6. NECESSIDADE DE CONTROLE?
Diante da situação apresentada, vale discutir a possibilidade de um controle eficaz e uma fiscalização rígida sobre os órgãos da mídia, visando impedir abusos e injustiças, já que as liberdades de imprensa e de expressão não podem violar a dignidade da pessoa humana do acusado, com fundamento no princípio da presunção de inocência.
Impende relatar que diante da inexistência de regulamentação no setor da imprensa, há quem defenda a criação de mecanismos de controle social da mídia, e também existem aqueles que desaprovam a referida proposta.
Neste sentido, em dezembro de 2009, o Brasil sediou a 1ª CONFECOM-Conferência Nacional de Comunicação, com o objetivo de discutir a modernização da comunicação social do país.
Insta constar que com a participação efetiva da Sociedade Civil, Sociedade Civil Empresarial e Poder Público foram apresentadas, através de um debate democrático, várias propostas orientadoras para uma Política Nacional de Comunicação, em busca de uma comunicação plural e democrática.
Dentre outras propostas, convém registrar algumas que foram aprovadas na CONFECOM: a instituição de um Conselho Federal de Jornalistas para fiscalizar a mídia; a criação de Conselhos Estaduais de Comunicação para impedir que ocorra manipulação da mídia com prejuízos à sociedade; a instituição de um Código de Ética do Jornalismo; a elaboração de uma nova lei de imprensa, que garanta o direito de resposta; a existência de um órgão que coibirá supostos desrespeitos a movimentos sociais; a proibição de políticos e seus familiares em até segundo grau de possuírem emissoras de televisão e rádio.
Neste diapasão, o Ceará foi o primeiro Estado brasileiro a tomar a iniciativa de criar o Conselho Estadual de Comunicação Social, órgão colegiado integrante da Secretaria da Casa Civil em conformidade com a Constituição Federal.
Sendo aprovado por unanimidade pela Assembleia Legislativa do respectivo Estado, em 19 de outubro deste ano de 2010, o projeto[38] de criação do Conselho Estadual que regulará a imprensa cearense, aguarda a sanção do governador Cid Gomes.
Vale consignar que a criação do referido Conselho influenciou outros Estados brasileiros (Alagoas, Bahia, Goiás, Pará, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul) que também deliberaram pela criação do órgão. Convém anotar ainda que em São Paulo tramita projeto similar ao do Ceará.
Importa registrar que dentre outros objetivos do Conselho Estadual de Comunicação Social do Ceará encontram-se: a garantia do exercício da mais ampla democracia; o respeito aos princípios éticos e de igualdade; a defesa do direito de livre expressão; a participação na elaboração de políticas públicas de comunicação social; a fiscalização de abusos e violações dos direitos humanos nos meios da mídia estadual, com ações em defesa da dignidade da pessoa humana.
É importante destacar que o órgão estadual será composto por 25 (vinte e cinco) membros:
- 07 (sete) do Poder Público que serão indicados por órgãos oficiais, dos quais eles fazem parte (Secretarias, Assembleia Legislativa e Ministério Público Federal) ou escolhidos através de eleição, no caso da escolha do representante das escolas de comunicação;
- 08 (oito) da Sociedade Civil – Produtores e Difusores, todos escolhidos através de eleições dos vários tipos de veículos da mídia, e;
- 10 (dez) da Sociedade Civil – Trabalhadores e Consumidores, escolhidos através de indicação, no caso do representante do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado do Ceará, por meio de eleições realizadas por entidades de comunicação e cultura social ou áreas afins e ainda haverá escolha de alguns membros através de eleição pelo primeiro plenário do Conselho.
Embora seja aprovada por grande parte das entidades estaduais que alegam não haver nenhum tipo de censura ou cerceamento à liberdade de imprensa, a criação do Conselho de Comunicação Social, que visa à participação popular, o controle social e a gestão democrática, encontra forte resistência de outras entidades.
Registre-se que a Ordem dos Advogados do Brasil no Ceará, através de seu presidente Valdetário Mota, declarou-se contra o Conselho, estranhando a tramitação do projeto de lei na casa legislativa cearense: "Nos causou estranheza o conteúdo da lei, que prevê o acompanhamento, fiscalização, deliberação e monitoramento do que é produzido por jornais e emissoras de rádio e televisão". Ele pediu atenção no caso, dizendo que "é preciso estar atento, pois o projeto interfere diretamente na liberdade de imprensa e na liberdade de expressão", declarando, por fim, que "não podemos aceitar algo que vá contra ao que determina a Constituição" (DIÁRIO DO NORDESTE, 2010, p. 1).
