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Diferenças entre a concessão de uso de espaço público e a concessão de direito real de uso

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Agenda 29/10/2013 às 14:15

O parecer trabalha as diferenças entre concessão de uso de espaço público e a concessão de direito real de uso. Contém aspectos históricos da licitação e do pregão e posicionamentos dos Tribunais de Contas dos Estados e da União.

Processo n. 928/2011 - CJ

Comunicação Interna n. 099/2011 – SAD

Rp n. 058684/2011

Interessados: Secretaria de Administração do TJPE

Assunto: Revisão do Enunciado Administrativo n. 17/2008 - CJ

EMENTA: CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. ART. 37, INCISO XXI, DA CRFB/1988. LICITAÇÕES E CONTRATOS. REVISÃO DO ENUNCIADO ADMINISTRATIVO N. 17/2008 DA CONSULTORIA JURÍDICA. POSSIBILIDADE. CONCESSÃO DE USO DE ESPAÇO PÚBLICO E CONCESSÃO DE DIREITO REAL DE USO. INSTITUTOS DISTINTOS. DIFERENÇAS. INTELIGENCIA DOSARTS. 2º E 23, § 3º, DA LEI N. 8.666/1993 – ESTATUTO DAS LICITAÇÕES E CONTRATOS ADMINISTRATIVOS.

I –A Concessão de uso é gênero que se subdivide em duas espécies: a) Concessão de Uso Administrativo e; b) Concessão de direito real de uso.

II - A licitação na modalidade concorrência, prevista no Art. 23, § 3º, da lei n. 8.666/1993, só é de observância obrigatória para casos de concessão de direito real de uso.

III - Na mera concessão de uso administrativo, referente a espaço público, a lei deixou ao alvedrio do Administrador a escolha da modalidade licitatória a ser utilizada.

III – Possibilidade de alteração do Enunciado Administrativo n. 17/2008 – CJ, no que concerne à Concessão de uso de espaço público, para adequar a sua redação aos precedentes do TCU, TCE/SC, TJSP e STJ, bem como com o posicionamento da doutrina pátria.

IV – Precedentes citados: Tribunal de Contas da União – TCU: Decisão n. 275.320/92-8; Acórdão n. 2844/2010 – Plenário; Superior Tribunal de Justiça – STJ: ROMS nº 16280, REsp nº 524811.


PARECER N. 988/2011 - CJ

1. RELATÓRIO

Vistos etc.

Trata-se de pedido de Revisão do Enunciado Administrativo n. 17/2008 – CJ, interposto pela Secretaria de Administração deste egrégio Sodalício, através da Comunicação Interna n. 099/2011 - SAD.

Vejamos o texto do dispositivo vergastado:

ENUNCIADO ADMINISTRATIVO CJ/TJPE Nº 17, DE 12 DE SETEMBRO DE 2008

USO DE ESPAÇOS PÚBLICOS - Os casos de concessões e permissões de uso de espaços públicos do Poder Judiciário do Estado de Pernambuco devem ser precedidos de procedimento licitatório, na modalidade concorrência, ressalvados os casos de uso de espaço público pela Associação dos Magistrados do Estado de Pernambuco - AMEPE, Instituto dos Magistrados de Pernambuco - IMP, Tribunal Regional Eleitoral, Ministério Público, Ordem dos Advogados do Brasil - OAB, Defensoria Pública e bancos ou outras instituições financeiras com as quais o Tribunal de Justiça opere. Em qualquer caso, é devido o pagamento das verbas locatícias definidas em laudo técnico (Lei Federal nº 8.666, de 21/06/1993, art. 2º).

O cerne do pedido objetiva a alteração do enunciado de modo a ser possível a utilização da modalidade Pregão para Concessão de uso de espaço público. Salienta-se que esta modalidade de licitação satisfaz os requisitos do art. 2º da Lei n. 8.666/1993.

O feito me foi distribuído sob o timbre de urgência, sob o fundamento da premente necessidade de realização de certame licitatório objetivando a Concessão da área destinada ao estacionamento do Fórum Rodolfo Aureliano, em Recife – PE.

