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Dotação orçamentária na ata de registro de preço:

desnecessidade de contrato por todo o período da ata

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Dispõe sobre o procedimento para pagamento de bens e serviços adquiridos mediante adesão à ata de registro de preço sem dotação orçamentária suficiente para formalização de contrato por todo o período de sua vigência.

Este parecer foi elaborado em razão de a Lei Orçamentária Anual não prever dotações orçamentárias suficientes para elaboração de contratos. Com isso, a ata de registro de preço foi a solução encontrada pela administração para andamento dos serviços públicos até existência de dotações.


Trata-se de consulta formulada ao Órgão Central do Sistema de Controle Interno pela Comissão Permanente de Licitações do Poder Executivo do Município de Santa Filomena/PE acerca de procedimento que deve ser adotado para o fornecimento de bens e serviços mediante adesão à ata de registro de preço, especificamente em relação a necessidade ou não de formalização de instrumento de contrato que envolva todo o período de fornecimento e referente à dotação orçamentária para fazer face à contratação.


1 – DA ATRIBUIÇÃO DO CONTROLE INTERNO SOBRE PROCEDIMENTO LICITATÓRIO.

O Controle Interno tem assento previsto na Constituição Federal, artigos 31, 70 e 74, bem como na Constituição do Estado de Pernambuco, artigos 29, 31 e 86, os quais determinam, dentre outras, a atribuição de fiscalização contábil e orçamentária quanto ao aspecto da legalidade e economicidade.

No âmbito do Estado de Pernambuco, a Resolução TCE/PE 001/2009 regulamentou a implantação do Sistema de Controle Interno no âmbito Municipal positivando no seu art. 5º, inciso XIV, a prerrogativa de verificar a legalidade e a adequação aos princípios e regras estabelecidos pela Lei Federal nº 8.666/93, referentes aos procedimentos licitatórios e respectivos contratos efetivados e celebrados pelos órgãos e entidades municipais.

Por sua vez, o § 3º, do art. 13, da Lei Municipal 198/2009 determina ao Órgão Central do Sistema de Controle Interno a verificação do cumprimento da supramencionada Resolução da Colenda Corte de Contas, o que inclui por consequência a análise da legalidade de procedimentos licitatórios.


2 – DO SISTEMA DE REGISTRO DE PREÇO.

Inicialmente é preciso esclarecer que o Sistema de Registro de Preços não se confunde com as modalidades licitatórias: concorrência, tomada de preços, convite, concurso e leilão, estas dispostas no artigo 22 da Lei 8.666/93 e o pregão previsto na Lei 10.520/2002.

O Sistema de Registro de Preços está originalmente previsto no artigo 15 da Lei 8.666/93, que assim dispõe:

Art. 15. As compras, sempre que possível, deverão:

[…]

II - ser processadas através de sistema de registro de preços;

[...]

§ 3º O sistema de registro de preços será regulamentado por decreto, atendidas as peculiaridades regionais, observadas as seguintes condições:

(...)

§ 4º A existência de preços registrados não obriga a Administração a firmar as contratações que deles poderão advir, ficando-lhe facultada a utilização de outros meios, respeitada a legislação relativa às licitações, sendo assegurado ao beneficiário do registro preferência em igualdade de condições. (Destaquei).

No âmbito federal, o Sistema de Registro de Preços foi regulamentado pelo Decreto 7.892/2013 e no Município de Santa Filomena coube ao Decreto nº 07/2017 a regulamentação das aquisições por meio do Sistema de Registro de Preços, estando autorizada, portanto, a sua adoção pela Comissão Permanente de Licitações.

Na esfera federal o Sistema de Registro de Preços foi definido pelo artigo 2º, inciso I, do Decreto Federal 7.892 de 2013, nos termos seguintes:

Sistema de Registro de Preços -  conjunto de procedimentos para registro formal de preços relativos à prestação de serviços e aquisição de bens, para contratações futuras (Grifei)

Por não ter a obrigatoriedade de contratar imediatamente com o licitante detentor do registro de preços é que a doutrina especializada entende pela desnecessidade de prévia dotação orçamentária.

