Resumo: Pesquisa bibliográfica dedicada a reconstruir discussão pertinente à aplicabilidade unilateral ou bilateral da Cláusula Penal Desportiva no Contrato de Trabalho do Atleta Profissional de Futebol se utilizando dos fundamentos epistemológicos, legislação desportiva, doutrina contemporânea e entendimento jurisprudencial, tendo em vista o aprimoramento dos fundamentos teóricos abordados sobre o tema. Com o lançamento da “Lei Pelé”, os clubes perderam uma grande fonte de renda que eram os antigos “Passes”, pois, em caso de transação de um atleta, este, considerado patrimônio do clube ao qual ele estivesse vinculo, o clube detentor de seus direitos receberia uma contraprestação financeira, assim como se o atleta fosse um produto. Hoje, com a extinção do “passe”, e a grande maioria dos clubes brasileiros sofrendo com problemas financeiros, estes clubes viram na Cláusula Penal Desportiva, a saída para serem recompensados pela perda de seus principais jogadores e principalmente para tentar inibir o êxodo em debandada destes atletas para outros mercados, tal como o Europeu, que vive realidade diversa da nossa, sendo mais organizado e contando com clubes de altíssima saúde financeira e competitividade esportiva.
Palavras-chave: Direito desportivo. Cláusula penal. Multa rescisória. Unilateralidade. Bilateralidade.
1 INTRODUÇÃO
O esporte, em especial o futebol, exerce uma função social de suma relevância, pois além de propiciar interação entre os grupos sociais, com enriquecimento cultural, atua também como instrumento de equilíbrio pessoal. Isto porque, quando o praticamos, saímos do sedentarismo, quando o assistimos, vários tipos de emoções repassadas no dia-a-dia transbordam, sem falar nas grandes cifras econômicas que este esporte movimenta.
O brasileiro oficializou o futebol como paixão nacional. Está na nossa raiz, no sangue, talvez em nosso DNA. Fato é que sem dúvida, ele atrai a atenção de milhões de torcedores em todo o país, e com isso investidores das mais variadas áreas da economia, movimentando milhões, seja pertinente às pessoas ou as cifras envolvidas.
Este estudo encontra sua justificativa no fato ser um ramo do direito bastante desafiador, e não encontrar muito respaldo em nossa vida acadêmica. Para muitos juristas o direito Desportivo é considerado o novo eldorado para se trabalhar. Consoante previsão constitucional de fomento às práticas desportivas constante do caput do artigo 217 da nossa Lei Maior, não é de todo estranho que se venha constatando um inerente alargamento das possibilidades de atuação para os operadores do Direito nesta nova e valiosa área do trabalho, que vem cada vez mais sendo explorada e em crescimento vertiginoso, sobretudo após a constitucionalização da autonomia das entidades esportivas e das novas diretrizes consignadas pela chamada lei “Pelé”.
Trata-se de pesquisa bibliográfica dedicada a reconstruir discussão pertinente à aplicabilidade da clausula penal desportiva se utilizando dos fundamentos epistemológicos, legislação desportiva, doutrina contemporânea e entendimento jurisprudencial, tendo em vista o aprimoramento dos fundamentos teóricos abordados sob o tema: “A aplicabilidade unilateral ou bilateral da Cláusula Penal Desportiva no Contrato de Trabalho do Atleta Profissional de Futebol”.
Tem-se por objetivo determinar e explicar com base nestes parâmetros algumas características sobre o contrato de trabalho do jogador de futebol, concernentes a essa problemática.
No país do futebol, o desporto é noticiado e discutido em todos os principais jornais e redes de televisão do País, jogo por jogo, lance por lance, contratação por contratação, sendo objeto de inflamadas e exaustivas discussões. Neste contexto os atletas profissionais são mais que personagens de uma partida de futebol, para sua torcida são seus heróis.
A Clausula penal, objeto de estudo em espeque, pode-se dizer que , é uma multa
contratual devida para as hipóteses de descumprimento, rompimento ou rescisão pelo atleta, unilateralmente, de todos os contratos de atletas profissionais de todas as modalidade desportivas, desde que acordada, observando que não poderá ser cobrada na hipótese de indenização por formação, pois a multa é superior à obrigação principal, situação que o Código Civil veda (Lei nº 9.615/98, artigo 28).
