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A relação entre a teoria institucional e a teoria da argumentação jurídica:

reflexos no processo jurisdicional democrático

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25/04/2014 às 15:15
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O desenvolvimento de uma teoria da argumentação jurídica passa a ser necessidade de primeira ordem para viabilizar uma procura racional e intersubjetivamente controlável da melhor resposta para os ‘casos difíceis’ do Direito, a fim de proporcionar uma valorização da razão prática no âmbito jurídico. Isso demanda dos intérpretes, em especial dos juízes, uma justificação razoável de suas decisões.

O processo não é um instituto novo. O Direito Processual ganhou autonomia em meados do século XIX, momento em que passou a ser visto como ciência e possuir o processo como seu objeto próprio. Esse ramo já conquistou suficiente maturidade para ser “pólo de irradiação de idéias e coordenador de diversos institutos, princípios e soluções” e, dessa forma, também preocupar-se em encontrar soluções adequadas para os problemas jurídicos sociais e políticos que assolam a atualidade.

Cândido Rangel Dinamarco afirma que a instrumentalidade é “o núcleo e a síntese dos movimentos pelo aprimoramento do sistema processual”. O processo deixa de ser puramente técnico, para ser instrumento permeável de valores presentes em toda ordem político-constitucional e jurídico-material, por estar imerso no universo axiológico da sociedade a que se destina1.

Tal instrumentalidade demanda “suficiente justificação lógico-jurídica para essa indispensável dinâmica do sistema e permeabilidade às pressões axiológicas exteriores”, a fim de possibilitar as adequações do sistema processual para conquistar a desejada efetividade a partir das “mutações políticas, constitucionais, sociais, econômicas e jurídico-substanciais da sociedade”2.

Nesse sentido, é indiscutível a relação do processo com a Constituição, a qual assegura “a conformação dos institutos do direito processual e o seu funcionamento aos princípios que descendem da própria ordem constitucional”. Dinamarco afirma que

O processualista moderno adquiriu a consciência de que, como instrumento a serviço da ordem constitucional, o processo precisa refletir as bases do regime democrático, nela proclamados; ele é, por assim dizer, o microcosmos democrático do Estado-de-direito, com as conotações da liberdade, igualdade e participação (contraditório), em clima de legalidade e responsabilidade.3

Diante dessas considerações acerca da instrumentalidade do processo e dos influxos que recebe dos valores e princípios que existem no ordenamento jurídico como um todo, bem como considerando a importante tarefa do operador do direito de dar efetividade a esse processo, principalmente por meio da correta compreensão do Direito, passa-se a analisar a relação da teoria institucional com a teoria da argumentação jurídica e a importância de ambas no atual estágio do processo civil contemporâneo.

Ressalte-se que a análise será feita de forma perfunctória e sem a pretensão de aprofundar o estudo de tais teorias, que por si só já renderam grandes debates e obras completas.


Teoria Institucional e Sua Evolução

Inicialmente, para se tratar da atual fase do processo, faz-se necessário compreender dentro de que sistema este instituto se insere e produz seus efeitos práticos, uma vez que para se entender a parte é de suma importância que se entenda o todo.

Como apontado, com a evolução da ciência processual, não é possível analisar “processo” sem que se compreenda previamente a organização jurídica constitucional, tendo em vista que esta se caracteriza como um invólucro desse micro-sistema e que, além disso, incorpora todos os valores, princípios e regras que atuam na sociedade.

Inicia-se, pois, a análise a partir da noção de constituição e da própria evolução de seu conceito. Com efeito, com o desenvolvimento do Estado, a constituição deixa de ser moral4 e de arranjo institucional natural5, para ser uma constituição política e de arranjo institucional artificial, no sentido de ser algo criado pelo homem e, portanto, sujeito a sua vontade.

Entretanto, nesse Estado “artificial”, em que tudo depende da vontade humana, a sujeição das pessoas aos seus próprios interesses particulares, imbuídos de sentimentos e paixões, passa a ser um problema. Implementou-se, pois, um “governo representativo”, com a ampliação da igualdade – por meio do voto universal – e da liberdade – por meio da democracia. Ademais, a criação do sistema de check and balances serviria para limitar eventual abuso por parte dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.

A teoria institucional clássica, portanto, surge como uma forma de estruturar o Estado, no sentido de coibir qualquer abuso do poder por parte daqueles que o detinham. Assim, o Estado de Direito era fundado em instituições bem definidas e tinham como substrato normas jurídicas claras para regulação das relações sociais e contenção do poder.

