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Impedimento e suspensão do prazo prescricional nas ações regressivas.

Um olhar no artigo 200 do Código Civil

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11/07/2012 às 10:12
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3 Do impedimento e suspensão do prazo prescricional das ações regressivas com fulcro no artigo 200, do Código Civil e artigo 19, §2º, da Lei n. 8.213/1991.

Não se pode olvidar que a causa de pedir das ações regressivas ajuizadas pelo Instituto Nacional do Seguro Social é a violação das normas de saúde e segurança do trabalho. Tanto é verdade que é comum nas ações ajuizadas pela autarquia serem apresentados como prova os Relatórios de Investigação de Acidentes de Trabalho realizados pelo Ministério do Trabalho e Emprego, bem como as decisões proferidas na Justiça do Trabalho.

Ademais, o próprio artigo 120 da Lei n. 8.213/1991 determina o ajuizamento das ações “nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva”.

À vista disso, como a causa de pedir da ação regressiva é passível de apuração na esfera penal, não há que se falar em fluência do prazo prescricional – impedimento ou suspensão - quando há inquérito policial instaurado para investigar o acidente de trabalho, bem como quando existente ação penal em curso sobre o fato.

A hipótese será de impedimento do prazo prescricional quando for imediatamente instaurado o Inquérito Policial ou, em uma situação mais difícil de ocorrer do ponto de vista prático, for imediatamente ajuizada a ação penal. Por outro lado, haverá hipótese de suspensão do prazo prescricional a partir da instauração do procedimento de investigação ou do ajuizamento da denúncia.

A questão posta não é novidade no âmbito do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, pois o Egrégio Tribunal já teve oportunidade de afastar a prescrição nas ações regressivas propostas pelo INSS com fulcro no artigo 200 do Código Civil brasileiro.

DIREITO CIVIL. AÇÃO REGRESSIVA PROPOSTA PELO INSS. RESSARCIMENTO DE DANO. ACIDENTE DE TRABALHO. ARTIGO 120 DA LEI Nº 8.213/91. PRESCRIÇÃO. INOCORRÊNCIA. SOLIDARIEDADE. ARTIGO 30 DA LEI 8.212/91. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS.

1. Consoante prescreve o artigo 120 da Lei nº 8.213/91, "nos casos de negligência quanto às normas padrão de segurança e higiene do trabalho indicados para a proteção individual e coletiva, a Previdência Social proporá ação regressiva contra os responsáveis".

2. Não há falar em prescrição no caso dos autos, porquanto a demanda se origina de fato processado criminalmente, hipótese em que o prazo não flui antes do julgamento.

3. Solidariedade decorrente do artigo 30 da Lei 8.212/91.

4. No mérito, não demonstrada a negligência das demandadas, mas culpa exclusiva da vítima, se impõe a improcedência da ação regressiva.

5. Mantida a verba honorária como fixada em sentença, uma vez que arbitrada com observância do disposto no artigo 20 do CPC (10% do valor atribuído à causa), estando de acordo com os parâmetros desta Turma para causas análogas. (TRF4, AC 0003917-46.2008.404.7001, Quarta Turma, Relator Sérgio Renato Tejada Garcia, D.E. 04/02/2011)

É importante destacar que essa apelação cível tem origem na ação ordinária n. 2008.70.01.003917-0/PR, que teve como sentenciante o Juiz Federal Gilson Luiz Inácio, cuja sentença bem lançou o seguinte alerta:

A alegada prescrição trienal, com fulcro no artigo 206, § 3º, inciso V, do Código civil não comporta acolhimento, pois, o valor pago pelo INSS a título de pensão por morte é mensal e contínuo, enquadrando-se, pois, na natureza de bem público e, por conta disso, indisponível e, consequentemente, imprescritível.

De outro norte, ainda que assim não fosse, como anotado pelo INSS, nos moldes gizados pelo artigo 200 do Código Civil, originando-se a presente demanda de fato a ser apurado na instância criminal, não corre prescrição antes da respectiva sentença.

Aliás, mesmo entre os Desembargadores Federais do Tribunal Regional Federal da 4ª Região que se manifestavam pela aplicação do prazo trienal de prescrição, como era o caso da Desembargadora Federal Silvia Maria Gonçalves Goraieb, reconhecem a suspensão do prazo prescricional quando demonstrada a existência de inquérito policial ou processo judicial. É o que se observa do seguinte trecho da decisão proferida na apelação civil n. 2008.71.17.000959-5:

Assim, aplicáveis as regras do Código Civil, poderia ter havido interrupção da prescrição, forte na letra do artigo 200 da lei material civil. Entretanto, embora noticiada a existência de uma ocorrência policial, menção não há quanto a inquérito policial ou processo judicial.

Por conseguinte, sempre que houver demonstração em juízo da existência de inquérito policial instaurado ou ação penal em curso, não haverá que se falar em contagem do prazo prescricional para a autarquia previdenciária ajuizar a ação regressiva. O prazo prescricional continuará o seu normal curso a partir da decisão judicial que arquivar o procedimento de investigação ou julgar a lide, seja pela condenação, absolvição ou mesmo extinção do feito sem exame do mérito.