Na esfera doutrinária, assim como na jurisprudencial, não há pensamento unívoco acerca da unilateralidade ou bilateralidade da clausula penal desportiva, prevista no artigo 28 da Lei 9615/98, a corrente relativa a aplicação unilateral, liderada por Álvaro Melo Filho e Domingos Sávio Zainagui, é predominante e cristaliza o espírito da particularidade do contrato de trabalho desportivo, ao sedimentar que a cláusula penal desportiva detém a teleologia de compensar as perdas e danos do investimento clubístico no exercício contratual, da atividade desportiva profissional, quando o contrato é rompido ante tempus, bem como evitar que haja uma migração total de talentosos jogadores brasileiros a troco de quantia irrisória, a maior fonte de renda das entidades de prática desportiva profissional. Corrente essa que tanto lutou para defender esta “bandeira” que conseguiu o respaldo jurisprudencial como veremos no decorrer do trabalho.
Por outra face, existe a vertente doutrinária minoritária, representada por Marcilio Krieger que contra argumenta a tese supramencionada, ao dizer que a cláusula penal é constituída de uma natureza especial indenizatória. E, por conseqüência, será devida por aquele que ensejou a resilição contratual, sendo um pacto adstrito à vontade das partes como tal, o contratante que cause prejuízo ao outro, deverá também quitar a indenização nos mesmos moldes valorativos.
2 BREVE RELATO SOBRE A EVOLUÇÃO LEGISLATIVA DO DESPORTO DE FUTEBOL NO BRASIL
Com o crescimento do futebol no país, fez-se necessário a criação de entidades que tratassem dos interesses dos desportistas e que organizassem as competições, pois outros esportes já possuíam suas federações.
Inúmeras foram as legislações desportivas que trataram do desporto brasileiro.
Merece destaque no nosso emaranhado legislativo, o Decreto-Lei 3.199, ordenamento de 1941, obra do respeitável do jurista João Lyra Filho.
Outras Legislações vieram com o passar dos anos, como a Lei 6.257/51 e os Decretos 81.102/77 e 82.877/77.
A lei nº 6.354/76 – a “lei do passe”, disciplinava a relação de trabalho entre o atleta profissional de futebol e as associações desportivas.
A Lei número 8.672, a "Lei Zico", de autoria do Secretário de Esportes Artur Antunes Coimbra, jamais teve aplicação, mas teve real influência na "Lei Pelé". Esta simplesmente copiou a maioria dos dispositivos daquela.
Mas foi em 1998, o ano de lançamento do vigente caderno legislativo desportivo nacional, com a Lei 9.615, o qual extinguiu a figura do “passe”.
3 DO CONTRATO DE TRABALHO DESPORTIVO
3.1 Definição e características
Segundo o saudoso professor Domingos Sávio Zainagui a definição do contrato de trabalho é:
O contrato de trabalho desportivo é aquele avençado entre atleta (empregado) e entidade de prática desportiva (empregador), através de um pacto forma, no qual resta claro o caráter de subordinação do primeiro em relação a este último, mediante remuneração e trabalho prestado maneira não eventual. Deve-se entender por formal como sendo o contrato de natureza escrita.
Portanto, é aquele pelo qual o praticante desportivo se obriga, mediante retribuição, a prestar atividade desportiva a uma pessoa singular ou coletiva que promova ou participe de atividades desportivas, sob a autoridade e a direção desta.
O famoso doutrinador Rodrigo Domingos Napier descreve detalhadamente o atleta profissional de futebol, senão vejamos:
É quem realiza exercícios físicos e táticos e treinamentos específicos de futebol, seguindo orientação de especialistas deste desporto, para aprimorar suas condições físico-técnicas; participadas competições de futebol, desempenhando as funções técnico-táticas que são atribuídas e segundo as orientações recebidas, para proporcionar divertimento ao público e alcançar, através de tentos e vitórias, os prêmios e ganhos oferecidos. Pode ser designado de acordo com a posição em que atua.