De acordo com Jorge Ulisses Jacoby Fernandes1, apud TCE/MT processo 9.305-0/2012:

Com a adoção do Sistema de Registro de Preços, a Administração deixa a proposta mais vantajosa previamente selecionada, ficando no aguardo da aprovação dos recursos orçamentários e financeiros. Não há necessidade de que o órgão tenha prévia dotação orçamentária porque o Sistema de Registro de Preços, ao contrário da licitação convencional, não obriga a Administração Pública face à expressa disposição legal nesse sentido. (Destaquei)

As licitações para registro de preço deverão adotar a modalidade concorrência ou pregão, a teor do que dispõem respectivamente o § 3º, do art. 15, da Lei 8.666/93 e o art. 11 da Lei 10.520/2002, consolidados pelo art. 7º, do Decreto 7.892/2013.

O Sistema de Registro de Preço poderá ser adotado quando, dentre outras hipóteses, quando não for possível pela natureza do objeto definir previamente o quantitativo a ser demandado pela Administração (Art. 3º, IV, do Decreto 7892/2013), consoante recente jurisprudência do Colendo TCU:

A utilização do Sistema de Registro de Preços é adequada em situações como a que se encontra sob comento, ou seja, quando a demanda é incerta, seja em relação a sua ocorrência, seja no que concerne à quantidade de bens a ser demandada. Afinal, não faria sentido realizar uma estimativa prévia e, com base nela, efetivar um processo licitatório, no qual tenham sido definidas quantidades exatas a serem adquiridas, sem saber nem se essas aquisições serão efetivamente necessárias. Num cenário bastante plausível, poderia haver a compra de bens que não seriam necessários. (Acórdão 2197/2015 - Plenário | Relator: Benjamin Zymler). (Destaquei).

No caso em epígrafe, salvo melhor juízo, entendemos que a aquisição pleiteada atende ao requisito do art. 3º, IV, do Decreto 7.892/2013, tendo em vista a impossibilidade de prever em números exatos a quantidade dos bens a serem adquiridos, inclusive se serão adquiridos ou não, a depender da demanda da administração de cada órgão que aderir a respectiva ata.


3. DA ILEGALIDADE DA ADOÇÃO DE CONTRATO GLOBAL EM QUE CONTEMPLE TODA A ATA DE REGISTRO DE PREÇO.

De acordo com a jurisprudência do Colendo Tribunal de Contas da União é ilegal firmar contrato pelo valor total da ata, tendo em vista que prejuízos poderão advir da referida contratação, conforme se demonstrará adiante:

Atenta contra os princípios da razoabilidade e da finalidade o ente público ("órgão gerenciador", nos termos do art. 1º, parágrafo único, III, do Decreto Federal nº 3.931/2001) valer-se do sistema de registro de preços para celebrar contrato com objeto absolutamente idêntico ao da ata que lhe deu origem, isto é, constituir uma ata de registro de preços para simplesmente firmar contrato pela totalidade do valor da ata. Não se pode aceitar aqui o argumento de que, nesse caso, a ata ainda teria utilidade para os "caronas", uma vez que sua finalidade precípua - sua razão maior de ser - é o atendimento às necessidades do "gerenciador" e dos eventuais "participantes" (art. 2º, III, do Decreto Federal nº 3.931/2001)*.

(Acórdão 1443/2015 - Plenário | Relator: Vital do Rêgo). * Atual art. 3º, do Decreto 7.892/2013.


4. DO INSTRUMENTO CONTRATUAL.

Inicialmente ressalta-se que a teor do que dispõem as normas previstas na Lei nº 8.666/93, os ajustes decorrentes de ata de registro de preços segue a mesma sistemática dos demais contratos.

Dessa forma, jamais se dispensa a formalização do contrato. No entanto, a maneira como o contrato deve ser formalizado é que sofre variação de acordo com certas condicionantes previstas na própria Lei de Licitações.

Com efeito, sabe-se que os contratos podem ser formalizados de diversas maneiras, seja através do que o caput do artigo 62 denomina de instrumento de contrato ou, dependendo do caso, podem ser formalizados por meio de outros instrumentos, tais como carta-contrato, nota de empenho de despesa, autorização de contra ou ordem de execução de serviço.

