Resumo: O Brasil seguiu a tendência mundial ao avançar em legislação e políticas de combate à pirataria. As convenções internacionais inspiraram a Constituição e a arquitetura do sistema infraconstitucional de tutela dos direitos autorais, em sua dupla dimensão: patrimonial e moral. O fisco federal, no âmbito da União, é competente para apreender e destinar as mercadorias ingressadas no território nacional com violação de direitos autorais, independentemente de prévia manifestação judicial. A responsabilidade civil decorre da prática do ato ilícito, cujo dano pode ser patrimonial e/ou moral. A comercialização de bens contrafeitos é crime, passível de ação penal de iniciativa privada ou pública; é possível a aplicação do princípio da insignificância, porém, afasta-se a adequação social, por ser crime formal e materialmente típico.
Palavras-chave: Direito Autoral, Convenções Internacionais, Constituição, leis, violação.
Sumário: 1. Considerações iniciais; 2. Principais acordos multilaterais de proteção; 3. A tutela constitucional e infraconstitucional; 3.1. O caráter singular dos direitos autorais; 4. O fisco e a destinação dos bens contrafeitos; 5. Da responsabilidade civil; 6. Do ilícito penal; 6.1. O princípio da insignificância; 6.2. O princípio da adequação social; 7. Considerações finais; 8. Referências bibliográficas.
1 – CONSIDERAÇÕES INICIAIS
Os direitos autorais são a expressão das criações do espírito inventivo do ser humano. Intimamente relacionados com o processo de transformação das sociedades, romperam o conceito tradicional de propriedade, ao deslocá-lo à dimensão das ideias.
A regulamentação, antes regida unilateralmente pelos países, passou para o ambiente internacional, sob a plataforma multilateral, que tem como sujeitos os governos e entidades representativas dos interesses dos titulares de direitos autorais. Nesse contexto, a indústria da pirataria preocupa não apenas os organismos internacionais, mas, também, os governos, por acarretar grandes prejuízos para a economia formal, com impacto na arrecadação tributária e no crescimento dos crimes por ela alimentados.
O reconhecimento dos direitos de autor é um dos pilares do grau de desenvolvimento dos países e, ao mesmo tempo, incentivo à produção intelectual. O Direito da Propriedade Intelectual é o gênero, do qual são espécies o Direito Autoral, objeto deste breve estudo; e o Direito de Propriedade Industrial, com regramento traçado pela Lei n° 9.279/96.
São apontados, inicialmente, os principais institutos de tutela internacional de proteção dos direitos de autor e os dele derivados. A seguir, é identificado, no ordenamento jurídico pátrio, o tratamento normativo constitucional e infraconstitucional. Passa-se, após, às ações do Estado para garantir e tornar efetiva aquela proteção. Por fim, são apresentados os dispositivos que podem ser manejados pelo titular do direito violado, em sua defesa.
2 – PRINCIPAIS ACORDOS MULTILATERAIS DE PROTEÇÃO
Cada Estado é sujeito ativo no processo de tutela dos direitos de propriedade intelectual. No plano internacional, a convergência de esforços para estruturar os padrões mínimos de proteção dos direitos autorais, com parâmetros inspirados na técnica jurídica, criaram as bases para avanço das legislações dos países signatários e para a formação de um direito iternacional privado comum.
A direção adotada é a multilateralidade internacional, força de orientação às construções legislativas dos países. Há várias convenções e tratados destinados a harmonizar o tratamento jurídico dado pelas legislações nacionais.
Para Fragoso (2009, p.77):
A tendência, na medida em que os países tiveram sua produção intelectual desenvolvida, mercê de seu próprio desenvolvimento econômico, com todas as consequências da internacionalização de suas economias, especialmente as européias, foi a de estabelecerem convenções multilaterais, englobando um número cada vez maior de países.
A Convenção de Berna é o documento jurídico mais expressivo na tutela internacional dos direitos autorais, com destaque a atenção dispensada aos valores da personalidade. Oficializada em 09 de setembro de 1886, estabeleceu o padrão sobre Direitos Autorais, ao harmonizar a proteção de obras literárias, artísticas e científicas no plano internacional. O Brasil é signatário, aderiu através da Lei nº 2.738, de 4 de janeiro de 1913, atualmente incorporada pelo Dec. nº 75.699, de 05/05/1975.