Assim, é a pessoa, que através de contrato de trabalho desportivo e após a necessária formação técnico-profissional, pratica uma modalidade desportiva como profissão exclusiva ou principal, auferindo por via dela uma retribuição.
O contrato de formação desportiva é celebrado entre uma entidade formadora (clube) e um formando (atleta), nos termos do qual aquela se obriga a prestar a este a formação adequada ao desenvolvimento da sua capacidade técnica e à aquisição de conhecimentos necessários à prática de uma modalidade desportiva, ficando o formando obrigado a executar as tarefas inerentes a essa formação.
As entidades formadoras são as pessoas singulares ou coletivas que garantam um ambiente de trabalho e os meios humanos e técnicos adequados à formação desportiva. Formando os jovens praticantes que, tendo cumprido a escolaridade obrigatória, tenham idades compreendidas entre os 14 e os 18 anos e tenham assinado o contrato de formação desportiva, tendo por fim a aprendizagem ou o aperfeiçoamento de uma modalidade desportiva.
4 CLÁUSULA PENAL DESPORTIVA: APLICABILIDADE UNILATERAL OU BILATERAL
4.1 Tipicidade da Cláusula Penal Desportiva
A cláusula penal, também chamada de cláusula indenizatória desportiva, tem sido muito discutida no meio desportivo, principalmente diante de situações de rescisão contratual de trabalho profissional no futebol e após polêmicas decisões do TST.
Vejamos abaixo a definição de cláusula penal desportiva nos ensinamentos do mestre Napier:
Cláusula penal, pode-se dizer, é uma multa contratual devida para as hipóteses de descumprimento, rompimento ou rescisão pelo atleta – unilateralmente – de todos os contratos de atletas profissionais de todas as modalidades desportivas, desde que acordada, observando que não poderá seu cobrada na hipótese de indenização por formação, pois a multa é superior à obrigação principal, situação em que o Código Civil veda (Lei nº 9.615/98, art. 28.
Esta cláusula está prevista no caput do art. 28 da Lei 9.615/98 (conhecida lei Pelé):
A atividade do atleta profissional, de todas as modalidades desportivas, é caracterizada por remuneração pactuada em contrato formal de trabalho firmado com entidade de prática desportiva, pessoa jurídica de direito privado, que deverá conter, obrigatoriamente, cláusula penal para as hipóteses de descumprimento, rompimento ou rescisão unilateral.
Anteriormente a esse regramento acima especificado, existia a “lei do passe” onde os atletas eram considerados patrimônio dos clubes que atuavam, somente sendo autorizadas suas transferências de um clube para outro mediante o pagamento do valor estipulado pelo “passe” do atleta. Esse foi um dos principais motivos da sua extinção, evitando com que atletas ficassem vinculados indefinidamente aos clubes e impossibilitados de exercer suas atividades desportivas, caso não fossem vendidos.
4.2 Valor da Cláusula Penal
Tendo em visto o que foi dito no tópico anterior, restou fixado a disposição de um limitador a referida cláusula com objetivo de inibir a rescisão antecipada do contrato, pela estipulação de quantias indenizatórias impagáveis, como podemos observar no parágrafo terceiro do art. 28, que dispõe: “O valor da cláusula penal a que se refere o caput deste artigo será livremente estabelecido pelos contratantes até o limite máximo de cem vezes o montante da remuneração anual pactuada.” Com isso o legislador busca um equilíbrio entre as partes garantindo que o atleta não abandone o clube sem uma justa compensação pelos investimentos e gastos realizados, bem como conferindo ao desportista liberdade de transferência a outra entidade de pratica desportiva, sem a necessidade do pagamento de valores exorbitantes.
Neste sentido o entendimento de Fábio Menezes de Sá: “na intenção de evitar arbitrariedade, ao se entender a proximidade dos termos racionalidade e razoabilidade, torna-se possível estabelecer um ponto comum entre a legalidade e a aceitabilidade”.
