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Processo por uso de música de Roberto e Erasmo Carlos pelo Deputado Tiririca está nas mãos do juiz para sentença

Agenda 18/04/2016 às 13:24

O uso de paródia, defendido pela Lei de Direitos Autorais, ainda é válido tratando-se de campanha eleitoral, na condição de promoção de candidato?

No último dia 11 de dezembro foi encaminhado à conclusão do Juiz Márcio Teixeira Laranjo, titular da 21ª Vara Cível do Foro Central de São Paulo, o processo impetrado pela EMI Songs do Brasil Edições Musicais Ltda contra o deputado Francisco Everardo Oliveira Silva - o popular Tiririca.

O processo, que refere-se à propriedade intectual/industrial, com foco em direitos autorais, é patrocinado pelos conhecidos especialistas  na área,  Leo Wojdyslawski e Jose Diamantino Alvarez Abelenda. Ele é referente ao fato de que durante sua campanha eleitoral, o deputado federal e candidato à reeleição Tiririca (PR-SP) usou a versão da música "O Portão", de Erasmo e Roberto Carlos, onde o verso “Eu voltei, agora pra ficar, porque aqui, aqui é o meu lugar” foi alterado para “Eu votei, de novo eu vou votar. Tiririca, Brasília é o seu lugar”.

Além de parodiar a música para fins de promoção de sua candidatura, o deputado também aparece caracterizado de Roberto Carlos e repete a expressão “bicho”, usada com muita frequência pelo Rei. Aparece com um prato de carne na mesa, referência clara à propaganda de conhecida marca de carnes que recentemente foi estrelada por Roberto Carlos.

Imediatamente os advogados da EMI entraram com um pedido liminar de suspensão de veiculação da referida propaganda, por considerarem que se tratava de violação de direitos autorais. Segundo o juiz que concedeu a liminar, "deve prevalecer a garantia dos direitos autorais na obra utilizada na paródia".E determinou  ao candidato que "os réus se abstenham de veicular filme publicitário que utilize a música e a letra adaptada, em qualquer meio de comunicação, sob pena de multa no valor de R$ 2 mil por ato de descumprimento, limitado a 100 mil reais.”

No entanto, apesar de concedida a liminar no dia 23 de setembro, dois dias depois, no dia 25, Tiririca voltou a exibir a propaganda. Foi então que a EMI resolveu entrar com processo contra o deputado. Segundo o Dr. Diamantino, estão caracterizados na propaganda do candidato, o uso da imagem e o uso desautorizado da canção, pelos quais foram pedidos indenização.

Também foi solicitada indenização por danos morais em razão da conotação com que a música foi usada, com finalidade eleitoral. Os autores do processo não fixaram valores para essas indenizações, solicitando que o juiz, diante dos fatos, do valor da imagem e da canção usada, os fixe.

O advogado do partido de Tiririca parte para a defensiva dizendo: "Não associamos ninguém à campanha neste caso, está claro que é uma imitação. Quem assiste não confunde, não acha que é o Roberto Carlos que está falando. É uma paródia, permitida pela Lei de Direitos Autorais, e não a utilização da música integral de Roberto”.

Em contrapartida, o advogado da EMI argumenta: "A lei permite a paródia em um contexto de comédia, em um circo ou em um programa de humor. Na medida em que uma pessoa usa a música adaptada para promover uma marca ou um candidato, o caso é diferente".

A verdade é que Tiririca não parou por aí. Em propaganda veiculada a posteriori, o deputado aparece vestido como Pelé e pede para que o ex-jogador “o defenda”. “Eu votei, de novo vou votar. Tiririca, Brasília é seu lugar”, diz o falso Pelé, repetindo o refrão cantado pelo falso Roberto no vídeo anterior. “E eu estou recitando. Para ninguém te processar, entende?”, diz ainda o personagem, numa clara provocação à EMI, Roberto Carlos e Erasmo.

Além de Roberto Carlos e Pelé, Tiririca usou em sua campanha paródia do filme Star Wars e de propagandas das empresas Nextel e Bom Negócio.

Ele também apareceu cantando e dançando funk ao lado de dançarinas, fazendo trocadilhos com as funções do cargo de deputado e comparando o funcionamento do Congresso Nacional (em Brasília) ao de uma Brasília velha (o carro). Nessa sina ironizou até a si mesmo, num slogan que dizia “ABC, ABC,  Tiririca saber ler e escrever”, refutando as críticas daqueles que assistiram em sua posse anterior a dificuldade  que encontrou para desenhar o próprio nome.

Depois de tudo isso, o candidato ainda colocou no Youtube a propaganda em questão, o que obrigou a Sony/ATV a protocolar uma reclamação junto ao site, que a retirou no mesmo dia. Outra palhaçada. Sem contar que ao parodiar  e divulgar música sem a devida autorização do autor, sonegou o que deveria ser recolhido ao ECAD- Escritório Central de Arrecadação e Distribuição que é uma instituição privada, sem fins lucrativos, instituída pela lei 5.988/73 e mantida pelas Leis Federais 9.610/98 e 12.853/13. Seu principal objetivo é centralizar a arrecadação e distribuição dos direitos autorais de execução pública musical. A instituição é considerada referência na área em que atua e dispõe de um dos mais avançados modelos de arrecadação e distribuição de direitos autorais de execução pública musical do mundo. Mas tomou calote do Tiririca. Por que será que acho que isso é mais uma palhaçada?