Dispõe o caput do artigo 62 da Lei nº 8.666/93:

O instrumento de contrato é obrigatório nos casos de concorrência e de tomada de preços, bem como nas dispensas e inexigibilidades cujos preços estejam compreendidos nos limites destas duas modalidades de licitação, e facultativo nos demais em que a Administração puder substituí-lo por outros instrumentos hábeis, tais como carta-contrato, nota de empenho de despesa, autorização de compra ou ordem de execução de serviço. (Destaquei).

Isto é, se o valor do contrato, independentemente se ele foi precedido de licitação ou não, independente de decorrente de ata de registro de preços ou não, ultrapassar os limites preconizados na Lei nº 8.666/93 para a modalidade convite, então ele obrigatoriamente, em regra, deve ser formalizado por meio de instrumento de contrato.

Por sua vez, se o valor do contrato não ultrapassar os limites da modalidade convite, então o instrumento de contrato pode ser substituído por outro instrumento, que, de acordo com o dispositivo legal em comento, podem ser carta-contrato, nota de empenho de despesa, autorização de compra ou ordem de execução de serviço.

Não obstante isso, o § 4 do artigo 62 da Lei nº 8.666/93 também dispensa o instrumento de contrato, denominado por ele de termo de contrato, a critério da Administração e independentemente de seu valor, nos casos de compra com entrega imediata e integral dos bens adquiridos, dos quais não resultem obrigações futuras, inclusive assistência técnica.

Percebe-se pois, nesse caso, que pouco importa o valor do contrato. O que importa é que o objeto do contrato possa ser qualificado como compra com entrega imediata e integral dos bens adquiridos, dos quais não resultem obrigações futuras, inclusive assistência técnica.

Nesse contexto, de acordo com o § 4º do artigo 40 da Lei nº 8.666/93, compra para entrega imediata são aquelas com prazo de entrega até trinta dias da data prevista para a apresentação da proposta.

Além disso, o § 4º do artigo 62 da Lei nº 8.666/93 exige, para que se possa dispensar o instrumento de contrato, que a compra, além de entrega imediata, seja integral e sem obrigações futuras, inclusive assistência técnica. Ou seja, não pode haver obrigações de caráter acessório, como as pertinentes à assistência técnica.

Ressalta-se ademais que a as hipóteses prescritas no caput do artigo 62 e do § 4º do mesmo artigo são autônomas e independentes, isto é, para dispensar o instrumento de contrato, não se faz necessário que se atenda ao mesmo tempo os requisitos de ambos os dispositivos.

Assim, se o objeto do contrato for qualificado como compra com entrega imediata e integral do objeto, sem obrigações futuras, inclusive assistência técnica, também é possível dispensar o instrumento de contrato e substituí-lo por outro equivalente.

Nesse sentido, o disposto no art. 7º, do Decreto Federal 7.892/2013, o qual remete expressamente ao disciplinado no art. 62, da Lei 8.666/93, inclusive prevendo expressamente, mas não limitando, os tipos de instrumentos hábeis a formalização da contratação:

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Art. 7º

[...]

§ 2o  Na licitação para registro de preços não é necessário indicar a dotação orçamentária, que somente será exigida para a formalização do contrato ou outro instrumento hábil.

Art. 15.  A contratação com os fornecedores registrados será formalizada pelo órgão interessado por intermédio de instrumento contratual, emissão de nota de empenho de despesa, autorização de compra ou outro instrumento hábil, conforme o art. 62 da Lei nº 8.666, de 1993.

Ainda nesse sentido, de acordo com a Secretaria de Governo do Estado de Minas Gerais2 a utilização de outros instrumentos contratuais flexibiliza as contratações, tendo em vista que não permaneceram inalteradas as condições por força de contrato:

Para que haja mais flexibilidade nas contratações por Registro de Preços é recomendado que se utilize os instrumentos equivalentes ao contrato, citados no art. 62 da Lei federal n.° 8.666/93 (nota de empenho, autoriza- ção de fornecimento, ordem de serviço etc.), para se efetivar as aquisições. Isso porque, dessa forma, o Órgão Participante poderá usufruir automaticamente das alterações realizadas na Ata de Registro de Preços pelo Órgão Gestor, tal como uma alteração para restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro ou uma redução do valor para ajustá-lo ao preço praticado no mercado, por exemplo.

Ademais, para formalização de contrato para vigência por todo o período exige-se dotação orçamentária que cubra todo o valor contratado, o que inviabiliza a gestão com uma obrigação que pode se quer não ser utilizada.

