7. A BUSCA DE UM EQUILÍBRIO ESTÁVEL
O impasse da judicialização da saúde, que tem cada vez mais tomado espaço no cenário brasileiro, tem preocupado e muito o poder público.
Pois bem, o Estado possui o dever de assegurar efetivamente os direitos fundamentais, entre eles se encontra o direito à saúde, que deve ser estendido a todos os cidadãos brasileiros.
Por um lado a Constituição Federal atesta que o acesso à saúde deve ser universal e igualitário, devendo, portanto, o poder público criar meios para a promoção, proteção e recuperação deste direito.
Tanto é assim que estabeleceu uma divisão entre os entes públicos para que o acesso à saúde não passe por obstáculos.
Todavia, muitas vezes o poder público se mantém inerte diante de algumas situações, cabendo ao indivíduo se valer do Poder Judiciário para conter com as omissões do Estado.
Contudo, a concessão de medicamentos e tratamentos de saúde fora da lista do Sistema Único de Saúde, que convém esclarecer que passa por inúmeros estudos e análises para sua elaboração, devem ser observados critérios para que a saúde de outras pessoas não seja colocada em risco.
No entanto, antes de se chegar a esta etapa, até porque esta deveria ser a última solução a ser pensada, e claro, ser utilizada em situações excepcionais, insta observar o problema da operacionalização da saúde pública no Brasil.
Com efeito, o Brasil é um país em desenvolvimento e com recursos bastante limitados e insuficientes. Para se buscar um equilíbrio alguns dados são necessários:
a) as políticas públicas que estão sendo implementadas para que o básico que o cidadão precisa seja tutelado;
b) a definição do mínimo existencial de cada integrante da população;
c) transparência dos gastos e investimentos orçamentários no país.
Portanto, se faz necessário que o Administrador Público procure alternativas para a implementação da saúde pública com foco na mão de obra e na infraestrutura conjuntamente com uma estrutura econômica que a sustente.
Pois caso isso não ocorra, a política pública implementada apresentará uma falha, vez que caso o orçamento público não seja estudado e se enquadre como insuficiente para atender a demanda, ao conceder um medicamento de alto custo a alguém, estará deixando outros indivíduos sem cobertura, ou outros direitos fundamentais não serão atingidos com presteza.
Sobre este tema, convém destacar os dizeres de Fabíola Supino Vieira (2007):
A prevalência da hepatite viral crônica C no Brasil é estimada em 1% da população geral. A população brasileira, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), era de 186.770.562 de pessoas em julho de 2006. Portanto, cerca de 1.867.706 delas possuem o vírus da hepatite C por aproximação. Supondo-se que o SUS trate 25% (466.927) dessas pessoas com o medicamento interferon peguilado e como o tratamento deve ser feito com a aplicação de 180 mcg, uma vez por semana durante 48 semanas e o preço da seringa preenchida de 180 mcg é de R$ 1.107,49, o custo estimado de 24,8 bilhões de reais. Se esta situação tivesse acontecido, este valor corresponderia a 64% do gasto total executado pelo Ministério da Saúde em 2006 (38,8 bilhões de reais). Ou seja, dois terços do orçamento federal da saúde seriam gastos para a oferta de um único produto farmacêutico com cobertura de 0,25% da população.
Desse modo, o Estado para atender as demandas, possibilitando o melhor acesso as políticas públicas desenvolvidas para atender cada vez mais as diversas classes sociais existentes no país, depende apenas do empenho do poder público diante das possibilidades apresentadas para efetivar o direito social à saúde.
7.1 A IDEIA DO IMPOSSÍVEL
Como um breve resumo sobre o tema da saúde pública tem-se que este é um direito de todos, e o papel do Estado é promover as condições para garanti-lo, independente da condição social do indivíduo. Portanto, não cabe um juízo de valores sobre quem necessita e merece mais ou quem realmente não merece. O que deve ser entendido pelo poder público é que o Sistema Único de Saúde deve funcionar de maneira igualitária para todos os brasileiros, e os serviços de saúde precisam se aperfeiçoar para melhorar cada vez mais o atendimento.
O que perdura do regime público brasileiro, e não só nele, é que se algo está ruim deve ser fechado, ou seja, não há um mínimo de esforço em reformá-lo, aperfeiçoá-lo para que fique bom. Assim, há uma dificuldade em reformar uma ideia que já estava construída.
Cabe ao poder público encarar a saúde como um bem maior, que deve sim ser tutelado primordialmente, vez que não é assim encarado. Deve se ter em mente que cabe ao Município tutelar aquilo que está ao seu alcance, bem como, os Estados e a União, contudo, a ideia estar ao seu alcance vai muito além do que é viável, deve ser além do que é realmente esperado.
Mas para que os entes políticos atuem de maneira ostensiva, é necessário que a transferência de recursos públicos seja condizente para o sistema funcionar.
Porém, além da transferência de recursos é ideal que não haja uma resistência entre os Estados e Municípios, pois estes muitas vezes por receio que a União corte a verba encaminhada ou até mesmo por medo da escassez de seus recursos, não assumem de fato ações na esfera da saúde publica.
Portanto, extrai-se que a saúde publica necessita de mais recursos públicos e estes devem ser melhores utilizados para sua implementação.
Assim, cabe a contribuição da União no andamento desta estrutura, vez que deveria ser terminantemente proibido o atraso das verbas públicas, bem como, seu corte, para que resultados significativos sejam alcançados.