Eis o relatório.

Passo a oferecer o seguinte opinativo.


2. FUNDAMENTAÇÃO

À saída, registro que estou cônscio de que o Enunciado n. 17/2008 – CJ teve sua redação esculpida pelo eminente Desembargador Aposentado e então Consultor Jurídico, Dário Rocha, vide os termos do Parecer n. 335/2008 – SJ, contido no processo n. 506/2008 – SJ. O douto chefe deste setor consultivo, naquela oportunidade, ponderou e alocou critérios analógicos para assentar a necessidade de realizar licitação na modalidade Concorrência como pressuposto da Concessão de uso de espaço público.

Entretanto, tais ponderações entraram em parcial desuso. Assim, passaremos a fazer breves colocações de forma a fundamentar a possibilidade de alteração do Enunciado n. 17/2008 – CJ, de sorte a adequar o conteúdo jurídico do dispositivo às recentes decisões do Tribunal de Contas da União – TCU e demais pretórios pátrios.

2.1 - DO DEVER DE LICITAR

A nossa Constituição da República Federativa do Brasil, em seu art. 37, inciso XXI, dispõe:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:

XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.

Assim, é de clareza solar que o Poder Público deve licitar as Concessões de espaço público, exvi art. 2º da Lei n. 8.666/93.

Art. 2º - As obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações, concessões, permissões e locações da Administração Pública, quando contratadas com terceiros, serão necessariamente precedidas de licitação, ressalvadas as hipóteses previstas nesta Lei (g.n).

Entre nós, o procedimento de licitação já existe há mais de 130 (cento e trinta) anos. O primeiro diploma a tratar do procedimento licitatório foi o Decreto n. 2.926, de 14.05.1862, que regulamentava as arrematações dos serviços prestados pelo então Ministério da Agricultura, Commercio e obras públicas.

Empós, tivemos algumas tentativas desastrosas no ordenamento jurídico brasileiro, culminando com a edição do Decreto n. 4.536, de 28.01.1922, que organizou o Código de Contabilidade da União, cf. arts. 49 usque 53.

Já em 1967, criou-se Decreto-Lei nº 200, de 25.02.67, que estabeleceu a reforma administrativa federal. Este diploma, mais tarde foi estendido, com a edição da Lei nº 5.456, de 20.06.68, às Administrações dos Estados e Municípios.

Poucos anos antes da CRFB/1988, o ordenamento pátrio teve o malogrado Decreto-lei nº 2.300, de 21.11.86, atualizado em 1987, pelos Decretos-lei 2.348 e 2.360, foi quando se instituiu, pela primeira vez, o Estatuto Jurídico das Licitações e Contratos Administrativos, reunindo normas gerais e especiais relacionadas à matéria[1].

Em 1988, tivemos a promulgação de nossa atual Carta Republicana, e, posteriormente a edição da Lei n. 8.666/1993.

Pois bem, vejamos agora o conceito de licitação. O professor Hely Lopes Meirelles conceitua licitação como:

"o procedimento administrativo mediante o qual a Administração Pública seleciona a proposta mais vantajosa para o contrato de seu interesse. Visa propiciar iguais oportunidades aos que desejam contratar com o Poder Público, dentro dos padrões previamente estabelecidos pela Administração, e atua como fator de eficiência e moralidade nos negócios administrativos.[2]"

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O conceito de licitação dado por Celso Antônio Bandeira de Mello enfatiza a concorrência entre os participantes. É como se lê:

"Licitação - em suma síntese - é um certame que as entidades governamentais devem promover e no qual abrem disputa entre os interessados em com elas travar determinadas relações de conteúdo patrimonial, para escolher a proposta mais vantajosa às conveniências públicas. Estriba-se na idéia de competição, a ser travada isonomicamente entre os que preencham os atributos e aptidões necessários ao bom cumprimento das obrigações que se propõem assumir[3]".

