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A mudança de nome e sexo do transexual e os seus reflexos na Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015/73)

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Agenda 12/04/2009 às 00:00

O STJ vem seguindo a visão moderna sulista, adotando a retificação registral com ressalvas, o que é bastante discutível e foco deste trabalho. Será que a ressalva constante da certidão de nascimento estaria protegendo o transexual?

1- Introdução

O presente trabalho tem por objetivo analisar a possibilidade ou não de alteração do sexo e do nome do transexual, à luz da Lei dos Registros Públicos (Lei nº 6.015/73). A tendência atual é para a aplicação dos princípios constitucionais diante da omissão legislativa de 1973.

Também é objetivo deste trabalho estudar a evolução doutrinária e jurisprudencial acerca do tema, partindo-se da posição mais tradicionalista, inviabilizando-se qualquer alteração, para a mais moderna em que se admitem as alterações, observando-se o caso concreto, aplicando-se a ponderação principiológica proposta por Alexy.

Alguns resistem em dar solução ao problema, pois os terceiros que se envolveriam com o transexual poderiam ser lesados, sendo este o posicionamento do tribunal de Minas.

Por outro lado, o STJ vem seguindo a visão moderna sulista, adotando a retificação registral com ressalvas, o que é bastante discutível e foco deste trabalho. Será que a ressalva constante da certidão de nascimento estaria protegendo integralmente o transexual? Eis aí uma discussão que tende a avultar nos nossos tribunais.

Trata-se ainda da visão processualista civil do manejamento da ação judicial para retificação do nome e sexo registral do transexual.

A Carta Magna prega a felicidade de todos, sendo esse o objeto de proteção do Estado. Não há espaços para tratamentos discriminatórios no ordenamento jurídico. Diante disso, surge a questão: como solucionar diante da omissão do legislador de 1973?


2 - O direito ao nome civil no Código Civil de 2002

O nome civil é um direito de identificação da pessoa, consagrado no art. 16 do Código Civil de 2002; e é composto pelo prenome - que designa cada membro da família, e sobrenome - que identifica o nome da família.

É obrigatória a atribuição de nome à criança, conforme dispõe o art. 50 da Lei nº 6.015, de 31 de dezembro de 1973, cabendo aos pais a escolha do nome individual; aplica-se, nesse aspecto, o princípio da liberdade. Quanto ao nome de família, prevalece o princípio da veracidade.

São características do nome ser indisponível, imprescritível, inalienável, incessível, inexpropriável e irrenunciável.

O direito ao nome é híbrido, apresentando dois elementos: o público e o privado. O primeiro tem como regra a imutabilidade. Todos os seres humanos têm direito ao nome com o intuito de identificação, visando a atender ao interesse social de segurança. Já o elemento privado do nome é atributo da personalidade, é construção da autonomia da pessoa humana e, portanto, tende à mutabilidade, pois não podemos ser escravos do nome.


3 - O princípio da mutabilidade relativa do nome

A Lei nº 6.015/73 - Lei de Registros Públicos - LRP - adotou o critério da imutabilidade do nome como regra, sendo admitida a mutabilidade apenas em casos excepcionais trazidos pela doutrina. Eis o que dispõe o art. 58 dessa Lei:

Art. 58 - O prenome será definitivo, admitindo-se, todavia, a sua substituição por apelidos públicos notórios.

(caput com redação dada pela Lei nº 9.708, de 18/11/1988).

Os professores Cristiano Chaves e Nelson Rosenvald (2007, p. 174-175) elencam as possibilidades legais de alteração do nome civil:

- Quando expuser o titular ao ridículo ou à situação vexatória, bem como se tratando de nome exótico (LRP, art. 55, parágrafo único);

- quando houver erro gráfico evidente, caracterizado, e.g., por equívocos de grafia;

- para incluir apelido notório (art. 58 e parágrafo único; LRP).

- pela adoção (ECA, art. 47, § 5º e CC, art. 1627);

- pelo uso prolongado e constante de nome diverso(...);

- quando ocorrer homonímia depreciativa, gerando embaraços profissionais ou sociais;

- pela tradução, nos casos em que foi grafado em língua estrangeira; (fls. 174-175, Direito Civil, Teoria Geral, Cristiano Chaves de Faria e Nelson Rosenvald, 6. ed., Lumen Júris, Rio de Janeiro, 2007).

