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Da necessidade de intimação pessoal para o início da contagem do prazo de 15 dias previsto no art. 475-J, do CPC

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Agenda 30/05/2013 às 10:00

5 PESQUISA DE CAMPO: A POSTURA ADOTADA PELOS MAGISTRADOS NO TOCANTE A APLICAÇÃO DA MULTA POR AUSÊNCIA DE PAGAMENTO ESPONTÂNEO NAS EXECUÇÕES CIVIS

A imposição de multa para coagir o devedor a cumprir a obrigação pecuniária constitui uma inovação no sistema processual civil brasileiro. Com efeito, o atual artigo 475-J do CPC, proveniente da Lei 11.232/05, prevê a incidência de multa no percentual de dez por cento, caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias.

Como se verificou ao longo deste trabalho, existe uma grande discussão na doutrina e na jurisprudência em relação ao momento em que é aberto o prazo conferido ao devedor para satisfazer a obrigação de forma voluntária, tendo em vista a ausência de regulamentação expressa acerca do termo a quo para a incidência da multa.

Outro ponto bastante intrigante em relação a esta multa coercitiva diz respeito à possibilidade de o magistrado dispensá-la no caso concreto. De fato, a lei expressamente determina que inexistindo cumprimento da obrigação na quinzena, automaticamente o valor da condenação deve ser acrescido de multa no percentual de dez por cento. A doutrina, contudo, diverge em relação a esta obrigatoriedade. Com efeito, para alguns doutrinadores o juiz pode dispensar a penalidade caso o devedor demonstre justa causa para o inadimplemento da obrigação.

Diante destes debates doutrinários e sendo certo que o tema é novo (já que a Lei 11.232 entrou em vigor em 23 de junho de 2006) e de grande interesse prático, foi realizada uma pesquisa com os magistrados do Fórum Ruy Barbosa da Comarca de Salvador- Bahia, a fim de demonstrar como essas questões estão sendo aplicadas na prática.

Assim sendo, doze juízes foram ouvidos no período entre 05 de maio e 03 de setembro de 2010, para responder as seguintes perguntas: 1) a partir de que momento começa a fluir o prazo de quinze dias conferido ao devedor para satisfazer a obrigação pecuniária de forma espontânea?; 2) é facultado ao juiz dispensar a multa caso o devedor demonstre que não cumpriu a obrigação por fato alheio à sua vontade?

5.1 A PARTIR DE QUE MOMENTO COMEÇA A FLUIR O PRAZO DE QUINZE DIAS CONFERIDO AO DEVEDOR PARA SATISFAZER A OBRIGAÇÃO PECUNIÁRIA DE FORMA ESPONTÂNEA?

Conforme analisado ao longo desta monografia, há três correntes doutrinárias que tentam delimitar o termo a quo para a incidência da multa. Com efeito, para alguns doutrinadores é suficiente que ocorra o trânsito em julgado da decisão para se inicie o prazo de quinze dias para o cumprimento voluntário da sentença civil. Para outros, somente após a intimação do devedor, por intermédio de seu advogado, é que será aberto o prazo de quinze dias para o adimplemento da obrigação. Por fim, para a terceira corrente doutrinária o prazo referido somente tem início com a intimação pessoal do devedor.

Dos doze juízes entrevistados, cinco entendem que a intimação deve ser pessoal, três determinam a intimação do devedor, na pessoa de seu advogado, três fixam o termo inicial do trânsito em julgado da decisão e um não emitiu posicionamento sobre o tema. Verifica-se que prevalece na prática, com 42%, o posicionamento defendido nesta monografia, qual seja, que o prazo de quinze dias previsto no caput do art. 475-J do CPC deve ser contado da intimação pessoal do devedor.

Em regra, os juízes se pautaram no princípio do contraditório e da ampla defesa para defenderem a necessidade de intimação pessoal do devedor para cumprir a obrigação. Também a distinção entre atos personalíssimos da parte e atos que exigem capacidade postulatória foi feita por alguns juízes para demonstrar que, sendo o pagamento ato pessoal da parte, a ela deve ser dirigida a intimação. Ademais, muitos alegaram que o devedor deve ter inequívoca ciência de que o descumprimento da obrigação no prazo legal enseja aplicação de multa, já que ele arcará com esta penalidade prevista na norma.

