Palavras-chave: Contratação terceirizada de serviços de conservação e limpeza, serviços continuados, reequilíbrio econômico-financeiro, Convenção Coletiva de Trabalho, verbas trabalhistas, direitos.
No início de cada ano, as empresas prestadoras de serviços de conservação, higienização e limpeza solicitam reajuste dos contratos devido às Convenções Coletivas de Trabalho da categoria.
O SINDEAC e SEAC, sindicatos que representam os empregados e empregadores de asseio e conservação em Belo Horizonte - MG, editaram a Convenção Coletiva 2012/2013, em 19 de dezembro de 2011.
Algumas empresas, em 2012, pediram um reajuste de 12%, taxa que ficou acima do índice inflacionário.
Para nosso estudo é importante diferenciar reajuste de revisão e repactuação.
O reequilíbrio econômico-financeiro de contrato é o gênero do qual revisão, reajuste e repactuação são espécies. Previstos na Constituição, devem ser realizados sempre que necessário. Tais instrumentos visam ajustar o contrato, mantendo as condições da proposta. Vejam:
1. Revisão
Decorre da Teoria da Imprevisão, fundamentada no art. 37, XXI, da CR/1988, que determina a manutenção das condições efetivas da proposta durante a execução do contrato. Ocorrerão de acordo com o art. 65, II, “d” e §5º, da Lei Nacional nº 8.666/1993.
Sujeita-se a eventos alheios à vontade das partes e por elas inevitáveis, que produzem impacto na execução do contato e oneram injustamente uma das partes. Desequilibrando a relação original entre custo e lucro, isto é, as condições efetivas da proposta.
A revisão deve ser formalizada por meio de termo aditivo. Não há necessidade de previsão em edital, pois decorre de imprevisibilidades. Não há prazo para concessão.
2. Reajuste
Visa à recomposição da perda inflacionária ocorrida nos dozes meses subsequentes à apresentação da proposta ou do orçamento a que ela se referir. Previsto no art. 40, XI, da Lei Nacional 8.666/1993 e indicado no art. 55, III, da mesma lei.
Previsto no contrato e edital, não configura alteração contratual, apenas retorna aos valores o poder aquisitivo inicial.
O reajuste deve retratar a variação efetiva do custo da produção no período de doze meses, admitindo-se a adoção de índices gerais ou setoriais. Deverá ser formalizado por apostilamento.
A data inicial para aferição é a da apresentação da proposta ou a data que lhe serviu de orçamento-base. Não é portanto a data da assinatura do contrato. Podendo ser a data da convenção, acordo coletivo ou dissídio, caso seja a maior parte do custo, em contratações desta natureza.
Atualmente, os indicadores econômicos variaram entre 3 e 7%, em 12 meses:
a) IGP: 4,29%;
b) IGP-M: 3,43%;
c) INPC: 5,47%;
d) IPCA-IPAD: 6,77%.
(http://www.fecomerciomg.org.br/. Acesso em 14/03/12).
3. Repactuação: forma de reajuste
Instituída pelo Decreto nº 2.271/1997, disciplinando os contratos de prestação de serviços contínuos contratados pela Administração Federal. Não há normatização específica na Lei nº 8.666/1993.
O art. 40, XI, da Lei de Licitações permite a utilização de outros critérios de reajuste diversos da indexação, atribuindo legitimidade ao procedimento.
Visa à adequação aos novos preços de mercado, observado o intervalo mínimo de um ano e a demonstração da variação dos comportamentos dos custos do contrato, devidamente justificada, conforme o art. 5º do Decreto citado. Ao contrário do reajuste, não admite a adoção de índices gerais ou setoriais, de acordo com o art. 4º do Decreto.
Deve ser realizada uma análise criteriosa dos custos do contrato, voltada para as reais variações visando a recomposição da perda inflacionária. É necessário que seja formalizada por meio de termo aditivo ou apostilamento.
