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A licença compulsória das patentes como instrumento efetivador do acesso a medicamentos

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Agenda 06/04/2013 às 09:01

5. Considerações Finais

Os direitos fundamentais, é sabido, carecem mais de efetivação que de discussão, vez que já não se admite, sob um regime constitucional como o brasileiro, cogitar-se de um Estado que não proporcione pleno acesso à saúde. Questão pertinente à efetivação do direito à saúde diz respeito ao fornecimento de medicamentos, amplamente discutido em virtude de ser a propriedade destes protegida pelo sistema de patentes.

Em decorrência das mudanças trazidas pelo que se convencionou chamar pós-modernidade, o conceito tradicional de propriedade – antes inviolável e absoluta – adquiriu novo conteúdo, haja vista a imperativa necessidade de cumprimento de sua função social. Esta é requisito essencial, por força do disposto na Constituição Federal, para que seja a propriedade industrial merecedora de tutela.

Ganha relevância, assim, a discussão acerca dos limites da proteção patentária, por ser questão diretamente ligada à divulgação de novas tecnologias. O necessário enfoque constitucional no que tange às patentes de medicamentos exige, em razão do interesse coletivo, sejam também levados em consideração interesses outros que não os do proprietário-inventor, impondo limitações aos direitos deste em prol dos interesses sociais.

De fato, não se pode privilegiar uma concepção individualista do sistema patentário; é preciso encará-lo como mecanismo necessário ao desenvolvimento do país, de relevante interesse coletivo, que tem sua proteção condicionada ao atendimento de sua função social. Sendo a patente um instrumento garantidor do retorno dos investimentos realizados pela indústria - sem tal incentivo financeiro não há investimento em novos produtos farmacêuticos - tem ela um preponderante papel social e desenvolvimentista. Afigura-se a patente, portanto, como propriedade digna de proteção, desde que não haja prejuízo no acesso ao direito à saúde.

A realidade, porém, mostra que o direito à saúde ainda está distante de superar a mera consagração formal no texto constitucional. Não se olvida que tal direito, juntamente com o próprio direito à vida e à dignidade da pessoa humana, em uma ponderação de valores, sempre deverão prevalecer. Entretanto, não basta que esta prevalência dê-se no âmbito das idéias; urge sejam buscados meios para sua garantia.

Assim, a proposta não é, de forma alguma, a exclusão dos fármacos do regime de proteção patentária de forma geral e absoluta, mas a utilização de alternativas que possibilitem, conforme o caso, sobreponha-se o direito à saúde ao direito de propriedade. Faz-se necessária, para tanto, uma ponderação criteriosa, à luz da proporcionalidade, a fim de eleger a medida mais adequada a cada demanda. É, em última análise, a opção pelo interesse social, preferindo-o em detrimento daquele meramente individual do inventor.

Exsurge, portanto, o instituto da licença compulsória como meio otimizador do direito à saúde. Mais do que instrumento para coibir o abuso do poder econômico, como punição, é possível valer-se do licenciamento involuntário em razão do interesse público. O direito de patente cede, em razão do interesse social, para que se efetive a prestação positiva do Estado, que, ao fornecer medicamento, cumpre seu dever de assegurar a todos uma saúde condizente com o disposto na Constituição Federal.


6.Referências Bibliográficas

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Notas

[1] A função social da propriedade privada é um dos princípios constitucionais da ordem econômica (art. 170, III CF), a qual se funda na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tendo por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social.

[2] FURTADO, Lucas Rocha. Sistema de Propriedade Industrial no Direito Brasileiro: comentários à nova legislação sobre Marcas e Patentes – Lei nº 9.279/96. Brasília: Brasília Jurídica, 1996. p. 25.

[3] Ibidem, p. 33.

[4] Ibidem, p. 41 et seq. Sobre os conceitos de propriedade industrial, v. os comentários de SOARES, José Carlos Tinoco. Lei de Patentes, marcas e direitos conexos. Lei 9.279 – 14.05.1996. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1997.