Sendo assim, verifica-se que a OAB-CE destaca a inconstitucionalidade do projeto de lei estadual e espera que o mesmo não seja aprovado pelo governador do Estado.
É importante registrar que, no mesmo sentido, a ANJ-Associação Nacional de Jornais se manifestou contra o órgão que regulará a mídia estadual. Ricardo Pedreira, diretor-executivo da respectiva associação, expressou o inconformismo com a proposta aprovada pela Assembleia Legislativa do Estado do Ceará:
É absurda e inconstitucional. Tão absurda que o governador certamente não levará o assunto adiante. Nossa Constituição é clara no sentido de impedir qualquer controle sobre a liberdade de expressão. Numa democracia, ninguém pode determinar o que deve ou não ser veiculado pelos meios de comunicação. Pretender esse controle é censura, é autoritarismo (DIÁRIO DO NORDESTE, 2010, p. 1).
Definido como autoritarismo e censura pela ANJ, o controle social da mídia foi também criticado pela ABERT-Associação Brasileira das Emissoras de Rádio e Televisão que prometeu recorrer ao Poder Judiciário se houver qualquer tentativa de tutelar o jornalismo (VEJA, 2010, p. 1). Na mesma reportagem, o presidente da AMB-Associação dos Magistrados Brasileiros, Mozart Valadares, condenou a regulamentação da comunicação social: "somos totalmente contra qualquer mecanismo que tente inibir o exercício da imprensa ou dificultar o exercício da profissão de jornalista".
Vale ressaltar que os defensores da inconstitucionalidade do Conselho Estadual de Comunicação Social consideram que o modelo atual é o melhor para o setor jornalístico, onde não há limitações, censuras e prejuízos às liberdades de imprensa e de expressão e quaisquer danos à imagem ou aos direitos humanos causados pelos meios de comunicação social devem ser reparados mediante ações judiciais civis (indenizações) e penais (crimes contra a honra). Portanto, não admitem a instituição de lei de imprensa. Isto seria um retrocesso, pois a sociedade adquiriu o direito de liberdade de imprensa e de expressão de forma plena somente após muitos anos e enfrentou muitos conflitos sociais.
Além de haver propostas de criação de um Código de Ética Jornalístico, sancionado pelo Estado e observados os interesses da sociedade, há também propostas de se reativar o CCS-Conselho de Comunicação Social, Conselho Federal que foi criado em 1991, diferentemente do Conselho Estadual que terá a função consultiva e não deliberativa.
Necessário se faz anotar que o Governo Federal também tem a intenção de criar mecanismos de controle social da imprensa no Brasil.
Convém consignar que Franklin Martins, ministro-chefe da Secretaria de Comunicação da Presidência, esteve pesquisando sobre o tema na Europa. Uma das propostas do ministro é de descentralizar o mercado jornalístico e aumentar a qualidade das divulgações midiáticas, sem, contudo, violar as liberdades de imprensa e de expressão.
O assunto será discutido através de propostas que serão apresentadas no Seminário Internacional das Comunicações Eletrônicas e Convergência de Mídias que será realizado neste mês de novembro de 2010, em Brasília, tendo a presença de vários palestrantes conhecedores da matéria, para fins de elaboração de um anteprojeto que será encaminhado à presidente eleita, Dilma Rousseff, que poderá dar continuidade ou não neste marco regulatório que redefinirá a organização do setor.
Diante dessas propostas apresentadas, há de se analisar o tema proposto neste trabalho. Será a solução definitiva para o problema? Controlando e fiscalizando os meios de comunicação social, haverá o devido respeito aos preceitos éticos e constitucionais? Haverá censura à imprensa? A dignidade do cidadão não será violada? O princípio da presunção de inocência do acusado da prática de um crime será obedecido? E nos crimes de grande repercussão social, a mídia e a sociedade julgarão e condenarão antecipadamente o investigado? Não haverá danos às pessoas que forem vítimas de falsas notícias?
Por fim, não se pode deixar de falar que, no que tange às atividades da mídia e do Poder Judiciário, diante da publicidade dos atos processuais e da presunção de inocência dos acusados da prática de um crime, foi tema do Projeto de Lei nº 65 de 1999, conhecido como “Lei da Mordaça”, tendo por objetivo instituir punições aos magistrados que divulgarem aos meios de comunicação informações dos autos processuais (FERREIRA, 2009, p. 29).
