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As ações afirmativas enquanto políticas de inserção de pessoas portadoras de deficiência no mercado de trabalho.

A realidade brasileira

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No Brasil, embora as políticas de inserção sejam recentes e resumam-se, em regra, às chamadas políticas de quotas, já se vislumbram os primeiros resultados positivos promovidos.

1. INTRODUÇÃO

As pessoas portadoras de deficiência (PPD ou PPDs) enfrentam sérias dificuldades para a sua inserção nas mais diversas esferas da vida social, haja vista ser-lhes comumente negado acesso à educação, mormente sob a justificativa de não estarem as escolas e demais estabelecimentos de ensino preparados para lidar com as peculiaridades exigidas por suas características especiais; o acesso ao lazer, em razão das barreiras arquitetônicas que ainda subsistem dificultarem-lhes o acesso à cinemas, shoppings, teatros, etc.; e o direito ao trabalho.

O presente estudo dedicou-se à análise deste último problema enfrentado pelas PPD por considerá-lo fundamental para a total inserção do indivíduo dentro do seu meio social e das políticas de ações afirmativas que buscam promover a igualdade material entre os desiguais constituindo-se hoje em importante instrumento de combate à discriminação.

A justificativa da pesquisa é a crescente importância da proteção aos deficientes físicos no Brasil país que apresenta uma das maiores populações de pessoas portadoras de deficiência do mundo e uma taxa de participação destas no mercado de trabalho inversamente proporcional ao seu número. O economista José Pastore aponta uma estimativa alarmante, segundo a qual no Brasil haveria 9 milhões de portadores de necessidades especiais em idade de trabalhar, dos quais apenas 2% se ativam no mercado formal, número bem inferior ao de países mais avançados onde esse percentual atinge de 30% à 45% ( PASTORE: 2000, p. 7).


2. ABRANGÊNCIA DO CONCEITO DE PESSOA DEFICIENTE

O primeiro passo para se planejar políticas sociais e econômicas para atender as suas necessidades das pessoas portadoras de deficiência é identificá-las. .A Organização Mundial de Saúde (OMS) em antiga classificação, distinguia as restrições da capacidade humana da seguinte maneira:

a) incapacidade – restrição para realizar uma atividade normal para o ser humano, v.g., ausência de um membro; b) deficiência – perda ou anomalia de uma estrutura ou função psicológica ou anatômica, por ex., perda ou redução da capacidade de falar ou andar; c) desvantagem – desempenho reduzido de determinada função, exemplo típico, como(sic) a prática de determinado esporte pela idade.

Esta diferenciação, no entanto, foi revista em 1999, quando a OMS passou a entender o seguinte:

O corpo humano possui uma estrutura (esqueleto, órgãos, membros e componente) e um conjunto de funções (fisiológicas, psicológicas e sociais). Com o seu corpo, os seres humanos desenvolvem atividades. No desenvolvimento dessas atividades podem existir dificuldades devido a impedimentos associados a problemas de estrutura ou das funções do corpo. Isso pode restringir a participação do seu portador em diversas situações da vida. A extensão destes impedimentos, entretanto, está ligada a providências que são ou não tomadas do lado social. Por isso, uma pessoa é deficiente quando tem restrições de estrutura ou funções corporais não compensadas por providências sociais.

A Assembléia Geral da Organização das Nações Unidas, por sua vez, no art. 1º da sua Declaração dos Direitos dos Deficientes estatuiu que “O termo ‘deficiente’ designa toda pessoa em estado de incapacidade de promover por si mesma, no todo ou em parte, as necessidades de uma vida pessoal ou social normal, em conseqüência de uma deficiência congênita ou não de suas faculdades físicas ou mentais”.

De maneira semelhante, a Organização Internacional do Trabalho definiu quem deve ser considerado deficiente para fins trabalhistas ao estabelecer no art. 1º da Convenção n. 159 que se entende como pessoa ‘deficiente’ todas aquelas cujas possibilidades de obter e conservar um emprego adequado e de progredir no mesmo fiquem substancialmente reduzidas devido a uma deficiência de caráter físico ou mental devidamente comprovada.