Na visão de Maria Sylvia Zanella Di Pietro a licitação é:

"o procedimento administrativo pelo qual um ente público, no exercício da função administrativa, abre a todos os interessados, que se sujeitem às condições fixadas no instrumento convocatório, a possibilidade de formularem propostas dentre as quais selecionará e aceitará a mais conveniente para celebração de contrato[4]"

Em que pese a exigência em testilha, é possível que a Administração cumpra com seu mister, sem ter que recorrer obrigatória e necessariamente a determinadas modalidades de licitação, dês que a lei assim o permita.

2.2 – DA CONCESSÃO DE USO E DA CONCESSÃO DE DIREITO REAL DE USO.

O Enunciado Administrativo n. 17/2008 da Consultoria Jurídica prescreve a modalidade da concorrência como meio obrigatório para a concessão e permissão de uso de espaço público (sic).

Mas, será que tal procedimento é de todo correto?

Proponho-me a enfrentar a presentevexata quaestio.

A prima facie é necessário estabelecer algumas premissas. A Concessão de uso ‘lato sensu’engloba duas modalidades:

I - a concessão administrativa de uso e;

II - a concessão de direito real de uso.

Nesta toada:

“A concessão de uso de bem público é o ajuste que se dá entre a Administração, tida como concedente, e um particular, visto como concessionário, em que aquela outorga a este a utilização exclusiva de um bem de seu domínio, para que o explore por sua conta e risco, respeitando a sua específica destinação, bem como as condições avençadas com a Administração, tais como prazo, preço a ser cobrado do público, entre outras”. Por outro lado, “a concessão de direito real de uso de bem público é o contrato que tem como objeto a transferência da utilização de terreno público ao particular, como direito real resolúvel, para fins específicos de urbanização, industrialização, edificação, cultivo ou qualquer outra exploração de interesse social, consoante art. 7º do Decreto-Lei nº 271, de 28.02.67, que a instituiu, sendo que a referida transferência poderá ser, à vista do aludido dispositivo, remunerada ou gratuita, por tempo certo ou indeterminado”[5].

O posicionamento consolidado na doutrina afirma que a Concessão administrativa de uso e a Concessão de direito real de uso são institutos distintos, e, desta feita, devem ser regidos por normas próprias.

Aconcessão de direito real de uso atribui o uso do bem público como um direito real, transferível a terceiros, requerendo, por isso, especial processo seletivo, merecendo destaque no Estatuto das Licitações, em seu art. 23, § 3º, cf. TCU, Processo n. 275.320/92-8.

Vejamos, adrede, o art. 23, § 3º, da Lei n. 8.666/93:

Art.23. (...)

§ 3º - A concorrência é a modalidade de licitação cabível, qualquer que seja o valor de seu objeto, tanto na compra ou alienação de bens imóveis, ressalvado o disposto no art. 19, como nas concessões de direito real de uso e nas licitações internacionais, admitindo-se neste último caso, observados os limites deste artigo, a tomada de preços, quando o órgão ou entidade dispuser de cadastro internacional de fornecedores ou o convite, quando não houver fornecedor do bem ou serviço no País.

Já a concessão administrativa de uso, também denominada concessão comum de uso, apenas confere ao concessionário um direito pessoal, intransferível a terceiros. Este procedimento apresenta, portanto, uma menor rigidez em sua contratação.

Na definição de Renato Geraldo Mendes, a Concessão de Uso seria:

(...) o negócio jurídico por meio do qual o Poder Público concede a um particular a utilização de bem público em caráter de exclusividade, por determinado prazo. Em razão da concessão, caberá ao particular respeitar a destinação do bem e explorá-lo por sua conta e risco e, ainda, pagar ao Poder Público um valor pela utilização do bem concedido. A concessão de uso para ser realizada dependerá, como regra, de licitação[6].

Assim, é lídimo concluir que, ante a maior flexibilidade conferida ao Administrador nesta última modalidade, os institutos da Concessão administrativa de uso e a Concessão de direito real de uso não se confundem.

Neste talante foi que a jurisprudência pátria, reiteradamente, proclamou a Concessão administrativa de uso como um contrato tipicamente administrativo[7].