A repactuação deve estar prevista no edital e no contrato, e pode ser eventual substituta do reajuste, considerada em aplicações aos contratos de prestação de serviços contínuos, do art. 40, XI e 55, III da Lei de Licitações. Sua aplicação decorre após um ano, conforme o reajuste.
Voltando ao tema inicial, este ano, em Minas Gerais, as contratadas solicitaram reajuste incluindo o Programa de Assistência Familiar (PAF), Programa de Qualificação Profissional e Marketing (PQM) e também a inclusão de auxílio alimentação.
Como até a presente data, não foi estabelecido um índice específico ou setorial, a taxa de 12%, se for o caso, deverá ser comprovada, pois supera em muito os indicadores econômicos. Salienta-se que o índice inflacionário estacionou em 6,5% (IPCA-IBGE), em 2011.
Deverá ser analisada criteriosamente a planilha de custos da empresa.
É necessário discorrer sobre cada item que majorou os contratos hodiernos.
O Programa de Assistência Familiar (PAF) e o Programa de Qualificação Profissional e Marketing (PQM):
O PAF tem por objetivo suprir aos associados e seus dependentes, legalmente reconhecidos, quites com suas obrigações sindicais, as necessidades básicas da área de saúde, tais como: consultas médicas, diagnóstico de enfermidades, emissão de receitas, emissão de atestado admissional, encaminhamento de pacientes a laboratórios e clínicas médicas conveniadas, análise e interpretação de exames com indicação do respectivo tratamento. Isto é, prestar assistência à saúde, lazer e cultura aos trabalhadores e seus dependentes.
O PQM visa qualificar o profissional, melhorar sua prestação laborativa e seu relacionamento interpessoal.
O SEAC-MG, o Sindicato dos Trabalhadores (Sindeac) e a Federação dos Empregados em Turismo e Hospitalidade do Estado de Minas Gerais (Fethemg – Região Metropolitana de BH e interior) implantaram, em 2005, o Programa de Assistência Social, Qualificação Profissional e Marketing (PAS). A partir da CCT/2006, evoluiu para o Programa de Qualificação Profissional e Marketing (PQM). O objetivo é a valorização do segmento, tendo como princípio a profissionalização da mão-de-obra. (www.seacmg.com.br).
Segundo interpretação da doutrina de Maurício Godinho Delgado (pp 397 e 698), o PAF e o PQM são parcelas não salariais, meramente instrumentais: são aquelas utilidades (bens ou serviços) ofertadas pelo empregador ao obreiro essencialmente como mecanismo viabilizador da própria realização do serviço contratado ou viabilizador do aperfeiçoamento no processo de consecução do trabalho.
São utilidades ofertadas pelo empregador, previstas no §2º, do art. 458, da CLT que não são consideradas como salário.
Estas parcelas não salariais são devidas e pagas pelo empregador, pois são instrumentos in natura, para viabilização ou aperfeiçoamento do trabalho. (Godinho, 2005, pp 704 a 705).
Não é devido pelo tomador de serviço, - o PQM, de acordo com cláusula 30º da Convenção coletiva 2012/2013 será custeado exclusivamente pelas empresas. Mesmo se fosse, os dois sindicatos deveriam optar pelo PQM ou pela contribuição feita ao SENAC, conforme o art. 6º, do Decreto-lei nº 8.621, de 10/01/1946.
O PAF não é devido pelo tomador de serviços, de acordo com parágrafo 1º, da cláusula 14º, da Convenção coletiva 2012/2013, o benefício será custeado pelo próprio empregado, pelas empresas e sindicatos.
Tais benefícios não tem natureza salarial; se foi celebrado uma Convenção Coletiva, entre os sindicatos das empresas e o dos empregados, cabe a ambos, arcar com as despesas e não o tomador de serviço. Uma visão rígida do caso, tendo em vista, que como o serviço é terceirizado, não há interesse das classes em diminuir os custos.
O auxílio alimentação está previsto na cláusula 12º, da Convenção coletiva 2012/2013.