Cabe ainda mencionar que o parágrafo quarto do art. 28 submete a cláusula penal a um redutor automático, cumulativo e progressivo na proporção de 10%, aplicável no primeiro ano de contrato cumprido, 20% no segundo, 40% no terceiro e 80% no quarto ano, considerando que o prazo de contrato máximo permitido é de cinco anos, nos termos do art. 29, caput da Lei 9.615/98.
Esse redutor automático e progressivo resulta na aplicação de critérios razoáveis na liquidação da cláusula penal, inibindo a constituição desproporcional a liberdade de contratar do atleta, já que seria injusto o pagamento de 100% da cláusula penal se o mesmo já tivesse cumprido dois dos cinco anos, porventura, contratados.
Desta feita, a cláusula penal seria uma garantia ao clube empregador/investidor no que diz respeito ao cumprimento integral do contrato pelo praticante desportivo em substituição como já dito, ao antigo “passe”.
Contudo, para Zainagui, o atleta continua sendo lesado: “Parece-nos que a multa continua pesada; acabou o passe, mas ele continua de outra forma e a multa, pelo menos no momento, acaba sendo prejudicial para o atleta”.
Todavia, sabemos que na prática, o pagamento desta multa é efetuado pelo clube comprador e não pelo atleta que está sendo vendido.
4.3 Multa Rescisória
Há juristas que entendem, no entanto, que esta cláusula também deveria ser aplicada ao clube, em benefício do atleta, caso o mesmo rescindisse antecipadamente o seu contrato, o que será, adiante, objeto de análise mais acurada.
Já a multa rescisória, conforme art. 31 da Lei 9.615/98, dispõe:
A entidade de prática desportiva empregadora que estiver com pagamento de salário de atleta profissional em atraso, no todo ou em parte, por período igual ou superior a três meses, terá o contrato de trabalho daquele atleta rescindido, ficando este, livre para se transferir para qualquer outra agremiação de mesma modalidade, nacional ou internacional, e exigir a multa rescisória e os haveres devidos.
Estipulando uma multa rescisória, dispôs o parágrafo terceiro que: “Sempre que a rescisão se operar pela aplicação do disposto no caput deste artigo, a multa rescisória a favor do atleta será conhecida pela aplicação do disposto no art. 479 da CLT”.
Isso caracteriza a garantia de rescisão indireta do vínculo trabalhista do atleta que tiver atraso ou inadimplemento de seu salário por mais de três meses.
Observado o art. 479 da CLT, o clube teria que pagar o equivalente a 50% do salário relativo ao período restante do contrato, estabelecido entre as partes. Enquanto alguns juristas consideram que a cláusula penal se aplica a qualquer das partes (atleta ou entidade de prática desportiva) que provocarem a rescisão antecipada, a multa rescisória é pacificamente de exclusiva responsabilidade do empregador.
Diante disto, podemos observar que tanto a cláusula penal quanto a multa rescisória buscam evitar injustiças e prejuízos consideráveis à parte que não provocou a rescisão antecipada do contrato.
4.4 Análise Literal
Muito se tem discutido acerca da responsabilidade pelo pagamento da cláusula penal, quando do rompimento do contrato do atleta.
Alguns entendem que a entidade desportiva também é responsável pelo pagamento da referida multa quando der causa à extinção do contrato. Tal posicionamento se funda na interpretação literal e isolada do art. 28 da Lei nº 9.615/98, alhures mencionado.
Ocorre que tal dispositivo deve ser interpretado de forma sistemática, observado o que dispõem o artigo 31 e seu parágrafo terceiro da citada norma, também já mencionado.
Para fazermos a melhor análise da questão em comento, é necessário que se ressalte que a cláusula penal desportiva, em termos históricos, veio como uma compensação para os clubes de futebol pela extinção da chamada “lei do passe”. Vale dizer que, outrora, o passe do atleta pertencia ao clube e qualquer transferência implicava considerável compensação financeira para a entidade desportiva pela perda do atleta, muitas vezes formado, com altos custos, desde a sua adolescência.