Na legislação estrangeira, um bom exemplo de conceito de pessoa deficiente é encontrado no artigo 1º da Lei Portuguesa n. 9/98 que assim dispõe:

Considera-se pessoa com deficiência aquela que, por motivo de perda ou anomalia, congênita ou adquirida, de estrutura ou função psicológica, intelectual, fisiológica ou anatômica susceptível de provocar restrições de capacidade, pode estar considerada em desvantagem para o exercício de atividades consideradas normais tendo em conta a idade o sexo e os factores sócio-culturais dominantes.

No Brasil, o art. 4 do Decreto 3.298 e 20 de dezembro de 1999, com redação alterada pelo Decreto n. 5.296 de 2004, assim define pessoa portadora de deficiência:

Art. 4º. É considerada pessoa portadora de deficiência a que se enquadra nas seguintes categorias:

I – deficiência física – alteração completa ou parcial de um ou mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física, apresentando-se sob a forma de paraplegia, paraparesia, monoplegia, monoparesia, tetraplegia, tetraparesia triplegia, triparesia, hemiplegia, hemiparesia, amputação ou ausência de membros, paralisia cerebral, membros com deformidades congênita ou adquirida, exceto as deformidades estéticas e as que não produzam dificuldades para o desempenho de funções;

II – deficiência auditiva – perda bilateral, parcial ou total, de quarenta e um decibéis (dB) ou mais, aferida por audiograma nas freqüências de 500 HZ, 1.000 HZ, 2.000 HZ e 3.000 HZ;

III – deficiência visual – cegueira, na qual acuidade visual igual ou menor que 0,05 no melhor olho, com a melhor correção óptica; os casos nos quais a somatória da medida do campo visual em ambos os olhos for igual ou menor que 60º; ou a ocorrência simultânea de quaisquer das condições anteriores;

IV – deficiência mental – funcionamento intelectual significativamente inferior à média, com manifestação antes dos dezoito anos e limitações associadas a duas ou mais áreas de habilidades adaptativas, tais como:

comunicação;

cuidado pessoal;

habilidades sociais;

utilização dos recursos da comunidade;

saúde e segurança;

habilidades acadêmicas;

lazer; e

trabalho;

V – Deficiência múltipla – associação de duas ou mais deficiências.

Essa definição legal apresenta grande precisão o que facilita a identificação dos portadores de necessidades especiais e impede que indivíduos sem estas características, invoquem dolosamente a proteção que o Estado confere aos deficientes.


3. Ações afirmativas

Durante muito tempo o princípio da igualdade perante a lei, característico do Estado Liberal Burguês, foi tido como a garantia da concretização da liberdade. Contudo, percebeu-se, com o passar do tempo que ele não se mostrava suficiente para tornar acessíveis a quem era socialmente desfavorecido as oportunidades de que gozavam os indivíduos socialmente privilegiados1. Passou-se então a se buscar a igualdade material ou substancial e não mais a igualdade formal extraída das revoluções francesa e americana2, Da transição da ultrapassada noção de igualdade “estática” ou “formal” ao novo conceito de igualdade “substancial” surge a idéia de “igualdade de oportunidade”. Foi esta noção que justificou experimentos constitucionais pautados na necessidade de se extinguir ou de pelo menos mitigar o peso das desigualdades econômicas e sociais e, consequentemente, de promover a justiça social, como é o caso das ações afirmativas. A consagração das ações afirmativas representa, outrossim, um momento de ruptura na evolução do Estado moderno,

Mas o que seriam então as chamadas ações afirmativas. As ações afirmativas, também chamadas discriminações positivas, podem ser definidas como as políticas estatais e privadas que utilizam mecanismos de inclusão visando a concretização de um objetivo constitucional universalmente reconhecido, qual seja a efetiva igualdade de oportunidades a que todos os seres humanos tem direito. Podem ter caráter compulsório, facultativo ou voluntário,e ser concebidas com vistas ao combate à discriminação racial, de gênero, por deficiência física e de origem nacional. Estas políticas dedicam-se a corrigir ou mitigar os efeitos presentes da discriminação praticada no passado, almejando concretizar o ideal de efetiva igualdade e acesso a bens fundamentais como a educação e o emprego.

Outros objetivos almejados com as políticas afirmativas são induzir transformações de ordem cultural, pedagógica e psicológica, aptas a subtrair do imaginário coletivo a idéia de supremacia e de subordinação de uma raça em relação a outra; eliminar os efeitos psicológicos, culturais e comportamentais da discriminação do passado, que tendem a se perpetuar e implantar uma certa “diversidade” e uma maior “representatividade” dos grupos minoritários nos mais diversos domínios de atividade pública ou privada. A discriminação positiva busca fazer com que a ocupação das posições do Estado e do mercado de trabalho se faça em maior harmonia com o caráter plúrimo da sociedade.