São pontos nucleares daquela Convenção: a exclusividade, com oponibilidade erga omnes; direito moral[i] do autor de reivindicar a paternidade da obra e de opor-se a qualquer modificação; a inalienabilidade e a irrenunciabilidade dos direitos morais do autor pelo vínculo da paternidade; cada país signatário tem a faculdade de legislar sobre os limites das utilizações; e os prazos de proteção não excederão aos previstos na lei de origem da obra.
A Convenção de Berna garantiu aos estrangeiros igual direito à proteção nos países signatários: as obras gozam de proteção em todos os países unionistas. A proteção é em benefício dos autores e de seus legítimos representantes.
De grande relevo também é a Convenção Universal Sobre Direitos de Autor. Realizada e firmada em Genebra, em 1952, e revista em Paris em 24 de julho de 1971, consagrou o uso do símbolo ©, que significa copyright, na publicação de obras. O Brasil tornou-se signatário, através do Decreto nº 76.905, de 24 de dezembro de 1975.
A Convenção de Genebra, de 29 de outubro de 1971, visa proteger os produtores fonográficos contra a reprodução não autorizada. É conhecida como a Convenção anti-pirataria da indústria fonográfica. O Brasil tornou-se signatário em 24 de dezembro de 1975, através do Decreto nº 76.909.
Logo após Berna e Genebra, tem-se, em grau de relevância, a Convenção de Roma, instituída com o propósito de dar proteção internacional aos artistas, intérpretes ou executantes, produtores de fonogramas e organismos de radiodifusão. É a Convenção dos titulares de direitos conexos. Assinada em 1961, sua a administração foi conferida à UNESCO, atualmente é confiada à OMPI[ii] e OIT.
Essa Convenção tem o propósito de conviver em harmonia com as normas estipuladas pelas outras, ao ressalvar, integralmente, a proteção concedida pela Convenção de Berna. Foi aprovada no Brasil pelo Decreto Legislativo n° 26/64 e promulgada pelo Decreto Presidencial n° 57.125 de 19/10/1965.
A legislação dos países signatários deve harmonizar-se a esses e outros[iii] acordos internacionais. O sistema não impede que a legislação de um país possa ser mais rígida que a tutela multilateral de referência, apenas evita que lhe seja contrária.
3 – A TUTELA CONSTITUCIONAL E INFRACONSITUCIONAL
A legislação internacional de referência influênciou a Carta Maior e a normatização infraconstitucional que trata do direito autoral. O país deve garantir proteção efetiva e eficaz aos direitos de autor e, ainda, impedir a utilização não autorizada das obras intelectuais protegidas[iv].
A Constituição Federal de 1998, no núcleo exemplificativo das garantias fundamentais, valoriza a liberdade de expressão e estabelece o direito exclusivo do autor sobre a obra, conforme os incisos IX e XXVII, do art. 5º:
Art. 5° Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
[...]
IX - é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença;
[...]
XXVII - aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar.
É a própria Constituição que reconhece os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa, ao elevá-los à categoria de principio fundamental da República (art. 1º, III, da CF/88).
A criação do autor, para receber proteção do direito autoral, deve ser original em sua forma de expressão e, ainda, respeitar os princípios constitucionais da propriedade privada, da função social da propriedade, da livre concorrência e da defesa do consumidor.
A propriedade deve ser considerada como o direito de usar, gozar, dispor da obra e de reavê-la de quem ilegalmente a possua[v]. A função social da propriedade se dá quando o direito do autor é exercido de modo que as vantagens para seu titular resultem em proveito social.
Assim dispõe o art. 170, da CF/88, ao inaugurar o capítulo que trata dos princípios gerais da atividade econômica:
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
[...]
II - propriedade privada;
III - função social da propriedade;
IV - livre concorrência;
V - defesa do consumidor;
Com a orientação dos acordos multilaterais e da Constituição, o legislador pátrio criou um sistema nacional de tutela dos direitos de autor.
A Lei nº 9.610/98 (Le de Direitos Autorais - LDA) altera, atualiza e consolida a legislação sobre direitos autorais. A proteção nasce com a obra, e independe de registro (art. 18, da LDA), este é facultativo e tem natureza probatória.
Face à dinâmica das transformações econômicas, políticas, sociais e o ambiente da internet, há amplo movimento para a revisão da LDA[vi].
A Lei nº 9.609/98 (Lei dos softwares) disciplina a proteção da propriedade intelectual de programa de computador. Interessante que, no seu art. 2º, o legislador atribuiu o regime de proteção da LDA.