A necessidade do sistema representativo, porém, não exclui a necessidade de vigilância ativa e constante quanto ao poder conferido aos representantes. Benjamin Constant alerta que “o perigo da liberdade moderna está em que, absorvidos pelo gozo da independência privada e na busca de interesses particulares, renunciemos demasiado facilmente a nosso direito de participar do poder político”6.

Desta forma, a democratização da vida política e a extensão das tarefas públicas ocasionaram a compenetração entre Estado e sociedade, com uma redescoberta da sociedade civil, a partir da noção de que o Estado nada mais é que uma especial dimensão da sociedade. Assim sendo, como aponta Rogério Ehrhardt Soares, procura-se que “esse Estado não seja, como no início, um instrumento do poder sobre a sociedade, mas a hipóstase política da sociedade”.

Isso significa que “acima de cada constituição formal, afirmam-se princípios constitucionais materiais apoiados na tradição duma certa cultura e demonstrados na sua experiência histórica”, que dão sentido e justificação a essa constituição. Tem-se, pois, que a “constituição deixou de ser, assim, o simples pressuposto lógico-formal do direito positivo ordinário”, para também se definir como “ordem ordenante do ser comum, à espera de sua diária atualização”.

A constituição, portanto, como “tentativa de participação no ser autêntico da comunidade”, não deve funcionar como um “código de vida da comunidade”. Conforme os ensinamentos de Rogério Ehrhardt Soares:

Cada constituição deve preservar aquela abertura que lhe garanta, sob o domínio dos princípios fundamentais que colheu na experiência histórica do povo, a possibilidade de se ir adaptando às mudanças técnicas, econômicas e sociais que o processo político da comunidade venha a manifestar.7

No Estado moderno, onde se cria uma constituição política, “atribui-se ao homem a capacidade de identificar, dentro de um mundo de objetos ideais, o modelo de Estado perfeito segundo a razão”, de forma que as “lucubrações dos homens se transmitam a acontecimentos políticos histórico-concretos”8.

Nesses termos, apesar da “razão institucional” ter sido inicialmente vista como uma crença de que se pode modificar uma nação por meio de um “arranjo constitucional”, solucionando os problemas derivados da natureza humana, como interesses e paixões, com a evolução do conceito de constituição foi possível constatar que o arranjo formal proposto não resolve todos os problemas.

Com efeito, novas tensões, que sequer podem ser previstas em sua integralidade, sempre surgirão em sociedades complexas, o que demonstra que a constituição – como ordenadora da coletividade atual e futura – é limitada e, justamente por isso, não pode ficar imobilizada, a fim de se possa alcançar em cada momento seu ponto de equilíbrio.

Diante desses fatos, naturalmente houve uma evolução da teoria institucional, que para efeitos desse estudo será chamada de teoria institucional moderna, principalmente por meio das obras de Maurice Hauriou e Santi Romano, que reconheceram que o Direito como tal não está contido tão somente na ideia de norma jurídica.

O Direito, visto como o conjunto de normas jurídicas que regula as relações sociais, é apenas parte da realidade. O todo envolve a noção de Direito como “organização, estrutura e posição da mesma sociedade em que se desenvolve e que ele constitui como unidade, como ente por si mesmo”.

Essa afirmação chega a revelar o óbvio, qual seja, que a fonte primária do direito está na própria sociedade e, assim, não se limita à produção jurídica do Estado. Em outras palavras, para essa teoria mais moderna, a Instituição do Direito como arranjo racional da sociedade possui um conceito mais amplo, em que as normas jurídicas fazem parte de um subsistema que está "imerso" em sistemas mais amplos, até que se chegue ao maior de todos que é o sistema social.

Nesse esteio, é de fundamental importância o reconhecimento de que no Estado de Direito efetivamente existe um ordenamento jurídico posto – por meio de “arranjos institucionais” nos moldes do direito positivo –, que vislumbra resguardar a previsibilidade e a segurança jurídica, para os indivíduos. Todavia, a positivação das regras não exclui a existência de lacunas pela impossibilidade de se prever todas as situações previamente. E, até mesmo diante dessa indeterminação do Direito, é que o conceito desde deve ser mais amplo que a positivação de normas jurídicas, a fim de viabilizar o recurso a outros meios para a solução do caso concreto.