O art. 56 da LRP possibilita a mudança do nome após a maioridade, até o indivíduo completar 19 anos. O exercício desse direito potestativo não pode prejudicar apelidos de família. Trata-se de única possibilidade de alteração do nome imotivada.

Nesse sentido se apresenta a doutrina do Professor Walter Ceneviva (2006), que segue a linha da imutabilidade como regra, admitindo alterações só nesses casos específicos. Nesse contexto, é relevante ressaltar que "o prenome, porém, deve ser definitivo, embora possa, por exceções motivadas, sofrer modificação em juízo, ouvido o Ministério Público". (CENEVIVA, 2006, p. 143).

Ceneviva (2006, p. 153) afirma, ainda, que

(...) A imutabilidade do prenome é clássica no direito brasileiro, pois o art. 58 subsistiu quase intocado na redação que lhe foi dada pelo Regimento nº 18.542, de 1928. Sofreu, porém, radical modificação, para pior, com a Lei nº 9.708⁄98, que, em lugar de ter o prenome por imutável, passou a afirmá-lo definitivo. A definitividade não conduz a interpretação diversa da que cabia para o texto anterior, pois alude à permanência do prenome, como regra. O vocábulo definitivo não tem, no caput, o significado de absoluto, final, como se colhe da leitura integral do artigo e de alternativas de mudanças inseridas na própria lei nos arts. 56 e 57. (...) .

Por outro lado, tem-se admitido a alteração do nome não só no que tange ao permissivo legal acima delineado, diante da complexidade social e da ausência de lei para solução dos inúmeros conflitos sociais, cabendo ao julgador o papel de intérprete do ordenamento jurídico, conforme o caso concreto.

O doutrinador Pontes de Miranda (1971, p. 284) critica o princípio da imutabilidade do prenome, afirmando que a função identificadora do nome não bastaria para considerá-lo imutável e inalterável. Para esse autor, não há um princípio jurídico de imutabilidade do prenome e sobrenome, tratando-se de uma regra jurídica adotada pelo nosso sistema.

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Eis a orientação dos professores Cristiano Chaves de Farias e Nelson Rosenvald (2007, p. 180) sobre a mutabilidade do nome civil:

(...) o princípio da inalterabilidade relativa do nome implica a possibilidade de o juiz modificar o nome (seja o prenome, seja o sobrenome) em casos justificáveis, na defesa da proteção integral da personalidade humana, independentemente de previsão legal. .

O Tribunal de Justiça de Minas Gerais já se pronunciou sobre a possibilidade de alteração, principalmente quando o nome causa distúrbios psicológicos na pessoa, conforme o voto do Desembargador Wander Marotta, corroborando a nova visão hermenêutica:

o excessivo apego à lei pode levar, neste caso, a uma injustiça, ou à aplicação exacerbada do conceito corrente de justo, que nem sempre coincide com a regra jurídica. (...) ‘sentir’ e ‘compreender’ também é fazer hermenêutica. Talvez seja a melhor forma de ‘interpretar’. Sentir o drama humano; compreender que a lei não possui uma vontade única, mas várias vontades, que o intérprete, na complexidade da vida, tentará aplicar na realização do mais justo. (AC 1.0000.00.289.475-6-001, TJMG, publicação 01-04-2004, julgamento 30-09-2003, relator, Belizário de Lacerda)

Segundo Rubens Limongi França, citado nesse Acórdão, a jurisprudência não só humaniza como rejuvenesce a norma jurídica a ser aplicada ao caso concreto:

Uma coisa é a lei no papel, nas páginas indiferentes do Diário Oficial, mera cristalização fria, inflexível e despersonalizada de um ideal jurídico; outra é a lei analisada, atividade humanizada e adaptada pelos julgados. É quando as imprecisões se evidenciam, as incongruências emergem, as asperezas se realçam e as falhas se tornam patentes.

("Da Jurisprudência como Direito Positivo", Revista da Fac. de Direito da USP, LXVI, 1971, p. 221). (AC 1.0000.00.289.475-6-001, TJMG, publicação 1º/1/04, julgamento 30/9/03, Relator: Belizário de Lacerda)


4 - Teoria da Argumentação. Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade

Segundo a Teoria Qualitativa de Alexy (1997, p. 83), as normas diferem dos princípios pela qualidade da resolução dos conflitos e não se desenvolvem a partir de uma perspectiva estática. Diante do momento de resolução do conflito é que se verifica se se trata de regra ou princípio.