A própria LDA, no art. 7º, inciso XII e § 1º, elencou os programas de computador como obra e lhes atribuiu a proteção subsidiária, verbis:
Art. 7º São obras intelectuais protegidas as criações do espírito, expressas por qualquer meio ou fixadas em qualquer suporte, tangível ou intangível, conhecido ou que se invente no futuro, tais como:
[...]
XII - os programas de computador;
[...]
§ 1º Os programas de computador são objeto de legislação específica, observadas as disposições desta Lei que lhes sejam aplicáveis.
A Lei 8.078/90, que instituiu o Código de Defesa do Consumidor, traz dispositivos de responsabilização do fornecedor de mercadorias adquiridas com violação aos direitos de autor (art. 18, § 6º, inciso II) e prevê sanções criminais ao ofensor (no Título II), sem prejuízo do disposto no Código Penal.
3.1 – O caráter singular dos direitos autorais
O direito de autor é, segundo a doutrina dominante, um direito de caráter singular, pois não se localiza, exclusivamente, na categoria dos direitos reais, os chamados direitos patrimoniais; ou apenas no domínio dos direitos pessoais, ambiente dos direitos morais.
A esse entendimento inclina-se Bittar (2003, p.11):
São direitos de cunho intelectual, que realizam a defesa dos vínculos, tanto pessoais, quanto patrimoniais, do autor com sua obra, de índole especial, própria, ou sui generis, a justificar a regência especifica que recebem nos ordenamentos jurídicos do mundo atual.
Portanto, para o entendimento do conteúdo dos direitos autorais, deve-se considerar a existência desses dois grupos de prerrogativas consagradas na Convenção de Berna: patrimonial e moral.
Os Direitos Patrimoniais são entendidos como a possibilidade de exploração econômica da obra pelo autor ou seus representantes legais. A eles a LDA dedica os arts. 28 a 45.
O prazo de proteção é o da vida do autor mais 70 (setenta) anos (art. 41, da Lei nº 9.610/98). Já na Lei nº 9.609/98 (softwares), o prazo é de 50 (cinquenta) anos (art. 2°, § 2°).
Os direitos morais referem-se à conexão eterna entre o criador e a criação. Bittar (2003, p. 47) entende que “os Direitos Morais são os vínculos perenes que unem o criador à sua obra, para realização da defesa de sua personalidade.” São tratados nos arts. 24 a 27 da LDA.
Diferentemente dos direitos patrimoniais, que têm sua vigência limitada no tempo, após o qual a obra cai em domínio público, os direitos morais produzem efeitos ad aeternum.
Vizinhos a esses direitos do autor gravitam os direitos conexos, cujo titular é um terceiro. O art. 89, da LDA, prevê que: “as normas relativas aos direitos de autor aplicam-se, no que couber, aos direitos dos artistas intérpretes ou executantes, dos produtores fonográficos e das empresas de radiodifusão.”
4 – O FISCO E A DESTINAÇÃO DOS BENS CONTRAFEITOS
O Estado deve observar, em sua atuação, os princípios constitucionais do devido processo legal, da ampla defesa, do contraditório e da inadmissibilidade de provas ilícitas. Esses princípios gerais, garantidores da preservação do Estado Democrático de Direito, estão gravados nos incisos LIV, LV e LVI, do art. 5º, da CF/88.
O Conselho Nacional de Combate à Pirataria e Delitos Contra a Propriedade Intelectual (CNCP), criado pelo Decreto nº 5.244/04, é o órgão colegiado consultivo, vinculado ao Ministério da Justiça, com a finalidade de elaborar as diretrizes para a formulação de um plano nacional para o combate à pirataria, à sonegação fiscal decorrente e aos delitos contra a propriedade intelectual. O atual plano, lançado em 2009, é composto de 23 (vinte e três) ações a serem implementadas até 2012.
No último Relatório Brasil Original, o CNCP divulgou sua atuação no período de 2009 e 2010. Chama a atenção os números dos inquéritos instaurados pela Polícia Federal, para apuração dos crimes de contrabando e descaminho (art. 334, do CP), e de pirataria (art. 184, do CP), vide quadro abaixo:
Ano |
Contrabando e Descaminho (art. 334, CP) |
Pirataria (art. 184, CP) |
||
Inquéritos |
Indiciamentos |
Inquéritos |
Indiciamentos |
|
2009 |
8.325 |
4.130 |
718 |
344 |
2010 |
8.066 |
8.066 |
555 |
555 |
Quadro 01 - Repressão ao contrabando, descaminho e pirataria.
Fonte: CNCP, relatório Brasil Original 2009/2010, p. 40.