Vale destacar ainda que o assunto também foi discutido em proposta de Emenda Constitucional, que proibia juízes, promotores de justiça e policiais de praticarem a seguinte conduta:
Revelar ou permitir indevidamente que cheguem ao conhecimento de terceiro ou aos meios de comunicação fatos ou informações de que tenham ciência em razão do cargo e que violem o sigilo legal, a intimidade, a vida privada, a imagem e a honra das pessoas (FOLHA ONLINE, 2010, p. 1).
Importa registrar que diante das indagações feitas, das tentativas de se preservar os direitos da personalidade dos envolvidos num processo penal e de garantir também os direitos da mídia e da sociedade, cabe salientar que a liberdade de imprensa, a liberdade de expressão e manifestação do pensamento, a publicidade dos atos processuais, a presunção de inocência, o direito à informação, à intimidade, à vida privada, à honra e à imagem das pessoas são direitos fundamentais que devem ser respeitados.
No entanto, nenhum deles é direito absoluto, devendo haver a ponderação, a razoabilidade, quando existir o conflito entre eles, e optar por aquele que for do interesse público, o mais justo para a sociedade. Entretanto, não se pode perder de vista o interesse particular do cidadão envolvido no caso concreto e a qualquer dano causado indevidamente, deve haver a justa reparação, sendo ainda aplicado penalidades àquele agente causador do ato ilícito, a fim de que sejam impedidos novos abusos e o cometimento de injustiças.
7. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Convém anotar a grande importância da mídia no desenvolvimento do ser humano, na formação de sua personalidade.
Os meios de comunicação social trazem a todo instante fatos e notícias relevantes do mundo do saber. Eles elevam o nível de informação e de conhecimento da população, desde os meios mais remotos, como a tipografia, quanto os mais recentes, os digitais, que proporcionam ao cidadão uma viagem ao mundo da informação sem sair de sua residência.
Importante salientar que a educação se adquire através da informação. Conclui-se, portanto, que sem a educação não há evolução do indivíduo e da sociedade.
Impende relatar que o Brasil é considerado um país capitalista moderno, onde é possível visualizar o amplo direito à propriedade e à liberdade, a existência da concentração e a centralização do capital em pequenos grupos sociais, a propriedade privada de meios de produção, a ânsia pela busca de valores econômicos, lucros, a grande concorrência e economia do mercado, a lei da oferta e da procura, além da presença de vários consumidores.
Os veículos de comunicação estão neste contexto, buscando a liderança por índices de audiência e tratando a informação como mercadoria. Quanto mais conseguem vendê-la, mais cresce esse desejo para fins de sobrevivência.
Vale notar que a sociedade movida por sentimentos em busca de informações relevantes para o seu desenvolvimento se utiliza dos meios informativos. Estes por sua vez vendem seus produtos através da publicidade, em consonância com seus interesses, mais comerciais do que sociais.
É de extrema importância registrar o poder de convencimento que a mídia exerce sobre os indivíduos, através de seus métodos de sons e imagens e com a divulgação de notícias repetitivas e rápidas, sem o tempo necessário para o cidadão comum observá-las e formar seu próprio convencimento, formando-se assim a opinião pública.
No que diz respeito aos crimes de grande repercussão social, a imprensa em geral exerce sua função pautada na publicidade dos atos processuais, na liberdade de imprensa, no direito à informação dos cidadãos, além de seus próprios interesses.
Neste caso, cabe analisar dois aspectos relevantes. Primeiramente, a sociedade precisa ser informada dos fatos e atos ligados à ação criminosa. Por outro lado, o investigado ou acusado da prática delituosa também precisa ser tratado como inocente até que se prove o contrário, já que também é ser humano e está sujeito à manifestação dos vários tipos de sentimentos: amor, carinho, saudade, emoção, alegria, tristeza, raiva, ódio, constrangimento etc.
Sendo assim, importa enaltecer o papel da mídia, desde que sejam divulgadas apenas notícias verdadeiras sobre o fato criminoso, respeitando-se os valores éticos, os preceitos constitucionais, a dignidade do investigado e os direitos a ele inerentes, evitando-se assim danos irreparáveis, o clamor público, a pressão sobre os atores do processo, que também são seres humanos, sujeitos aos sentimentos, inclusive ao medo de decidir contra o modo coletivo de pensar produzido pelos noticiários.
Por fim, resta considerar que havendo ou não o controle social dos meios de comunicação de massa, o profissional da área jornalística sempre será um ser humano, estará sujeito a erros. Portanto, é inadmissível atribuir, sem plena convicção, um fato criminoso a alguém que não o cometeu, ferindo assim sua honra e sua dignidade pelo resto de sua vida.
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