Diferente do PAF e o PQM, o auxílio alimentação se enquadra como prestação in natura, previstas no art. 458, da CLT compõe o salário para todos os efeitos legais.
A cláusula décima segunda da Convenção Coletiva afirma que as empresas ficam obrigadas a fornecer o Ticket alimentação, no valor de R$ 8,40, por dia efetivamente trabalhado, aos empregados que a laborarem em jornada mensal igual ou superior a 190 horas ou especial 12x36 horas.
Um funcionário da área de conservação e limpeza, por exemplo, em uma empresa ou Órgão Público, labora de 7h as 16h30m, com uma hora de almoço, exceto as quartas-feiras, de 7h as 13h.
Trabalham 8h30m por dia, exceto as quartas-feiras que são 6h. Em março, do corrente, temos um total de 22 dias úteis:
1. 8h30m = 8 x 60m + 30m = 510m = ao dia;
2. 6h = 6 x 60m = 360m = quartas-feiras;
3. minutos semanais trabalhados: 510m x 4 + 360 = 2.400 minutos;
4. horas semanais trabalhadas: 2.400m : 60m = 40h;
5. média de horas diárias trabalhadas: 40h : 6 dias = 6,7h (arredondado);
6. duração mensal trabalhada, seguindo o raciocínio da Constituição da República de 1988, art. 7º, XIII: 30 x 6,7h = 200h (arredondado);
7. dias úteis trabalhados: Março: 22 – 4: 18 dias;
8. quartas-feiras trabalhadas: 4.
9. 18 dias x 510m = 9.180 minutos;
10. 4 dias x 360m = 1.440 minutos;
11. 9.180m + 1.440 = 10.620m;
12. 10.620m : 60m = 177h efetivamente trabalhadas.
Os funcionários da seara de conservação e limpeza, nesta empresa ou Órgão, laboram efetivamente 177 horas mensais, portanto, de acordo com a Convenção Coletiva não teriam direito ao auxílio refeição.
Contudo, se utilizarmos o raciocínio, por dia efetivamente trabalhado, aos empregados que laborarem em jornada mensal igual ou superior a 190 (cento e noventa) horas ou especial de 12x36 horas, tratando o “efetivamente” apenas ao dia que pessoa trabalhou, ela teria (tem) direito apenas a cada dia de trabalho. Neste caso, o “efetivamente” está relacionado ao dia e não a “jornada mensal”, que inclui as horas ou dias de descanso remunerados. Neste contexto, os funcionários têm direito ao Auxílio alimentação apenas nos dias em que trabalharam, e é claro, não tem direito ao benefício nos dias de descanso remunerado.
Outro exemplo: os funcionários administrativos, que trabalham em seções, permanecem de 8h30m as 18h; laboram 8h30m por dia, exceto as quartas-feiras, de 8h30m as 13h, dá 4h30m.
A única diferença dos funcionários administrativos são as quartas-feiras:
1. 4h30m: 4 x 60 = 30 = 270m;
2. 8h30m = 8 x 60m + 30m = 510m = (dia) horas trabalhados;
3. minutos semanais trabalhados: 510m x 4 + 270m = 2310m;
4. horas semanais trabalhadas: 2310m : 60m = 38,5h;
5. média de horas diárias trabalhadas: 38,5h : 6 dias = 6,4h (arredondado);
6. duração mensal trabalhada, seguindo o raciocínio da Constituição da República de 1988, art. 7º, XIII: 30 x 6,4h = 192h (arredondado);
3. dias úteis trabalhados: Março: 22 – 4: 18 dias;
4. 18 dias x 510m = 9.180 minutos;
5. quartas-feiras trabalhadas: 4 x 270m = 1080m;
6. total: 1.080m + 9.180m = 10.260m;
7. 10.260m : 60 = 171h mensais.
As funcionárias administrativas também não fazem jus ao ticket de alimentação, de acordo com a Convenção Coletiva.
A jornada padrão de trabalho é, hoje, de 8 horas ao dia' com a consequente duração semanal de trabalho de 44 horas (art. 7º, XII, CR/88).
