenamento como um todo, e não às normas consideradas singularmente, como mencionado anteriormente; 2) Não se trata de criar categorias metafísicas puras, de forma que, sim, um estado de direito também conterá elementos de coerção, assim como estados totalitários também contam, empiricamente, com algum grau de adesão. Portanto, o fato de existirem normas sem sanção na “ponta” do ordenamento não é capaz de negar, por si só, a tese sancionista.

Capítulo VI – Classificação das normas jurídicas

Normas gerais e singulares 

Em que pese a existência de inúmeros critérios de classificação da norma, o critério pertinente a este livro é o critério formal, que é aquele que diz respeito à estrutura lógica da norma, sabendo-se que, no âmbito da lógica, a norma corresponde a uma proposição prescritiva, como visto anteriormente.

A partir deste critério, é possível classificar as normas jurídicas em normas universais e normas singulares.

Toda proposição prescritiva é formada por 2 elementos: o 1) destinatário e 2) a ação prescrita. Tanto o destinatário-sujeito quanto a ação-objeto podem apresentar-se em uma norma jurídica, em forma universal ou singular.

Assim, teremos:

. Normas com destinatário universal: Ex1: art. 5º caput CF. “Todos são iguais [...]”

. Normas com destinatário singular: Ex2: Juiz manda réu juntar documento num processo.

. Normas com ação universal: Ex3: art. 1634 CC – “Compete a ambos os pais, qualquer que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar , que consiste em [...]”. Note-se que aqui, a ação não se exaure. O poder familiar se prolonga no tempo e se perpetua em todas as situações que o ensejarem.

. Normas com ação singular: Idem exemplo 2. Só muda a fundamentação: neste caso, a ação é singular pois, assim que o réu juntar o documento requisitado pelo juiz, o imperativo/prescrição perde a sua eficácia posto que consumado.

Generalidade e abstração

Convencionando que a universalidade em relação ao sujeito-destinatário seja chamada de “geral” e a universalidade relativa à ação objeto seja chamada de “abstrata”, e considerando a classificação da norma acima exposta (normas universais x singulares, em relação à ação prescrita ou aos destinatários da norma prescrita), temos 4 tipos de normas jurídicas:

  1. Normas gerais e abstratas: (a maior parte das leis é desse tipo).
  2. Normas gerais e concretas: Ex: Uma lei que preveja um plebiscito único numa determinada data.
  3. Normas individuais e abstratas: Ex: uma lei que atribui um cargo a um indivíduo.
  4. Normas individuais e concretas. Ex: sentença judicial.

Normas afirmativas e negativas

Trata-se aqui de mais uma distinção oriunda do campo da lógica. A partir das relações entre proposições descritivas, o autor deduz as relações entre as proposições prescritivas.

A respeito deste esquema sobre essas 4 diferentes proposições (sempre [x], nunca [x não], nem sempre [não x], nem nunca [não (x não)]), temos proposições cujas relações entre si, são:

à Contrárias: quando não podem ser ambas Verdadeiras, mas podem ser ambas Falsas;

à Subcontrárias: Quando podem ser ambas V, mas não podem ser ambas F;

à Contraditórias: Quando não podem ser ambas V nem ambas F. São mutuamente excludentes.

à Subalternas: Quando, da Verdade da primeira pode se deduzir a Verdade da segunda; ou, quando da Falsidade da segunda, pode-se deduzir a Falsidade da segunda.

Ainda, pode-se dizer que, entre duas proposições:

Contrárias = relação de incompatibilidade;

Subcontrárias = relação de disjunção;

Contraditórias = relação de alternativa (ou um ou outro é V);

Subalternas = relação de subordinação/implicação. Ex: o non omnis está contido no interior do nullus (logo, é subordinado ao nullus). Ou seja, a Verdade do nullus implica necessariamente na Verdade do non omnis, mas o non omnis não implica necessariamente no nullus. àObs: já o esquema a partir da Falsidade é o inverso, ou seja, aí é o nullus que está subordinado ao non omnis (p. 179).

           

Transpondo esta estrutura lógica para as proposições prescritivas, que são as que concernem ao direito, ao invés de afirmarmos descritivamente X (que corresponde ao “sempre”), afirmaremos prescritivamente O, uma Obrigação           

Ora, em se tratando de proposições prescritivas, constitutivas da norma jurídica como já visto, se se estabeleceu uma obrigação O, é necessário contemplar também a categoria da permissão, a qual chamaremos de P. A respeito disso:

  1. não (O não) = P                 à      Permitido fazer.
  2. Não O = P não      à    Permitido não fazer.

Normas categóricas e hipotéticas

Trata-se de mais uma distinção formal, cujos termos são usados em sua acepção kantiana.

Assim, temos: a) Normas categóricas = prescrições que devem ser seguidas incondicionalmente; b) normas hipotéticas = prescrições que devem ser seguidas, caso se verifique uma determinada condição.

Bobbio apresenta uma nomenclatura mais adequada e mais utilizada para estas duas categorias de normas:

Normas categóricas = obrigações simples;

Normas hipotéticas = obrigações condicionadas;

                                             


[1] Quanto ao que é “natural”, temos dois problemas: 1) O termo “natureza” não é usado de maneira unívoca, de modo que cada autor atribui a ela um significado muito particular, como o próprio Rousseau observou (p. 48/9); 2) Ainda que se encontre uma definição comum para o termo, é cediço atualmente que a moralidade é ontologicamente humana, não encontrando correspondente na natureza. Logo, não é possível extrair valores – humanos – do que é natural.


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