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Anencefalia: acrescentando questões médicas a uma discussão jurídica

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Agenda 26/01/2013 às 15:52

5. ADPF 54

5.1. A ADPF

A emenda constitucional nº 3/93, inovou ao prever, no artigo 102, § 1º da Constituição Federal:

Art. 102. Compete ao Supremo Tribunal Federal, precipuamente, a guarda da Constituição, cabendo-lhe:

§ 1.º A argüição de descumprimento de preceito fundamental, decorrente desta Constituição, será apreciada pelo Supremo Tribunal Federal, na forma da lei. (Transformado em § 1º pela Emenda Constitucional nº 3, de 17/03/93)

A simples menção não desvendava em que consistia a Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental. Foi necessária a Lei 9882/99 para regulamentar o dispositivo constitucional. Esse diploma legal delimita:

Art. 1º A argüição prevista no § 1º do art. 102 da Constituição Federal será proposta perante o Supremo Tribunal Federal, e terá por objeto evitar ou reparar lesão a preceito fundamental, resultante de ato do Poder Público.

Parágrafo único. Caberá também argüição de descumprimento de preceito fundamental:

I - quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, incluídos os anteriores à Constituição;

Destarte, trata-se de Ação Constitucional que pode ser aplicada preventiva ou repressivamente. Procura-se classificá-la em autônoma (direta ou principal) ou incidental (paralela ou incidente processual de constitucionalidade).179 Para outros doutrinadores é divida em ação autônoma ou por equivalência. Explicando essas duas maneiras de aplicação, Pedro Lenza detalha:

Percebe-se, então, nítido caráter preventivo na primeira situação (evitar) e caráter repressivo na segunda (repara) lesão a preceito fundamental, devendo haver nexo de causalidade entre a lesão ao preceito fundamental e o ato do poder público, de que esfera for, não se restringindo a atos normativos, podendo a lesão resultar de qualquer ato administrativo, inclusive decretos regulamentares.

A segunda hipótese (por equiparação), prevista no parágrafo único do artigo 1º da Lei nº 9.882/99, prevê a possibilidade de argüição quando for relevante o fundamento da controvérsia constitucional sobre lei ou ato normativo federal, estadual, municipal (e por conseqüência o distrital, acrescente-se, incluídos os anteriores à Constituição).180

Traçadas suas características fundamentais, passa-se a abordar a ADPF 54, objeto de todo esse trabalho.

5.2. A ADPF 54

Finalmente é chegada a hora de analisar os argumentos ventilados pela ADPF 54 e o pedido formulado ao Supremo Tribunal Federal.

Registre-se que os argumentos já expostos por esse estudo não se restringiram aos apresentados em sede de ADPF. Isso porque as decisões dos Ministros do Supremo Tribunal Federal não se limitam aos fundamentos esposados na exordial. Para o julgamento, outros motivos podem ser utilizados; afinal, iura novit curia (o juiz sabe o direito).

Mesmo existindo outros embasamentos, é vital apresentar quais os argumentos traçados na exordial. A ADPF 54, por si só, já tem o enorme mérito de ter sido admitida, o que não havia ocorrido anteriormente. Nas Argüições de Descumprimento de Preceito Fundamental, propostas anteriormente, o STF entendeu, em um primeiro momento, que o artigo 102, § 1º não seria auto-aplicável. Em 1999, a Lei 9.882 disciplinou o processo e o julgamento das ADPFs. Nas tentativas seguintes, as ADPFs propostas, novamente, não foram admitidas, em razão de não se apresentar o caráter subsidiário. Em outras linhas, o STF entendeu serem cabíveis outros tipos de Ação Constitucional para solucionar as lides.

Nada obstante, a Ação Constitucional objeto deste trabalho foi aceita pelo Supremo Tribunal Federal, em 24/08/05. Os Ministros atestaram, em sua maioria, tratar-se de matéria em que estão envolvidos preceitos fundamentais. Ademais, não existia nenhuma outra forma processual apta a levar tal matéria à Corte Máxima. Por fim, os dispositivos do Código Penal, já apontados, são anteriores à Constituição Federal de 1988.