Por fim, as ações afirmativas contribuem para o fim das discriminações por criar as chamadas personalidades emblemáticas. Pessoas oriundas de grupos desfavorecidos que obtiveram sucesso na vida e, por isso, tornaram-se exemplos vivos de mobilidade social ascendente. A simples existência de indivíduos com esse perfil mostra-se capaz de incentivar a educação e o aprimoramento de jovens integrantes destes mesmos grupos desprivilegiado, fazendo com que eles consigam ultrapassar o bloqueio de seu potencial de inventividade, de criação e de motivação a aprimoramento e ao crescimento individual.

A necessidade de ações afirmativas para a inserção dos portadores de deficiência no mercado de trabalho está expressamente reconhecida no artigo 4º da Convenção n. 159 da OIT que assim se refere à política de reabilitação profissional e emprego dos portadores de deficiência, determinada aos países signatários:

Essa política deverá ter como base o princípio de igualdade de oportunidades entre os trabalhadores deficientes e os trabalhadores em geral. Dever-se-á respeitar a igualdade de oportunidades e de tratamento para as trabalhadoras deficientes. As medidas positivas especiais com a finalidade de atingir a igualdade efetiva de oportunidades e de tratamento entre os trabalhadores deficientes e os demais trabalhadores, não devem ser vistas como discriminatórias em relação a estes últimos.

4. AÇÕES AFIRMATIVAS NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA

As ações afirmativas também podem ser identificadas no artigo. 3º e seus incisos da Constituição da República de 1988 na medida em que eles consagram como objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil construir uma sociedade livre, justa e solidária; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalização; reduzir as desigualdades sociais e regionais e promover o bem de todos sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação. Outros dispositivos legais que consagram a igualdade material são:

Art.170. a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:

(...)

VIII – redução das desigualdades regionais e sociais(...)

IX – tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País.

Art. 7º. São direitos dos trabalhadores urbanos e rurais, além de outros que visem à melhoria de sua condição social:

(...)

XX – proteção do mercado de trabalho da mulher, mediante incentivos específicos, nos termos da lei,

Art. 37 (...)

VIII – A lei reservará percentual dos cargos e empregos públicos para as pessoas portadoras de deficiência e definirá os critérios de sua admissão.

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Como se vê, a Constituição Brasileira de 1988 não se limita a proibir a discriminação, afirmando a igualdade, mas permite também a utilização de medidas que efetivamente implementem a igualdade material, como é o caso das ações afirmativas.


5. AÇÕES AFIRMATIVAS EM DEFESA DOS DEFICIENTES

Nos Estados Unidos, precursores do desenvolvimento das ações afirmativas, temos os seguintes exemplos de ação afirmativa no sistema normativo norte-americano: 1) Architectural Barriers Act; 2) Reabilitation Act de 1973, exigindo que os contratantes com o governo federal oferecessem oportunidades de emprego para os deficientes físicos; 3) Veterans Readjustment Act de 1974, concedendo favorecimentos e proteção para os veteranos da Guerra do Vietnã; 4) Education for all Handicapped Children Act (1975); 5) Develpmental Disabilities Assistance (1976); Fair Labour Standards Act (1976); e mais recentemente o Americans with Disabilities Act de 1990, adicionou as pessoas com deficiência às categorias de pessoas protegidas contra discriminação no emprego.

No Brasil o debate sobre as ações afirmativas se iniciou de maneira equivocada, na medida em que se confunde ação afirmativa com sistema de cotas, enquanto na verdade estas nada mais são do que um dos modos de implementação daquelas..Os sistemas de cotas, contudo, não se mostram suficientes para garantir o direito à igualdade do grupo favorecido.

Reanalisando os dispositivos legais que buscam a inserção dos portadores de deficiência no mercado de trabalho, verifica-se que estes ou tratam de política de quotas ou de normas de vedação à discriminação, que, a rigor, sequer podem ser consideradas políticas afirmativas uma vez que não representam a imposição de condutas positivas, mas tão somente a vedação de determinadas práticas abomináveis. Apenas para exemplificar, entre estas temos o art. 5º, caput e o art. 7º, XXXI . Entre aquelas o art. 37, VIII; o art. 91 e seu § 1º da Lei n. 8213.

