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Contratação de serviços de supervisão e fiscalização de obras com eficiência e celeridade

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5. DUAS SOLUÇÕES PARA GARANTIR A QUALIDADE E A EFICIÊNCIA

A primeira solução que se apresenta é, talvez, a mais óbvia, mas também a mais complexa. É necessário conceber regras para uma licitaçãolegítima, por técnica e preço, que atenda as exigências da jurisprudência do Controle e, mais ainda, que garanta a efetividade.

A equação do maior tempo gasto na realização do processo licitatório torna-se vantajosa em face da maior eficiência na execução dos serviços. Deve-se ter em mente o tempo gasto na conclusão do empreendimento, e não das contratações necessárias para a sua execução.

A segunda solução é a utilização, quando cabível, da modalidade mais em voga no cenário das licitações: o Regime Diferenciado de Contratações – RDC.

O RDC, além de trazer regras que tornam o processo mais célere e eficiente, permite que a Administração adote regras e procedimentos que garantem uma avaliação criteriosa das propostas técnicas, sem perda de muito tempo.

É claro que o âmbito deste trabalho não nos permite exaurir a matéria que as duas soluções acima proporcionam. No sentido de contribuir com os profissionais dedicados ao tema, contudo, especialmente aqueles encarregados da dura missão de concretizar os programas governamentais de desenvolvimento, apresentamos, a seguir, os mais importantes aspectos que, no nosso entendimento, podem contribuir significativamente para o sucesso dessa empreitada.

1.5. Utilização do tipo técnica e preço – é possível uma avaliação técnica do licitante, totalmente objetiva?

A redação da Lei de Licitações não contribui com o tipo de licitação técnica e preço. O art. 46, §1º, inciso I, que trata desse tipo de licitação, estabelece que para o julgamento das propostas técnicas os critérios devem ser “definidos com clareza e objetividade no instrumento convocatório”.

Do mesmo modo, os artigos 44 e 45 da Lei estabelecem expressamente a necessidade do critério objetivo para julgamento das propostas.

A preocupação do legislador foi tamanha com a obrigatoriedade do critério objetivo que até mesmo quando se trata da possibilidade de avaliação das metodologias de execução, para obras complexas e de grande vulto, está inserida a necessidade de critérios objetivos de julgamento.[15]

Nesse sentido, o grande vilão das licitações pelo tipo técnica e preço tem sido a necessidade de definição de critérios objetivos para o julgamento das propostas.

Mesmo que ainda exista boa vontade e simpatia com esse tipo de licitação, não há como fugir desse importante dilema: como estabelecer critério objetivos para o julgamento de propostas eminentemente técnicas, onde o que se pretende avaliar é a melhor aptidão dos licitantes para a execução de determinado objeto? Como julgar quem é melhor sem o mínimo de subjetividade na escolha?

A Lei define os critérios de avaliação das propostas técnicas da seguinte maneira: (i) capacitação e a experiência do proponente; (ii) qualidade técnica da proposta, compreendendo metodologia, organização, tecnologias e recursos materiais a serem utilizados nos trabalhos; e (iii) qualificação das equipes técnicas a serem mobilizadas para a sua execução.[16]

Dois problemas decorrem dessa definição.

5.1.1. Avaliação de proposta técnica não é repetição da qualificação técnica prevista na fase de habilitação

O primeiro problema é quanto à capacitação e experiência do proponente e das equipes técnicas a serem mobilizadas.

Em muito se confunde esse critério de avaliação como uma espécie de repetição da qualificação técnica, ou como uma qualificação técnica mais rigorosa. Ou seja, faz-se uma avaliação da qualificação técnica da empresa e dos profissionais sem as limitações inseridas no art. 30, tais como número mínimo de atestados, limitações de tempo, de espaço, etc.

A repetição torna um tanto inútil a avaliação da proposta técnica no certame, pois a avaliação de atestados de experiência anterior já está superada na fase de habilitação.

Já uma exigência de atestados de experiência anterior pode contribuir com a avaliação da proposta técnica sim. Por exemplo, pontuar uma experiência mais próxima do que 50% do quantitativo exigido na habilitação ou até mesmo comprovações de experiência anterior em condições de prazo, duração e localidade podem ser determinantes na qualidade técnica do licitante para executar o que se pretende executar.

Por exemplo, para a contratação dedeterminados serviços de longa duração, o próprio TCU tem admitido que se estabeleçam exigências de atestados de experiência anterior com limitações de tempo mínimo de duração, como requisito de habilitação[17] e pontuação[18].