Contudo, não podemos confundir a flexibilidade de utilização de procedimento licitatório com a desnecessidade deste, pois resta, em ambos os casos, caracterizada a predominância do interesse público sobre o particular[8].

O percuciente Ministro do TCU, Adylson Motta, verberou que:

“(...) vale lembrar a abrangência do art. 2º da Lei nº 8.666/93, que dispôs: 'As obras, serviços, inclusive de publicidade, compras, alienações, concessões, permissões e locações da Administração Pública, quando contratadas com terceiros, serão necessariamente precedidas de licitação, ressalvadas as hipóteses previstas nesta lei.' 5. Conforme se verifica, o mencionado art. 2º utilizou o termo 'concessão' referindo-se ao gênero, e não à espécie. Assim o fazendo, tornou necessária a licitação em toda e qualquer concessão, seja ela 'administrativa de uso' ou 'de direito real de uso'. O Estatuto fez distinção apenas quanto à modalidade de licitação a ser empregada, tornando obrigatória a realização de concorrência somente para as concessões de direito real de uso"[9].

Nesta linha de raciocínio, percebe-se que o pregão é modalidade de licitação, muitas vezes mais célere e eficiente, que pode atender, plenamente, aos objetivos da Administração nos casos de Concessão de uso de espaço público.

2.3 - DO PREGÃO

O nome da modalidade licitatória do Pregão originou-se na Europa Medieval. Segundo Hely Lopes Meirelles:

"nos Estados medievais da Europa usou-se o sistema denominado "vela e pregão", que consistia em apregoar-se a obra desejada, e, enquanto ardia uma vela os construtores interessados faziam sua ofertas. Quando extinguia a chama adjudicava-se a obra a quem houvesse oferecido o melhor preço. Reminiscência desse sistema medieval é a modalidade de licitação italiana denominada "estinzionedi candela vergine", em que as ofertas são feitas verbalmente enquanto se acendem três velas, uma após a outra. Extinta a última sem nenhum lance, a licitação é declarada deserta; caso contrário, acende-se uma quarta vela e assim sucessivamente, pois, para que se possa adjudicar o objeto do certame, é obrigatório que uma vela tenha ardido por inteiro sem nenhum lance superior precedente"[10].

Pois bem, é certo que o Pregão destina-se à contratação de bens e serviços comuns, independentemente do valor estimado da contratação. Nessa modalidade, os licitantes apresentam propostas de preço por escrito e por lances, que podem ser verbais ou na forma eletrônica.

O pregão foi instituído, entre nós, pela Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002. É modalidade de licitação em que a disputa pelo fornecimento de bens ou serviços comuns, e, é feita em sessão pública, ainda que virtual. Os licitantes, após apresentação das propostas com os preços escritos, têm a faculdade de reduzi-los mediante lances verbais ou via internet.

Ao contrário do que ocorre nas demais modalidades, no pregão a escolha da proposta é feita antes da análise da documentação, razão maior da celeridade que envolve este procedimento.

O pregão tem se mostrado uma boa opção quando a Administração busca adquirir bens ou contratar serviços. Segundo sítio eletrônico do STJ, colacionamos os seguintes gráficos, atualizado até meados de 2005[11]:

A modalidade do Pregão se coaduna com os anseios de eficiência administrativa; inclusive, segundo o pensamento de Alice Gonzalez Borges:

"(...) põe-se em pauta, cada vez mais intensamente, o anseio generalizado para a realização de certames licitatórios que tenham efetivamente, como verdadeiro objetivo, a busca das melhores propostas, não mais se perdendo em uma multiplicidade de exigências burocratizantes, formais, descendo a detalhes desnecessários, na fase de habilitação - palco para verdadeiras guerras entre licitantes, armados de providenciais liminares judiciais, que conduzem ao efeito perverso de afugentar propostas realmente vantajosas para o interesse público, em detrimento do princípio constitucional da eficiência.[12]"

Ofertando abalizada opinião sobre o assunto,preleciona Jessé Torres Pereira Junior:

"Pena que a inversão seja privativa do pregão. O que se pretendia provocar era o estudo sobre a possibilidade de introduzi-la no rito procedimental de todas as modalidades de licitação, do tipo "menor preço", o que demandaria reforma da estrutura traçada na Lei nº 8.666/93. O tema decerto que comporta evolução"[13].