A referida cláusula visa minimizar eventuais prejuízos a que estão hoje sujeitos os clubes em caso de não cumprimento ou cumprimento parcial do contrato por parte do atleta, bem como os custos que o clube teria com a contratação de outro profissional para substituí-lo, muitas vezes com o campeonato ou o torneio ainda em andamento, em caso de transferência para outra agremiação.
4.5 Da polêmica decisória do Tribunal Superior do Trabalho
No dia 01 de dezembro de 2004 foi decidido pelo TST, o Agravo de Instrumento no processo nº 1490/2002-022-03-40, movido pelo atleta Alexandre de Oliveira Silva contra América Futebol Clube, a qual se observa a seguir:
A C Ó R D Ã O
2ª Turma
JCHSP/me/ac
AGRAVO DE INSTRUMENTO. CONTRATO DE TRABALHO DE JOGADOR DE FUTEBOL. CLÁUSULA PENAL. REDUÇÃO DO VALOR EX OFFICIO. QUANTUM. Em face de aparente violação do artigo 413 do CCB/2002, merece provimento o agravo de instrumento para determinar o processamento do recurso de revista para melhor análise da matéria.
RECURSO DE REVISTA. CONTRATO DE TRABALHO DE JOGADOR DE FUTEBOL. CLÁUSULA PENAL. REDUÇÃO DO VALOR EX OFFICIO. QUANTUM. O artigo 413 do CCB/2002, nas hipóteses que elenca, permite ao juiz reduzir eqüitativamente o valor da cláusula penal ajustada entre os contratantes. No caso dos autos, fixada em cem vezes a anuidade salarial do jogador, tem-se que a redução para apenas uma remuneração mensal não observou a eqüidade exigida no dispositivo civil pátrio. Recurso de revista conhecido e provido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista nº. TST-RR-1490/2002-022-03-40.7, em que é recorrente ALEXANDRE DE OLIVEIRA SILVA e recorrido AMÉRICA FUTEBOL CLUBE.
O e. Tribunal da 3º Região, pelos vv. acórdãos de fls. 126-129 e 139, proveu o recurso ordinário do reclamante por entender que a cláusula penal prevista no artigo 28 da Lei 9.615/98 aplica-se tanto ao atleta quanto ao clube, reformando a r. sentença nesse aspecto. Analisando o valor da cláusula penal, fixada no equivalente a 100 vezes a anuidade salarial do atleta, considerou-o extravagante e, com base no artigo 413 do CCB de 2002, reduziu-o para o valor equivalente a uma remuneração mensal (salário + "direito de imagem" + média do valor recebido a título de "bicho e/ou premiações").
Inconformado, o reclamante interpõe recurso de revista às fls. 141-166, argüindo preliminar de nulidade por negativa de prestação jurisdicional e julgamento extra petita, insurgindo-se, ainda contra a redução do valor da multa. Por tudo, aponta divergência jurisprudencial e violação à lei e à Constituição Federal.
O recurso teve seu seguimento negado pelo r. despacho de fls. 175-176, que foi agravado de instrumento, conforme minuta de fls. 02-19.
O agravo foi provido para processar a revista denegada.
Sem remessa dos autos à d. Procuradoria-Geral do Trabalho, ante o que dispões o artigo 82, II, do RITST. (ANEXO A – DECISÓRIA PELA BILATERALIDADE)
Na mencionada decisão acima declinada, os Ministros da Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho mantiveram a decisão dos membros do Tribunal Regional do Trabalho da 3ª região, que aceitaram a tese do reclamante alegando que "a cláusula penal prevista no artigo 28 da Lei nº 9.615/98 aplica-se tanto ao atleta quanto ao clube". Assim, além da multa rescisória regulada pela CLT (50% do que receberia até o termo do contrato), também foi determinado o pagamento da cláusula penal.
Entretanto, não concordamos com a decisão do douto Julgador, aplicando a cláusula penal para o clube, bilateralmente, pelos motivos a seguir.