O que não pode ocorrer nesse tipo de avaliação é que se estabeleçam exigências de comprovação de experiência anterior em condições excessivamente rigorosas e sem nenhum amparo técnico razoável. Isso dá origem a critérios subjetivos antijurídicos, na medida em que ofendem o princípio da busca pela proposta mais vantajosa – o que defendemos ser o imponderável axioma das contratações públicas.

5.1.2. Avaliação da qualidade técnica da proposta com critérios lacunosos de julgamento

A avaliação da qualidade técnica da proposta, muitas vezes, representa outro grave problema nas licitações do tipo técnica e preço.

Os critérios de avaliação da proposta devem ser ligados ao objeto em licitação. Assim, comumente avalia-se o conhecimento dos objetivos da Administração por parte do licitante, o conhecimento da região e do local onde serão executados os serviços por meio de um memorial descritivo.

O fato é que quando se avalia esse tipo de conhecimento, especialmente por meio de memorial descritivo ou outras formas textuais de exposição de conhecimento, é inevitável a subjetividade. Note-se que a pontuação desse tipo de conhecimento é realizada por notas estabelecidas previamente pelo edital, conforme critérios também previamente estabelecidos pelo edital – tudo a fim de afastar a subjetividade do julgamento. Exemplo:

a) estabelece-se o objeto da avaliação na proposta – “tecnologias empregadas”;

b)  estabelece-se o critério de julgamento – “informações e análises completas sobre o tema, com abordagem coerente e objetiva, padrão de apresentação adequado”; e

c) estabelece-se a pontuação – “zero para quem não atender o quesito, 5 para quem atender parcialmente o quesito e 10 para quem atender plenamente o quesito”.

Não afirmamos que os critérios definidos acima estão totalmente equivocados. Há que se reconhecer, no entanto, que tanto os critérios de julgamento acabam ficando muito vagos, como a pontuação estabelecida se ampara em conceitos onde a subjetividade é inafastável.

Por exemplo, no momento de formular uma proposta técnica com base no critério acima desenvolvido, o que representaria uma informação completa, com abordagem coerente e objetiva sobre as tecnologias empregadas em um serviço de engenharia consultiva? O que representaria “atender parcialmente” esse critério?

Assim, não há como negar razão ao Controle quando questiona a subjetividade em uma licitação do tipo técnica e preço, especialmente, considerando o fato de que, em um certame acirrado, a pontuação parcial em apenas um quesito pode significar a vitória de uma empresa ou de outra.

A experiência jurídica confirma que a utilização de conceitos vagos, lacunosos, na norma, acarreta insegurança jurídica, pois abre espaço irrestrito para interpretações diversas para casos semelhantes. Essa insegurança jurídica dá ensejo à iniquidade no julgamento – o que não é desejável em uma licitação pública.

5.1.3. Subjetividade e motivação – uma solução para a legitimidade do procedimento

Uma solução viável para preservar a legitimidade desse tipo de julgamento não pode estar voltada exclusivamente para a definição dos critérios de avaliação das propostas técnicas.

A uma, porque é inevitável a subjetividade em um julgamento de proposta técnica. Como demonstramos, pretender a objetividade estrita nesse tipo de licitação corrompe-o a uma mera repetição da qualificação técnica. Pior, com a inserção de critérios de avaliação que naquela etapa seriam considerados abusivos, porquanto desnecessários.

A duas, porque, nesse tipo de licitação, é desejável alguma subjetividade por parte da Administração Pública, a fim de que esta possa efetivamente selecionar aquela empresa que tem maior qualidade técnica para a execução dos serviços ou da obra pretendida.[19] Ora, se o legislador abre espaço para considerar no julgamento do certame a proposta técnica dos licitantes, é óbvio que lhe parece importante considerar esse elemento de forma expressiva no certame – não meramente protocolar.

Assim, critérios como “melhor abordagem”, “utilização de tecnologias mais adequadas”, “emprego de metodologia mais eficiente de execução” devem ser avaliados pela Administração no certame, por mais subjetividade que tais critérios possam implicar no julgamento.

A solução que identificamos, portanto, deve abrangera definição dos critérios de julgamento, de modo a torná-los razoáveis, mas também preocupar-se com a definição razoável e adequada dos julgadores e da forma de julgamento.

