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Desaverbação de tempo de contribuição excedente após a aposentadoria no serviço público

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Agenda 27/07/2016 às 15:28

4 – É POSSÍVEL desaverbação de tempo de contribuição excedente após a aposentadoria?

4.1 Conceitos de averbação/desaverbação

A pessoa ao longo da vida pode exercer atividade privada e pública, intercaladamente ou concomitantemente, quando permitido pela CF/88, logo contará com períodos contributivos para regimes diversos.

Nesse contexto, imagine-se uma pessoa que, ao ingressar no serviço público de determinado ente federativo, já tenha exercido atividade privada (contribuiu ao RGPS) e atividade pública em outro ente federativo ou mesmo em cargo diferente no mesmo ente público (contribuiu a um RPPS). Para acrescentar o tempo anterior (privado ou público) ao novo vínculo, deverá realizar um pedido administrativo de averbação, requisito indispensável para produzir os efeitos jurídicos e financeiros na nova atividade pública.

Em que consiste a averbação de tempo de serviço/contribuição? Marcelo Barroso Lima Brito de Campos responde:

"Averbação de tempo de contribuição, para fins do regime próprio de previdência social dos servidores públicos, é o ato administrativo pelo qual a Administração Pública reconhece, a pedido ou de ofício, período de contribuição do servidor realizado em atividade laboral diversa do cargo em que se dará o registro do tempo." (p. 335).

A desaverbação, por sua vez, nas palavras do autor supracitado, consiste em "(...) ato administrativo pelo qual a Administração Pública cancela, de ofício ou a pedido, o registro do tempo de contribuição do servidor perante o RPPS." (p. 335).

4.2 Tempo excedente de contribuição

No que toca ao tempo de contribuição excedente, convém recordar que a aposentadoria voluntária pode ser: (i) por idade ou (ii) por tempo de contribuição. Segundo o ordenamento atual, a aposentadoria por tempo de contribuição no serviço público e privado, em regra, exige 35 anos de contribuição para homem e 30 anos para mulher, com a redução de 5 anos para professores que comprovem atividade exclusiva de magistério na educação infantil e no ensino fundamental e médio.

No serviço público é comum que os segurados ultrapassem o tempo mínimo contributivo nas aposentadorias por tempo de contribuição (art. 40, §1º, III, "a" da CF/88), seja pela exigência cumulativa de idade mínima (65 e 60 anos, para homens e mulheres, respectivamente), seja pelos benefícios financeiros (ex.: gratificações propter laborem e abono de permanência) ou para evitar a ociosidade do afastamento.

Portanto, ao requerer a aposentadoria no serviço público, o RPPS acaba considerando a totalidade do tempo de contribuição, englobando as frações de tempo de contribuição que excedem o requisito temporal mínimo previsto na CF/88. Esse período é chamado de tempo "excedente" de contribuição.

4.3 Aspectos legais, doutrinários e jurisprudenciais acerca do tempo excedente de contribuição

A Lei 6.226/1975, que regula a contagem recíproca de tempo de serviço público federal e de atividade privada, para efeito de aposentadoria dispõe em seu art. 5º, parágrafo único, in verbis:

Art. 5º A aposentadoria por tempo de serviço, com o aproveitamento da contagem recíproca, autorizada por esta Lei, somente será concedida ao funcionário público federal ou ao segurado do Instituto Nacional de Previdência Social (INPS), que contar ou venha a completar 35 (trinta e cinco) anos de serviço, ressalvadas as hipóteses expressamente previstas na Constituição Federal, de redução para 30 (trinta) anos de serviço, se mulher ou Juiz, e para 25 (vinte e cinco) anos, se ex-combatente.

Parágrafo único. Se a soma dos tempos de serviço ultrapassar os limites previstos neste artigo, o excesso não será considerado para qualquer efeito.