A cláusula penal aplica-se somente ao atleta, ou seja, se a rescisão ocorrer por iniciativa do clube, não terá ele que pagar o valor da cláusula penal. Um dos motivos encontra-se no parágrafo 5º do artigo 28 da Lei Pelé, que determina:
"§ 5º - Quando se tratar de transferência internacional, a cláusula penal não será objeto de qualquer limitação, desde que esteja expresso no respectivo contrato de trabalho desportivo."
Este dispositivo aplica-se somente ao atleta que rompe o contrato com objetivo de transferir-se para clube estrangeiro, já que é evidente que só o atleta pode transferir-se, e não o clube.
Mais adiante, o artigo 33 da Lei Pelé dispõe:
Cabe à entidade nacional de administração do desporto que registrar o contrato de trabalho profissional fornecer a condição de jogo para as entidades de prática desportiva, mediante a prova de notificação do pedido de rescisão unilateral firmado pelo atleta ou documento do empregador no mesmo sentido, desde que acompanhado da prova de pagamento da cláusula penal nos termos do art. 28 desta Lei.
Com uma simples leitura do artigo acima, percebe-se que a condição de jogo é dada ao atleta, "desde que acompanhada de prova de pagamento da cláusula penal". E esta parte final não deixa dúvidas de que a cláusula penal apenas é aplicada ao atleta, pois do contrário bastaria que o clube não a pagasse para que o atleta não tivesse condição de jogo, além de receber o que lhe seria devido.
Na mesma Lei, outro dispositivo, qual seja, o inciso II do artigo 57 da Lei Pelé, que dispõe:
Constituirão recursos para a assistência social e educacional aos atletas profissionais, ex-atletas e aos em formação, recolhidos diretamente para a Federação das Associações de Atletas Profissionais – FAAP:
II – um por cento do valor da cláusula penal, nos casos de transferências nacionais e internacionais, a ser pago pelo atleta;...
Desse modo a letra da lei retira qualquer dúvida de que a cláusula penal só se aplica ao atleta.
4.6 Divergência Jurídica
Sobre o assunto, assim se posiciona o nosso mestre Álvaro Melo Filho:
É importante aduzir que a cláusula penas desportiva (art. 28) é aplicável apenas ao atleta que "quebra" unilateralmente o contrato, pois no caso de esse rompimento ser de iniciativa do clube, aplica-se multa rescisória (art. 31) em favor do atleta. Quanto ao § 3º do art. 28 não fixar limite para avençar a cláusula penal nas transferências internacionais, deixa evidenciado que o transferido é o atleta, e não o clube, daí porque a cláusula penal incide exclusivamente sobre o atleta. Além disso, quando o art. 33 refere-se a condição de jogo (conceito aplicável tão-somente a atleta, e nunca a clube), que só será concedida com a "prova do pagamento da cláusula penal", reforça o entendimento de que a cláusula penal incide apenas sobre a resolução unilateral pelo atleta profissional. (...) o mesmo legislador no art. 57, II, dissipa qualquer dúvida ao grafar que cláusula penal será paga pelo atleta. Assim, vê-se, em face de interpretação sistemática, que a cláusula penal desportiva é devida somente pelo atleta ao clube nos valores pactuados no respectivo contrato profissional desportivo.
E, mais adiante, continua:
Aliás, é preciso atender à finalidade visada pelas partes ao estipularem a cláusula penal desportiva, que é uma compensadora das perdas e danos que o clube sofrerá em face do não-cumprimento ou cumprimento parcial, pelo atleta, do contrato de trabalho desportivo profissional. Vale dizer, a cláusula penal, na esfera desportiva, dotada de colorações e conotações especiais, tem em mira compensar o custo que o clube terá com a contratação de outro atleta, no mínimo com a mesma qualidade técnica, para substituir aquele atleta que, unilateral e desarrazoadamente, recusa-se a cumprir o pacto laboral, muitas vezes abrindo uma lacuna de difícil preenchimento para o conjunto da equipe.
No mesmo sentido, Domingos Sávio Zainaghi, para quem “a cláusula penal, a nosso ver, e desde sua introdução na legislação, só é devida pelo atleta quando este rescindir o contrato”.