A subjetividade no julgamento desse tipo de licitação somenteécontrolável na medida em que se impõe que a avaliação das propostas seja realizada por equipe técnica também especializada e que cada pontuação seja devidamente motivadano processo.

Ao contrário do que muitos pensam, o preenchimento de tabelas com pontuações pré-definidas não soluciona a subjetividade excessiva na licitação. Na verdade, a impulsiona, na medida em que a comissão não se obriga a justificar porque uma empresa atingiu cinquenta por cento da questão, ao passo que a outra atingiu cem por cento.

A motivação do ato administrativo é importante porque é o único aspecto controlável, de modo que, exigindo da comissão um julgamento técnico e motivado, todas as partes do processo ficarão confortáveis. Os licitantes saberão os motivos das suas notas e das notas dos concorrentes, e, assim, poderão se insurgir contra o resultado de maneira transparente.

A qualificação dos membros da comissão que procederá com o julgamento das propostas também é importante, poisassim será possível atribuir as notas com base técnica, sem riscos de futuros questionamentos por parte dos órgãos de controle.

Por fim, os órgãos de controle ficam mais balizados na análise do processo, pois dali já podem avaliar se a licitação foi julgada com critérios técnicos razoáveis ou não.

Nesse sentido, defendemos que a expressão legal mais correta não seria “critérios objetivos”, pois essa exigência é irreal. No intuito de dar maior segurança jurídica aos gestores responsáveis pela condução de processos licitatórios, o ideal seria impor que os editais de licitação do tipo técnica e preço estabeleçam a obrigatoriedade de que “as propostas técnicas sejam avaliadas por critérios técnicos vinculados ao objeto do certame, devidamente justificados”.

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Em complemento, seria louvável que o edital estabelecesse a necessidade de que a “pontuação técnica atribuída nas propostas dos licitantes, deve ser acompanhada da motivação expressa pela equipe avaliadora”.

5.1.4. Definindo critérios de pontuação técnica mais adequados

Embora a redação da Lei de Licitações não tenha sido muito precisa, é verdade que o art. 46, §1º, inciso I, destaca importantes aspectos a serem considerados no julgamento das propostas técnicas – tornando o procedimento mais transparente.

Esse dispositivo estabelece que a avaliação das propostas técnicas poderá conter critérios que considerem “a capacitação e a experiência da proponente, a qualidade técnica da proposta e a qualificação das equipes técnicas a serem mobilizadas para sua execução”.

A capacitação e a experiência da proponente e a qualificação de suas equipes técnicas não se confunde com os requisitos de habilitação para o certame, por mais que a redação induza a esse entendimento.

É que como a habilitação é um requisito eliminatório, a própria Constituição e a lei adotaram postura mais rigorosa quanto aos limites dessas exigências. Já no julgamento da proposta técnica, como se trata de uma etapa classificatória e dentro de um contexto de avaliação mais criterioso, é possível que a Administração estabeleça requisitos de avaliação mais robustos, desde que tenham aderência ao objeto licitado e representem, efetivamente, um ganho de eficiência para o contrato.

Nesse âmbito de avaliação, é possível pontuar, por exemplo, tempo de experiência e quantidade de projetos semelhantes já executados pelo proponente. Qualificações profissionais, como títulos de especialização, também podem ser avaliados na pontuação técnica.

É no terceiro critério sugerido pelo legislador, contudo, que reside a maior possibilidade de ganho na avaliação das propostas técnicas. Note-se que dispõe a lei sobre avaliação da qualidade da proposta técnica compreendendo “metodologia, organização, tecnologias empregadas e recursos materiais a serem utilizados nos trabalhos”.

Neste ponto, além de se poder acrescentar grande ganho de qualidade na contratação, a Administração terá mais facilidade para estabelecer critérios mais objetos de avaliação. Por exemplo, é possível que se estabeleça como critério de pontuação a utilização de tecnologias que impliquem em maior durabilidade, menor consumo de energia ou de outros recursos naturais. Recursos materiais que utilizem insumos recicláveis ou que permitam algum outro tipo de aproveitamento.

Todos esses critérios são avaliados de forma bastante objetiva e tem efeito direto na qualidade do licitante e do produto ou serviço por ele ofertado.