Para Alexy, a solução dos conflitos está nas regras de exceção. As regras são específicas, e os princípios são gerais, abarcam uma gama de situações. A ponderação dos princípios deve se dar no caso concreto, situação em que se devem verificar os aspectos jurídicos, sociais e morais.

A proposta desse estudioso é que os conflitos sejam solucionados com base na argumentação, na razoabilidade e na ponderação dos princípios.

Para Alexy, princípios são mandados de otimização no sentido de que algo deve ser concretizado da melhor forma possível, podendo ser cumpridos, portanto, em diferentes graus, ao passo que as regras são dotadas de uma estrutura fechada, cumpridas ou não; e, se válidas, essas devem ser aplicadas em seus exatos termos [01].

Dessa forma, a solução do conflito de regras opera-se no campo da validade ou da invalidade, em razão da objetividade decorrente desse tipo de norma, conquanto, no sistema aberto dos princípios, não haja espaço para a subsunção direta do fato à norma, haja vista ser da natureza dos princípios a amplitude do seu raio de ação. Dessa forma, busca-se a razoabilidade, e não a racionalidade.

Os princípios alcançam um campo de atuação mais abrangente do que as regras, pois se espraiam por todo o ordenamento jurídico, vinculando o aplicador intérprete a determinada diretriz.

Na antinomia entre regras, a conflitante é extirpada do ordenamento jurídico em função de sua incompatibilidade com outra que esteja situada no mesmo plano de validade por meio de critérios estabelecidos em cada ordenamento jurídico: o critério hierárquico - "lex superior derogat lex inferiorem" -; o critério da especialidade -" lex specialis derogat generalem"-; e o critério cronológico – "lex posterior derogat priorem".

Na antinomia entre princípios, o aplicador do direito faz opção por um dos princípios de acordo com o seu peso e a sua importância, de modo que o outro não seja excluído do sistema, podendo ser aplicado a outras hipóteses fáticas.

Na verdade, na ocorrência de colisão de princípios, o que há é uma precedência condicionada de acordo com elementos extraprincipiológicos, como fatos, regras, circunstâncias sociais e culturais, de forma que haja pesos que devem ser considerados no momento da escolha do princípio a ser aplicado.

Marcelo Galuppo, na obra que trata sobre a teoria de Alexy, demonstra, de forma peculiar, o sistema da ponderação ora analisado, conforme se observa do excerto a seguir transcrito:

Isso significa que o conflito de regras se dá na dimensão da validade, e o de princípios na dimensão do peso (Alexy, 1993b:89 e 91). Essa idéia de peso significa que o conflito entre princípios será resolvido tendo em vista uma hierarquização dos mesmos. Não se trata de uma hierarquização tendo-se em vista o caso concreto, realizada pelo procedimento da ponderação dos princípios envolvidos na situação. A ponderação, como concebida por Alexy, refere-se a ‘qual dos interesses, abstratamente do mesmo nível, possui maior peso no caso concreto’ (Alexy, 1993b:90). Como já disse, essa precedência condicionada não é absoluta, cuja determinação "consiste em que, tomando-se em conta o caso, indiquem-se as condições sob as quais um princípio precede a um outro. Sob outras condições, a questão da precedência pode ser solucionada inversamente’ (Alexy, 1993b:92)" [02].

Na solução dos conflitos, em que não há resposta no quadro proposto pelo legislador infraconstitucional, cabe ao julgador não só aplicar, mas interpretar o ordenamento jurídico, conforme o caso concreto, fazendo jus à técnica da ponderação, com fulcro nos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Nessas situações, a solução mais racional e legítima é a que realiza a vontade constitucional.


5 - Discussões sobre a possibilidade de mudança do estado civil do transexual.

A visão dogmática do direito registral encontra entraves na hermenêutica contemporânea, tendo em vista que a sociedade atual é aberta, plural, porosa, multifacetária e globalizada. Dessa forma, rompe-se o prisma individualista e patrimonialista, configurando-se como fim maior do ordenamento jurídico o ser humano, ou seja, este deve ser protegido, respeitando-se as diferenças.