Para os juízes que entendem que o prazo começa a fluir da intimação do devedor, na pessoa de seu advogado, a solução para o problema está no meio termo. Com efeito, alegam que a corrente que entende que o prazo flui do trânsito em julgado viola o princípio do devido processo legal, ao passo em que a necessidade de intimação pessoal do devedor enfraquece o principal objetivo da reforma, qual seja, dar maior celeridade ao processo e efetividade ao julgado.

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Os magistrados que entendem que o prazo flui do trânsito em julgado da decisão argumentaram que esse é o posicionamento que mais se adapta ao espírito da reforma processual, já que é o entendimento que exprime maior celeridade e efetividade no cumprimento das decisões judiciais[25]. Alguns juízes também utilizaram como base a decisão do STJ sobre a matéria (REsp nº 954.859- RS). Assim, para esses magistrados a necessidade de intimação, seja na pessoa do devedor ou do advogado, não se compatibilizaria com o escopo da reforma.

Assim sendo, diante da pesquisa realizada, foi constatado que tem prevalecido na prática o posicionamento que determina a intimação pessoal do devedor para cumprir o julgado. Com efeito, conforme visto ao longo desta monografia, ainda que a intenção da reforma processual seja a de agilizar a forma de satisfação do credor, essa diretriz deve se compatibilizar com os princípios constitucionais, notadamente o do contraditório e da ampla defesa.

5.2 É FACULTADO AO JUIZ DISPENSAR A MULTA CASO O DEVEDOR DEMONSTRE QUE NÃO CUMPRIU A OBRIGAÇÃO POR FATO ALHEIO À SUA VONTADE?

Uma segunda questão que tem grande divergência na doutrina diz respeito à possibilidade de o juiz dispensar a incidência da multa no caso concreto, caso o devedor demonstre justa causa para o inadimplemento da obrigação.

O tema ganha relevância tendo em vista que a lei expressamente determina que a multa deve incidir caso o pagamento não seja efetuado na quinzena. Assim, para alguns doutrinadores, devido a esta imposição legal, não sobraria opção para o magistrado senão aplicar a multa na hipótese de o devedor não cumprir a obrigação no prazo de quinze dias. Para outros, em atenção ao princípio da adequação do processo às peculiaridades da causa, pode o juiz dispensar a multa caso o devedor demonstre que não pagou a dívida por fato alheio à sua vontade.

Dos doze magistrados entrevistados, cinco entendem que é facultado ao juiz dispensar a multa em virtude de justa para o inadimplemento da obrigação, quatro entendem que pouco importa as peculiaridades do caso concreto, uma vez que escoado in albis o prazo de quinze dias sem o pagamento, a norma legal deve incidir de forma imediata e automática de modo a acrescentar ao valor da condenação a multa de 10%, e três magistrados não se posicionaram sobre o tema.

Assim, regra geral, para os magistrados que entendem que não é lícito dispensar a multa em caso de descumprimento da obrigação na quinzena, a justificativa utilizada é que a lei não prevê esta dispensa em casos de dificuldades comprovadas pelo devedor. Nesse sentido, foi dito por um dos juízes entrevistados que “a multa sempre deve incidir, uma vez que o artigo fala que deve e não que poderia incidir, portanto, não existe uma faculdade, mas sim uma imposição”.

Em sentido contrário, para a outra parcela dos juízes entrevistados, a multa pode ser dispensada caso o devedor não esteja de má-fé e efetivamente comprove que não adimpliu a obrigação por fato alheio à sua vontade. Com efeito, foi dito por um dos magistrados que “não se pode tratar de forma idêntica o devedor que mostrou impedimento para cumprir a obrigação e o devedor que deixou passar in albis o prazo de quinze dias sem apresentar o pagamento ou motivo de impossibilidade de fazê-lo”.

Ex positis, restou demonstrado que, com 42%, tem prevalecido o entendimento de que é lícito ao juiz, em virtude das especificidades do caso concreto, dispensar a multa do devedor. Com efeito, este posicionamento privilegia os princípios da adequação do processo às peculiaridades da causa e o da proporcionalidade, já que não seria razoável tratar de forma semelhante o devedor que provou impossibilidade de realizar o pagamento na quinzena, e o devedor que, podendo cumprir a obrigação, mostrou-se recalcitrante.


6 CONCLUSÃO

Após a análise do tema, chegou-se às seguintes conclusões:

1) O processo, para ser utilizado como instrumento verdadeiramente democrático, deve ser realizado sob o manto da garantia constitucional do contraditório e da ampla defesa.