A Lei 8.213/91, por sua vez, fixou em seu art. 98, que permanece com sua redação original desde a publicação do diploma legal, que:

Art. 98. Quando a soma dos tempos de serviço ultrapassar 30 (trinta) anos, se do sexo feminino, e 35 (trinta e cinco) anos, se do sexo masculino, o excesso não será considerado para qualquer efeito.

Portanto, pela literalidade dos dispositivos legais, o excesso não será considerado para qualquer efeito. Utilizando interpretação ampliativa desta norma, o INSS tem negado o pedido de emissão de CTC para o tempo excedente. No entanto, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), de forma acertada, restringe a interpretação do art. 98, veja:

Aposentadoria. Regime Geral de Previdência Social/estatutário. Contagem recíproca. Excesso de tempo. Aproveitamento no cálculo. Art. 98 da Lei nº 8.213/91. Interpretação favorável ao segurado. 1. Eventual excesso de tempo que restar após contagem recíproca para a concessão de aposentadoria no regime estatutário pode ser considerado, como na hipótese, para efeito de aposentadoria por tempo de serviço no Regime Geral de Previdência Social. 2. Recurso especial provido em parte. (REsp 674.708/RS, Rel. Ministro NILSON NAVES, SEXTA TURMA, julgado em 18/10/2007, DJ 17/12/2007, p. 353)

PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. SEGURADO JÁ APOSENTADO NO SERVIÇO PÚBLICO COM UTILIZAÇÃO DA CONTAGEM RECÍPROCA. CONCESSÃO DE APOSENTADORIA JUNTO AO RGPS. TEMPO NÃO UTILIZADO NO INSTITUTO DA CONTAGEM RECÍPROCA. FRACIONAMENTO DE PERÍODO. POSSIBILIDADE. ART. 98 DA LEI N.º 8.213/91. INTERPRETAÇÃO RESTRITIVA. (...) 2. O art. 98 da Lei n.º 8.213/91 deve ser interpretado restritivamente, dentro da sua objetividade jurídica. A vedação contida em referido dispositivo surge com vistas à reafirmar a revogação da norma inserida na Lei n.º 5.890/73, que permitia o acréscimo de percentual a quem ultrapassasse o tempo de serviço máximo, bem como para impedir a utilização do tempo excedente para qualquer efeito no âmbito da aposentadoria concedida. 3. É permitido ao INSS emitir certidão de tempo de serviço para período fracionado, possibilitando ao segurado da Previdência Social levar para o regime de previdência próprio dos servidores públicos apenas o montante de tempo de serviço que lhe seja necessário para obtenção do benefício almejado naquele regime. Tal período, uma vez considerado no outro regime, não será mais contado para qualquer efeito no RGPS. O tempo não utilizado, entretanto, valerá para efeitos previdenciários junto à Previdência Social. 4. Recurso especial a que se nega provimento. (REsp 687.479/RS, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 26/04/2005, DJ 30/05/2005, p. 410)

Com razão o STJ, pois a interpretação sistemática da legislação previdenciária, afasta a aplicação integral do art. 98 da Lei 8.213/91, que reproduziu a previsão do art. 5º, p. único, da Lei 6.226/1975.

Ora, a total desconsideração do tempo excedente seria incompatível com as normas legais que regulam a composição dos proventos, as quais consideram a integralidade do tempo de contribuição do segurado, tais como: a utilização da média aritmética dos maiores salários de contribuição/remunerações correspondentes a oitenta por cento de todo o período contributivo (RGPS: 29 da Lei 8.213/91 e RPPS: art. 1º da Lei 10.887/04); a previsão do fator previdenciário a partir da Lei 9.876/1999; mais recentemente está em vigor também a regra 85/95 da Lei 13.185/15, que acrescentou o art. 29-C à Lei 8.213/91, trazendo uma alternativa ao segurado, que opte por não utilizar o fato previdenciário.