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Apesar de ter disposto de mais tempo na TV do que muitos candidatos à presidência, ele não apresentou nenhuma proposta de campanha. Manteve-se na palhaçada, sua especialidade, sem atentar para a Lei de Direitos Autorais, a saber, Lei 9.610 de 19 de Fevereiro de 1998.

E a Lei existe e está aí para ser cumprida. Um bom exemplo disso é o voto da Ministra Nancy Andrighi ao Resp. 1.424.044-GO. Nele, ela esclarece muitos pontos desconhecidos ou desrespeitados por Tiririca em sua campanha. A íntegra do voto da ministra está aqui:

DIREITO CIVIL. TERMO INICIAL DOS JUROS DE MORA RELATIVOS À EXECUÇÃO DESAUTORIZADA DE OBRA MUSICAL.

 Contam-se da execução pública não autorizada de obra musical – e não da data da citação – os juros de mora devidos em razão do não recolhimento de direitos ao Escritório Central de Arrecadação e Distribuição (ECAD).

 O ECAD – órgão instituído e administrado pelas associações de gestão coletiva musical, mandatárias de todos os titulares de obras musicais a elas filiados – intermedeia, em nome dos autores de composições musicais, a arrecadação, distribuição e fiscalização dos seus direitos. Assim, deve-se determinar não a natureza da relação entre os executores de composições musicais e o ECAD, e sim a natureza da relação entre esses executores e os próprios autores, que são apenas representados pelo ECAD na arrecadação e fiscalização de seus direitos. Nesse aspecto, ganha relevância o comando do art. 68 da Lei 9.610/1998, segundo o qual, sem prévia e expressa autorização do titular, não poderão ser utilizadas composições musicais em representações e execuções públicas. Necessário distinguir ainda a relação decorrente da execução desautorizada de composição musical, daquela derivada da execução realizada mediante prévia autorização do titular. Evidentemente, na execução comercial desautorizada de obra musical, a relação entre o titular da obra e o executor será extracontratual, ante a inexistência de vínculo entre as partes. Todavia, a situação muda de figura quando a execução comercial de composições musicais advém de prévia autorização do titular, ainda que por intermédio do ECAD, em que há autêntico acordo de vontades para a cessão parcial, temporária e não exclusiva de direitos autorais. Em suma, na execução comercial desautorizada de obras musicais a relação entre executor e ECAD (mandatário dos titulares das obras) é extracontratual, de sorte que eventual condenação judicial fica sujeita a juros de mora contados desde o ato ilícito, nos termos do art. 398 do CC e da Súmula 54 do STJ. E na execução comercial autorizada a relação entre executor e ECAD é contratual, de maneira que sobre eventual condenação judicial incidem juros de mora contados desde a citação, nos termos do art. 405 do CC. REsp 1.424.044-GO, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 25/3/2014.

Para esclarecer aos mais incautos, o art. 398 do Código Civil (Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002) dispõe que:

Art. 398. Nas obrigações provenientes de ato ilícito, considera-se o devedor em mora, desde que o praticou.

Já a Súmula 54 do STJ, oriunda de julgamento da Corte Especial em 24 de Setembro de 1992, esclarece que:

Súmula 54- Os juros moratorios fluem a partir do evento danoso, em caso de responsabilidade extracontratual.

Por fim, o art. 405 do Código Civil diz:

Art. 405. Contam-se os juros de mora desde a citação inicial.

Lembro aqui aos colegas que o artigo acima só é válido quando a execução é autorizada, criando uma relação contratual entre autor e executor, o que está longe de ser o caso do Tiririca.

Isto posto temos apenas que comentar que apesar do slogan: “Tiririca, pior que tá não fica!", a realidade é bem outra. Os juros sobre a utilização desautorizada já estão rolando desde setembro de 2014. Além disso, há a multa imposta, de 2 mil reais por dia e ainda as possíveis indenizações. Portanto essa é uma bola de neve com o que o Sr. Francisco Everardo Oliveira Silva devia se preocupar, pois quando desabar sobre sua cabeça, não vai haver palhaçada que pague.

Sobre a autora
Maria Luísa Duarte Simões

Formada em jornalismo pela Universidade Metodista do Estado de São Paulo, onde também cursei Publicidade e Propaganda e Teologia. Mais tarde, depois de ganhar 3 Prêmios Esso, 1 Prêmio Telesp, 1 Prêmio Remington e 1 Prêmio Status de contos, resolvi me dedicar à carreira jurídica. Para tanto fiz a Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo, onde me formei em 1985. Fiz pós graduação em Direito Penal na Faculdade do Largo São Francisco, sob a supervisão do prof. Dr. Miguel Reale Júnior. Hoje dedico-me a criticar as coisas erradas, elogiar as certas e ironizar aquelas que se travestem de corretas, mesmo sendo corruptas. Sou sua vigilante diária das traquinagens governamentais e da sociedade em geral. Sou comprometida com a verdade, o que muitas vezes vai me fazer dizer aquilo que você não que ouvir.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SIMÕES, Maria Luísa Duarte. Processo por uso de música de Roberto e Erasmo Carlos pelo Deputado Tiririca está nas mãos do juiz para sentença. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4674, 18 abr. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/35843. Acesso em: 22 nov. 2024.

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