[5] Embora a questão fuja ao escopo deste trabalho, cumpre mencionar que há diversas teorias que buscam justificar o privilégio da exploração exclusiva. Segundo a Teoria do Direito Natural, um invento novo deve pertencer a seu inventor porque este o trouxe ao mundo, e, portanto, ao conceder-lhe o direito exclusivo não se tira nada dos outros. Pela Teoria da Recompensa, é justo conceder a exploração exclusiva de um produto por certo período ao indivíduo que dispendeu tempo e recursos para criá-lo. A Teoria do Estímulo entende que é necessário que se vislumbre lucro quando da realização de uma pesquisa; caso contrário, não haveria mais investimentos e tampouco progresso científico. Para a Teoria do Contrato, há uma espécie de acordo entre o indivíduo e o Estado: aquele torna público seu invento, permitindo que outros o conheçam e impedindo gastos desnecessários em pesquisas buscando criar técnicas ou produtos já existentes, enquanto este garante ao inventor o direito exclusivo de exploração econômica sobre sua criação por certo tempo. Sobre o assunto, cf. HAMMES, Bruno Jorge. Reflexões Sobre a Privilegiabilidade dos Inventos de Medicamentos e de Gêneros Alimentícios. Estudos Jurídicos, São Leopoldo, Unisinos, v. 21, n. 53, set. –dez. 1988, p. 51 et seq.

[6] Art. 5º, XXIX, da CF: “a lei assegurará aos autores de inventos industriais privilégio temporário para sua utilização, bem como proteção às criações industriais, à propriedade das marcas, aos nomes de empresas e a outros signos distintivos, tendo em vista o interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do país.”

[7] Art. 2º, I, da Lei nº 9.279/96: “A proteção dos direitos relativos à propriedade industrial, considerado o seu interesse social e o desenvolvimento tecnológico e econômico do país, se efetua mediante: I – concessão de patentes de invenção e modelos de utilidade.”

[8] OLIVEIRA, Ubirajara Mach de. A Proteção Jurídica das Invenções de Medicamentos e de Gêneros Alimentícios. Porto Alegre: Síntese, 2000. p. 163.

[9] Em uma sociedade como a atual, torna-se difícil individuar um interesse particular que seja completamente autônomo, independente, isolado do interesse dito público. A distinção, hoje, não é mais qualitativa, mas quantitativa. Para um novo olhar sobre o direito privado, v. PERLINGIERI, Pietro. Perfis do Direito Civil: introdução ao direito civil constitucional. 2. ed. São Paulo: Renovar, 2002.

[10] FURTADO, Lucas Rocha. Op. cit. p. 23.

[11] BENJAMIN, Antonio Herman V. Proteção do consumidor e patentes: o caso dos medicamentos. Revista de Direito do Consumidor, nº 10, abr.-jun. 1994. p. 26.

[12] Trata-se de um dos objetivos fundamentais da República, por força do art. 3º, I, da CF.

[13] Segundo dados do INPI, até 1996, já tendo transcorrido 20 anos de vigência do Código de Propriedade Industrial, somente foram concedidas duas únicas licenças, ambas a uma única empresa nacional, Nortox Agroquímica S/A, de patentes pertencentes à empresa norte-americana Monsanto. Sobre o assunto, cf. FURTADO, Lucas Rocha. Op. Cit., p. 64.

[14]  Os princípios da ordem econômica, embora estabeleçam a liberdade do mercado como regra, exigem que se reprima o abuso de poder econômico, coibindo, deste modo, práticas que visem à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e ao aumento arbitrário dos lucros. Sobre o assunto, v. excelente artigo de BENJAMIN, Antonio Herman V. Op. Cit., e FURTADO, Lucas Rocha. Op. cit, p. 65.

[15] CUNHA, Rodrigo. A quebra de patente de medicamentos anti-Aids: benefícios sociais e econômicos para países periféricos. Revista Com Ciência, reportagem especial, ago. 2001. Disponível em: <http://www.comciencia.br/especial/pataids/pataids01.htm>. Acesso em: 24 jun. 2004.