No mesmo sentido, Frederico Amado também critica a aplicação pura e simples do art. 98, da Lei 8.213/91 para impedir o exercício do direito à contagem recíproca de contribuição:

"Para a Procuradoria Federal Especializada do INSS, 'este artigo encontra-se derrogado pelo §7º do Art. 29, acrescentado pela Lei 9.876, de 26/11/99, que, ao dispor sobre o fator previdenciário, determina que seja considerado todo o período de contribuição do segurado, inclusive o que ultrapassar 30 e 35 anos de contribuição, respectivamente, para mulheres e homens'."

"Entende-se que o artigo 98, da Lei 8.213/91, carece de fundamento constitucional de validade, pois afronta de maneira irrazoável o artigo 201, §9º, da Lei Maior, limitando indevidamente a contagem recíproca do tempo de contribuição, pois não permite que o período contributivo excedente seja computado em outro regime previdenciário." (p. 544-545).

Ressalte-se que o Decreto 3.048/99 (RPS), que regulamenta o RGPS, autoriza a contagem de eventual tempo de contribuição posterior a aposentadoria, conforme art. 125, § 3º: "É permitida a emissão de certidão de tempo de contribuição para períodos de contribuição posteriores à data da aposentadoria no Regime Geral de Previdência Social.". Acerca do dispositivo, Frederico Amado pontua:

Inclusive, o próprio Regulamento da Previdência Social o despreza, ao dispor que 'é permitida a emissão de certidão de tempo de contribuição para períodos de contribuição posteriores à data da aposentadoria no Regime Geral de Previdência Social' (art. 125, §3º)." (p. 545)

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De forma didática, Kerlly Huback Bragança contextualiza a aplicação do art. 125, §3º do RPS:

"Também é permitida a emissão de certidão de tempo de contribuição para períodos de contribuição posteriores à data da aposentadoria no RGPS (art. 125, §3º, RPS). Com isso, pense na hipótese de uma trabalhadora ter se aposentado por tempo de contribuição aos 50 anos de idade. Embora aposentada, continuou a trabalhar e a contribuir para o RGPS, no que fez por mais cinco anos, quando foi aprovada em concurso público federal. Aos 70 anos de idade, foi compulsoriamente aposentada pela União (art. 40, §1º, II, CF). Poderá contar com os cinco de contribuição para o RGPS? Sim. Somará os 15 anos de contribuição para o RPPS da União com os cinco para o RGPS e se aposentará com proventos proporcionais, na razão de 20/30." (pag. 490).

4.4 A desaverbação de tempo excedente após a aposentadoria configura desaposentação?

Primeiramente, cumpre frisar o conceito de desaposentação. Representando a melhor doutrina, Fábio Zambitte Ibrahim apresenta o seguinte conceito:

"A desaposentação é definida como a reversão da aposentadoria obtida no Regime Geral de Previdência Social, ou mesmo em Regimes Próprios de Previdência de Servidores Públicos, com o objetivo exclusivo de possibilitar a aquisição de benefício mais vantajoso no mesmo ou em outro regime previdenciário." (pag. 728).

No que tange ao impacto no equilíbrio financeiro e atuarial, Fábio Zambitte Ibrahim sustenta que a desaposentação não o comprometerá:

"A desaposentação não prejudica o equilíbrio atuarial do sistema, pois as cotizações posteriores à aquisição do benefício são atuarialmente imprevistas, não sendo levadas em consideração para a fixação dos requisitos de elegibilidade do benefício. Se o segurado continua vertendo contribuições após a obtenção do benefício, não há igualmente vedação atuarial à sua revisão, obedecendo-se assim as premissas jurídicas e atuarias a que se deve submeter a hermenêutica previdenciária." (pag. 729).

Como se sabe a desaposentação é reiteradamente negada administrativamente pelo INSS e pelos órgãos gestores dos RPPS, em especial por afetar a segurança jurídica (ato jurídico perfeito) e o equilíbrio financeiro e atuarial do respectivo fundo previdenciário, estando a questão pendente de solução definitiva pelo Supremo Tribunal Federal, aguardando-se a conclusão do julgamento do Recurso Extraordinário nº 661.256.