As demais normas que tratam da questão ou são meramente programáticas, como o art. 66 da Lei n. 8069, de 13 de julho de 1990; de organização legislativa, como o art. 24, XIV, 244 da CF; limitam-se a instituir benefício compensatório ou tratamento diferenciado, como é o caso do art. 203, IV e V; o art. 208, III, 227,II da CF e Lei Lei n. 10.098, que muitas vezes, ao invés de ajudar a integração dos deficientes, deixa-os ainda mais excluídos.

Como já fora afirmado em outro momento deste trabalho estas normas representam um significativo avanço no sentido da implementação de uma igualdade material entre as partes, mas são apenas os primeiros passos de uma longa caminhada.


6. AS AÇÕES AFIRMATIVAS JÁ EXISTENTES

6.1. NO SERVIÇO PÚBLICO

No serviço público, uma das medidas mais importante é a que reserva um número determinado de vagas a serem preenchidos em um concurso público (art. 37, VIII da CF). O dispositivo em referência foi regulamentado pelo Regime Jurídico Único dos Servidores Civis da União, Lei 8.112, d 11.12.90, que em seu art. 5, § 2º, previu que às pessoas portadoras de deficiência seriam reservadas até 20% (vinte por cento) das vagas oferecidas no concurso.

Essa taxação mereceu críticas porque ao fixar o percentual em até 20% o legislador findou por impossibilitar, em certas circunstâncias, o seu cumprimento pleno. É o que ocorre, por exemplo, quando o número de vagas for inferior a 5, situação e que o percentual de uma eventual vaga resultaria maior do que aquele limite (1 em 4=25%; 1 em 2=50%).

Melhor seria se o legislador retirasse tal vinculação, deixando ao administrador o poder discricionário e a liberdade para deliberar a respeito da necessidade e da conveniência do número de vagas a fixar, caso a caso, concurso a concurso. Ademais a lei de regência deveria estabelecer apenas o patamar mínimo de vagas, sem estipular um percentual máximo de reservas de vagas.

Por fim, a compatibilidade entre as atribuições do cargo e a deficiência representa um requisito subjetivo que deve ser aferido já no momento em que o candidato se inscreve para prestar concurso e que, uma vez deferida a inscrição, não poderá o administrador, após superado todo o exaustivo e tormentoso processo seletivo, negar-se a dar posse ao candidato.

Não se pode esquecer também que devem ser asseguradas às PPD’s candidata em concurso público todas as condições para que realize a prova em igualdade de condições com os demais candidatos. E isto inclui medidas para tornar o acesso aos locais de prova livre e desimpedido.


6.2. NA INICIATIVA PRIVADA

A primeira tentativa concreta de reduzir a discriminação das PPD no que se refere ao acesso a empregos na iniciativa privada foi a criminalização de qualquer procedimento discriminatório na admissão do portador de deficiência (art. 8º da Lei n. 7.853). Esta medida – que como vimos sequer pode ser considerada ação afirmativa – não apresentou resultados satisfatórios, uma vez que não coibiu a chamada discriminação branca, aquela natural do preconceito cultural vigente em nossa sociedade.

Poteriormente, surgiu a lei de benefícios da previdência social – Lei n. 8.213 que, em seu artigo 93, introduziu o sistema de quotas no preenchimento de cargos, assim dispondo:

“A empresa com 100 (cem) ou mais empregados está obrigada a preencher de 2% (dois por cento) a 5% (cinco por cento) dos seus cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência habilitadas, na seguinte proporção:

I – até 200 empregados: 2%;

II – de 201 a 500: 3%;

III – de 501 a 1.000: 4%;

IV – de 1.001 em diante: 5%.

§ 1ª A dispensa de trabalhador reabilitado ou de deficiente habilitado ao final de contrato por prazo determinado de mais de 90 (noventa) dias, e a imotivada, no contrato por prazo indeterminado, só poderá ocorrer após a contratação de substituto de condição semelhante.

§2º. O Ministério do Trabalho e da Previdência Social deverá gerar estatísticas sobre o total de empregados e as vagas preenchidas por reabilitados e deficientes habilitados, fornecendo-as, quando solicitadas, aos sindicatos ou entidades representativas dos empregados.”

