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O dilema de Creonte e o Ministro Celso de Mello

16/09/2013 às 12:22

Resumo:


  • Na peça Antígone, de Sófocles, o rei Creonte enfrenta o dilema de manter a proibição do sepultamento de Polinice e o encarceramento de Antígone, o que resulta em tragédias familiares.

  • Alertado por Tirésias, Creonte decide libertar Antígone e honrar Polinice, mas as Fúrias e os Deuses não aceitam suas decisões, resultando em mortes trágicas na família real de Tebas.

  • Em um ensaio comparativo, o dilema jurídico enfrentado pelo Ministro Celso de Mello, no caso dos embargos infringentes da Ação Penal 470, é equiparado ao dilema vivido por Creonte, com desfechos incertos e consequências trágicas.

Resumo criado por JUSTICIA, o assistente de inteligência artificial do Jus.

A decisão sobre o cabimento ou não dos embargos infringentes na ação penal que julga o mensalão está nas mãos do ministro Celso de Mello.

Em Antígone, de Sófocles, podemos encontrar o rei de Tebas, Creonte, vivendo um dos dilemas mais famosos da literatura clássica: manter ou não a proibição do sepultamento dos restos mortais de Polinice, traidor da pátria, bem como o encarceramento subterrâneo da bela Antígone, que ousou desobedecê-lo; condenações essas que seriam castigadas pelos deuses com a morte do seu único herdeiro vivo, o jovem Hémon.

Naquela obra imortal, depois de alertado pelo velho Tirésias, em famoso trecho que sempre deveria ser citado com destaque em ações rescisórias[1], o rei Creonte vive momentos de indecisão até que resolve por fim ao seu dilema, determinando a libertação de Antígone - noiva do seu filho Hémon – e que fosse erigido um túmulo para honrar os restos mortais de Polinice.

As Fúrias, deusas vingadoras, e os próprios Deuses, porém, não aceitaram as titubeações de Creonte, e por conta da profanação do cadáver de Polinice e do encarceramento em túmulo da bela Antígone, que se enforcou na sua prisão subterrânea, nada fizeram para impedir que Hémon tirasse a sua vida, sob o olhar aflito de Creonte, com a própria espada paterna. E mais: a esposa do já desgraçado Creonte, ao saber da morte do filho, também se suicida.

Esse intróito é necessário para colocarmos, num ensaio comparatista, os contemporâneos personagens no palco atual: o Ministro Celso de Mello, respeitadíssimo – assim como Creonte - decano do e. Supremo Tribunal Federal, vivencia, como o rei de Tebas, o dilema jurídico mais palpitante dos últimos tempos. Em suas mãos, em seu decidir, paira o destino de pessoas, sombras dos homens que foram um dia, que como Polinice, traíram sua pátria.

Se decidir sobre o cabimento de embargos infringentes no bojo da Ação Penal nº 470, o Ministro Celso de Mello estará honrando a Constituição Federal, preservando seu rebento exarado publicamente em agosto de 2012? Ou estará dando à Carta Magna o mesmo destino da bela Antígone, encarcerando-a viva nos subterrâneos das inúmeras possibilidades recursais, ao mesmo tempo em que deixa insepultos os restos mortais dos homens de outrora?

Os embargos infringentes garantem aos réus um desfecho mais digno aos seus despojos mortais ou prolongarão ainda mais a exposição em praça pública dos cadáveres viventes, sujeitos às aves e cães, que a toda hora arrancam sem misericórdia e abocanham famintos mais um pedaço das carnes já sem vida dos acusados?

 Ao que tudo indica e assim antevejo, o Ministro Celso de Mello decidirá seu dilema contemporâneo pensando salvar seu querido Hémon, consentindo no cabimento dos embargos infringentes, mas não pestanejará em acatar – também – o encarceramento imediato dos condenados, como pedirá a Procuradoria Geral da República em ato contínuo ao desdobramento da próxima semana.

O dilema de Creonte, vivido pelo Ministro Celso de Mello, em verdade não tem solução simples, que reste impune. Qualquer que seja sua decisão, haverá conseqüências graves e inflexivelmente trágicas, pois “não é lícito aos mortais evitar as desgraças que o destino lhes reserva!”.

Penso que mesmo que dê com uma mão (a esperança) e tire com a outra (a liberdade), numa inglória tentativa de agradar tanto aos gregos como aos troianos, o Ministro Celso de Mello sofrerá as angústias e o isolamento inerente aqueles que detêm o poder de decidir destinos, vidas.

Como Tirésias, presto atenção nos presságios e busco em oráculos os signos que se anunciam para o futuro: “Mais algum tempo, e angustiosos lamentos de homens e mulheres se ouvirão neste palácio! Contra ti já se erguem as cidades irritadas, cujos altares estão poluídos pelas exalações dos cadáveres que não receberam sepultura...”.


Nota

[1] “O erro é comum entre os homens: mas quando aquele que é sensato comete uma falta, é feliz quando pode reparar o mal que praticou, e não permanece renitente.”

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Sobre o autor
Adriano José Borges Silva

Advogado em Brasília (DF).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Adriano José Borges. O dilema de Creonte e o Ministro Celso de Mello. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3729, 16 set. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25300. Acesso em: 22 dez. 2024.

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