Em outra interpretação, parte da doutrina defende a bilateralidade da cláusula com base nos princípios da isonomia (art. 5º, caput da Constituição Federal), da proteção ao trabalhador, da hipossuficiência, do princípio do in dúbio pro operário e da razoabilidade.
Sobre a natureza da cláusula penal, é necessário destacar o entendimento do doutrinador que encabeça a fileira da corrente ampliativa, Marcílio Ramos Krieger:
Parto do princípio de que a cláusula penal tem uma característica híbrida: por nascer do contrato de trabalho, sendo dele um acessório, tem natureza trabalhista; mas, porque se refere especificamente à inexecução de uma obrigação (o contrato de trabalho), tem natureza essencialmente indenizatória. E é exatamente por ter característica indenizatória que a cláusula penal é devida por aquele que deu causa ao descumprimento ou rescisão unilateral, na dicção da parte final do caput do art. 28.
Nesse sentido, o despedimento sem justa causa gera ao atleta, danos que devem ser indenizados pelo empregador. Então, se esta cláusula tem como função o estabelecimento antecipado de um quantum indenizatório, deve ser paga ao atleta quando este sofrer o despedimento imotivado. A perda do emprego, além de gerar uma privação de receitas, os salários, gera ao atleta o prejuízo de não mais poder expor suas qualidades ao público e a outros empregadores.
Para esta corrente, ainda que porventura tenha sido outra a intenção do legislador, o que ficou expresso no art. 28 da Lei 9.615/98 é a obrigação de pagamento da cláusula penal por qualquer das partes que der causa à extinção do contrato. Não há, ao menos na interpretação literal do texto legal, qualquer indicação contrária à bilateralidade de seu alcance, ou seja, de ser a cláusula, destinada a um só dos contratantes.
4.7 Do novo entendimento do Tribunal Superior do Trabalho, o qual corrobora com o defendido neste trabalho:
Para tanto, após momento de grande confusão e discussões sobre o tema, o TST colocou um ponto final nessa polêmica e vem decidindo conforme a corrente que defende a unilateralidade da cláusula penal desportiva, como podemos aquilatar a frente:
A C Ó R D Ã O
3ª Turma
RMW/nks/rlc
RECURSO DE REVISTA. CLÁUSULA PENAL. ART. 28 DA LEI 9615/98. DESCUMPRIMENTO DE DEVERES CONTRATUAIS. DESTINATÁRIO DA NORMA. OBRIGAÇÃO IMPOSTA SOMENTE AO ATLETA. A jurisprudência desta Corte é no sentido de que a cláusula penal, prevista no art. 28 da Lei 9615/1998, tem como exclusivo destinatário o atleta. Precedentes da SDI-I/TST.
MULTA DO ART. 479 DA CLT. Reconhecido pela Corte de origem o direito do autor ao pagamento da indenização prevista no art. 479 da CLT, no valor de metade da remuneração a que o autor teria direito até o final do contrato, não há falar em violação do referido artigo celetista.
Recurso de revista integralmente não conhecido.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Recurso de Revista n° TST-RR-238000-52.2006.5.07.0003, em que é Recorrente PATRIK FABIONN LOPES e
Recorrido FORTALEZA ESPORTE CLUBE.
O Tribunal Regional do Trabalho da 7ª Região, pelo acórdão das fls. 471-6, complementado às fls. 594-600, deu parcial provimento ao recurso ordinário do autor para incluir na condenação o pagamento de honorários advocatícios.
Interpõe recurso de revista o autor (fls. 491-500). Fundamentado o recurso nas alíneas -a- e -c- do art. 896 da CLT.
Despacho positivo de admissibilidade do recurso de revista (fl. 630-3).
Sem contrarrazões (certidão da fl. 638).
Feito não remetido ao Ministério Público do Trabalho (art. 83 do RITST).
É o relatório. (ANEXO B – DECISÓRIA PELA UNILATERALIDADE)
Acredito que, posicionou-se o TST, da melhor maneira possível, pois ainda que vejamos os clubes de futebol como entidades ricas e poderosas, essa não é bem a nossa realidade, e nem sempre o atleta é o lado mais fraco em um litígio trabalhista.