Nesse sentido, por dever de coerência, os adeptos da aplicação do prazo trienal de prescrição devem admitir a causa de impedimento ou suspensão do prazo prescricional estampada no artigo 200 daquele diploma legal, cujo teor, aliado ao artigo 19, §2º, da Lei n. 8.213/1991, tem aplicabilidade nas ações regressivas ajuizadas pela autarquia previdenciária que tenham como causa de pedir o descumprimento, por parte da empresa, das normas de segurança e higiene do trabalho.


Conclusão

A doutrina e jurisprudência divergem a respeito do prazo prescricional para o ajuizamento das ações regressivas, uns defendendo a aplicação do prazo quinquenal previsto no artigo 1º do Decreto 20.910/1932 e outros o prazo trienal estabelecido no artigo 206, §3º, V, do Código Civil de 2002.

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Contudo, a aplicação do prazo trienal do Código Civil de 2002 exige, por dever de coerência, a aplicação das causas de impedimento, suspensão e interrupção do prazo prescricional previstos naquele diploma legal, em especial o artigo 200, o qual prevê que não correrá prescrição enquanto o fato é apurado no juízo criminal.

É certo que a causa de pedir das ações regressivas ajuizadas pelo Instituto Nacional do Seguro Social, com fulcro no artigo 120 da Lei n. 8.213/1991, é a violação das normas de segurança, saúde e higiene do trabalho, que, por sua vez, configura contravenção penal prevista no artigo 19, §2º, da Lei n. 8.213/1991.

Portanto, como o artigo 200 do Código Civil determina que não correrá a prescrição quando a ação se originar de fato passível de apuração no juízo criminal, o que é o caso do acidente de trabalho decorrente da violação das normas de segurança e higiene do trabalho, não haverá o transcurso do prazo prescricional da ação regressiva enquanto houver inquérito policial em curso ou ação penal para apurar o fato.


Referências Bibliográficas

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SILVEIRA, Sandro Cabral. A ação regressiva proposta pelo INSS. Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 111, 22 out. 2003. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/4392>. Acesso em: 22 fev. 2012.

Zimmermann, Cirlene Luiza. A ação regressiva acidentária como instrumento de tutela do meio ambiente de trabalho. São Paulo: LTr, 2012.


Notas

[1]             Segundo dados da Coordenação-Geral de Cobrança e Recuperação de Créditos da Procuradoria-Geral Federal, após a criação da Advocacia-Geral da União a primeira ação regressiva foi ajuizada na 10ª Vara Federal de Minas Gerais, em 15 de março de 1994, recebendo a seguinte numeração 94.00.06177-3.

[2]            Sandro Cabral de Silveira defende a aplicação do prazo trienal in A ação regressiva proposta pelo INSS, Jus Navigandi, Teresina, ano 8, n. 111, 22 out. 2003. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/4392>. Acesso em: 22 fev. 2012.

[3]    Esta orientação da Procuradoria Federal restou manifestada no Memorando circular n. 017/2009/AGU/PGF/CGCOB.

[4]            PRADO, Luiz Regis. Curso de Direito Penal. V.1. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2009, p.442.

[5]                Ibid., p.444.

[6]                Cezar Roberto Bitencourt, René Ariel Dotti, Munoz Conde, Maurach entre outros.

[7]             O cumprimento da pena por uma pessoa física importa em sofrimento e angustia para os seus familiares, mas nem por isso se fala em violação da personalidade da pena.

[8]             MAGALHÃES NORONHA, E. Do crime culposo. E Ed. São Paulo: Saraiva, 1966, p. 147-148 apud MASSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado: Parte Geral. V.1, 4.ed. São Paulo: Editora Método. 2011, p. 276.

[9]            GALVÃO, Fernando. Responsabilidade Penal da pessoa jurídica. 2. Ed. Belo Horizonte. Del Rey. 2003, p. 16.

[10]           FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Curso de Direito Ambiental Brasileiro. 10 ed. São Paulo: Editora Saraiva, 2009. p.22.

[11]           Zimmermann, Cirlene Luiza. A ação regressiva acidentária como instrumento de tutela do meio ambiente de trabalho. São Paulo: LTr, 2012, p.27.

[12]        ROTH DALCIN, Eduardo. A responsabilidade penal da pessoa jurídica e o descumprimento das normas de segurança e medicina do trabalho – o tipo penal do art. 19, §2º, da Lei n. 8.213/1991. Revista do Ministério Público do Rio Grande do Sul. V.33, 1994, P.75.

[13]          RESPONSABILIDADE CIVIL, PENAL, TRABALHISTA E PREVIDENCIÁRIA DECORRENTES DO ACIDENTE DO TRABALHO. . Palestra proferida no 8° Congresso Goiano de Direito do Trabalho e Processo do Trabalho – Goiânia junho/1999.

[14]              Idem. p.80.

[15]               http://www.mp.ms.gov.br/portal/principal/notall.php?pg=1&id=7746

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Sobre o autor
Pedro Paulo Ribeiro de Moura

Procurador Federal - Pós-Graduado em Direito Público e em Direito Constitucional pela Uniderp.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MOURA, Pedro Paulo Ribeiro. Impedimento e suspensão do prazo prescricional nas ações regressivas.: Um olhar no artigo 200 do Código Civil. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3297, 11 jul. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22186. Acesso em: 29 mar. 2024.

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