A grande crítica dirigida a este dispositivo não está relacionada com o seu conteúdo, por demais louvável, mas à sua forma. O legislador brasileiro desavisadamente inseriu dispositivos de natureza trabalhista em norma de natureza nitidamente previdenciária.Quanto ao conteúdo a norma em comento além de abrir postos de trabalho para as PPD, incentiva-as a melhorar seu potencial, aprimorar suas qualidades e superar as barreiras que a sociedade lhe impõe. Não fosse isto o bastante, vem crescendo na doutrina e na jurisprudência o entendimento de que o dispositivo acima transcrito, ao estabelecer como condição para a dispensa de trabalhador reabilitado ou de deficiente habilitado a contratação de substituto de condição semelhante, instituiu uma nova modalidade de garantia de emprego.

A Ordem de Serviço Conjunta do INSS n. 90/98, no entanto, limitou este avanço aos postos de trabalho que surgirem após a edição da norma ao estatuir que:

6.2. A empresa cujo quadro de recursos humanos já esteja preenchido, sem no entanto atender ao percentual de reserva de vagas a que se refere item 4, promoverá o preenchimento do mesmo, de forma gradativa, a medida em que surjam as vagas.

Esta medida não é de todo censurável na medida em que não se pode retirar do empregador o jus variandi, para simplesmente determinar a criação de posto para o trabalhador em condições especiais. O que se pode e deve buscar é a prioridade no provimento de vaga acaso existente, por trabalhador reabilitado ou deficiente habilitado em condições de exercê-la. Com efeito, embora acabe adiando ainda mais a inserção das PPD nas empresas, esta orientação mostra-se correta pois evita que trabalhadores já em atividade sejam dispensados para que a empresa atenda ao disposto na Lei 8.213.


7. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Concluindo este escrito, algumas conclusões são imprescindíveis para que haja uma efetiva colaboração no estudo deste tema tão importante.

Primeiramente, observou-se pela análise da forma como as pessoas portadoras de deficiência eram tratadas nas mais antigas civilizações que a discriminação por elas sofrida não é um fato histórico recente. Pelo contrário, trata-se de uma prática desprezível verificada há milênios.

Este fato, por si só, mostra o débito enorme que os considerados “normais” ou “não deficientes” tem para com aqueles com características diferentes.

Esse débito, no entanto, não deve ser pago mediante privilégios injustificáveis, piedade ou um assistencialismo arcaico duplamente maléfico por retirar do deficiente o direito ao trabalho, pressuposto de sua cidadania e dignidade enquanto ser humano, e por penalizar a comunidade que é obrigada a sustentar indivíduo muitas vezes em plenas condições de trabalho. A melhor maneira de pagá-lo é criando mecanismos capazes de inseri-los no mercado de trabalho mediante ações que promovam a igualdade material onde há desigualdade formal.

Este é o fim almejado pelas chamadas ações afirmativas, surgidas nos Estados Unidos.

No Brasil, embora estas políticas sejam recentes e resumam-se, em regra, às chamadas políticas de quotas, já se vislumbram os primeiros resultados positivos por elas promovidos.

Deve-se, ainda assim, buscar cada vez mais se conscientizar a população de que as particularidades visíveis nos deficientes não os torna digno de pena, inferior ou mais necessitado, e de que com o fim da discriminação em relação a eles, sobretudo no que diz respeito ao acesso ao trabalho, toda a sociedade tem muito a ganhar. Afinal, como muito bem observou José Pastore “em muitos casos, a pessoa deixa de ser deficiente no momento em que a sociedade proporciona condições adequadas”(PASTORE, 2000, p. 7).

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Sobre o autor
Jorge Cavalcanti Boucinhas Filho

Mestre e Doutor em Direito pela Universidade de São Paulo (USP). Pós-doutor em Direito pela Université de Nantes (França). Professor e pesquisador da Fundação Getúlio Vargas. Professor, Coordenador de cursos de pós-graduação e membro do Conselho Curador da Escola Superior de Advocacia da OAB/SP. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

BOUCINHAS FILHO, Jorge Cavalcanti. As ações afirmativas enquanto políticas de inserção de pessoas portadoras de deficiência no mercado de trabalho.: A realidade brasileira. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 3077, 4 dez. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/20575. Acesso em: 2 nov. 2024.

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