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Um caso concreto de condenação criminal em segunda instância

Agenda 26/01/2018 às 18:15

O ex-presidente Lula teve sua condenação confirmada no TRF-4. O revisor Leandro Paulsen, o relator João Pedro Gebran e o juiz federal Victor Laus decidiram aumentar a pena do petista para 12 anos e um mês de prisão.

O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve sua condenação confirmada no TRF-4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) na tarde do dia 24 de janeiro do corrente ano. O revisor Leandro Paulsen, o relator João Pedro Gebran e o juiz federal Victor Laus votaram por aumentar a pena do petista para 12 anos e um mês de prisão. Em julho de 2017, o juiz Sérgio Moro havia dosado a sentença em 9 anos e meio.

A defesa de Lula tem dois dias a partir da publicação do acórdão para apresentar embargos de declaração. 

Nos casos em que a decisão judicial não seja clara e precisa, surge a necessidade de ser aclarada e o remédio recursal é o ajuizamento do recurso de embargos de declaração.

Desde já, pontue-se que nos embargos de declaração não se reavaliam provas e fatos.

Dispõe, a propósito, o artigo 619 do Código de Processo Penal que aos acórdãos proferidos pelos Tribunais de Apelação, câmaras ou turmas, poderão ser opostos embargos de declaração, no prazo de dois dias, contado de sua publicação, quando houver na sentença, ambiguidade, contradição, obscuridade e omissão. Em verdade todas essas formas se reduzem à omissão.

Há ambiguidade quando a decisão permite mais de uma interpretação. Há obscuridade, quando não há clareza na relação, de modo que não se pode saber com certeza qual o pensamento ali exposto. Há contradição quando as afirmações colidem.

Discute-se se o julgamento dos embargos de declaração podem alterar o teor da decisão exarada.

Ora, como bem lecionou Pontes de Miranda (Comentários ao Código de Processo Civil, Rio de Janeiro, Forense, 1975, tomo VII, pág. 117), nos embargos de declaração, o que se pede é que se declare o que foi pedido, porque o meio empregado para exprimi-lo é deficiente ou impróprio. Não se pede que se decida novamente, pede-se que se reexprima.

Não era outra a lição de João Monteiro (Teoria do Processo Civil e Comercial, vol. III, 4ª edição, Ed. Off, Graph do Jornal do Brasil, 1925,  pág. 615), para quem só é lícito ao juiz declarar a sentença já proferida, não podendo, portanto, modificar em ponto algum a mesma sentença.

De todo modo, Barbosa Moreira (Comentários ao Código de Processo Civil, Rio de Janeiro, Forense, volume V, 3ª edição, 1978, pág. 143) admite possa haver modificação na decisão embargada, ocorrendo a hipótese de omissão.

Na medida em que os embargos de declaração sejam julgados improvidos, haverá as seguintes consequências: 

a) expedição de mandado de prisão contra o réu, inclusive em respeito à jurisprudência cediça do TRF 4 - Região; 

b) por força da Lei da Ficha limpa o réu ficará inelegível. 

Por 7 votos a 4, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu  admitir que um réu condenado na segunda instância da Justiça comece a cumprir pena de prisão, ainda que esteja recorrendo aos tribunais superiores.

Assim, bastará a sentença condenatória de um tribunal de Justiça estadual (TJ) ou de um tribunal regional federal (TRF) para a execução da pena. Até então, réus podiam recorrer em liberdade ao Superior Tribunal de Justiça (STJ) e ao próprio Supremo Tribunal Federal (STF).

Desde 2009, o STF entendia que o condenado poderia continuar livre até que se esgotassem todos os recursos no Judiciário. Naquele ano, a Corte decidiu que a prisão só era definitiva após o chamado "trânsito em julgado" do processo, por respeito ao princípio da presunção de inocência.

Mas, o STF, em decisões recentes, já tem admitido que o mandado de prisão definitiva somente será objeto de execução com o trânsito em julgado de todos os recursos. 

Com base na garantia constitucional de que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória, o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, concedeu Habeas Corpus ao ex-vereador de Goiânia Amarildo Pereira, condenado em segunda instância a 7 anos de prisão por peculato — ele foi representado pelo advogado Carlos Leonardo Pereira Segurado.

“Como se sabe, a nossa Constituição não é uma mera folha de papel, que pode ser rasgada sempre que contrarie as forças políticas do momento”, criticou o ministro, ao afirmar que não há na Constituição qualquer menção à execução antecipada de pena. Na decisão Lewandowski lembrou que foi enfático em seu voto contrário à prisão após sentença de segundo grau, quando o tema foi discutido no Plenário da corte — na ocasião, a maioria decidiu por permitir a prisão antecipada.