De outra banda, sendo necessário que os contratos tenham prazos restritos a vigência dos créditos orçamentários, com o surgimento de nova dotação orçamentária novo contrato, compreenda-se “novo instrumento hábil” equivalente poderá ser firmado, desde que vigente a ata de registro de preço ou se trate de aditivo ao contrato que se refira à prestação de serviços contínuos, conforme previsão contida no art. 57, II, da Lei 8.666/93.

Por fim, a Lei de Finanças recepcionada em nosso ordenamento jurídico como status de Lei Complementar de caráter Nacional, prevê expressamente que a liquidação da despesa por fornecimento feito pode ter por base outros instrumentos que não apenas o contrato stricto sensu:

§ 2º A liquidação da despesa por fornecimentos feitos ou serviços prestados terá por base:

I - o contrato, ajuste ou acordo respectivo;

II - a nota de empenho;

III - os comprovantes da entrega de material ou da prestação efetiva do serviço. (Destaquei).

Assim também entende, o Egrégio Tribunal de Contas do Estado do Mato Grosso do Sul, Processo TC/58728/2011, Relator: Cons. José Ricardo Pereira Cabral, in verbis:

[…] voto preliminarmente no sentido de dar ciência ao consulente que o enunciado prescritivo do § 4º do art. 62 da Lei n. 8.666, de 1993, no âmbito e no referente à competência deste Tribunal de Contas, tem o significado de que:

─ no caso de compra de bem/produto pactuada para entrega imediata e integral, que para o comprador/consumidor não resultem obrigações futuras, inclusive no referente à assistência técnica cabível,

─ a faculdade para dispensar o “termo de contrato” e substitui-lo por outro instrumento hábil (tal como carta contrato, nota de empenho de despesa ou autorização de compra) pode ser exercida pela autoridade competente, em relação a qualquer modalidade de licitação previamente realizada, independentemente do valor, inclusive nos casos de dispensa e de inexigibilidade de licitação que preencham os requisitos estabelecidos pelas regras, respectivamente, dos arts. 24 e 25 da Lei n. 8.666, de 1993, observadas as necessárias justificativas e a instrumentalização previstas nas disposições do art. 26 da mesma Lei, desde que:

I - a compra em referência ─ a compra e venda, sem dúvidas, porquanto inexiste compra sem a recíproca venda; a compra resulta da venda ─ seja notoriamente de bem móvel, corpóreo ou material, que para os efeitos das relações jurídicas de consumo é definido como produto pela regra do art. 3º, § 1º, do CDC;

II - a entrega do bem/produto pelo vendedor/fornecedor deva ser imediata (sem tratativa ou efetividade de entrega futura) e integral (sem fracionamento), ou seja, a entrega do objeto deve ou deverá ser feita na data e no todo ajustados.

Ou dizendo de outro modo: na contratação de compra e venda, inclusive da que instaure relação jurídica de consumo, de bem/produto móvel, corpóreo ou material, a faculdade para substituir o “termo de contrato” por outro instrumento hábil (carta contrato, nota de empenho de despesa ou autorização de compra etc.) pode ser exercida pela autoridade competente, desde que:

I - nos termos em que haja sido estabelecido no procedimento licitatório prévio ou, sendo o caso, no instrumento de dispensa ou de inexigibilidade da licitação:

a) a contratação resulte ou venha resultar perfeita e acabada pela conexão-interação de todos os seus elementos intrínseco-constitutivos: o bem/produto (res), o preço (pretium) e o consentimento (consensus);

b) deva ocorrer imediata e integralmente a entrega, significativa da tradição (CC, art. 1.267), ou seja, da transferência da propriedade do bem/produto pelo vendedor/fornecedor ao adquirente/consumidor;

II - da contratação cumprida pelos contraentes ─ e daí realizada apropriadamente a tradição do bem/produto ─ não resultem obrigações futuras para o adquirente/consumidor, inclusive no tocante à assistência técnica àquele cabível. (Grifei).

Nesse contexto, despiciendo acrescentar que o fato da administração está autorizada a adquirir bens da ata de registro de preço dentro do período de sua validade não configura hipótese de fracionamento ou tratativa de entrega futura, tendo em vista que existe apenas expectativa de que os bens ou serviços ali constantes sejam adquiridos, o que fica sob a discricionariedade e necessidade da administração, bem como da existência de crédito orçamentário vigente.