Nota-se assim, que o pregão é uma modalidade de licitação muito mais aprazível ao interesse público do que a concorrência, seja pela sua celeridade, seja pela simplicidade que envolve o procedimento.

In casu, o presente procedimento envolve, dentre outros aspectos, a urgência de realizar certame licitatório objetivando a Concessão de uso da área destinada ao estacionamento do Fórum Rodolfo Aureliano (Fórum do Recife – PE).

O serviço de estacionamento não está previsto no rol da Portaria n. 16, de 11.06.2003, da Presidência do TJPE.

Entretanto, o rol de bens e serviços comuns não é exaustivo. Segundo Hely Meirelles:

"SERVIÇOS COMUNS - serviços comuns são todos aqueles que não exigem habilitação especial para sua execução. Podem ser realizados por qualquer pessoa ou empresa,pois não são privativos de nenhuma profissão ou categoria profissional. São serviços executados por leigos[14]"

Ricardo Ribas da Costa Berloffa, em seu escólio, verbera:

"Bem ou serviço comum é aquele que pode ser adquirido, de modo satisfatório, por intermédio de um procedimento de seleção destituído de sofisticação ou minúncia. Enfim, são comuns os objetos padronizados, aqueles que têm um perfil qualitativo definido no mercado.[15]"

Ao remate, Vera Scarpinella salienta que:

"(...) o objeto comum para fins de cabimento da licitação por pregão não é mero sinônimo de simples, padronizado e de aquisição rotineira. Bens e serviços com tais características estão incluídos na categoria de comuns da Lei 10.520/2002, mas não só. Bens e serviços com complexidade técnica, seja na sua definição ou na sua execução, também são passíveis de ser contratados por meio de pregão. O que se exige é que a técnica neles envolvida seja conhecida no mercado do objeto ofertado, possibilitando, por isso, sua descrição de forma objetiva no edital.[16]"

Assim, tanto na seara Federal, quanto na Estadual, concluímos que a Concessão de uso de espaço público através do pregão é possível, tendo em vista que a lista prevista na Portaria n. 16/2003 – TJPE não é exaustiva. Marçal Justen Filho, por seu turno, aduz que:

"Não se afigura cabível interpretar em termos rígidos o elenco contido no Anexo II. A ausência de rigidez se manifesta sob dois aspectos. (...) Em primeiro lugar, o elenco não é exaustivo. Qualquer outro objeto qualificado como comum, ainda que não constante do rol do Anexo II pode ser contratado através de pregão. (...) Se algum objeto qualificado como comum puder ser caracterizado além do elenco do Decreto, seria inconstitucional pretender excluí-lo com fundamento na ausência de alusão por parte do ato infralegal. Ou seja, não é juridicamente cabível que a competência instituída por Lei seja restringida por meio de Decreto. Ademais disso, a inclusão de um bem ou serviço na relação não o transforma, de modo automático, em suscetível de contratação por meio de pregão. (...) Esse entendimento decorre de que os bens e serviços enumerados no regulamento poderão, em certas circunstâncias, não preencher os requisitos necessários para qualificação como comuns. Então, a competência criada por Lei não poderia ser ampliada por via de Decreto.[17]"

Este entendimento pode ser facilmente utilizado pelo TJPE. Aliás, o próprio Tribunal de Contas da União – TCU - já pacificou seu entendimento no sentido de que a lista de serviços constante do Anexo II do Decreto 3.555/2000 não é exaustiva. Como exemplo:

"(...) Por outro lado, o mencionado Decreto (3.555/2000) não caracteriza o serviço de locação de mão-de-obra como serviço comum, o que impossibilitaria a utilização da modalidade pregão. No entanto, a nosso ver, a lista de serviços constante do Anexo II do Decreto 3.555/2000 não é exaustiva, haja vista a impossibilidade de relacionar todos os bens e serviços comuns utilizados pela Administração."