[16] Há casos em que a licença compulsória é utilizada como um instrumento de barganha, como ocorreu quando da redução no preço de medicamentos anti-Aids, em que esta possibilidade serviu como forma de pressão aos grandes laboratórios. Para economizar nos gastos e garantir um tratamento de qualidade à população, o Ministério da Saúde iniciou, em 2001, um processo para pedir a quebra de patentes dos medicamentos que integram tal coquetel. Com a ameaça de ver seus lucros reduzidos, grandes laboratórios como Roche, Merck e GlaxoSmithKlein negociaram a redução de preços com o governo, evitando desta forma a quebra de suas patentes. Sobre o tema, v. CUNHA, Rodrigo. Op. cit. e ESCUDERO, Camila e BARTIÈ, Elisa. A quebra de patentes e o papel do Brasil. Disponível em: <http://dolexplica.dgabc.com.br/1601remedio_patente.asp>. Acesso em: 25. jun. 2004.

[17] OLIVEIRA, Op. cit., p 40.

[18] SCHWARTZ, Germano A. e GLOECKNER, Ricardo Jacobsen. A tutela antecipada no direito à saúde: a aplicabilidade da teoria sistêmica. Porto Alegre: Fabris, 2003. p. 85 et. seq.

[19] Trata-se, em sua conceituação, de direitos a prestações em sentido estrito. Sobre o tema, v. ALEXY, Robert. Teoría de los Derechos Fundamentales. Madrid: Centro de Estudios Constitucionales, 1997. p. 482.

[20] PERLINGIERI, Pietro. Op. cit., p. 54 et. seq.

[21] ROCHA, Julio Cesar de Sá da. Direito da Saúde: direito sanitário na perspectiva dos interesses difusos e coletivos. São Paulo: LTr, 1999. p. 43.

[22] SOUZA, Mauro Luís Silva de. A saúde como garantia fundamental. São Leopoldo: [ ], 2002. No original. 

[23] Não se aceita, e nem se poderia, esta restrição. A Constituição Federal estabeleceu que a saúde é uma "política social" (art. 6º), “direito de todos e dever do Estado” (Art. 196). É política de "relevância pública" (Art. 197) parte integrante da "Seguridade Social" (Art. 194), devendo ser "financiada por toda a sociedade", de forma direta e indireta, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (Art. 195, e, §§ 1º e 2º, I, II e III do Art. 198), além de contribuições sociais (I, II e III, do art. 195) e outras fontes (§ 1º, art. 198), jamais podendo ser reservada apenas e na quantidade que alguém possa individualmente financiar, e sim na medida da necessidade dos indivíduos e das coletividades (II do Art. 198). É, ainda, direito de todos os brasileiros e estrangeiros que vivem no Brasil; logo, em sendo "direito fundamental", tem aplicação imediata (§ 1º, do art. 5º). Para uma ampla conceituação do direito à saúde, v. SCHWARTZ, Germano A. e GLOECKNER, Ricardo Jacobsen. Op. cit., principalmente o Cap. III. Sobre as atribuições do pode público na prestação do direito à saúde, mormente no que tange às atribuições do Sistema Único de Saúde, confira TAVARES, Lúcia Léa Guimarães. O fornecimento de medicamentos pelo Estado, Revista de Direito da Procuradoria-Geral do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, v. 55, 2002, p. 103.

[24] SARLET, Ingo Wolfgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 3. ed. Porto Alegre, Livraria do Advogado, 2003. p. 314 et seq.

[25] A concepção atual de saúde, pela OMS, está assim enunciada: “Saúde é o completo bem-estar físico, mental e social, e não apenas a ausência de doenças.” Direito à Saúde, então, seria o direito assegurado a todas as pessoas de exigirem do Estado condições para gozar de boa saúde. O seu desdobramento constitui o Direito da Saúde, que se pode conceituar como o conjunto de normas jurídicas que definem os meios de concretizá-lo. Por fim, por Direito Sanitário entende-se o estudo interdisciplinar que objetiva aproximar conhecimentos jurídicos e sanitários. Sobre o assunto, veja TORRES-FERNANDES, Marília de Castro. Ministério Público em São Paulo: Eficácia da função institucional  de zelar pelo direito à saúde. Dissertação de mestrado. Universidade de São Paulo, 1999.         