A mudança do nome e sexo do transexual, no Registro Civil, é um caso complexo, alvo de grandes discussões não só no cenário da medicina, mas nos diversos tribunais brasileiros, o que merece uma análise doutrinário-jurisprudencial diante do conflito entre princípios constitucionais e infraconstitucionais.

De fato, não se pode resolver tal conflito conforme a subsunção perfeita entre a norma e o caso concreto; inexistindo lei que preveja a possibilidade de mudança de nome e de sexo para o transexual na LRP, configura-se patente o conflito entre a legalidade estrita da LRP e as normas constitucionais e infraconstitucionais, a dignidade da pessoa humana, o interesse público, além dos princípios que norteiam a atividade do notário e registrador, que são a fé pública e a segurança jurídica dos documentos confeccionados por esses delegatários.


6 - Os princípios constitucionalistas

O direito civil contemporâneo é interpretado à luz da atual Constituição do Brasil, rompendo com o sistema tradicional patrimonialista e individual, que não reflete a sociedade atual pluralizada, e tem como foco o ser humano como sujeito de direitos e não mais como objeto de proteção jurídica.

Esse direito apõe seu olhar na defesa e proteção do ser humano em sua integralidade, visando à pacificação dos conflitos, de forma a atender ao princípio da dignidade humana insculpido no Texto Magno.

É sabido que a República Federativa do Brasil, de cunho democrático, pugna pelo respeito à diversidade, observando-se que a dignidade humana precede a toda a ordem social. Tal princípio é uma qualidade inerente, indissociável de todo e qualquer ser humano, relacionando-se com a sua autonomia, razão e autodeterminação de cada indivíduo (art. 1º, III, CR/88). É a autonomia que transforma o indivíduo em pessoa, sendo o ser humano o meio e o fim da existência do próprio Estado Democrático de Direito.

Nesse sentido, assim dispõe a Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948:"Todos seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. Dotados de razão e consciência, devem agir uns para com os outros em espírito e fraternidade".

Não há contradição entre os princípios de que os valores de realização individual tenham um grau hierárquico superior aos da primazia do bem-estar coletivo geral. Uma coisa são as condições essenciais para a realização dos valores da pessoa humana, e outra são os valores egoísticos de um indivíduo.

Em se tratando de direitos fundamentais, não há respostas certas, dependendo do caso concreto. Trata-se de direitos irrenunciáveis. Atualmente, conforme entendimento do STF, aplica-se, nas relações entre particulares, a eficácia direta ou imediata dos direitos fundamentais, ou seja, independe da existência de lei; os princípios fundamentais podem ser aplicados às relações entre particulares, consagrando-se a eficácia horizontal dos direitos fundamentais.

Os princípios não são absolutos, sendo que os conflitos serão resolvidos conforme o caso concreto, adotando-se a ponderação.

O princípio da dignidade humana tem o aspecto negativo - que diz respeito à abstenção dos particulares e Poder Público. Segundo Kant, a dignidade é o que diferencia o ser humano do animal, sendo que o ser humano não pode ser tratado como instrumento, objeto, principalmente quando esse tratamento for fruto de desprezo.

O segundo aspecto é o positivo, que está ligado ao mínimo existencial, sendo que o Estado deve proporcionar os meios necessários para a existência digna.

Como solucionar a colisão de princípios relativa à autonomia da vontade, que tem fundamento no art. 1º, IV, da CR/88, e o da dignidade humana?

Sob essa perspectiva de colisão de princípios, deve-se verificar se é possível harmonizá-los. Não sendo possível, o Judiciário intervém para definir qual o princípio que deve prevalecer, orientado pelos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. Conforme o caso concreto, um irá prevalecer em detrimento do outro.


7 - Os princípios da atividade do oficial registrador

A fé pública conferida ao oficial registrador diz respeito à verdade daquilo que atesta. O termo fé significa crença, crédito, confiança, testemunho autêntico, sendo a fé pública a qualidade e a autoridade do que se atesta, conforme outorga de poderes conferidos pelo Estado, sendo o registrador agente da paz social, prestigiando-se a segurança jurídica.

A autenticidade é a declaração de veracidade dos documentos apresentados ao registrador ou notário. O registro tem presunção relativa de verdade, é retificável, modificável.