Segundo a jurisprudência pacífica do STJ, intérprete último da legislação infraconstitucional, a aposentadoria configura direito patrimonial disponível, portanto passível de renúncia pelo seu beneficiário, independentemente de devolução de valores percebidos (REsp. 1.334.488/SC, julgado sob o rito do art. 543-C do CPC/73).

Porém, qual a razão do questionamento do presente tópico? Qual o envolvimento dos dois institutos: desaposentação x desaverbação de tempo excedente? A resposta encontra-se no art. 96, III da Lei 8.213/91 e art. 11, II da Portaria MPS 154/2008, já expostos linhas acima, vamos recordá-los:

"Art. 96. O tempo de contribuição ou de serviço de que trata esta Seção será contado de acordo com a legislação pertinente, observadas as normas seguintes:

(...)

III - não será contado por um sistema o tempo de serviço utilizado para concessão de aposentadoria pelo outro;"

"Art. 11. São vedadas:

(...)

II - a emissão de CTC para período que já tiver sido utilizado para a concessão de aposentadoria, em qualquer regime de previdência social;"

Acerca da aplicação em concreto dos dispositivos, convém destacar três situações:

(i) uma em que o segurado já aposentado pretende retirar a totalidade do tempo de contribuição de um regime e levar para outro regime;

(ii) uma intermediária em que o segurado pretende a desaverbação somente do tempo de contribuição excedente, porém que foi computado para a composição dos proventos, ou seja, sua retirada afetaria o valor do benefício; e

(iii) uma em que o tempo a ser retirado é excedente de contribuição, e que não produziu nenhum efeito jurídico e financeiro.

Acerca da situação nº 1, inequivocamente haverá a necessidade de desaposentação para emissão de CTC do período contributivo utilizado para concessão de aposentadoria. Com efeito, o segurado aposentado deverá renunciar a aposentadoria em curso, para somente assim poder requerer a emissão de CTC para contagem em outro regime de previdência.

Interessante a decisão do Tribunal Regional Federal da 3ª Região na Apelação 2003.61.83.006793-2, que entendeu pela impossibilidade de desaposentação para fins de contagem recíproca. Confira-se a ementa do julgado:

PREVIDENCIÁRIO - DESAPOSENTAÇÃO PARA FINS DE CONTAGEM RECÍPROCA NO REGIME PRÓPRIO DE PREVIDÊNCIA DOS SERVIDORES PÚBLICOS - IMPOSSIBILIDADE - ART. 196, III, DA LEI 8.213/91 - AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL - LEI 9.796/99 - IMPOSSIBILIDADE DE COMPENSAÇÃO FINANCEIRA ENTRE REGIMES. 1. É expressamente proibido pelo ordenamento jurídico o cômputo, em outro regime, do tempo de serviço/contribuição utilizado para a concessão do benefício ao qual pretende renunciar. 2. A renúncia existiria se o autor não pretendesse utilizar, no regime próprio, o tempo de serviço computado no RGPS para a concessão da aposentadoria proporcional. 3. A ausência de previsão legal reflete, precisamente, a proibição e não a permissão de contagem do tempo requerida pelo autor. 4. O aproveitamento do tempo de serviço/contribuição relativo ao período de filiação no Regime Geral de Previdência Social para fins de contagem recíproca no Regime Próprio dos Servidores Públicos pressupõe que o regime de origem (RGPS) ainda não tenha concedido e pago benefício utilizando o mesmo período que se pretende agora computar. 5. O apelado aposentou-se por tempo de serviço, no Regime Geral de Previdência Social, em 19-02-1992, tendo computado 34 anos e 04 meses. Posteriormente, aprovado em concurso público, foi nomeado em 30-12-1993 para o cargo de Auditor Fiscal do Tesouro Nacional. Recebe os proventos da aposentadoria concedida pelo RGPS há aproximadamente 19 (dezenove) anos, e agora, prestes a ser alcançado pela idade que o levará à aposentadoria compulsória no Regime Próprio, pretende "renunciar" àquele benefício para, por meio da contagem recíproca, aposentar-se com proventos integrais. 6. O regime de origem já concedeu o benefício e pagou os respectivos proventos durante 19 anos. Não poderá compensar o Regime Próprio porque já concedeu a cobertura previdenciária requerida à época pelo autor. 7. A ser atendida a pretensão do autor, o Regime Geral de Previdência Social restará duplamente onerado: pagou os proventos e deverá, ainda, compensar financeiramente o Regime Próprio, onde agora pretende se aposentar. 8. Apelação e remessa oficial providas para julgar improcedente o pedido. (TRF-3 - AC: 2003.61.83.006793-2, Nona Turma, Relator: DESEMBARGADORA FEDERAL MARISA SANTOS, Data de Julgamento: 14/03/2011)