5.2.1. Argumentos ventilados na petição inicial

Consciente da dificuldade, até aquele momento, de o STF reconhecer o cabimento da ADPF, grande parte da peça vestibular da ADPF 54 foi voltada para demonstrar a pertinência do meio empregado.(ANEXO IV) Dessa feita foram apresentados os seguintes argumentos:

a) Legitimidade ativa da CNTS (Confederação Nacional dos Trabalhadores da Saúde), conforme previsão do artigo 2º, inc I da Lei 9.882/99 e a pertinência temática;

b) Ameaça de violação a preceitos fundamentais através de ato do poder público;

c) Inexistência de outro meio eficaz de sanar a lesividade (subsidiariedade).

d) Necessário efeito vinculante.

Em um primeiro ponto, deixou-se incontroverso o interesse da CNTS na propositura de tal demanda, visto o mérito afetar diretamente os profissionais da área de saúde. Tal conclusão é obtida pelo fato de a Confederação representar interesses da classe que trabalha na área de saúde, os quais necessariamente se envolvem em procedimentos como o da antecipação terapêutica do parto.

A despeito de inexistir um disciplinamento sobre o que seriam os preceitos fundamentais, por omissão do legislador, está assentado pela doutrina e pelo próprio Supremo que preceitos englobam os artigos 1º ao 4º (fundamentos e objetivos da República), 5º (Direitos e Deveres individuais e coletivos), 60, § 4º (Cláusulas Pétreas), e 34, VII (Princípios Constitucionais sensíveis), da Constituição Federal. Como atos públicos causadores da lesão, foram enumerados os artigos 124, 126, caput, e 128 I e II do Código Penal.

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Para ser aceita a ADPF, é imprescindível a subsidiariedade - não ser possível obter a pretendida tutela através de outra ação de caráter constitucional. Nesse sentido, deixou-se clara a inexistência de outro meio viável. Afinal, descabe, para solucionar o caso em tela, Ação Direita de Inconstitucionalidade ou Ação Declaratória de Constitucionalidade. Além disso, busca-se alcançar o efeito vinculante da eventual decisão que permitiria a interrupção da gravidez. Por fim, não se olvide que as disposições do Código Penal, questionadas, são anteriores à Constituição Federal, o que também impossibilita o manejo de ADC ou ADIN.

Entrando no mérito, explicou-se que existe uma discussão entre dois bens jurídicos: a potencialidade da vida do nascituro e a autonomia e liberdade individual da gestante. Enfatizou-se o estado da gestante:181

26. Diante disso, o foco da atenção há de voltar-se para o estado da gestante. O reconhecimento de seus direitos fundamentais, a seguir analisados, não é a causa da lesão a bem ou direito de outrem – por fatalidade, não há viabilidade de uma outra vida, sequer um nascituro29, cujo interesse se possa eficazmente proteger. É até possível colocar a questão em termos de ponderação de bens ou valores, mas a rigor técnico não há esta necessidade. A hipótese é de não-subsunção da situação fática relevante aos dispositivos do Código Penal. A gestante portadora de feto anencefálico que opte pela antecipação terapêutica do parto está protegida por direitos constitucionais que imunizam a sua conduta da incidência da legislação ordinária repressiva.

Bem se vê que a Confederação pretende comprovar a imunidade, por aspectos fáticos (a fatalidade da anencefalia), da conduta da gestante.

No corpo da petição inicial, são colocados em um extremo o nascituro e em outro a gestante. Faz uma avaliação dos interesses em jogo e conclui que os direitos da mulher são protuberantes, através dos seguintes Preceitos Fundamentais:

a) Dignidade da pessoa humana;

b) Legalidade, liberdade e autonomia da vontade;

c) Direito à saúde.

Em uma avaliação sucinta, aborda cada um desses alicerces. No que concerne ao pedido, após fazer ilações sobre a interpretação conforme a Constituição, a Confederação pleiteia um pedido cautelar, outro principal e, por fim, um alternativo.