No ano de 2010, a totalidade dos inquéritos resultou em indiciamentos dos suspeitos. Foram 544 (quinhentos e quarenta e quatro) prisões em 2009; e 412 (quatrocentos e doze) em 2010.
O Decreto nº 7.496, de 08 de junho de 2011, instituiu o Plano Estratégico de Fronteiras, cujo objetivo, segundo seu art. 1º é “o fortalecimento da prevenção, controle, fiscalização e repressão dos delitos transfronteiriços e dos delitos praticados na faixa de fronteira brasileira”.
Inserida naquele plano, a Operação Fronteira Blindada é a ação permanente da Receita Federal de combate ao contrabando, descaminho e pirataria. A Instituição aumentou em 20% do volume de apreensões de mercadorias irregulares nas fronteiras brasileiras, no primeiro trimestre de 2012, em relação a igual período de 2011, o valor chegou a R$ 88,5 milhões. Já na Zona Secundária, que exclui os portos e aeroportos, foi lançado quase R$ 1 bilhão nos primeiros três meses de 2012, ou seja, 29% a mais na comparação com o mesmo período do ano passado[vii].
Bens produzidos com violação de direitos autorais são proibidos de ingressar no país. Porém, penetram as fronteiras através de todas as vias possíveis (terrestre, aérea e aquática), trata-se do contrabando.
Segundo o entendimento de Decomain (2008, p. 541-542):
Contrabando designa a conduta de importar ou exportar mercadoria cuja saída do território nacional ou cuja entrada nele são absoluta ou relativamente proibidas. A proibição é absoluta quando a importação ou exportação não é permitida em situação alguma.
Compete à Receita Federal aplicar a pena de perdimento das mercadorias e dar a destinação apropriada, que, para aquelas produzidas com violação de direitos autorais ou ingressadas no território nacional irregularmente, será a destruição ou inutilização, de acordo com os arts. 28 e 29, incisos III e IV, § 1º, inciso I e § 4º, ambos do Decreto-Lei nº 1.455, de 7 de abril de 1976[viii].
A Portaria MF nº 282, de 9 de junho de 2011, determina no art. 2º, inciso III, alínea 'f', que os fonogramas, livros e obras audiovisuais com indícios de violação ao direito autoral serão destruídos ou inutilizados.
A destinação é realizada ainda que haja processos judiciais pendentes de apreciação, salvo determinação judicial em sentido contrário. Isso é assim, porque a autoexecutoriedade é o atributo do poder de polícia que permite à Administração executar suas próprias decisões.
Assim a define Di Pietro (2012, p.126):
A autoexecutoriedade (que os franceses chamam de executoriedade apenas) é a possibilidade que tem a Administração de, com os próprios meios, pôr em execução as suas decisões, sem precisar recorrer previamente ao Poder Judiciário.
O Auditor-Fiscal da Receita Federal (autoridade fiscal com competência nacional), ao executar a apreensão, o perdimento e a destinação das mercadorias contrafeitas, age no exercício de atividade administrativa vinculada à legislação que rege a matéria.
Na atividade vinculada, informa Di Pietro (2012, p.125) que “a Administração terá que adotar solução previamente estabelecida, sem qualquer possibilidade de opção”.
5 – DA RESPONSABILIDADE CIVIL
O Código Civil de 2002 é a norma jurídica dotada de cláusulas gerais de aplicação no âmbito da tutela dos direitos autorais. A obrigação de indenizar encontra seu núcleo no art. 927, ao dispor: “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”.
A função social, a probidade e a boa-fé são princípios orientadores do Código Civil de 2002, afetos, pois, aos direitos autorais. A responsabilidade civil é uma consequência imposta pela norma civil àquele que violou o direito do autor ou titular de direitos conexos, independentemente de haver ou não instrumento contratual.
É nesse sentido o pensamento de Tartuce (2012, p. 415 - 416):
A responsabilidade civil surge em face do descumprimento obrigacional, pela desobediência de uma regra estabelecida em um contrato, ou por deixar determinada pessoa de observar um preceito normativo que regula a vida. Neste sentido, fala-se, respectivamente, em responsabilidade civil contratual ou negocial e em responsabilidade civil extracontratual, também denominada responsabilidade civil aquiliana.
Mas, o ordenamento jurídico não tutela qualquer reclamação do autor. A violação ao seu direito deve ser originária da ação ou omissão do agente; dessa conduta deve resultar um dano (moral ou patrimonial); e, por fim, que o eventual dano seja resultado do comportamento do agente ofensor.
