CONCLUSÃO
Em sede conclusiva, cumpre que inicialmente retomemos algumas das proposições discutidas ao longo do trabalho que entendemos terem pavimentado nosso caminho até esse momento derradeiro.
Destarte, reiteramos entendimento acerca da importância assumida pelo princípio da livre iniciativa em nosso modelo de Estado, mormente enquanto pedra angular de nosso sistema econômico, notadamente de matizes capitalistas neoliberais. Assim, enquanto vetor econômico, restou demonstrada sua inarredável predominância em nossa conjuntura jurídico-política, bem como sua configuração em nosso paradigma constitucional enquanto princípio político conformador de todo o sistema econômico, não olvidando seus visíveis reflexos na seara social.
De outro lado, assentamos também no começo de nossa explanação o conteúdo atinente à carga valorativa eminentemente social do princípio da busca do pleno emprego. Assim, não obstante o enfoque mais amplo que lhe é dado nas ciências econômicas, lastreamos sua utilização em nosso discurso enquanto princípio determinador de tarefas ao Estado, vale dizer, visando a criação e ocupação de postos de trabalho bastantes para todo o contingente populacional apto ao desenvolvimento de atividade laboral. Ademais, o concebemos – utilizando a classificação de Canotilho – enquanto princípio jurídico impositivo, definidor de diretrizes a serem seguidas.
Em um segundo momento de nosso discurso, tratamos de delimitar as bases teóricas que nos conduziriam ao exame do fenômeno jurídico estudado. De modo que, foi exposta a necessidade de se proceder a uma interpretação constitucional que se desvinculasse das anacrônicas noções hermenêuticas subordinadas à vontade do legislador ou ao espírito da lei.
Para tal desiderato, valendo-nos novamente dos ensinamentos de Canotilho, lançamos mão do método interpretativo normativo-estruturante com matizes sistemáticas bastante acentuadas, além da observação dos princípios de interpretação constitucional afetos a tal método, em especial, pautando-nos pelo metaprincípio da hierarquização axiológica, desenvolvido por Juarez Freitas.
Posteriormente, fundados os alicerces de nossa pesquisa, partimos para a análise propriamente dita da configuração do conflito normativo entre os cânones constitucionais da livre iniciativa e da busca do pleno emprego. Destarte, diferenciamos antinomia (conflito normativo entre regras ou entre regras e princípios) de colisão principiológica, asseverando tratar-se da configuração dessa última categoria o ponto fulcral de nossa empresa exegética.
Nesse sentido, dividimos nossa análise em duas vertentes, relativamente à possibilidade de configuração do conflito normativo, quais sejam, no plano hierárquico-formal e no axiológico-material.
Desse modo, acentuamos a inocorrência de conflito de natureza hierárquico-formal entre os princípios estudados, haja vista o entendimento perfilhado de que ambos consolidam-se como componentes de igual valor inseridos em um mesmo sistema aberto de regras e princípios, isento de hierarquia e com aptidão para harmonizar-se.
Em contrapartida, no que concerne ao plano axiológico-material do conflito, foi necessário o desenvolvimento do maior espectro de considerações tendentes a analisar propriamente a celeuma instalada. Assim, firmamos entendimento positivo atinente à configuração de colisão principiológica de ordem material entre a livre iniciativa e a busca do pleno emprego. De modo que, entendermos que a busca do pleno emprego, nos moldes em que foi positivada em nossa Constituição - carecendo de mecanismos jurídicos que lhe conferissem efetividade prática - tem seu conteúdo axiológico completamente prejudicado pela incidência da carga valorativa de natureza capitalista própria à livre iniciativa que, conforme restou demonstrado, encontra apenas abjetos limites negativos à sua predominância em nosso ordenamento jurídico.
Sendo assim, derradeiramente perscrutamos acerca dos motivos determinantes de tal aporia, bem como acerca de sua possível superação. Nesse sentido, identificamos o momento histórico em que se deu a promulgação de nossa Constituição Federal - qual seja, de ruptura com um regime autoritário – como determinante para a elaboração de uma Carta Política de teor notadamente dirigente, definindo compromissos, tarefas e enunciando objetivos. Todavia, assim o entendemos, também legando grande parte da responsabilidade pela consecução desses fins à vontade política o que, no caso de uma jovem democracia, tem demonstrado as mais pesarosas consequências; desde a patente confusão entre Estado e Governo até as vicissitudes atinentes à intervenção estatal.
Por conseguinte, entendemos que para além da existência de conflitos normativos que dificultem a efetivação de princípios de natureza social como o da busca do pleno emprego, devemos afirmar os compromissos legitimamente plasmados em nossa Constituição Cidadã. Destarte, mediante não apenas a evocação de anseios e desejos político-sociais, mas principalmente através da observação da cogente força normativa da constituição, cuidemos de torná-la efetiva e eficaz, em todas suas linhas, mormente no escopo do desenvolvimento e progresso social.