Desta feita, com base nos fundamentos aqui expendidos, pugnamos pela viabilidade da Concessão de uso de espaço público para fins de estacionamento através da modalidade pregão, considerando, maiormente, que a finalidade da Concessão envolve serviço comum, qual seja, o estacionamento.

2.4 - DA UTILIZAÇÃO DO PREGÃO PARA CONCESSÃO DE USO DE ESPAÇO PÚBLICO.

O Tribunal de Justiça de São Paulo – TJSP - já se posicionou pela possibilidade de utilização de outras modalidades de licitação diferentes da concorrência, nos casos de Concessão administrativa de uso. Senão vejamos:

“Tratando-se de contrato administrativo, que não se confunde, em hipótese alguma, com instituto de direito privado, a concessão de uso se sujeita a normas diferenciadas e, conseqüentemente, a determinadas formalidades essenciais à sua validade. Assim, para que sua realização seja regular, imprescindível o procedimento licitatório. Isso porque, sem a observância de tal procedimento haveria desistência, por parte da Administração Pública, de poderes por ela irrenunciáveis. Além disso, princípios constitucionalmente garantidos seriam desobedecidos. É a hipótese dos autos. Verifica-se, claramente, que a lei questionada afronta o artigo 117 da Constituição do Estado de São Paulo, que prevê a obrigatoriedade de processo de licitação pública, com a finalidade única de assegurar a igualdade de condições a todos os concorrentes”[18].

O próprio Tribunal de Contas da União - TCU, em outro julgado destacou que:

No que tange à concessão de uso (...), mesmo não havendo na Lei de Licitações a exigência da modalidade concorrência para tal instituto, é imprescindível a realização de procedimento licitatório, uma vez que se trata de contrato administrativo e, por conseguinte, deve submeter-se à prévia licitação[19].

Não é ocioso lembrar a Súmula do TCU, enunciado n. 222:

As Decisões do Tribunal de Contas da União, relativas à aplicação de normas gerais de licitação, sobre as quais cabe privativamente à União legislar, devem ser acatadas pelos administradores dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (g.n.).

No mesmo trilhar, segue o Tribunal de Contas do Estado de Santa Catarina – TCE/SC, que alarga as possibilidades na cessão de uso de espaço público entre órgãos públicos, mas rechaça a contratação direta com particulares:

“Contrato de comodato e cessão de uso entre órgãos e entidades públicas. Permite-se o contrato de comodato quando a Administração Pública figura como comodatária, sendo desnecessária a autorização legislativa. O comodato não se presta para instrumentalizar a transferência da posse de bens públicos, não servindo, assim, para a hipótese formulada. A transferência de um bem público para um particular poderá ser feita através da concessão de uso ou da concessão de direito real de uso, dependendo ambas as modalidades de autorização legislativa e processo licitatório”[20].

Neste mesmo sentido, temos o posicionamento de Jorge Ulisses Jacoby Fernandes:

“Concessão de uso é gênero, do qual a Concessão de direito real de uso é espécie. É contrato administrativo pelo qual a Administração Pública atribui a determinada pessoa o direito de uso de bem público, por tempo certo e de forma exclusiva, remunerado ou não. Precedida de licitação, em princípio também sob a forma de concorrência, a lei deixou ao alvedrio do Administrador a escolha da modalidade a ser utilizada . ‘A maior flexibilidade conferida ao administrador não se confunde, contudo, com a desnecessidade de realização do procedimento licitatório, uma vez caracterizada a predominância do interesse público sobre o particular, que fez com que a jurisprudência pátria (...) a proclamasse como um contrato tipicamente administrativo’ (Excerto do Voto do Min. Adhemar PaladiniGhisi. Proc. TCU n. 275.320/92-8. Decisão 207/1995 – 2ª Câmara). (...) (A Concessão de uso) não pode ser transferida, posto que o contrato firmado entre as partes tem caráter pessoal. Este instituto, juntamente com a autorização, Concessão de direito real de uso e a permissão de uso foram objeto de longo debate no Tribunal de Contas do DF. Assim como a Concessão de uso não necessita ser precedida de concorrência, admitindo-se outra modalidade, é possível que o traspasse ocorra como objeto de um outro acessório de um outro contrato administrativo (...)” (grifos apostos)[21].