[26] Art. 2º e § 1º da Lei 8.080/90 (Lei Orgânica da Saúde - LOS) e Art. 196 da Constituição da República Federativa do Brasil. 1998.

[27] CANOTILHO, José Joaquim Gomes e MOREIRA, Vital. Fundamentos da Constituição. Coimbra: Coimbra, 1991. p. 197.

[28] Saliente-se, aqui, que, pela sua inequívoca relevância, haja vista tratar-se de garantia do próprio direito à vida, poder-se-á ter como certo que o direito à saúde, ainda que não tivesse sido reconhecido expressamente pela Constituição, assumiria a feição de direito fundamental implícito, a exemplo, aliás, do que ocorre em outras ordens constitucionais, como é o caso da Argentina, ao menos segundo parte da doutrina, e da Alemanha.

[29] TORRES-FERNANDES, Marília de Castro. Ministério Público em São Paulo: Eficácia da função institucional de zelar pelo direito à saúde. Dissertação de mestrado. Universidade de São Paulo, 1999. Fl. 9.        

[30] RANG, H.P, DALE, M. M., & RITTER, J. M. Farmacologia. 3. ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 1997. p. 4.

[31] Ibidem.

[32] CAVALIERI FILHO, Sergio. Apud LICKS, Otto. Registro de Medicamentos genéricos na ANVS e infrações de patentes. Revista da ABPI, nº 45, mar.-abr.2000. p. 28.

[33] Art. 6°, I, d, da Lei nº 8.089/90.

[34] GOUVÊA, Marcos Maselli. O Direito ao Fornecimento Estatal de Medicamentos. No original.

[35] TAVARES, Lúcia Léa Guimarães. Op. cit., p. 103.

[36] Neste sentido, RESP 83.800/RS, 1ª T., maioria, Rel. Min. Gomes de Barros, vencido o Relator originário, Min. Demócrito Reinaldo (medicamentos para fenilcetonúria); AGA nº 253938/RS, 1ª T., unânime, Rel. Min. José Delgado (medicamentos para AIDS); ROMS 11.183/PR, 1ª T., unânime, Rel. Min. José Delgado (medicamentos para esclerose lateral amiotrófica).

[37] V. RE 257.109 (Rel. Min. Maurício Corrêa, 2ª T.), RE 242.859 (Rel. Min. Ilmar Galvão, 1ª T., publ. DJ 17/09/99), 247.900 (Rel. Min. Marco Aurélio, julg. 20/09/99), RE 267.612 (Rel. Min. Celso de Mello, j. em 02/08/2000, com Agravo Regimental 271.286 j. unânime pela 2ª T. em 12/09/2000), RE 279.519 (Rel. Min. Nelson Jobim, j.em 22/09/2000) e RE 273834 (Rel. Min. Celso de Mello, j. em 23/08/2000). Todos estes recursos são oriundos do Rio Grande do Sul.

[38] In verbis: “O problema fundamental em relação aos direitos do homem, hoje, não é tanto o de justificá-los, mas o de protegê-los. Trata-se de um problema não filosófico, mas político.” BOBBIO, Norberto. A Era dos Direitos. 14. ed. Rio de Janeiro: Campus, 1992. p. 24. Grifos no original.

[39] Como lembra GOUVÊA, “em sede de normas atributivas de direitos negativos, oponíveis a abstenções, é mais fácil reconhecer seu caráter impositivo, porque, para sua implementação, não demandam gastos ostensivos.” Em contrapartida, cumpre lembrar que o argumento da ausência de recursos orçamentários não pode servir de obstáculo à promoção da saúde e à garantia da própria vida do cidadão, dever do Estado e direito de todos...

[40] LEGEAIS, Raymond. Le Droit D’Auteur Face aux Nouvelles Technologies. Revue Internationale de Droit Comparé. Paris, Société de Législation Comparée, n.2,  abr.-jun. 1990.