No pedido cautelar, requer, liminarmente, em função de existirem o fumus boni iuris e o periculum in mora, que seja concedida medida para suspender o andamento de processos ou os efeitos de decisões judiciais que pretendam aplicar ou tenham aplicado os dispositivos do Código Penal nos casos de antecipação terapêutica do parto de fetos anencéfalos.

No pedido principal, visa ao reconhecimento do direito constitucional da gestante a se submeter à antecipação terapêutica do parto e do profissional de saúde a realizá-lo, desde que atestada a ocorrência da anencefalia. No rogo alternativo, sem tanta relevância para a discussão travada nesse estudo, é requerida, caso não se entenda cabível a ADPF, o recebimento da demanda como Ação Declaratória de Inconstitucionalidade. No arremate pretende a declaração de inconstitucionalidade, com eficácia abrangente e efeito vinculante, da interpretação dos arts. 124, 126, caput, e 128 I e II do Código Penal , garantindo à gestante o direito de interromper terapeuticamente o parto, no caso de feto portador da anomalia.

Agora é importante apresentar o trâmite processual até o presente momento da ADPF 54.

5.2.2. Andamentos Processuais (ADPF 54)

Após a distribuição da ADPF 54, em 17/06/2004, o Relator da ação, Ministro Marco Aurélio, declarou-se, em 21/06/2004, habilitado a atuar no feito. Em 24/06/2004, proferiu decisão quanto ao requerimento de intervenção, a título de amicus curiae, formulado em 23/06/2004, pela Confederação Nacional dos Bispos do Brasil – CNBB. O referido pleito foi sumariamente indeferido por não ser cabível a analogia pretendida entre a Lei da ADPF (Lei 9882/99) e a norma disciplinadora das ADINs e ADCs (Lei 9868/99). Além disso, entendeu que tal intervenção apenas tumultuaria o processo.

No dia 01/07/2004, prolatou decisão liminar quanto ao pedido da ADPF 54. Primeiro, reconheceu presentes os requisitos de admissibilidade. A ofensa aos preceitos fundamentais e a subsidiariedade como satisfatoriamente demonstrados. No mérito, decidiu por estar presente a ofensa à Dignidade Humana, à Saúde e à Liberdade. Ressaltou a inviabilidade do feto anencéfalo e a importância da medida para evitar decisões conflitantes e descrença no Judiciário. Por essas razões, concedeu a liminar, reconhecendo o direito das gestantes a se submeterem à intervenção médica no caso de anencefalia, a partir de laudo médico comprovador da deformidade do feto.

Em 02/08/2004, o Tribunal deliberou que a matéria fosse julgada pelo pleno. Foram concedidas vistas ao Procurador Geral da República. A Associação Nacional Pró-Vida e Pró-Família - Pró-Vida-Família e a Associação Univida, requereram suas admissões no feito, na qualidade de amicus curiae, em 09/08/2004. Na mesma data, o Relator novamente indeferiu a intervenção. Em 19/08/2004 foi juntado o parecer de Cláudio Fonteles, Procurador Geral da República.

A Associação de Desenvolvimento da Família - adef, também requereu sua admissão no feito na qualidade de amicus curiae. O Relator também a indeferiu. O Ministério Público Federal, em 30/04/2004, solicitou o exame, a título de questão de ordem, da via eleita à Corte. Em outras palavras, se seria cabível a ADPF.

Em 20/10/2004, houve o julgamento pelo pleno do Supremo Tribunal Federal. No dia, houve sustentação oral do advogado na CNTS, Luis Roberto Barroso. Em contrapartida, o Procurador Geral da República – Cláudio Fonteles - defendeu a posição contrária. O Ministro Carlos Aires de Brito pediu vistas. O julgamento terminou sendo desdobrado em duas questões: a) prejudicial (cabimento da ADPF) e b) principal (mérito). O Ministro Eros Grau, como questão de ordem, suscitou um reexame da liminar concedida. O plenário do Pretório Excelsior decidiu reapreciar o mérito da liminar. O resultado foi a cassação parcial da medida. Não se vislumbrou a verrossimilhança, afinal, trata-se de ponto polêmico. Os procedimentos médicos voltaram a ser proibidos. A votação foi de sete (contrário) a quatro (favorável).