1.6. A utilização do Regime Diferenciado de Contratações – maior liberdade para definição de critérios de seleção dos licitantes

Com o advento da Lei Federal nº 12.462, de 04 de agosto de 2011, foi instituído o Regime Diferenciado de Contratações Públicas, com foco inicial nos grandes eventos esportivos que serão sediados no Brasil. Posteriormente, esse regime foi ampliado para as obras do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC, de iniciativa do Governo Federal.[20]

Não é foco deste trabalho uma explanação mais detalhada sobre as características desse regime, mas é cabível que apontemos algumas características especificamente voltadas para o nosso objetivo – tornar mais eficiente a forma de contratação de serviços de supervisão e fiscalização de obras públicas.

5.2.1. Redução de tempo na realização do procedimento – inversão de fases e unificação da fase recursal

Uma grande desvantagem do tipo de licitação técnica e preço é a necessidade de maior tempo para a realização dos julgamentos. Há que se fazer um exame criterioso das propostas técnicas das empresas, além das fases de habilitação e de julgamento do preço.

Com o RDC, a unificação da fase recursal é um elemento que dá maior celeridade ao processo licitatório, pois, especialmente no tipo técnica e preço, elimina a perda de prazos com duas fases recursais desnecessárias, que podem ser superadas ao final do procedimento.[21]

A unificação da fase recursal dá considerável ganho de celeridade para o processo.

5.2.2. Maior aderência às regras do setor privado

O RDC permite a aplicação subsidiária da Lei Federal nº 8.666/1993 e traz em sua redação importantes menções às regras do setor privado, que podem contribuir substancialmente para a melhoria na seleção do contratado.

Um exemplo disso é a expressa menção do art. 4º, onde se estabelece como diretriz do procedimento “condições de aquisição, de seguros e de pagamento compatíveis com as do setor privado, inclusive mediante pagamento de remuneração variável conforme desempenho”.

5.2.2.1. Condições de garantia como critério de seleção de qualidade

As regras de seguros e garantias no setor privado são muito mais rigorosas do que as estabelecidas na Lei Federal nº 8.666/1993.Por exemplo, no setor privado, normalmente se exige uma garantia maior do que 5 a 10% do valor do contrato – o que seria vedado pelo art. 56, §2º, da Lei de Licitações.

Essa permissibilidade, além de dar maior segurança quanto à execução do objeto licitado, é um excelente parâmetro de avaliação das licitantes. Notem que, para obter garantias em patamares de 20%, chegando a até 100% do valor do contrato, a empresa licitante terá que obter uma reputação irretocável no mercado, pois o risco financeiro da operação de seguro será bem maior para a própria seguradora.

Assim, o simples fato de a empresa apresentar uma garantia de execução em patamar mais elevado já servirá como excelente demonstração de que se trata de uma empresa séria e de qualidade.

5.2.2.2. Pagamento variável conforme o desempenho da contratada

Dispõe o art.10 do RDC que nas contratações de obras e serviços de engenharia “poderá ser estabelecida remuneração variável vinculada ao desempenho da contratada, com base em metas, padrões de qualidade, critérios de sustentabilidade ambiental e prazo de entrega”.

Essa regra permite que a Administração incentive a qualidade na prestação dos serviços, inclusive com a previsão de bonificações, ao mesmo tempo em que desestimula a má execução, com possibilidade de retenções e glosas de valores a depender do desempenho do contratado.

5.2.3.Possibilidade de julgamento de propostas alternativas no tipo técnica e preço

Uma inovação relevante do RDC é a permissão de que os licitantes apresentem propostas com metodologias alternativas de execução.

Dispõe o art. 20, §1º, inciso II, que o tipo técnica e preço será utilizado nos projetos e serviços que“possam ser executados com diferentes metodologias ou tecnologias de domínio restrito no mercado, pontuando-se as vantagens e qualidades que eventualmente forem oferecidas para cada produto ou solução”.

Ou seja, é possível que se avalie diferentes soluções técnicas no mesmo certame, pontuando-se cada vantagem aferida. Essa avaliação é essencial ao processo de seleção por técnica e preço, pois é o critério decisivo para selecionar o melhor licitante, dentro da necessidade da Administração.

Será possível alcançar, inclusive, alternativas de eficiência e economia não pensadas pela Administração na concepção inicial do objeto.

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Sobre o autor
Álvaro Luiz Miranda Costa Júnior

Advogado na Jacoby Fernandes e Reolon Advogados Associados.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COSTA JÚNIOR, Álvaro Luiz Miranda. Contratação de serviços de supervisão e fiscalização de obras com eficiência e celeridade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3704, 22 ago. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25155. Acesso em: 25 abr. 2024.

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