2) Decorre da noção de processo a idéia de equilíbrio e diálogo, e, para tanto, é necessário que se dê ciência a cada parte dos atos praticados pelo juiz e pelo seu adversário. Para viabilizar o conhecimento destas informações, o processo civil se vale de dois instrumentos de comunicação dos atos processuais: citação e intimação.

3) O CPC de 1939 tentava diferenciar notificação de intimação, apesar de que, na prática, estes conceitos acabavam se confundindo. O atual CPC não mais prevê a notificação como espécie de ato de comunicação processual.

4) Citação é o ato de comunicação processual por meio do qual o demandado é chamado a integrar a relação jurídica processual, a fim de que possa, querendo, manifestar-se acerca do pedido deduzido em juízo pelo autor.

5) Regra geral, a citação deve ser realizada pelo correio, exceto nas hipóteses abarcadas pelo art. 222 do CPC. Nas hipóteses previstas no mencionado artigo, bem como nos casos em que a citação pelo correio for frustrada, far-se-á a citação por meio de oficial de justiça.

6) Intimação é o ato pelo qual se dá ciência a alguém dos atos e termos do processo, para que faça ou deixe de fazer alguma coisa. A intimação pode ser feita por publicação do ato na imprensa oficial, por via postal, por meio de oficial de justiça, pessoalmente em cartório ou na própria audiência, bem como por edital ou com hora certa.

7) Ordinariamente, os advogados são intimados pela só publicação dos atos na imprensa oficial. Existem situações, entretanto, em que a própria lei excepciona a regra geral da intimação dos advogados pela imprensa oficial, exigindo a cientificação pessoal do causídico (por exemplo, art. 242, § 2º, CPC).

8) Exige-se a intimação pessoal da parte no processo quando o ato deva ser por ela praticado e/ou quando as conseqüências pelo descumprimento do comando judicial devam ser por ela suportadas, tendo em vista que, nesta última hipótese, é necessário que a parte tenha ciência inequívoca das sanções que lhes serão aplicadas em caso de descumprimento da ordem judicial.

9) As partes, regra geral, são intimadas pela via postal. Esta modalidade de intimação pode ser afastada quando o dispositivo legal estabelecer outra forma de intimação (art. 238, CPC) ou quando frustrada a realização pela via postal, hipótese em que a intimação far-se-á por meio de oficial de justiça (art. 239, CPC).

10) Tanto a intimação pelo correio como a realizada por oficial de justiça são modalidades de intimação pessoal.

11) A Lei 11.232/2005 unificou a matéria da execução de sentença, de sorte que, atualmente, todas as espécies de obrigações (fazer, não fazer, dar coisa diferente de dinheiro e pagar quantia) estão regidas por um processo sincrético, quando a obrigação provém de sentença civil.

12) O art. 475-J, CPC, inserido pela Lei 11.232/05, prevê um prazo de quinze dias para o devedor efetuar o pagamento espontâneo do valor da condenação, sob pena de ver incidir sobre sua dívida uma multa no percentual de dez por cento.

13) A multa prevista no art. 475-J do CPC tem a finalidade de estimular o rápido cumprimento da obrigação pecuniária, incentivando o devedor a evitar a incidência da multa através do pagamento voluntário. Trata-se, portanto, de medida coercitiva indireta.

14) A multa tem o percentual fixo (10%) e deve ser aplicada se não ocorrer o pagamento voluntário no prazo de quinze dias.

15) Pode o juiz dispensar a multa do devedor caso este demonstre justa causa para o não pagamento no prazo de quinze dias. Com efeito, não seria razoável tratar de forma semelhante o devedor que provou impossibilidade de realizar o pagamento na quinzena, e o devedor que, podendo cumprir a obrigação, mostrou-se recalcitrante.

16) Para que o devedor fique livre da incidência da multa, mister se faz que seja adimplida completamente a ordem judicial. Na hipótese de cumprimento parcial, a incidência da multa dar-se-á, proporcionalmente, em relação à parte não observada (art. 475-J, § 4º, CPC).

17) O valor da condenação não se confunde com o valor da obrigação. Com efeito, o valor da condenação abrange tudo aquilo que deve ser pago pelo devedor, em função da sentença proferida contra si.