No entanto, o STJ modificou a decisão acima do TRF da 3ª Região, reafirmando a possibilidade de renúncia a aposentaria concedida, inclusive para fins de aproveitamento do tempo de contribuição (por meio de CTC) em regime previdenciário diverso, entendendo que não haveria prejuízo ao INSS (regime de origem), pois não se trata de cumulação de benefícios, mas tão somente do fim de uma e início de outra aposentadoria. Eis o teor do julgado:

PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. APOSENTADORIA POR TEMPO DE SERVIÇO NO REGIME GERAL DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC, NÃO CARACTERIZAÇÃO. DIREITO DE RENÚNCIA AO BENEFÍCIO. POSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO DE CERTIDÃO DE TEMPO DE SERVIÇO PARA NOVA APOSENTADORIA EM REGIME DIVERSO. EFEITOS EX NUNC. DEVOLUÇÃO DE VALORES RECEBIDOS. DESNECESSIDADE. CONTAGEM RECÍPROCA. COMPENSAÇÃO ENTRE OS REGIMES PREVIDENCIÁRIOS. INEXISTÊNCIA DE PREJUÍZO DA AUTARQUIA. OBSERVÂNCIA AINDA DO RECURSO ESPECIAL REPETITIVO 1.334.488/SC. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO EM PARTE E NESSA PARTE PROVIDO. (...) 2. Cinge-se a tese recursal no reconhecimento do direito à renúncia do benefício aposentadoria por tempo de serviço para fins de expedição de certidão de tempo para contagem recíproca junto ao regime próprio da União. 3. O recorrente aposentou-se por tempo de serviço, no Regime Geral de Previdência Social, em 19/2/1992, tendo computado 34 anos e 4 meses. Posteriormente, aprovado em concurso público, foi nomeado em 30/12/1993 para o cargo de Auditor Fiscal do Tesouro Nacional, hoje transformado no cargo de Auditor da Receita Federal do Brasil. Recebeu proventos do Regime Geral por 19 (dezenove) anos; está próximo de alcançar a aposentadoria compulsória no Regime Próprio. 4. A jurisprudência do STJ que se firmou no âmbito da Terceira Seção, ao interpretar a legislação em comento, é no sentido de que a abdicação do benefício não atinge o tempo de contribuição. Estando cancelada a aposentadoria no regime geral, tem a pessoa o direito de ver computado, no serviço público, o respectivo tempo de contribuição na atividade privada. Não se cogita a cumulação de benefícios, mas o fim de uma aposentadoria e o consequente início de outra. 5. O STJ decidiu, em sede de representativo da controvérsia, ser possível renunciar à aposentadoria, objetivando o aproveitamento do tempo de contribuição e posterior concessão de novo benefício, independentemente do regime previdenciário em que se encontra o segurado. Recurso Especial Repetitivo 1.334.488/SC. 6. Em observância da jurisprudência que vem se firmando no âmbito do STJ e também pela força vinculante do acórdão proferido em representativo da controvérsia, impõe-se o julgamento de procedência. 7. Recurso especial conhecido em parte e nessa parte provido, restabelecendo a sentença de primeiro grau. (REsp 1401755/SP, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/04/2014, DJe 29/04/2014).

