2. DA CONTRADIÇÃO ENTRE O VOTO DA MINISTRA RELATORA E A TRANSCRIÇÃO DOS DEBATES OCORRIDOS DURANTE A SESSÃO DE JULGAMENTO:
12. Por outro lado, ao cotejarmos o conteúdo do voto da Ministra Relatora e da ementa do ED-RE nº 600.885/RS com os debates ocorridos durante o julgamento, notamos clara contradição.
No primeiro, como já dito, o STF entendeu que nas ações ajuizadas devem ser mantidas as decisões nele proferidas que afastaram o limite de idade para ingresso nas Forças Armadas.
Porém durante os debates a Ministra Relatora afirmou que “àqueles que tiverem os casos judicializados será aplicada a observância exatamente dos limites fixados nos regulamentos”, em clara contradição com o que assentado no voto e expresso também na ementa do ED-RE 600.885/RS. Abaixo transcrevemos os debates ocorridos durante o julgamento em que inserida tal afirmação:
O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Senhor Presidente, com o devido respeito ao Ministro Marco Aurélio, estou, em tese, acompanhando o voto da Relatora. Só queria saber, porque me parece que há pretensão de distinguir o aproveitamento de candidatos com até certo limite de idade, porque alguns que estão próximos a setenta anos de idade deveriam ser excluídos.
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA (RELATORA) – Essa pretensão nem é o objeto dos embargos, Ministro. Foi citado apenas porque, no voto da Ministra Ellen Gracie, ela chegava a dizer que havia candidatos com setenta e sete anos. Entretanto, o objeto específico dos embargos para efeito de omissão é que não ficou expresso na ementa que aqueles que tivessem os processos judicializados teriam, reconhecido o direito deles às condições próprias, também o direito de ter reconhecida a possibilidade de se basearem com as fixações de limites nos regulamentos. Essas situações extravagantes, teratológicas, nem foram objeto dos embargos.
O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Pois é, mas é isso que me preocupa. Eu acho que ela deveria ser, já que nós estamos aproveitando a oportunidade para esclarecer o alcance do julgado.
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA (RELATORA) - Mas aí esbarra até na própria Constituição, ninguém com mais de setenta anos pode nem entrar.
O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Às vezes não é setenta; sessenta e nove anos. Quem vai colocar nas Forças Armadas uma pessoa com sessenta e nove anos de idade?
A SENHORA MINISTRA CÁRMEN LÚCIA (RELATORA) - Sim, mas estamos dizendo exatamente isso, Ministro. Nós estamos dizendo que àqueles que tiverem os casos judicializados será aplicada a observância exatamente dos limites fixados nos regulamentos.
O SENHOR MINISTRO CEZAR PELUSO - Nos regulamentos vigentes. Então estou de pleno acordo com essa solução. (grifamos)
Tal incongruência, certamente, se deve a algum erro material na transcrição e revisão dos debates, uma vez que, como dito, o voto condutor do julgamento do recurso extraordinário e a própria ementa do acórdão proferido em embargos de declaração apontam claramente pelo afastamento dos limites fixados por meio de regulamentos para os candidatos que ajuizaram suas demandas.
A observância aqui não se refere tão somente ao trabalho do setor de taquigrafia do STF na transcrição dos pronunciamentos orais, mas também ao conhecido trabalho de revisão de texto feito por todos os ministros do tribunal e respectiva assessoria, após a referida respectiva.
3. DO LAPSO TEMPORAL ENTRE A PUBLICAÇÃO DA DECISÃO EM RE E DAQUELA PROFERIDA EM EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – DA NATUREZA DA SEGUNDA DECISÃO
13. Por fim, cabe ainda uma última indagação sobre o julgamento do STF em face dos embargos de declaração opostos no RE 600.885/RS: se, como já explicitado, a diretriz do tribunal expressa em outros julgados é a de que cada decisão apenas gera efeitos a partir da publicação do respectivo acórdão, o que dizer dos efeitos do julgamento de tais embargos, no que tange à pretensão de estender a modulação da não-recepção do art. 10 da Lei nº 6.880/80 de 31.12.2011 para 31.12.2012, tendo em conta que a sessão de julgamento ocorreu em 29.06.2012 e a publicação do acórdão ocorreu apenas em 19.12.2012?
Primeiramente, não podemos olvidar que a modulação de efeitos em questão era totalmente descabida, como já explicado, porque se tratava de processo subjetivo, cujos limites da jurisdição são os pedidos das partes, formulados na exordial e em eventual reconvenção.
A par disso, ainda que entenda válida tal modulação de efeitos, é notório que, tendo o STF estabelecido bem claramente um limite inicial, a decisão em embargos de declaração teve efeitos retroativos, pois, apreciados os embargos em junho de 2012, pretendeu o tribunal alcançar os concursos realizados com base em ato editado por autorização do art. 10 da Lei nº 6.880/80 durante todo o ano de 2012, contrariando seu próprio julgamento inicial que fixava 31.12.2011 como início da não-recepção em tela.
Não menos alarmante é que tal decisão prolatada nos embargos de declaração opostos no RE 600.885/RS e com a referida pretensão retroativa só foi publicada no fim do ano a que se referia, em 12.12.2012, isto é, a 19 dias do prazo que novamente fixava para a edição da norma legal a que se refere o art. 142, § 3º, X, da Constituição brasileira de 1988.
CONCLUSÃO
Como visto, as decisões proferidas pelo Supremo Tribunal Federal no Recurso Extraordinário nº 600.885/RS, a par de expressarem a sempre louvável intenção do STF de tratar coletivamente as controvérsias judiciais que lhe são submetidas, mostram-se extremamente controvertidas e ensejam reflexões sobre os limites constitucionais e legais dos processos subjetivos no Brasil, bem como acerca dos mecanismos para solução das demandas que se lhe apresentam.
Por outro lado, tais julgados revelam o quanto nosso Supremo Tribunal ainda precisa ter reestruturadas as atividades de revisão textual e publicação de acórdãos (além obviamente de ver desobstruída sua pauta de julgamentos), a fim de que suas decisões tenham a eficácia e eficiência que se aguarda da cúpula de nosso Poder Judiciário, em termos de celeridade e clareza.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituiçao.htm. Acesso em: 26 de junho de 2013.
BRASIL. Lei 9.868 (1999). Lei ordinária nº 9.868, de 10 de novembro de 1999. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9868.htm. Acesso em: 26 de junho de 2013.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 600.885/RS, Tribunal Pleno, Relatora Ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, Brasília, DF, 09 de fevereiro de 2011. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28RE%24%2ESCLA%2E+E+600885%2ENUME%2E%29+OU+%28RE%2EACMS%2E+ADJ2+600885%2EACMS%2E%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/av86e24. Acesso em: 26 de junho de 2013.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Recurso Extraordinário nº 600.885/RS, Tribunal Pleno, Relatora Ministra Cármen Lúcia Antunes Rocha, Brasília, DF, 29 de junho de 2012. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28RE%24%2ESCLA%2E+E+600885%2ENUME%2E%29+OU+%28RE%2EACMS%2E+ADJ2+600885%2EACMS%2E%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/av86e24. Acesso em: 26 de junho de 2013.
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Embargos de declaração na Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 3.601, Tribunal Pleno, Relator Ministro José Antonio Dias Toffoli. Brasília, DF, 17 de junho de 2010. Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=5606. Acesso em: 03 de julho de 2013.