Entende Diniz (2010, p. 36-38) que a responsabilidade civil requer a existência de três pressupostos:
a) Ação, comissiva ou omissiva, qualificada juridicamente, isto é, que se apresenta como ato ilícito ou lícito;
b) Ocorrência de um dano moral e/ou patrimonial causado à vítima por ato comissivo ou omissivo do agente ou de terceiro por quem o imputado responde; e
c) Nexo de causalidade entre o dano e a ação.
A ilicitude cominada no art. 186 do CC/02 diz respeito à infringência de norma legal, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência. É a violação de um dever de conduta, por dolo ou culpa, que tenha como resultado prejuízo de outrem, ainda que o dano seja exclusivamente moral.
Quem, no exercício de um direito autoral, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes, comete, também, ato ilícito (187, do CC/02).
Poderá a vítima buscar o pronunciamento judicial, através de ação de perdas e danos, com fulcro nos arts. 402 a 405, do Código Civil de 2002. O pedido de antecipação de tutela (art. 273, do CPC) é medida útil, se presentes seus requisitos.
Para afastar eventuais danos materiais permanentes, é possível, ainda, formular a cautelar de busca e apreensão, antes ou no curso do processo principal (art. 796, do CPC), cuja concessão dependerá da presença do fumus boni iuris e periculum in mora. Assim já decidiu o TJSP:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. MEDIDA CAUTELAR. SOFTWARE. Pretensão que objetiva a concessão de liminar de vistoria, busca e apreensão, antes da citação da ré. Cabimento. Alegação de uso indevido de programa de computador (software) com violação de direitos autorais. Presentes a plausibilidade do direito invocado e do risco de ineficácia da medida. Precedentes. Decisão reformada. Liminar deferida. Recurso provido. (1608071420118260000 SP 0160807-14.2011.8.26.0000, rel. De Santi Ribeiro, 1ª Câmara de Direito Privado do TJSP, j. 06.12.2011, Dje 07.12.2011).
A prestação jurisdicional poderá impor ao ofensor uma obrigação de fazer, ou não fazer e de reparar o prejuízo causado. O prazo prescricional para a propositura da ação é de três anos (art. 206, § 3º, V, do CC/02).
Veja-se decisão do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em sede de apelação, que impôs ao ofensor o ônus dos danos materiais e morais sofridos pelo autor, pela utilização de sua obra, sem autorização:
TJRS-581558) APELAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL. DIREITOS AUTORAIS. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS PATRIMONIAIS E EXTRAPATRIMONIAIS. VIOLAÇÃO DE DIREITOS AUTORAIS. USO DE PROJETO DE FACHADA DE RESTAURANTE SEM A AUTORIZAÇÃO DO AUTOR. LEI Nº 9.610/98. DANOS MATERIAIS CONFIGURADOS. DANOS MORAIS. FATOS CONSTITUTIVOS COMPROVADOS. ART. 333, INCISO I, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. VIOLAÇÃO A DIREITO DA PERSONALIDADE CONFIGURADO. DANOS MORAIS. VIOLAÇÃO DE DIREITOS AUTORAIS - DANOS MATERIAIS. Os danos materiais decorrentes da violação a direitos autorais são aqueles que dizem respeito aos resultados econômicos da obra, assegurados ao autor. Advêm eles da reprodução e da comunicação do trabalho intelectual ao público. Possibilita-se ao criador auferir proventos econômicos compensatórios de seu esforço. Comprovado nos autos a utilização indevida de projeto, porquanto ausente autorização do autor da obra, imperativo o dever de indenizar. VIOLAÇÃO DE DIREITOS AUTORAIS - DANOS MORAIS CONFIGURADOS. Dentre os direitos discriminados no art. 24, da Lei nº 9.610/98, a paternidade da obra, sua integridade e os direitos relativos à publicação e à sua preservação, receberam proteção legal. Neste aspecto, vislumbra-se na conduta da ré potencial lesivo apto a violar esses direitos, sobretudo diante da expressa negativa de paternidade da obra. Tal conduta lesiva, por si só, implica em inequívoca violação a direito de paternidade de autor, causadora de danos morais, porquanto ínsitos à própria conduta lesiva referida. Danos morais configurados. APELO DO RÉU DESPROVIDO. APELO DO AUTOR PROVIDO. (Apelação Cível nº 70042905562, 9ª Câmara Cível do TJRS, rel. Leonel Pires Ohlweiler, j. 19.10.2011, DJ 21.10.2011).