Pois bem, mudando um pouco o foco, é condizente aduzir que o Ministério da Saúde deve reafirmar este direito social, formular políticas e supervisionar as ações sociais, para que, sob um aspecto geral, não exista aquela alusão de que há hospitais públicos que funcionam e outros que não.
A consciência pública que deve existir é a obsessão pela melhoria na saúde pública, generalizá-la como um ideal que deve ser buscado diariamente pelos entes públicos.
A título de exemplo cabe explanar sobre o setor da vacinação, vez que muitas vezes essa e a saída para o controle de epidemias e doenças infecciosas, um problema muito sério no Brasil. Aqui a questão não é a falta de verba pública, nem de profissionais, mas sim de um jogo entre os entes políticos, pois há muita coisa envolvida para que efetivamente aconteça à ação pública.
Cabe, portanto, a Administração Pública, encarada como um todo, ora Municípios, Estados e a União, que conjuntamente atuem, afastando o joguinho de empurra-empurra existente, e façam com que sejam cumpridos os cronogramas de ação pública.
Cabe aos entes políticos encararem que suas atuações devem ser somadas para que diante deste esforço, em conjunto com as ações sociais e públicas, sejam finalmente concretizadas a contento do que é esperado e muito mais que isso, que os impactos na qualidade de atendimento sejam dirimidos efetivamente.
Todavia, uma análise que deve ser feita aqui, é que o poder publico não pode apenas se preocupar com os setores carentes, mas não deixar desamparado os setores que andam avançando pontualmente, vez que a ampliação e o fortalecimento destas áreas são sempre bem vindos.
Por fim, é válido frisar que no Brasil apesar da onda de manifestações públicas ultimamente, estas jamais devem deixar de existir, haja vista que o regime político brasileiro está muito aquém de dirimir o atendimento a saúde insuficiente e inadequado, mas isso não quer dizer que não será alcançado, o importante é trazer a noção que de algo que se busca um dia será atingido, mas a busca sem o esforço é em vão, e como o poder público pode achar algo, ainda mais agora diante da onda de corrupção que cresce a cada dia, se não nos manifestarmos, não nos hesitarmos, não reclamarmos?!
O poder público precisa ter em mente que o serviço que oferece deve ser tratado com respeito os usuários com dignidade, pois isto é uma condição necessária para que estes serviços melhorem, nos dizeres de José Serra (2002, p. 18).
No Brasil, apesar do tratamento de saúde estar em tese disponível a todos, na prática, cerca e um quarto da população é atendida por planos privados de saúde.
Isso jamais pode trazer uma ideia de que haja uma transferência, em um futuro próximo, de responsabilidades para o poder privado, posto que ocorreria um afastamento do que denomina-se democracia.
8. CONCLUSÃO
O direito à saúde vem preocupando gerações ao longo dos anos, contudo, no ordenamento jurídico brasileiro ele passou a figurar expressamente a partir da Constituição Federal de 1988, que muitos estudiosos dizem ser a mais democrática do país até o momento.
Não obstante, apesar de traçar as linhas gerais para que este direito social vigore, sua atuação ainda sofre inúmeros problemas, pois com o aumento da população há a necessidade, por sua vez, do aumento do números de leitos nos hospitais, bem como, a quantidade de remédios disponíveis de maneira gratuita, e por fim, ampliação dos tratamentos médicos oferecidos pelo Sistema Único de Saúde, haja vista que a tecnologia aliada ao aperfeiçoamento dos estudos médicos, traz cada vez mais para o mercado meios alternativos para conter as doenças que vem atingindo a população.
Todavia, tal procedimento não vem sendo concretizado no Brasil, vez que diariamente aumentam as demandas judiciais que buscam o acesso à saúde ante a omissão ou negação do Estado no oferecimento de procedimentos médicos eficazes para manter o bem estar do suplicante.
As conclusões para que tal situação tenha chegado nesse nível seria, como se verifica neste trabalho, a má distribuição entre os entes políticos das verbas públicas, posto que o orçamento público para o bom desenvolver da saúde pública não chega nem perto do que seria o razoável.
No entanto, como uma forma de tutelar a dignidade da pessoa humana, o Poder Judiciário tem concedido por meio de medidas cautelares o acesso ao medicamento ou o tratamento postulado, desde que cabalmente demonstrado pela parte.
Porém, tal ato tem afetado a estrutura financeira do país, haja vista que para o poder público fornecer o remédio ou o procedimento médico que está fora da lista do SUS, precisa que retire de uma reserva que estaria destinada para o fornecimento de outros fármacos, ora os constantes na lista do SUS ou para a promoção de outro direito fundamental, que também traz um sério prejuízo.
Para que isso não ocorra, pois o Poder Judiciário deveria ser considerado o “último suspiro”, é necessário que se faça um estudo das verbas públicas, para sua melhor destinação para a área da saúde, para que a população obtenha o acesso à saúde pela via administrativa, como deveria ser, via de regra.
Observa-se que a grande falha que existe no setor da saúde é gerada pelo Poder Executivo que tem atuado deficientemente na distribuição das verbas públicas, sem contar na corrupção que tem assolado o país.
Portanto, uma forma de conter este problema apresentado, é a busca por meios alternativos que tenham como premissa a melhoria na infraestrutura dos hospitais, bem como, na contratação de médicos especialistas, para que o socorro ao Poder Judiciário se reduza cada vez mais, pois com a melhor distribuição da renda pública, mais bem agraciados estarão os setores mais importantes do país, e consequentemente, a dignidade da pessoa humana estará sendo consagrada que, por sua vez, é o foco da Constituição da República.