A indeterminação do Direito não passou despercebida nem pelo positivismo. Na, Hans Kelsen e Herbert Hart, na tentativa de entender e conceituar o ordenamento jurídico, criaram parâmetros para aplicação do direito. Kelsen cria a “moldura” – norma hipotética fundamental –, de onde se extrai a validade de qualquer norma sem qualquer análise de valor e justiça. Hart, por sua vez, desenvolve a “regra de reconhecimento”, com intuito de identificar o direito, como unidade, por critérios objetivos, sem a análise de qualquer moral.

No entanto, ambos reconheceram que existe uma zona de penumbra referente à indeterminação, em que o direito não é capaz de oferecer previamente uma resposta. A solução por eles encontrada foi a aplicação estrutural do direito, o que deu ensejo a uma espécie de “decisionismo mitigado e pautado na discricionariedade”, que demanda o recurso a regras e, diante de um caso de indeterminação, utiliza-se do argumento da “autoridade” do aplicador do direito.

A teoria positivista pura, portanto, em muito se aproxima da teoria institucional pura – não aquela proposta neste texto – por acreditar que um arranjo de regras e o uso da discricionariedade pela autoridade (coerção) são capazes de solucionar todos os problemas de aplicação do direito em uma sociedade.

Essa posição, porém, foi firmemente combatida por Ronald Dworkin, como elucidam os professores Argemiro Martins e Caroline Ferri:

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Observa-se, dessa forma, que a questão da discricionariedade judicial está presente desde as primeiras determinações de escolas positivistas. Em cabendo ao direito a explicação de acontecimentos fáticos, este conhecer está ligado com a questão de que decisões passadas acabam, em geral, a determinar as presentes. Assim, em não havendo uma norma de direito ou uma decisão judicial anterior que possa ser aplicada a um acontecimento atual, cabe ao juiz, no uso de seu poder discricionário, decidir. Essa decisão, então, por não utilizar o direito vigente, cria algo novo na esfera jurídica.

[...]

Dworkin argumenta contrariamente a esta tese. Se para o positivismo a argumentação discricionária supõe a pré-existência do direito de uma das partes, para este autor a decisão judicial não descobre um direito já existente, mas criar um novo. Em utilizando uma ficção artística acerca da discricionariedade, os positivistas tomam a posição de um escultor e sua obra: o agente não cria, mas apenas retira, de um bloco de pedra, uma figura qualquer. Não há criação; há descobrimento. Para Dworkin, ao contrário, o artista tem diante de si uma tela em branco, onde, por meio de tintas que perpassam os fios dos pincéis, dá forma a figurações diversas. Aqui não há descobrimento, há criação. 9

Assim, Dworkin rechaça a discricionariedade judicial como forma de superar as lacunas existentes no Direito, e propõe uma “teoria construtivista” que vincula de forma indissociável a interpretação jurídica com a noção de democracia, de modo que “reconhece a centralidade dos direitos fundamentais como condição possibilitadora do regime democrático”.

Trata-se da chamada “teoria da integridade” de Dworkin, pela qual propõe que a interpretação e a aplicação da Constituição sejam centradas na “igualdade de tratamento de respeito”. A interpretação, portanto, é indissociável de uma concepção centrada na noção de Estado Democrático de Direito, e conta com o fundamental papel dos direitos fundamentais como instrumentos de um direito construído de forma legítima.

Nesse sentido, os autores mencionados explicitam que a ideia de integridade “exige do julgador um esforço hercúleo para construir uma decisão que integre materiais vastos e, não raro, conflitantes entre si”. Afirmam o seguinte:

Dworkin procura, com a idéia de integridade, atingir simultaneamente dois propósitos importantes: moldar a atitude do intérprete de maneira a excluir o recurso à discricionariedade e propor uma forma de legitimar a decisão judicial considerando devidamente os princípios legais, morais e políticos - na terminologia por ele empregada, princípios relativos à “justiça”, à “eqüidade” e ao “devido processo legal”.10

Dessa forma, apesar de Dworkin afirmar que direto e moral são esferas distintas, não nega a vinculação entre elas. De fato, entende que os princípios envolvem concepções específicas de moralidade pública, o que implica a abertura do direito para questões morais e a necessidade de se proceder a uma leitura moral na prática constitucional. Isso quer dizer que a própria institucionalização se justifica pela moralidade política e não pela cadeia de autoridade.