Quanto à segurança jurídica, é a realização do Direito e é obrigação do registrador, como profissional do direito, assegurar a idoneidade técnica, satisfazendo os clamores sociais por informação e assessoramento frente a um direito cada vez mais complexo.

O serviço registral tem como função assegurar a publicidade erga omnes dos atos jurídicos conferidos ao oficial delegatário. Sobre esse aspecto, eis o escólio de Renan Lotufo (2003, p. 43):

(...) a publicidade não implica que todos saibam dos fatos registrados, mas sim que todos tenham possibilidade de vir a conhecer dos atos e fatos.

Tais princípios estão consagrados no art. 1º da Lei nº 8.935/94 - Lei dos Notários e Registradores:

Art. 1º - Serviços notariais e de registro são os de organização técnica e administrativa destinados a garantir a publicidade, autenticidade, segurança e eficácia dos atos jurídicos.

A atividade dos notários e registradores tem por fim garantir às pessoas - físicas ou jurídicas - o direito que lhes corresponde, tendo os atos jurídicos a natureza jurídica constitutiva ou declaratória.

Sobre a função de garantia conferida à atividade dos notários e registradores, assim se manifesta o estudioso Walter Ceneviva (2007, p. 26):

A garantia referida é, ainda, própria do serviço público. Gera responsabilidade para o Estado e para os titulares dos respectivos serviços em caso de dano aos terceiros que nelas confiarem.


8 - A cirurgia de transgenitalização

O transexual é o indivíduo que apresenta uma dissonância entre o corpo e a psique, podendo apresentar-se com o corpo feminino e o psicológico masculino e vice-versa.

O transexualismo é uma doença genética incurável prevista na Classificação Internacional de Doenças (CID 10 - F640) e provocada por defeito cromossômico ou fatores hormonais, sendo a cirurgia de transgenitalização a terapêutica para a adequação do sexo biológico de nascimento ao sexo psicossocial.

Diante disso, foi editada a Resolução do CFM nº 1.652⁄02, que revoga a Resolução nº 1.482⁄97 e determina que o transexual seja tratado como um caso médico, devendo preencher os seguintes requisitos para a realização da cirurgia de transgenitalização:

Art. 4º - Que a seleção dos pacientes para cirurgia de transgenitalismo obedecerá a avaliação de equipe multidisciplinar constituída por médico psiquiatra, cirurgião, endocrinologista, psicólogo e assistente social, obedecendo os critérios abaixo definidos, após, no mínimo, dois anos de acompanhamento conjunto:

1) Diagnóstico médico de transgenitalismo;

2) Maior de 21 (vinte e um) anos;

3) Ausência de características físicas inapropriadas para a cirurgia. (www.mp.ba.gov.br pesquisa realizada no dia 10/10/08).

O Enunciado nº 276 da IV Jornada de Direito Civil do Conselho de Justiça Federal - CJF - autoriza a cirurgia de transgenitalização em conformidade com os procedimentos estabelecidos pelo Conselho Federal de Medicina - CFM - e a conseqüente alteração do prenome e do sexo no Registro Civil. (www.flaviotartuce.adv.br⁄secoes⁄enunciados⁄EN-IVJOR_CN.doc, consulta realizada no dia 10/11/08).

A medicina legal não mais admite o conceito do sexo fora da visão plurivalente, composto de fatores genéticos, somáticos, psicológicos e sociais. Em interessante digressão, Elimar Szaniawski (1999, p. 44-45) afirma que

(...) o transexual não redesignado vive em situação de incertezas, de angústias e de conflitos, o que lhe dificulta, senão o impede, de exercer as atividades dos seres humanos. Desse modo, a alteração do prenome para o sexo biológico e psíquico reconhecido pela medicina e pela justiça harmoniza-se com o ordenamento, não só com a Constituição, mas também com a lei dos Registros Públicos, não conflitando com seu artigo 58.

Sobre a autora
Patricia da Cunha Gurgel

Advogada militante na área cível, especialmente Direito Militar. Bacharel em Direito pela PUC Minas. Especialização em Direito Público pela PUC Minas.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

GURGEL, Patricia Cunha. A mudança de nome e sexo do transexual e os seus reflexos na Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015/73). Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 14, n. 2111, 12 abr. 2009. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/12614. Acesso em: 27 nov. 2024.

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