Isso significa que a Carta de 1988 revogou, em parte, o art. 58 da CLT, que estipulava duração diária de trabalho de 8 horas e semanal de 48 horas. Revogação apenas parcial, esclareça-se, dado que a jornada padrão continua a ser de 8 horas. Não é essa jornada, porém de 7,20 horas (parâmetro resultante da divisão de 44 horas por 6 dias de trabalho na (sic), incorporado o repouso). Nesse contexto, não serão extras os minutos diários laborados entre a fração temporal 7,20 e a oitava hora diária.
A duração mensal padrão de labor, hoje, é de 220 horas (em contraponto a 240 horas antes da Carta de 1988). Nesse montante já se encontra incluída a fração temporal equivalente ao repouso semanal remunerado (Lei n. 605, de 1949). Para cálculo mensal é que tem interesse a utilização ideal diária de 7,20 horas, uma vez que esta fração que já inclui o repouso semanal remunerado (7,20 horas x 30 dias = 220 horas). (Godinho, 2005, pp 877-878).
De acordo com a doutrina de Maurício Godinho Delgado, o critério de tempo efetivamente trabalhado, para fixação da jornada de trabalho, não foi recepcionado pela Constituição da Republica de 1988. Considera apenas o tempo de transferência da força de trabalho em benefício do empregador. (Godinho, 2005, p 838).
O exposto no parágrafo anterior justifica a não aplicação do trecho da Convenção Coletiva: “(...) por dia efetivamente trabalhado”. Situação prevista na Cláusula 12ª.
Isto posto, considero a aplicação do raciocínio Constitucional, do cálculo da carga horária mensal laborada, ou seja, 200h trabalhadas e 192h, itens “6” dos cálculos acima. Sendo o mais adequado, incluindo a explicação acima, sobre o trecho: “efetivamente”, que está relacionado ao dia e não a “jornada mensal”. Recorro também, ao princípio da proteção e ao in dubio pro operario. Nos exemplos, ambas as classes têm direito ao Auxílio alimentação.
Sou de opinião que ao reequilibrar os contratos de prestação de serviços de conservação e limpeza, ou qualquer outro, de forma continuada, no que for pertinente, as empresas ou Órgãos Públicos:
1. após a adjudicação e contratação, verificar a planilha de custos e calcular o percentual de lucro da empresa;
2. no início do ano, quando for solicitado aumento de valor no contrato, devido a Convenção Coletiva, as empresas ou órgãos vão aumentar apenas os valores referentes ao custo da mão de obra, respeitando o percentual de lucro calculado, mediante reajuste, por meio de apostilamento;
3. quando passar 12 meses de contrato, as empresas/Órgãos vão utilizar o percentual de lucro, e sobre ele somar (calcular) o percentual inflacionário. Do resultado faz um termo aditivo por meio de repactuação, após a solicitação da empresa.
Este ano 6,5% sobre o valor da taxa de lucro inicial do contrato. Salienta-se que não será calculado sobre o valor total, mas sobre a taxa de lucro inicial.
4. Caso o contrato fique oneroso para a contratada, e ela solicite mais aumento, o Órgão deverá realizar pesquisa de mercado, e se for conveniente, revisar o contrato por meio de termo aditivo ou se a solicitação aumentar acima da média dos orçamentos, deverá ser rescindido o contrato.
Concluindo, a contratante tem de ter especial atenção com a planilha de custos, devendo calcular o número de funcionários com os encargos, de acordo com as normas pertinentes. É muito comum as empresas contratadas aumentarem os valores de forma equivocada, mas direcionada ao lucro.
REFERÊNCIAS
1. Delgado, Maurício Godinho. Curso de Direito do Trabalho. 4 ed. São Paulo-SP: Ed. Ltr, 2005.
2. Pérsio, Gabriela Verona. Contratos Administrativos: sob a ótica da gestão e da fiscalização. Curitiba-PR: Ed. Negócios Públicos, 2010.