Dessa forma, após a elaboração do processo de compra, a contratação será efetivada, o que a nosso ver, poderá ocorrer por meio de emissão de nota de empenho, autorização de fornecimento ou ordem de serviço, consoante previsão do art. 62, da Lei 8.666/93, devendo contudo, após a efetivação da contratação pelo órgão participante ocorrer a baixa no quantitativo total deste órgão, para que este não extrapole a quota indicada no termo de adesão.

4.1 – Garantia Legal. Desnecessidade de Contrato.

Ainda sobre a necessidade de formalização de contrato stricto sensu nos casos em que mesmo sendo de entrega imediata exista obrigação futura, como é o caso da assistência técnica, deve ser ressaltado que não se inclui nessa hipótese a mera garantia legal prevista na Legislação de Consumo.

É que a garantia legal está prevista na própria Lei 8.666/93 nos seus artigos 69 e §2º do art. 73, de modo que não precisa o contrato, quando este existe, ser prorrogado para que a garantia permaneça vigente, igualmente, nas entregas imediatas não há também que se falar em formalização de contrato para que a garantia legal tenha vigência, tendo em vista que esta decorre diretamente da Lei.

Nesse sentido, transcrevemos precedentes do Tribunal de Contas da União:3

É bem verdade que a garantia declarada no texto legal, consoante preceitua o art. 69, e o § 2º, do art. 73, da Lei 8666/93, ou a garantia contratual prevista no o art. 50 e seu parágrafo único da Lei 8078/90 ( Código de Defesa do Consumidor) não necessitava ter seu prazo de vigência inserido no período de duração do contrato, protelando assim a vigência do termo para além do prazo máximo estabelecido na Lei das Licitações.

[…]

Assim, o período de duração do contrato deve incluir apenas as etapas de consecução de seu objeto, posto que o direito relativo à garantia legal ou contratual subsiste depois de executado o contrato, conforme se depreende das normas contidas no Estatuto das Licitações - art. 69, e o § 2º, do art. 73, da Lei 8666/93. Esse direito nasce com a avença, mas perdura além da contratação, pelo prazo acordado entre as partes. (Destaquei).

Colhe-se ainda da doutrina, citada pelo TCE/MS nos autos do processo TC/58728/2011, que a garantia legal é oriunda de determinação legal e exatamente por isso, não depende de vontade das partes, dispensando-se assim a realização de contrato:

Confirmando essa mesma linha de pensamento, verifica-se que a disposição contida na parte final do § 4º do art. 62 da Lei de Licitações, apesar de excepcionar as compras com entrega imediata e integral em que resultem obrigações futuras, não alcança a previsão de garantia legal, pelos eventuais vícios que o produto possua, expressamente prevista no art. 24 do Código de Defesa do Consumidor, afinal esta garantia é inerente ao produto e justamente por ser oriunda de determinação legal é obrigatória, automática e independentemente da vontade das partes, MOTIVO PELO QUAL AFASTA A NECESSIDADE DE INSTRUMENTALIZAR A CONTRATAÇÃO, nesse caso específico, por meio de um termo de contrato propriamente dito. (Sem destaques no original).

Ao final, o Egrégio Tribunal de Contas do Estado de Mato decide pela desnecessidade de elaboração de termo de contrato quanto a garantia legal na entrega imediata de bens, por entender que a aquela decorre diretamente da Lei e, nesse caso, a administração adota a posição de consumidora, aplicando-se a hipótese do art. 24, do CDC:

E mais necessariamente dizendo, é explicitar que ocupando o consulente a posição jurídica de consumidor ─ ainda que circunstancialmente ─, tão logo cumprida em todos os seus termos a contratação e daí realizada imediata e integralmente a tradição do produto, resultam:

I - a incidência da regra jurídica assecuratória de “adequação do produto”, ou seja, a automática instauração da garantia legal por “eventuais vícios que o produto possua”, consoante o disposto no art. 24 do CDC. Isso significa que:

a) essa garantia não é contratual, mas obrigatória por força ou efeito de Lei (ex vi legis) e, desse modo, independe da vontade das partes contratantes;

b) para ser adequado o produto deve possuir as qualidades típicas, estar pronto ou disponível para propiciar ao consumidor:

1. a utilização integral, sem restrições de uso, relativamente à sua destinação ou finalidade;

2. fruir as (das) suas utilidades, conforme os “padrões de qualidade, segurança, durabilidade e desempenho”, segundo o significado das regras-princípios estabelecidas no art. 4º, caput e inciso II, d, do CDC;

c) PARA USUFRUIR AS (DAS) UTILIDADES DO PRODUTO O CONSUMIDOR NÃO CONTRAI “OBRIGAÇÕES FUTURAS” que devam ser cumpridas durante o prazo de validade da garantia legal, inclusive quanto à assistência técnica cabível, visto que o produto deve oferecer ao consumidor, sem ônus ou encargos adicionais, os padrões de “qualidade, segurança, durabilidade e desempenho” a que se referem as regras-princípios do art. 4º, II, d, do CDC.

Assim, por decorrer de prescrição legal impositiva (modal “obrigatório” do dever jurídico), TAL GARANTIA NÃO PRESSUPÕE NEM EXIGE INSTRUMENTALIZAÇÃO FORMAL ESPECÍFICA (“TERMO DE CONTRATO”) para ser exigida ou usufruída pelo seu beneficiário; (Sem destaques no original).

4.2 – Da Alteração do Instrumento Equivalente a Contrato. Possibilidade.4

Como já visto acima, via de regra os contratos administrativos devem ser formalizados por meio de termo de contrato, podendo ser adotadas em seu lugar outras formas, tais como carta contrato, nota de empenho, autorização de compra, ordem de execução de serviços, etc.

No entanto, a ausência do termo do contrato não é causa impeditiva para eventual alteração do ajuste que se fizer necessária, em consonância com a prerrogativa estabelecida no art. 58, inc. I e com os limites previstos no art. 65, ambos da Lei nº 8.666/93.

Com efeito, qualquer modificação que afete as bases contratuais iniciais, significa dizer, que altere as disposições obrigacionais, deve ser formalizada por termo aditivo, cujo extrato deve ser publicado na imprensa oficial.

Outrossim, quando a modificação não impactar nas bases contratuais, a exemplo da variação do valor contratual em decorrência de reajustes, atualizações, compensações ou penalizações financeiras, poderá ser registrada por simples apostila. Tais afirmações decorrem da interpretação do disposto no § 8º do art. 65 da Lei nº 8.666/93:

§ 8º A variação do valor contratual para fazer face ao reajuste de preços previsto no próprio contrato, as atualizações, compensações ou penalizações financeiras decorrentes das condições de pagamento nele previstas, bem como o empenho de dotações orçamentárias suplementares até o limite do seu valor corrigido, não caracterizam alteração do mesmo, podendo ser registrados por simples apostila, dispensando a celebração de aditamento. (Grifei).

Resta evidente, portanto, que o fato de o termo de contrato ter sido substituído por instrumento equivalente não impede eventuais alterações contratuais e não elide a obrigação da respectiva formalização. Em qualquer caso, as modificações promovidas nos contratos devem ser formalizadas por meio de termo aditivo ou apostila, conforme o caso, e juntadas ao processo administrativo que instrui a contratação.

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Sobre o autor
Leandro da Conceição Benício

Advogado. Bel. em Direito pela UNICAP. Especialista em Direito Eleitoral. Ex-Assessor Jurídico do Consórcio Intermunicipal do Sertão do Araripe Pernambucano. Ex-Controlador Interno da Prefeitura Municipal de Santa Filomena/PE. Aprovado nos concursos públicos para: Procurador Jurídico do Município de Picos/PI - 2º lugar, Analista Judiciário do TJPE - 2º lugar, Controlador Interno da Prefeitura de Dormentes/PE - 1º lugar, Controlador Interno da Câmara de Bodocó/PE - 2º lugar, Analista Judiciário do TRF 1 - São Raimundo Nonato/PI - 5º lugar. Ex-Secretário Municipal de Educação Santa Filomena/PE.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BENÍCIO, Leandro Conceição. Dotação orçamentária na ata de registro de preço:: desnecessidade de contrato por todo o período da ata. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 24, n. 5959, 25 out. 2019. Disponível em: https://jus.com.br/pareceres/65018. Acesso em: 29 mar. 2024.

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