REFERÊNCIAS
ALMEIDA, Fábio Portela Lopes de. Os Princípios Constitucionais entre Deontologia e Axiologia: pressupostos para uma teoria hermenêutica democrática. Disponível em: http://www.direitogv.com.br/subportais/publicaçõe/RD-08_8_493_516_Os principios constitucionais entre deontologia e axiologia_Fabio Lopes de Almeida.pdf Acesso em 10 jul. 2010.
ALVES, José Eustáquio Diniz. O Direito ao Pleno Emprego e ao Trabalho Decente. Disponível em: http://www.ecodebate.com.br/2010/08/11/o-direito-ao-pleno-emprego-e-ao-trabalho-decente-artigo-de-jose-eustaquio-diniz-alves/. Acesso em 12 ago. 2010.
BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Texto de 05 de outubro de 1988, atualizado até 12 de abril de 2009. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constitui%C3%A7ao.htm>.Acesso em: 09 jul. 2009.
CANOTILHO, José Joaquim Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7.ed. Coimbra: Almedina, 2008.
COSTA, Eder Dion de Paula. Considerações sobre o Sistema Jurídico.Disponível em:http://www.buscalegis.ufsc.br/revistas/index.php/buscalegis/article/viewFile/32906/32095. Acesso em 25 jul. 2010.
COUTINHO, Jacinto Nelson de Miranda. Canotilho e a Constituição Dirigente. 2 Ed. Rio de Janeiro: Renovar, 2005.
CRISTOVAM, José Sérgio da Silva. A Resolução das Colisões entre Princípios Constitucionais. Disponível em: <http:// jus.com.br/revista/texto/3682. Acesso em 12 dez. 2009.
FIGUEIREDO, Leonardo Vizeu. Lições de Direito Econômico. Rio de Janeiro: Forense, 2006.
FREITAS, Juarez. A Interpretação Sistemática do Direito. São Paulo: Malheiros, 1995.
GABRIEL, Sérgio. O papel da empresa no Sistema Econômico Capitalista no Brasil. Subsídios para compreensão do ciclo do desenvolvimento econômico. Disponível em: < http://jusvi.com/artigos/30035>. Acesso em 20 abr. 2010.
GARCIA, Tatiana Marselha Lins. A noticiada morte da Constituição Dirigente. Disponível em: <http:// www.direitonet.com.br/artigos/exibir/5615/A-noticiada-morte-da-constituicao-dirigente. Acesso em 15 ago. 2010.
GRAU, Eros Roberto. A Ordem Econômica na Constituição de 1988. 8 ed. São Paulo: Malheiros, 2003.
GUSMÃO, Paulo Dourado de. Introdução ao Estudo do Direito. 31 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002.
HESSE, Konrad. A Força Normativa da Constituição. Tradução de Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1991.
KELSEN, Hans. O Estado como Integração: um confronto de princípios. Tradução de Plínio Fernandes Toledo. São Paulo: Martins Fontes, 2003.
KELSEN, Hans. Teoria Pura do Direito. 4 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1995.
LIMA, George Marmelstein. A Hierarquia entre Princípios e a Colisão de Normas Constitucionais. Disponível em: <http:// jus.com.br/revista/texto/2625>. Acesso em 15 jun. 2010.
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 26.ed. São Paulo: Malheiros, 2009.
SANTOS, Roseli Rego. O Princípio da Busca do Pleno Emprego como Aplicação da Função Social da Empresa na Lei de Falências e Recuperação de Empresas. Disponível em: www.conpedi.org.br/manaus/anais/salvador/roseli_rego_ santos.pdf. Acesso em 25 jan. 2010.
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 26 ed. São Paulo: Malheiros, 2006.
SILVA, Lúcio Tadeu da. Princípios Constitucionais Fundamentais. Os Conflitos entre si e com as Regras Jurídicas. Disponível em: <http:// www.tex.pro.br/wwwroot/00/070520principios_lucio.php. Acesso em 10 mar. 2010.
TRINDADE, André Karam. Breves Considerações Acerca do Papel dos Tribunais na Concretização dos Direitos Fundamentais Sociais. Disponível em: www.dombosco.com.br/faculdade/revista_direito/1edicao-2009/eos-4-2009-2.pdf. Acesso em 02 abr. 2010.
ZIMMERMANN, Augusto. Princípios Fundamentais e Interpretação Constitucional (Análise meta-jurídica dos fundamentos axiológicos do ordenamento constitucional). Disponível em: <http:// www.achegas.net/numero/nove/augusto_zimmermann_09.htm>. Acesso em 20 abr. 2010.