No voto do Ministro Campbell Marques no julgamento do REsp 1401755/SP acima, foi citada a doutrina de Daniel Machado da Rocha e José Paulo Baltazar Júnior, que interpretam o art. 96, III da Lei 8.213/91 de forma restritiva, considerando válida a vedação apenas enquanto o benefício estiver sendo usufruído. Uma vez renunciada a aposentadoria, nada impede o direito a contagem de tempo recíproca. Sobre o art. 96, os referidos autores destacam que:

"No terceiro inciso o preceito normativo pretende impedir que o tempo já considerado para um benefício seja novamente empregado.

As questões a serem investigadas aqui fundamentalmente serão duas:

a) se essa vedação seria capaz de impedir a contagem do tempo de serviço pertinente a benefício já concedido, quando o segurado pretende dele abdicar;

b) em sendo admitida essa abdicação, se o tempo anteriormente empregado poderá ser utilizado no mesmo regime ou apenas em regimes diversos.

O benefício previdenciário é uma posição jurídico-subjetiva patrimonial de natureza pública, de cunho disponível.

No nosso entendimento, a vedação contida no preceito deve ser entendida como referente apenas ao tempo empregado em benefício ativo, pois, se o segurado abdica de benefício mantido pelo sistema, a proibição deixaria de existir" (p. 330-332).

Quanto à situação nº 2, proposta anteriormente, em que o tempo de contribuição excedente teria produzido efeitos, também haverá a necessidade de desaposentação para emissão de CTC do período contributivo utilizado para concessão de aposentadoria, sendo situação equivalente a situação nº1.

O tempo excedente produzirá efeitos jurídicos e financeiros na maioria das situações, notadamente nos casos de: (i) aposentadoria por tempo de contribuição, quando ocorrer pela média das remunerações (art. 40, §1º, III, "a" c/c o art. 1º da Lei 10.887/04); (ii) recebimento de abono de permanência (salvo devolução dos valores); (iii) promoção/progressão na carreira durante o tempo excedente, quando a aposentadoria for por alguma das regras de transição (EC 20, 41 e 47), haja vista os reflexos diretos da promoção/progressão na última remuneração. Esta é a posição da jurisprudência, confira:

INATIVIDADE - PRETENSÃO À DESAVERBAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO PARA UTILIZAÇÃO NA APOSENTADORIA PELO INSS -INADMISSIBILIDADE. 1. O prazo pretendido já foi utilizado para a percepção de outros benefícios, no cargo anterior, como adicional, quinquênios, adicional de tempo de serviço, além de outras vantagens pecuniárias resultantes de evolução funcional. 2. Impossibilidade de exclusão de lapso temporal, o que poderia afetar toda a situação funcional da interessada, com efeitos retroativos. 3. Legalidade do ato administrativo. 4. Sentença que julgou improcedente a ação, mantida. 5. Recurso de apelação, desprovido (Apelação nº 1015933-80.2013.8.26.0053 / Comarca: São Paulo / Órgão julgador: 5ª Câmara de Direito Público / Data do julgamento: 18/08/2014)

Por fim, a situação n°3 é aquela em que o tempo excedente não ensejou reflexos financeiros na composição dos proventos. Embora de difícil ocorrência prática, é plenamente possível a emissão de CTC nesse caso, pela simples razão da não utilização do tempo excedente para a composição pecuniária dos proventos de aposentadoria, não incidindo a vedação do art. 96, III da Lei 8.213/91. É a posição que prevalece no âmbito jurisprudencial:

APELAÇÃO CÍVEL. SERVIDOR PÚBLICO INATIVO. ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL.  MAGISTÉRIO. CERTIDÃO DE TEMPO DE SERVIÇO EXCEDENTE E DESAVERBAÇAO. APROVEITAMENTO DO TEMPO EXCEDENTE PARA FINS DE APOSENTADORIA JUNTO AO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. POSSIBILIDADE. PRECEDENTES. Considerando que a lei não veda a possibilidade de cômputo de tempo de serviço excedente para fins de concessão de outro benefício em regime diverso, o que se proíbe, expressamente, é a contagem do mesmo tempo de serviço ou de contribuição para obtenção de duas aposentadorias (art. 96, III, da Lei nº 8.213/91), relevando, ademais, a insuficiência da prova apresentada pelo Estado de que todo o tempo de sobra foi utilizado para fins de composição dos proventos, a procedência do pedido era mesmo de rigor, não merecendo reforma a sentença. APELAÇÃO DESPROVIDA. (TJ-RS - AC: 70054849971 RS, Relator: Eduardo Uhlein, Data de Julgamento: 17/09/2014, Quarta Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 01/10/2014)

Aposentadoria. Regime Geral de Previdência Social/estatutário. Contagem recíproca. Excesso de tempo. Aproveitamento no cálculo. Art. 98 da Lei nº 8.213/91. Interpretação favorável ao segurado. 1. Eventual excesso de tempo que restar após contagem recíproca para a concessão de aposentadoria no regime estatutário pode ser considerado, como na hipótese, para efeito de aposentadoria por tempo de serviço no Regime Geral de Previdência Social. 2. Recurso especial provido em parte. (REsp 674.708/RS, Rel. Ministro NILSON NAVES, SEXTA TURMA, julgado em 18/10/2007, DJ 17/12/2007, p. 353)

Esta situação de tempo excedente "ocioso" ocorrerá, regra geral, nos casos de aposentadoria por alguma das regras de transição (EC 20, 41 e 47), que garantem integralidade e paridade, nas quais o requisito mínimo de contribuições seja superado pelo tempo efetivo de contribuições do servidor. Isso porque as regras de transição asseguram a aposentadoria com proventos equivalentes à última remuneração (e não pela média), ou seja, se o segurado homem que se aposenta no cargo "X" com exatos 35 anos de contribuição receberá o mesmo provento do segurado que se aposentar no cargo "X" com 42 anos de contribuição. Logo, este segurado que contou com 42 anos não utilizou os 7 anos a mais de contribuição para composição dos proventos.

Agora imagine que o segurado acima que contou com 42 anos de contribuição tenha progredido da classe 2 para a classe 3 dentro do cargo "X" durante o tempo excedente, com exatos 37 anos de contribuição. Nesse caso, depois de aposentado no cargo "X", classe 3, com 42 anos de contribuição (pelo art. 3º da EC 47/05, por exemplo), só poderá retirar o tempo excedente a partir da classe 3 (de 37 a 42 anos de contribuição, portanto), pois se retirasse o tempo entre 35 e 37 anos de contribuição, teria efeitos financeiros na composição dos proventos, pois deveria regredir aos proventos correspondentes ao cargo "X", classe 2 (e não mais classe 3).

4.5 Nas situações excepcionais em que é possível a emissão de CTC para tempo excedente, o segurado poderá escolher o intervalo no qual será retirado o excesso?