O cabimento da ADPF foi apreciado em 24/08/05. Por maioria a favor, decidiu-se pela admissibilidade da Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental para avaliar se é possível a interrupção terapêutica da gravidez no caso do feto anencéfalo.

Em 25/05/2005 o Procurador Geral da República requereu a realização de audiência pública. Os autos permanecem, até o presente momento, conclusos. (ANEXO V)

Aparentemente, a questão ainda trará muita divergência, pelos argumentos já anteriormente ventilados, não existindo uma posição firmada.


DISPOSIÇÕES FINAIS

A aplicação da proporcionalidade nos princípios constitucionais

Dados da Organização Mundial de Saúde revelam que o Brasil é o 4º colocado em nascimento de fetos anencefálicos.182 Isso, mais uma vez, atesta o relevo da problemática traçada até aqui. Não consiste em tema novo. Apenas após a ADPF 54, a mídia começou a noticiar os casos em que Tribunais autorizaram a antecipação terapêutica do parto. Houve particular repercussão de uma decisão, proferida em 10/05/2005 pelo Desembargador Sílvio de Arruda Beltrão, do TJPE183, e de outra, concedida em 13/05/2005 pelo Juiz substituto Rafael Pagnon Cunha, do TJRS184. Mas, como frisado no principio dessa monografia, são mais de 3.000 casos de liminares concedidas registrados.

Diante desse contexto, os dados médicos introduzidos nessa monografia comprovam que a anencefalia não tem cura. Não existe também nenhum meio de prevenção. É plenamente viável um diagnóstico seguro, inclusive aferindo qual o percentual cerebral atingido. No caso do anencéfalo, não há um ou os dois hemisférios cerebrais. Isso inviabiliza o funcionamento do cérebro. Grande parte dos bebês nem chega a nascer. Quando ocorre o parto, em regra, a “vida” dessas crianças dura apenas minutos. São comuns danos à saúde da gestante.

Tudo isso traz em si uma única conclusão: o parto dessas crianças é um sacrifício sem benefícios à gestante.

Trazendo uma abordagem abrangente registramos que no ordenamento jurídico não há uma única visão sobre quando e como ocorre a vida. O texto legal do Código Civil é truncado e dá margem a duas correntes: a natalista e a conceptista. A discussão continua sendo travada, não se obtendo uma conclusão definitiva.

Já no que concerne à morte, mais elucidativos foram os resultados. Em se tratando de matéria inegavelmente da seara médica, de inestimável valia foram as Resoluções do Conselho Federal de Medicina. Mesmo com ressalvas, na Resolução 1480/97 está descrita a morte, nos exatos parâmetros em que se concebe o anencéfalo. A lei de doação de órgão, ao definir a morte cerebral como requisito, também trouxe luz à matéria. Por fim, a Resolução 1752/04, que permitiu a doação dos órgãos do anencéfalo, foi a peça fundamental que faltava, pois disciplinou, especificamente a hipótese do nascituro. Diante dessas características, e frente ao quadro clínico do anencéfalo, não há outro arremate: ele está morto.

O tipo penal do aborto foi apresentado em suas diversas interpretações, conferidas por vários doutrinadores. Em síntese, demonstramos a inviabilidade de conceber a norma penal como um tipo perfeito, sem margem para a exegese.

Restou certo que o tipo penal do aborto é uma norma em branco. Não existe uma só forma de o compreender. Tanto é assim que o Ministro Carlos Ayres Brito asseverou que há “pelo ao menos três acepções ou representações mentais ou conteúdos semânticos tenho como passíveis de extração dos signos lingüísticos em que se vaza o discurso legal.185

Noções do que seria a Argüição de Descumprimento de Preceito Fundamental foram introduzidas ao leitor. Da Ação Constitucional de n° 54 apontamosos seus fundamentos, bem como aos andamentos processuais.

