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Estado Democrático de Direito e o acesso à educação para pessoas portadoras de deficiência

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5 INCLUSÃO SOCIAL

Pode se entender por Inclusão Social a inserção das pessoas com necessidades especiais ao cotidiano da vida social, econômica e política, respeitando os princípios do Estado Democrático de Direito. De acordo com Jonatas Luiz Moreira de Paula (2002, p. 91):

[...] o conceito de inclusão social é um conceito que conota um processo, atinente a eliminar a manutenção da exclusão. Por isso, a inclusão social é um processo que visa eliminar a manutenção de pessoas ou de grupos sociais à margem dos benefícios do sistema político – econômico.

Assim, em virtude das diferenças que carregam em relação aos demais cidadãos, é preciso que suas necessidades específicas sejam atendidas pelo poder público para a prática daqueles direitos sociais, econômicos e políticos que nada mais é do que o exercício da sua cidadania.

Para Álvaro Ricardo de Souza Cruz (2009, p. 112):

O paradigma da inclusão constata que todos os seres humanos têm idêntico valor e cada um deles é autor da sua própria trajetória em busca da felicidade pessoal. Todos somos diferentes e a diferença deve ser elemento de coesão social.

A CF/88 em seu artigo 1º, inciso II dá respaldo ao direito à cidadania por todos brasileiros, e obviamente, isso inclui as pessoas com deficiência, e nesse mesmo sentido Alexandre de Moraes (2007, p.83) entende que:

A Constituição Federal de 1988 adotou o princípio da igualdade de direitos, prevendo a igualdade de aptidão, uma igualdade de possibilidades virtuais, ou seja, todos os cidadãos têm o direito de tratamento idêntico pela lei em consonância com os critérios albergados pelo ordenamento jurídico. Dessa forma, o que se veda são as diferenciações arbitrárias, as discriminações absurdas, pois, o tratamento desigual dos casos desiguais, na medida em que se desigualam, e exigência tradicional do próprio conceito de Justiça, pois o que realmente protege são certas finalidades, somente se tendo por lesado o princípio constitucional quando o elemento discriminador não se encontra a serviço de uma finalidade acolhida pelo direito [... ].

De acordo com Aquino (1998, apud TECILLA, 2013, p. 23):

[...] a exclusão social e inclusão social são conceitos dialéticos, polarizados, simétricos e constituem uma das grandes preocupações da sociedade atual. Como excluídos, pode-se considerar todos os grupos de pessoas que não participam, em nossa sociedade do consumo de bens materiais (produtos e mercadorias) ou serviços. O conceito exclusão social veio substituir, no Brasil, a partir dos anos oitenta, conceitos menores e setoriais, como segregação, marginalização, discriminação, miséria, pobreza.

O Decreto 6.215 de 2007 estabelecia o compromisso pela Inclusão das Pessoas com Deficiência, no entanto fora revogado pelo Decreto 7.612 de 20119, que instituiu o Plano Nacional dos Direitos das Pessoas com Deficiência – Plano Viver sem Limite, nos termos da Convenção Internacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência, que por sua vez foi aprovado pelo Decreto Legislativo 186 de 2008 com prestígio de emenda constitucional, e foi promulgado por meio do Decreto 6.949 de 200910.

Dentre suas outras diretrizes, o Plano Viver sem Limite atua na área da educação, e o tem como um dos seus principais eixos de atuação; o Plano estatui a garantia de um sistema educacional inclusivo, e também a garantia de que os equipamentos públicos de educação sejam acessíveis para as pessoas com deficiência, inclusive por meio de transporte adequado.

O balanço do Plano Viver sem Limite realizado no 1º semestre de 2012, na área da Educação, constata que foram disponíveis 20 mil vagas para as pessoas com deficiência, que quanto ao transporte Escolar Adaptado, seriam entregues 678 ônibus acessíveis entre novembro de 2012 e março de 2013 a 519 municípios beneficiados. O balanço trousse ainda outros números e expectativas em relação a escolas acessíveis e Educação Superior, mas que ainda não tiveram comprovação, que virá apenas no próximo balanço.