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Segundo ele, trata-se do princípio da presunção de inocência da pessoa e que as garantias individuais devem ser respeitadas, “ainda que os anseios momentâneos, mesmo aqueles mais nobres, a exemplo do combate à corrupção, requeiram solução diversa, uma vez que, a única saída legítima para qualquer crise consiste, justamente, no incondicional respeito às normas constitucionais”.

O ex-presidente da República poderá ajuizar, após a preclusão dos recursos ordinários, na segunda instância, concomitantemente, recurso especial, com base no artigo 105, III, da CF e recurso extraordinário, com base no artigo 102, III, da norma paratípica. Esse recursos têm apenas efeito devolutivo, não sendo possível (Súmula 07 do STJ) admissão de análise probatória. Isso ocorre para ambos os recursos. 

Para evitar a prisão definitiva, após decisão de segunda instância, será caso do presidente da República ajuizar habeas corpus, primeiramente ao STJ, e, caso não obtenha sucesso, ao STF. 

A providência foi concedida no HC 147.427 - GO. 

Disse o ministro relator Ricardo Lewandowski: 

"Se, por um lado, o princípio constitucional da presunção de inocência não resta malferido diante da previsão, em nosso ordenamento jurídico, das prisões cautelares, desde que observados os requisitos legais, por outro, não permite que o Estado trate como culpado aquele que não sofreu condenação penal transitada em julgado, sobretudo sem qualquer motivação idônea para restringir antecipadamente sua liberdade."

Para poder ser inscrito como candidato a presidente da República, poderá o ex-presidente ajuizar medida cautelar preparatória para que o tribunal superior reconheça a suspensão de uma eventual inelegibilidade. Para tanto, deverá comprovar fundada fumaça de bom direito e perigo de demora, com grave risco de dano irreparável a suas pretensões. 

Vejamos a posição do TSE e de especialistas: 

Ao julgar a candidatura da ex-deputada federal Jaqueline Roriz (PMN), em 2014, a ministra Maria Thereza de Assis Moura votou pela inelegibilidade ao afirmar que “não há qualquer previsão legal (...) no sentido de que a oposição de embargos de declaração afaste a possibilidade de a decisão proferida por órgão colegiado atrair a incidência da hipótese de inelegibilidade”. Em outro julgamento no mesmo ano, o ministro Gilmar Mendes usou o mesmo entendimento para indeferir a candidatura de Marcelo de Lima Lelis (PV) ao cargo de vice-governador do Tocantins: “a Lei Complementar n° 64/90, que prevê as condições de inelegibilidade e foi alterada pela Lei da Ficha Limpa, pressupõe decisão colegiada, não exaurimento de instância ordinária.”

"Existe uma discussão em torno desse ponto, mas a Lei da Ficha Limpa deixa claro que tendo condenação de grau colegiado o candidato já está inelegível", afirma o advogado Luciano Pereira dos Santos, ex-presidente da Comissão de Direito Eleitoral da seção de São Paulo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP).

O advogado faz menção ao inciso I do artigo 1º da lei complementar 64/90, que lista sete possibilidades em que os candidatos podem ser proibidos de concorrer a um cargo eletivo se “forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado”. O advogado lembra que o julgamento de um embargo costuma ser rápido, então não haveria prejuízo ao andamento do processo. 

Redator da Lei da Ficha Limpa, o advogado Márlon Reis é contra a espera pelo julgamento dos recursos. Segundo ele, não deveria nem haver debate em torno desse assunto:

— Um dos objetivos da criação da lei foi justamente evitar que um candidato pudesse concorrer à eleição enquanto aguarda a solução de uma batalha de recursos protelatória.

Para o ex-ministro do STF e do TSE Carlos Velloso, um acórdão da segunda instância não está completo até que os recursos sejam julgados. Na opinião dele, a inelegibilidade deveria valer só após a análise dos embargos:

— A sentença só está completa após os embargos, que servem para esclarecer um ponto da sentença e cabem sempre. E a lei fala em inelegibilidade após a condenação em órgão colegiado. Então, valeria o mesmo entendimento já usado no cumprimento da pena: é confirmada a sentença de primeiro grau, são julgados os embargos e, aí, sim, cumpre-se a pena.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. Um caso concreto de condenação criminal em segunda instância . Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 23, n. 5322, 26 jan. 2018. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/63695. Acesso em: 22 dez. 2024.

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