Ao adentrar no mérito, entendemos que questões religiosas não devem reger um Estado de Direito definido como laico. O Direito à Vida, sim, é um Preceito Fundamental. Entretanto, não é absoluto. Ademais, não possui um conteúdo ou um conceito fechado. Está aberto a estudos e ponderações. Inequivocamente, há no caso em tela um chamado choque de direitos fundamentais. O Princípio da Dignidade Pessoa Humana, da Liberdade, da Saúde, da Vedação à Tortura também estão em jogo.

Ponderar, de maneira alguma, é turbar competência. Esse mecanismo permite detectar situações inconstitucionais menos flagrantes. Garante ao jurista um instrumento prático inigualável para evitar uma excessiva intervenção do legislador na seara dos direitos fundamentais.186 Através desse meio, é viável indagar “se as condições impostas pelo legislador não se revelariam incompatíveis com o princípio da razoabilidade ou da proporcionalidade (adequação, necessidade, razoabilidade).187

Por todos os argumentos outrora ventilados, entendemos que inexiste adequação, necessidade ou proporcionalidade.

Ao adentrar nos dados concretos, bem se vêem, de maneira ainda mais evidente, o quanto é desproporcional a aplicação da tipificação penal ao caso da gestante do anencéfalo, e a ofensa direta aos Preceitos Constitucionais que tal enquadramento penal representa. Não se olvide que “uma questão de direito é sempre uma questão de fato, e uma questão de fato, será sempre uma questão de direito. Não é possível separar esses âmbitos.188

A realidade brasileira demonstra a desproporção e a irracionalidade da permanência da punição do aborto anencéfalo. Como provas, registre-se que em 2003, “o Sistema Único de Saúde fez 1.888 abortos legais, ao custo de R$ 231.4 mil reais”.189 Entretanto, “no mesmo ano, a rede pública fez 236.365 intervenções cirúrgicas pós-abortos espontâneos ou provocados ao custo de R$ 28.9 milhões”. Tenta-se resolver o problema de uma maneira que vai de encontro ao próprio interesse público.

Ademais, é necessário colocar um ponto final na questão. Os administrados não possuem uma posição segura sobre a matéria. “Para cada autorização concedida, várias outras são negadas, criando-se assim uma incerteza, uma insegurança jurídica inadmissível num domínio em que o ordenamento jurídico tem de oferecer a mais firme proteção ao cidadão.”190

O Supremo Tribunal Federal já decidiu que, nas medidas restritas de direitos, há de ser uma relação meio-fim (Zweck-Mittel Zusammenhang), devendo ser pronunciada a inconstitucionalidade da lei que contenha limitações inadequadas, desnecessárias ou desproporcionais (não razoáveis).191 Exatamente assim é no caso da anencefalia.

A separação de poderes não pode ser obstáculo. A concretização dos direitos exige, não raras vezes, a edição de atos legislativos, visto que eventual inércia do legislador pode se configurar como afronta a um dever constitucional de legislar.192 Conforme um dos votos da ADPF 54, “essa ação constitucional deve ser vista, a meu sentir, como instrumento de alargamento da ação protetiva dos direitos fundamentais, que é a missão primordial da jurisdição constitucional”.193

Por todo o exposto, espera-se ter traçado alguns meandros desse tema tão controvertido. Como arremate, entendemos que não basta ao Brasil possuir uma Constituição com um amplo rol de Direitos Fundamentais positivados. É preciso aplicá-los. Levar em consideração sua finalidade e objetivos. Atentar para a evolução de conceitos Ponderar em relação a normas infraconstitucionais, em busca de um Estado de Direito pleno. Em verdade, visamos nesse trabalho defender uma vida digna aos seres humanos.

Sobre a autora
Mariana Barbosa Cirne

Mestre em Direito, Estado e Constituição (UnB). Especialista em Direito Público (UnP) e em Processo Civil (IDP). Bacharela em Direito (UFPE). Procuradora Federal (AGU). Coordenadora do Centro de Estudos Jurídicos da Presidência da República (PR).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CIRNE, Mariana Barbosa. Anencefalia: acrescentando questões médicas a uma discussão jurídica. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3496, 26 jan. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23524. Acesso em: 23 dez. 2024.

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