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Dessa forma, percebe-se que a sociedade caminha para a inclusão educacional, considerando que esta é a base para a formação de uma nação mais justa e igualitária, e o acesso a todos à educação em rede regular de ensino deve ser mais do que uma meta a ser conquistada pela Inclusão Social, uma vez que se trata de um direito constitucional do Estado Democrático de Direito.

5.1 Acesso à Educação pelas Pessoas com Necessidades Especiais

De acordo com o demonstrado, nota-se que em questões normativas, as pessoas com necessidades especiais dispõem de um amplo conjunto de regras constitucionais e infraconstitucionais que lhe garantem o absoluto acesso às instituições de ensino em redes regulares, e quando necessário em redes especiais, o que infelizmente se difere bastante da realidade.

Outrossim, a Educação Especial, apesar de ser confundida por muitos como substituta da educação regular, o que se transformaria em uma instituição de segregação, também é fator essencial de integração para aqueles alunos que ainda apresentam alguma dificuldade que os impedem de frequentar a escola comum.

Destarte, diante desses institutos, a Inclusão Social no âmbito educacional torna-se possível, e perante aqueles números demonstrados, que exibem o crescimento do número de matrículas de alunos com deficiência em escolas da rede regular, existe a tendência de maior integração dessas pessoas na sociedade.

Contudo, todas essas disposições ainda são insuficientes para alcançar um resultado adequado a Democracia, o que só poderá vir a ser obtido em longo prazo, dependendo de muitos esforços governamentais, que devem aprimorar cada vez mais suas políticas públicas de integração para cercar os obstáculos mais frequentes e mais imponentes aos alunos que buscam sua colocação em redes de ensino.

As escolas precisam se tornar inclusivas, e aprimorar seus projetos educacionais, como observa Fávero (2004, p. 30):

[...] para que os alunos com ou sem deficiência possam exercer o direitos à educação em sua plenitude, é indispensável que essa escola aprimore suas práticas, a fim de atender às diferenças. Esse aprimoramento é necessário, sob pena de os alunos passarem pela experiência educacional sem tirar dela o proveito desejável, tendo comprometido um tempo que é valioso e irreversível em suas vidas: o momento do desenvolvimento.

Ademais, deve haver colaboração pedagógica, que precisa ser uma proposta diferenciada para que haja um ensino de qualidade.

Não obstante, o acesso educacional por alunos com necessidades especiais não será alcançado enquanto não houver um forte investimento na infraestrutura das escolas, em equipamentos que são definitivamente indispensáveis para proporcionar maior igualdade entre os alunos que não tem limitações, o que seria um incentivo aos educadores, que atualmente não dispõem dessas ferramentas.

Dessa forma, observa-se que o acesso às escolas pelos alunos com deficiência ainda está longe de padrões humanitários desejáveis, mas com o esforço das autoridades competentes será possível à concretização dessa inclusão, haja vista que os preceitos legais estão direcionados a esta finalidade.


6 EFETIVIDADE E APLICABILIDADE DOS DIREITOS CONTEMPLADOS

O Estado Democrático de Direito tem a obrigação de assegurar a efetividade das normas dispostas em nosso ordenamento jurídico, principalmente sob a ótica dos princípios constitucionais.

A proteção do portador de deficiência se dá, basicamente, em quatro áreas, sendo duas delas: o direito à educação especial, gratuita e, de preferência, integrada com não deficientes e o direito a tratamento adequado. O Estado, por seu turno, protege o deficiente mediante: auxílio financeiro direto ao beneficente ou à sua família: quando o grau de deficiência não permite ao individuo se auto – manter; auxilio financeiro indireto: na manutenção de escolas especializadas, centros de reabilitação, prevenção de deficiências, etc.; aprovação de leis: quer as de natureza substantiva, quer as de ordem processual. (BENJAMIN, 1997)

Nesse sentido, tratando-se da efetividade e aplicabilidade das leis, percebemos que o Estado fica muito aquém de materializas as previsões normativas pela falta de sua prestação financeira indireta, em que o número de escolas despreparadas para receber alunos com necessidades especiais é bastante superior a aquelas que abriram vagas para os mesmos.