18) É cabível o arbitramento de honorários advocatícios no procedimento de cumprimento da sentença. De fato, a supressão da verba honorária na fase de cumprimento de sentença colidiria com os objetivos da reforma processual, notadamente com a busca da satisfação do direito do credor em tempo razoável, já que a supressão dos honorários advocatícios tornaria inócua a finalidade coercitiva da multa prevista no art. 475-J do CPC.

19) A grande discussão em torno do art. 475-J, CPC, diz respeito ao momento em que se inicia o prazo conferido ao devedor para satisfazer a obrigação de forma voluntária, tendo em vista a ausência de regulamentação expressa acerca do termo a quo para a incidência da multa.

20) Três correntes doutrinárias procuram delimitar o termo inicial da incidência da multa.  Para a primeira, é suficiente que ocorra o trânsito em julgado da decisão para que se inicie automaticamente o prazo de quinze dias para o cumprimento voluntário da sentença civil. Para a segunda concepção doutrinária, o prazo para cumprimento da decisão começa a fluir da intimação do devedor, na pessoa de seu advogado. Por fim, para a terceira corrente doutrinária o prazo referido somente tem início com a intimação pessoal do devedor.

21) Para os adeptos da corrente que entende que o prazo de quinze dias flui do trânsito em julgado, a exigência de intimação do devedor para cumprir a ordem judicial, seja por intermédio de seu advogado ou pessoalmente, violaria a idéia de celeridade que motivou as recentes reformas do CPC. Este posicionamento, contudo, viola os princípios constitucionais do contraditório, ampla defesa e da publicidade, tendo em vista que é necessário que o devedor seja informado de que a decisão judicial está com a eficácia “liberada” para ser cumprida.

22) A segunda corrente doutrinária entende que somente depois da intimação do devedor, por intermédio de seu advogado, é que será aberto o prazo de quinze dias para cumprimento voluntário da decisão. Com efeito, os adeptos deste entendimento aduzem que é suficiente a intimação do advogado da parte, já que esta é a regra geral da intimação dos atos no processo. Ademais, a necessidade de intimação pessoal esbarraria no principal objetivo da reforma, qual seja, a celeridade processual.

23) Para o terceiro entendimento, o prazo de quinze dias flui da intimação pessoal do devedor. Este parece ser o posicionamento mais adequado, tendo em vista que o ato a ser realizado (pagamento) é um ato personalíssimo da parte, razão pela qual a ela deve ser dirigida a intimação. Ademais, o devedor deve ter ciência inequívoca de que o não cumprimento da obrigação no prazo de quinze dias enseja a aplicação de multa em percentual inegavelmente expressivo, já que ele, em última análise, arcará com esse acréscimo pecuniário.

24) Não há que se falar que a necessidade de intimação pessoal representa uma quebra na celeridade processual, uma vez que a lei instituiu a presunção de validade das intimações realizadas no endereço constante nos autos (art. 238, parágrafo único, CPC).

25) A intimação do devedor para cumprir a obrigação sob pena de multa deve ser pessoal, preferencialmente pelo correio, por ser uma medida mais compatível com a efetividade do processo. Revela-se prudente que esta regra de intimação por via postal seja sopesada com as exceções do art. 222 do CPC, já que em alguns casos descritos neste artigo (incisos II, V e VI), a intimação deve ser realizada por oficial de justiça.

26) Em pesquisa de campo realizada com os magistrados do Fórum Ruy Barbosa da Comarca de Salvador-Bahia, ficou demonstrado que, na prática, tem prevalecido o entendimento que determina a intimação pessoal do devedor para cumprir a obrigação. Assim sendo, verifica-se que o posicionamento defendido nesta monografia tem sido o mais aplicado na prática.

27) A pesquisa de campo também revelou que os juízes entendem que é lícito dispensar o devedor da multa, caso este demonstre que não cumpriu a obrigação no prazo de quinze dias por fato alheio à sua vontade.

Sobre o autor
Luig Almeida Mota

Procurador do Estado do Rio de Janeiro. Advogado. Ex-Procurador do Estado do Paraná. Ex-Advogado da Petrobras Distribuidora S/A. Especialista em Direito Processual Civil pela Universidade Federal da Bahia. Extensão em Direito Constitucional Avançado pelo Instituto Brasiliense de Direito Público.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MOTA, Luig Almeida. Da necessidade de intimação pessoal para o início da contagem do prazo de 15 dias previsto no art. 475-J, do CPC. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3620, 30 mai. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24548. Acesso em: 23 dez. 2024.

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