Assim, concluímos, com segurança, que o pregão é modalidade licitatória que atende aos preceitos exigidos na Concessão de uso de espaço público, também chamada de Concessão administrativa de uso, pois é modalidade lídima, célere e eficiente, capaz de angariar a proposta mais vantajosa para a Administração.

2.5 – POSSIBILIDADE DE ALTERAÇÃO DO ENUNCIADO ADMINISTRATIVO N. 17/2008 DA CONSULTORIA JURÍDICA.

Diante do exposto, pelas conclusões trazidas à baila, concluímos pela possibilidade de alteração do Enunciado Administrativo n. 17/2008 – CJ. Assim, SUGERIMOS ao Excelentíssimo Senhor Presidente do TJPE a alteração do referido dispositivo administrativo.

Os Enunciados Administrativos, depois de chancelados pelo Presidente do TJPE, vinculam toda a Administração do Poder Judiciário Estadual.A alteração de um enunciado, como cediço, somente pode ser feita pelo Presidente, em respeito ao princípio básico da hierarquia administrativa, bem como por ser a autoridade máxima deste Poder.

A título de contribuição, sugerimos a seguinte redação para o enunciado n. 17/2008:

ENUNCIADO ADMINISTRATIVO CJ/TJPE Nº 17, DE 12 DE SETEMBRO DE 2008.

USO DE ESPAÇOS PÚBLICOS - Os casos de concessões de direito real de uso de espaços públicos do Poder Judiciário do Estado de Pernambuco, devem ser precedidos de procedimento licitatório, na modalidade concorrência. (Lei Federal nº 8.666, de 21/06/1993, art. 23, § 3º c/c art. 2º)". Os casos de concessões administrativas de uso de espaços públicos do Poder Judiciário do Estado de Pernambuco, devem ser precedidos de procedimento licitatório, ressalvados os casos de uso de espaço público pela Associação dos Magistrados do Estado de Pernambuco - AMEPE, Instituto dos Magistrados de Pernambuco - IMP, Tribunal Regional Eleitoral, Ministério Público, Ordem dos Advogados do Brasil - OAB, Defensoria Pública e bancos ou outras instituições financeiras com as quais o Tribunal de Justiça opere. Na hipótese de Concessão Administrativa de Uso,caberá à Administração do Poder Judiciário a escolha da modalidade licitatória mais adequada. E, em ambos os casos de Concessão, caberá à Presidência do Tribunal decidirquanto à cobrança, ou não, de pagamento das verbas indenizatórias definidas em laudo técnico. (Lei Federal nº 8.666, de 21/06/1993, art. 2º. Precedentes do TCU: Acórdão nº 3042/2008 – Plenário. Acórdão nº 2844/2010 – Plenário, TC – 011.355/2010-7. Rel. Min. Walton Alencar Rodrigues, 27.10.2010 – Informativo TCU LC 210 40; STJ: ROMS nº 16280, REsp nº 524811. 2.FERNANDES, José Ulisses Jacoby. Vade-mécum de licitações e contratos, Legislação: organização e seleção de jurisprudência, notas e índices de José Ulisses Jacoby Fernandes. 2 ed. Belo Horizonte: Fórum, 2005, p. 298/299.)".

Em tempo, só para rematar: as verbas indenizatórias referem-se aos gastos com água, luz etc.

Sobre o autor
Irving William Chaves Holanda

Assessor Técnico Judiciário de Desembargador do TJPE, atuando na 1ª Câmara de Direito Público. Ex-Assessor Jurídico da Presidência do TJPE. Ex-Parecerista da Consultoria Jurídica do TJPE. Ex-professor da Escola do Legislativo de Pernambuco - Assembléia Legislativa do Estado (ALEPE).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

HOLANDA, Irving William Chaves. Diferenças entre a concessão de uso de espaço público e a concessão de direito real de uso. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3772, 29 out. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/pareceres/25623. Acesso em: 22 nov. 2024.

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