Nesse raciocínio, Helena Machado Albuquerque11 (apud MANDELLI, 2012), diz que é necessário mais investimento na Educação Especial: “Para a inclusão ocorrer, precisamos querer incluir. Para isso, faltam dinheiro e políticas focadas. Precisamos investir mais em professores e materiais”.

Outro fator de peso é de fato a falta de políticas publicas de conscientização, dado o pensamento arcaico que ainda prevalece na mentalidade de algumas pessoas que consideram que as escolas especiais que são os espaços mais adequados a atender aqueles alunos portadores de deficiência, seguindo um pensamento de segregação e exclusão que como visto, está passando por um processo avançado de superação, em que a Inclusão Social tende a prevalecer.

Vale salientar que, o convívio dos alunos com deficiência é o ponto inicial para o processo inclusivo, onde os cidadãos são formados, e onde aprendem que as diferenças físicas, auditivas, visuais, ou múltiplas são fatores que impõem certos limites àquelas pessoas para o exercício de algumas atividades comuns da vida social, contudo elas não a definem como pessoa, e como qualquer outro indivíduo, eles são seres de deveres e direitos, e merecem igualdade de tratamento.

Assim, percebe-se que apesar do número de alunos com necessidades especiais nas instituições de ensino da rede regular ter aumentado, o país ainda está longe de atingir a inclusão educacional de forma satisfatória. Ainda persistem vários desafios a ser vencidos, devendo haver principalmente um sério comprometimento daqueles que lidam diretamente com os alunos portadores de deficiência, mas também de toda sociedade.

Como bem ponderado por Elisa Tomoe Moriya Schulünzen12 (apud MANDELLI, 2012):

Hoje, temos as salas multifuncionais, a formação continuada, o duplo Fundeb e outros recursos. o compromisso tem que ser de todos. [...] As escolas devem revisar Existe um investimento por parte do MEC e dos governos. Mas isso não basta porque seus projetos políticos-pedagógicos e os diretores devem solicitar as verbas, além de colocar essas metas no plano de desenvolvimento institucional da sua escola.

Outrossim, como já foi arguido, as escolas e seus gestores se deparam com situações complicadas por não disporem de infraestrutura adequada para receber aquele aluno que carece de certo tratamento especial, obviamente porque como dito, o processo de inclusão despende um longo prazo para acontecer, e dessa forma, poucas instituições estarão em uma condição tida como adequada para receber esses alunos.

As escolas dependem de materiais especializados, educadores preparados, salas de apoio, dentre todos outros elementos de integração que conseguem fazer com que aqueles alunos possam participar das atividades propostas aos estudantes.

Todavia, esses obstáculos que as próprias escolas enfrentam, que poderiam impedi-las de atender e matricular esses alunos não servem mais como justificativa para recusar a matricula de um estudante portador de deficiência. Assim, com a educação inclusiva as escolas devem se adaptar às necessidades que seus alunos têm.

Dessa forma, conforme Fávero (2004, p. 32) explica:

[...] as escolas não podem mais se organizar com a exclusão de crianças que não se adaptam aos seus padrões; não podem mais avaliar crianças e adolescentes exigindo deles mérito para cursar o ensino fundamental, absurdo diante do fato de que essa etapa escolar é um direito indisponível. Garantir o aparente sucesso de algumas escolas com base na subordinação dos alunos a tais regras está muito longe da almejada prática da liberdade.

Contudo, existem críticas acerca da obrigatoriedade que as escolas têm de receber os alunos com deficiência, alegando que o papel da escola de educar pode não ser alcançado quando aquela instituição se diz não adequada ou despreparada para receber aquele aluno, contudo, a recusa dessas instituições poderia ao contrário, ser o maior obstáculo imposto a esses alunos, já que no país poucas academias poderiam se dizer ajustadas aquelas pessoas.