Conforme análise da Portaria MPS 154, somente é permitida a emissão de CTC para ex-servidor (art. 12), ou seja, somente após finalizado o vínculo funcional-previdenciário com determinado ente público. Portanto, o servidor na ativa não poderá emitir CTC para período contributivo no próprio cargo em curso, de modo a não afetar a evolução funcional do servidor efetivo. Esta é a posição do TJSP:

SERVIDOR PÚBLICO ESTADUAL. PEB II. Pretensão a expedição de certidão de tempo de contribuição, do período de 21.03.1983 a 15.05.1995, para averbação de tempo junto à Prefeitura Municipal de São Paulo. "Desaverbação". Inviabilidade. O tempo de serviço decorre do exercício e está ligado ao cargo respectivo; produziu e continua produzindo efeitos no cargo atual, o que impede a pretendida 'desaverbação'. Sentença de procedência modificada. Ordem denegada. Recurso e reexame necessário providos. (TJ-SP - APL: 00203361220138260053 SP 0020336-12.2013.8.26.0053, Relator: Paulo Galizia, Data de Julgamento: 04/08/2014, 10ª Câmara de Direito Público, Data de Publicação: 04/08/2014)

Por oportuno, vale destacar trecho do voto do Desembargador Torres de Carvalho na Apelação Cível nº. 0013107-06.2010 (julgado em 22.10.2012), cujos fundamentos enriquecem o debate, ipsis litteris:

"Não é correto dizer que apenas o funcionário tem interesse no tempo de serviço e que, por ser 'seu', pode usá-lo como melhor lhe aprouver. O tempo de serviço decorre do exercício e está ligado ao cargo respectivo; produziu e continua produzindo efeitos no cargo atual, o que impede a pretendida 'desaverbação' para computá-lo junto ao INSS. Por conta desse tempo o impetrante recebeu adicionais, é favorecido em concursos internos, obtém promoções, teve precedência na escolha de classes a cada ano e não há como restituir os benefícios passados e já recebidos. Há uma incompatibilidade lógica entre o exercício do cargo e a inexistência (em decorrência da 'desaverbação') do tempo de serviço a ele ligado e uma impossibilidade prática e jurídica de eliminar os efeitos já produzidos. É por isso que o Estado, corretamente, não procede à 'desaverbação' de tempo passado; certifica apenas o tempo de serviço a partir do momento em que cessado o vínculo com o Estado, em que o tempo já produziu todos os efeitos que podia ter produzido e desvinculou-se, pela cessação, do cargo em que o interessado teve exercício. O tempo de serviço em curso, que produziu e continua produzindo efeitos no cargo atual, não pode ser 'desaverbado' como pretende o impetrante, pois impossível a eliminação dos efeitos já produzidos. O tempo de serviço se vincula ao cargo exercido e, enquanto perdurar o exercício, não pode ser dele desvinculado. ”

No exemplo dado no tópico anterior, em que o segurado precisava de 35 anos de contribuição, mas se aposentou com 42 anos, os 7 anos excedentes (sem efeitos financeiros) poderão ser transferidos pela contagem recíproca para outro regime de previdência. Porém, os 7 anos podem ser retirados de qualquer intervalo dentro dos 42 anos de contribuição do segurado? Ou só podem ser retirados do final, ou seja, a partir do que superar os 35 anos?

A melhor resposta é a aquela em que os 7 anos só podem ser retirados da parte final, ou seja, somente a partir do dia que superar o tempo mínimo de contribuição (no lapso de 35 a 42 anos). Por somente ser possível a emissão de CTC na situação nº 3 (vide tópico 4.3), em que a aposentadoria é por meio de regras de transição que asseguram a integralidade (proventos iguais a última remuneração), todo o período funcional anterior ao implemento do requisito temporal mínimo de contribuição (antes dos 35 anos) estará afetado à aposentadoria, não podendo ser suprimido sem que tenha efeitos jurídico-financeiros na composição dos proventos.

Sobre o autor
Antônio Ítalo Ribeiro Oliveira

Advogado inscrito na OAB/PI e Gestor Público do Estado do Piauí. Bacharel em Direito pela Universidade Federal do Piauí, 2014.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

OLIVEIRA, Antônio Ítalo Ribeiro. Desaverbação de tempo de contribuição excedente após a aposentadoria no serviço público. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4774, 27 jul. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/50879. Acesso em: 22 dez. 2024.

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