[41] Os medicamentos farmacêuticos têm duas características especiais, que os diferem de outros produtos: a natureza credencial dos medicamentos e os chamados problemas de agência. Pela primeira característica, tem-se que o consumidor, em geral, não é capaz de avaliar diversos aspectos da qualidade dos medicamentos, sendo necessário um profissional especializado para atestá-la. Assim, na ausência de uma certificação pública, reconhecida como confiável, a reputação da marca passa a ser componente relevante na determinação das decisões de compra. Já os problemas de agência decorrem da dissociação entre consumidor e o responsável pelo diagnóstico e receita dos medicamentos (quem prescreve é o médico, mas quem compra é o paciente). Cf. GARCÍA, Jorge, BERMUDO, Vera e COURO, Betovem. Opções estratégicas para a indústria farmacêutica brasileira após a Lei de Patentes e Genéricos. Disponível na internet.

[42] BENJAMIN, Antonio Herman V. Op. cit., p. 26.

[43] Ibidem.

[44] É importante esclarecer a diferença entre produzir o princípio ativo (o insumo) e o produto final (o remédio). Por princípio ativo entende-se a substância que exerce a ação terapêutica. Já o produto final é o princípio ativo agregado de substâncias farmacêuticas que o fazem passível de ser utilizado no organismo humano. Cf. FISCHER-PUHLER, Platão. O acesso a medicamentos. Gazeta Mercantil, caderno A3, 17 nov. 2003.

[45] LOUGUE Doris Lei. Proteção à propriedade intelectual: patentes dos produtos farmacêuticos. Tese de doutoramento. Universidad de Barcelona, 1999.

[46] OLIVEIRA, Ubirajara Mach de. A Proteção Jurídica das Invenções de Medicamentos e de Gêneros Alimentícios. Porto Alegre: Síntese, 2000. p. 96.

[47] Ibidem, p. 154.

[48] Por todos, v. HAMMES, Bruno Jorge, para quem “a idéia de que não se pode fazer negócio da doença dos homens é irreal e ingênua. É absurdo remeter à recompensa divina o tratamento curativo do homem, precisamente em um mundo comercializado, excluindo da proteção da patente as invenções da medicina”. Op. cit., p. 55 et. seq.

[49] Itália, Alemanha, Suíça, França e Japão somente incorporaram essa política na década de 70. Sobre o assunto, v. LOUGUE Doris Lei. Proteção à propriedade intelectual: patentes dos produtos farmacêuticos. Tese de doutoramento. Universidad de Barcelona, 1999. CUNHA, Rodrigo. A quebra de patente de medicamentos anti-Aids: benefícios sociais e econômicos para países periféricos. Revista Com Ciência, reportagem especial, ago. 2001. Disponível em: <http://www.comciencia.br/especial/pataids/pataids01.htm>. Acesso em: 24 jun. 2004.

[50] MARANHÃO, Clayton. Tutela jurisdicional do direito à saúde. São Paulo: RT, 2003. p.256 et seq.

[51] Países periféricos como o Brasil e a Índia, apesar de suas grandes contradições sociais, possuem uma razoável produção científica e um certo acompanhamento dos avanços tecnológicos gerados nos países ricos, podendo, portanto, beneficiarem-se da discussão internacional em torno das patentes.

[52] A quebra de uma patente pode ser meio para possibilitar, por exemplo, a produção local do produto patenteado. Em verdade, a simples possibilidade da utilização dessa prerrogativa tem obrigado muitas multinacionais a reduzir os preços sem que, no entanto, fiquem prejudicados seus lucros. Para coibir abusos, o acordo Trips (Trade-Related Aspects of Intellectual Property Rights), do qual o Brasil é signatário, prevê a concessão de licença de uso da patente sem a autorização do seu proprietário.

[53] In verbis: “O titular ficará sujeito a ter a patente licenciada compulsoriamente se exercer os direitos dela decorrentes de forma abusiva, ou por meio dela praticar abuso de poder econômico, comprovado nos termos da lei, por decisão administrativa ou judicial.”

[54] Outrossim, na forma do art. 80 da lei em comento, a licença poderá ser seguida da própria caducidade do privilégio. Cf. OLIVEIRA, Ubirajara Mach de. A Proteção Jurídica das Invenções de Medicamentos e de Gêneros Alimentícios. Porto Alegre: Síntese, 2000. p. 149.