Sobre esta discussão, Eugênia Augusta Gonzaga Fávero (2004, p. 33) diz com propriedade:

Os críticos da educação inclusiva jamais dizem que são contra a inclusão, mas, com um discurso muito palatável, alegam serem a favor de uma inclusão “com responsabilidade”. Segundo eles, inclusão com responsabilidade significa que a escola deve continuar selecionando e recebendo penas os alunos para os quais ela se julga previamente “preparada”, o que implica a recusa reiterada de muitos deles. Pensamos que inclusão com responsabilidade significa que a escola deve receber todos os educandos, adequando-se conforme as necessidades deles, por ser impossível prever todas de antemão. Não há responsabilidade na rejeição de um aluno com limitações, sabendo-se que ele precisa da convivência com outros educandos sem as mesmas necessidades especiais. É mais provável que, com essa recusa, ele acabe ficando sem acesso à educação escolar.

Dessa forma, devem ser tomadas todas as medidas cabíveis para que a inclusão social se concretize, e como avaliado por Okamoto (1990. P. 102), esse processo será lento:

A reversão deste quadro é lenta, mas possível diante de uma atuação eficiente do Promotor de Justiça. Para tanto, mister se faz compreender que: a) a ausência de sensibilidade, não significa a ausência de sentimentos; b) a incapacidade de movimentos, não significa uma pessoa incapaz; c) a deficiência de um sentido, não quer significar uma vida sem sentidos.

Finalmente, a inclusão nas escolas é essencial e deve acontecer para que as pessoas portadoras de deficiência sejam integrados na sociedade, posto que a Educação é um direito indisponível e também considerado como direito basilar de todos cidadãos.


7- CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os direitos disponíveis as pessoas portadoras de deficiência passou por um longo processo de evolução, e como visto, de um pensamento primitivo de exclusão passamos a ter um pensamento de integração, lidando com as diferenças.

A deficiência não é fator capaz de definir a pessoa, e tendo em vista os princípios basilares da CF/88, principalmente aqueles que asseguram a igualdade de tratamento e a dignidade da pessoa humana, esses cidadãos hoje têm sua cidadania reconhecida.

Contudo, para que de fato houvesse a possibilidade do exercício pleno de todos os direitos garantidos e igualmente exercidos pelos outros indivíduos, bem como a mudança na mentalidade da sociedade, o Estado dispôs diversas normas em nosso ordenamento jurídico que foram necessários para inseri-los à sociedade, regras estas que acompanharam as concepções internacionais acerca dos problemas enfrentados pelas pessoas com deficiência.

Quanto ao acesso à educação, que se trata da um direito primordial para formação de todo cidadão, a CF/88 e leis infraconstitucionais asseguraram a educação especial que preferencialmente seria fornecida em escolas da rede regular, seguindo o ideal da Inclusão Social.

No entanto, esse é um processo que leva tempo, já que depende de políticas públicas para conscientizar a população e também para que aconteçam as adaptações necessárias nas instituições de ensino.

Porém, ao mesmo tempo, esses impasses não podem ser o pilar da exclusão, devendo as escolas sempre receber esses alunos sem qualquer objeção, já que os centros de ensino poderiam se negar fazer as matrículas de todos aqueles alunos com deficiência baseando-se na sua falta de infraestrutura e preparação, vez que, obviamente um aluno com deficiência despende de maior atenção e equipamentos que são incomuns aos outros estudantes.

Assim, a educação inclusiva impõe a todas as instituições que a matrícula deverá ser compulsiva, sendo as adaptações realizadas de acordo a necessidade de cada aluno, o que é imprescindível, já que esse é um direito que não pode ser negado a nenhuma pessoa.

Diante de todo exposto, percebe-se que o caminho para a plena inclusão educacional não é simples, mas juridicamente essas pessoas estão amparadas, dependendo agora de uma evolução social e receptiva, que ocorrerá de acordo com a concretização de políticas públicas implantadas.

Sobre os autores
Saint-Clair Guilherme Campos Maciel

Advogado no Escritorio Quites e Maciel

Leandro Henrique Simões Goulart

Especialista em processo civil, mestre em Direito, professor do Centro Universitário Newton Paiva, Coordenador do CEJU – Centro de Exercício Jurídico da Newton Paiva.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MACIEL, Saint-Clair Guilherme Campos; GOULART, Leandro Henrique Simões. Estado Democrático de Direito e o acesso à educação para pessoas portadoras de deficiência. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 4149, 10 nov. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/29974. Acesso em: 22 nov. 2024.

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