[55] Mesmo não adotando o termo expressamente, o art. 31 do Acordo permite a “quebra” da patente. Referido dispositivo, apesar de não elencar as razões que podem levar um governo a lançar mão da licença compulsória, determina requisitos que devem ser obedecidos quando for utilizado este recurso. Outrossim, a Declaração de Doha, assinada pelos membros da OMS em 2001 e que pode ser considerada uma soft law sobre a questão e da qual o Brasil também é signatário, dispõe, na alínea b de seu parágrafo 5º, que cada país tem garantido o “direito de conceder licenças compulsórias e a liberdade de determinar os fundamentos para os quais as licenças são concedidas”. Em outros termos, tem-se que obedecidos os requisitos desta norma, o motivo que impele um governo a conceder licenças compulsórias é de sua escolha. Ainda assim, o licenciamento compulsório previsto na legislação brasileira tem sido alvo de contestação por parte dos EUA, país onde se concentra a maior parte dos laboratórios que detém as patentes de medicamentos anti-Aids, por exemplo. Sobre o assunto, v. GARCÍA, Jorge, BERMUDO, Vera e COURO, Betovem. Op. cit., e MORAES, Henrique Choer. O Estado das Discussões sobre patentes de remédios na OMC. Disponível na internet.

[56] OLIVEIRA, Ubirajara Mach de. Op. cit., p. 163. Saliente-se, por oportuno, que ambas as diretrizes guardam consonância com o preceituado na Constituição Federal, porquanto esta as prevê como condição de existência da proteção da propriedade industrial.

[57] FURTADO, Lucas Rocha. Op. cit., p. 68.

[58] SOARES, José Carlos Tinoco. Comentários à Lei de Patentes, Marcas e Direitos Conexos: Lei 9279/96. São Paulo: RT, 1997. p. 117.

[59] Para OLIVEIRA, na hipótese de os particulares não se desincumbirem da tarefa, talvez a expropriação, com base na CF, venha a ser medida impostergável. Op. cit., p. 167.

[60] Médicos sem Fronteiras. Patentes de Medicamentos em Evidência. Informativo 14, 2002.  Disponível na internet.

[61] Segundo dados fornecidos pela ONG Médicos sem fronteiras, apenas 10% dos gastos com pesquisas em saúde são para doenças que representam 90% das enfermidades mundiais, a maioria delas doenças típicas de países pobres. Além disso, a África, por exemplo, representa apenas 1% do mercado mundial de medicamentos e, caso não houvesse proteção de patentes no continente africano, os lucros das grandes indústrias seriam minimamente afetados.

[62] O Brasil tem cerca de 400 patentes de drogas concedidas, a maioria devida ao sistema pipeline, que permitiu o reconhecimento retroativo de patentes. Ao todo, foram depositados apenas cerca de 1200 pedidos - após a nova Lei de patentes - no Instituto Nacional de Propriedade Industrial (INPI), que, no Brasil, é o órgão responsável pela concessão de patentes. Saliente-se que o problema do baixo pedido de patentes é decorrente do pouco ou nenhum estímulo, seja do governo, seja da indústria, para que se façam investimentos em pesquisas que gerem produtos patenteáveis.

[63] Nesse cenário, talvez a função das multinacionais seria trazer para o Brasil principalmente medicamentos inovadores, que são comercializados em todo o mundo.

[64] Sobre a licença compulsória no caso dos genéricos e suas conseqüências, em especial na fase de testagens, veja LICKS, Otto. Registro de Medicamentos genéricos na ANVS e infrações de patentes. Revista da ABPI, nº 45, mar.-abr.2000.

[65] CUNHA, Rodrigo. Op. cit.

[66] MÉDICOS SEM FRONTEIRAS. Op. cit.

Sobre a autora
Aline Machado Weber

Procuradora Federal. Especialista em Direito Público pela UnB. Especialista em Direito Ambiental pela UFRGS. Especialista em Direito Previdenciário pela PUC-Minas.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

WEBER, Aline Machado. A licença compulsória das patentes como instrumento efetivador do acesso a medicamentos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3566, 6 abr. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24102. Acesso em: 8 nov. 2024.

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