Ressalte-se que, muito embora Dworkin defenda a relação intrínseca do direito com a moral e refute peremptoriamente a discricionariedade, diante da ausência de previsão legal expressa para determinado caso concreto, não ignora a importância da existência do direito posto (normas jurídicas) e não abandona a teoria institucional. A proposta desse filósofo do Direito é incrementar a teoria institucional com o conteúdo da “integridade”, inovando-a em sua “perspectiva interna”, ou seja, fazendo a mediação entre o que já está posto na estrutura do Estado com o debate existente na leitura moral da constituição.

Outrossim, essa nova concepção do institucionalismo – como algo que não pode mais ficar preso à crença de que se pode modificar uma nação por meio do simples “arranjo constitucional” formal para solucionar os problemas derivados da natureza humana, como interesses e paixões, e que, sendo assim, precisa incorporar razões de moralidade pública, como aponta Dworkin – teve total respaldo no “constitucionalismo contemporâneo”.


Constitucionalismo Contemporâneo

Nesse momento, e com muito zelo, é fundamental trazer à baila breves noções sobre o que se entende pelo referido “constitucionalismo contemporâneo”, a fim de se compreender a relação existente entre a teoria institucional moderna e a teoria da argumentação jurídica.

Antes de tratar do tema, porém, esclarece-se a opção pela nomenclatura “constitucionalismo contemporâneo”. É notório que existe uma grande polêmica no uso de prefixos para se falar em uma nova versão de uma antiga teoria. Iniciar uma exposição de idéias com termos como pós-positivismo e neoconstitucionalismo, de antemão, já causa certo desconforto no auditório e, sem dúvidas, conquista a antipatia de, pelo menos, parte dele. Assim, fazendo uso da retórica nos moldes aristotélicos, optou-se por uma expressão descritiva, e quase auto-explicativa, para se falar da atual fase em que se encontra o direito constitucional.

Superado esse ponto, faz-se mister declarar que a posição adotada nessa seara encampa integralmente a doutrina de Daniel Sarmento11, que apesar de falar em “neoconstitucionalismo”, deixa claro que é uma palavra que não encontra consenso entre os estudiosos do tema12. Isso demonstra a dificuldade de se adotar o “neoconstitucionalismo” como uma teoria única e coesa, de maneira que se prefere utilizar a locução “constitucionalismo contemporâneo”.

Nesses termos, Daniel Sarmento pontua algumas características que entende mais relevante nessa teoria. Passa-se a explanar as mais importantes com a intenção de elucidar a relação entre as teorias tratadas neste trabalho.

A primeira característica é a nítida busca pela superação do positivismo tradicional – o qual prega a mera subsunção do fato à norma e a discricionariedade para os casos de indeterminação –, para se dedicar “à discussão de métodos ou de teorias da argumentação que permitam a procura racional e intersubjetivamente controlável da melhor resposta para os ‘casos difíceis’ do Direito”, proporcionando uma valorização da razão prática no âmbito jurídico.

O segundo ponto está na releitura do clássico princípio da separação de poderes, no intuito de abrir espaço para uma atuação mais flexível do Poder Judiciário em defesa dos valores constitucionais, bem como que restringir os poderes do legislador em nome dos direitos fundamentais e da proteção das minorias, por meio de teorias de democracia mais substantiva.

A terceira observação, que tanto importa no presente trabalho, é que “ao reconhecer a força normativa de princípios revestidos de elevada carga axiológica, como dignidade da pessoa humana, igualdade, Estado Democrático de Direito e solidariedade social”, abre-se “as portas do Direito para o debate moral”. E, nesse ponto, o autor se coloca de acordo com a vertente não positivista dos adeptos da teoria, que afirma que Moral e Direito têm uma conexão necessária e entende, na linha proposta por Gustav Radbruch, que “as normas terrivelmente injustas não têm validade jurídica, independentemente do que digam as fontes autorizadas do ordenamento”. Nas palavras do autor

[...] para os não-positivistas, a vigência dos princípios morais não decorrerá de um "teste de pedigree", mas de exigências da própria Moral, acessíveis à razão humana. Porém, para ambas as linhas os valores morais incluídos nas constituições são jurídicos e devem produzir efeitos no mundo concreto.

Diante dessas considerações, tem-se que a argumentação jurídica abre um significativo espaço para a Moral e “atenua a distinção da teoria jurídica clássica entre a descrição do Direito como ele é, e prescrição sobre como ele deveria ser”. Resume que

Os juízos descritivo e prescritivo de alguma maneira se sobrepõem, pela influência dos princípios e valores constitucionais impregnados de forte conteúdo moral, que conferem poder ao intérprete para buscar, em cada caso difícil, a solução mais justa, no próprio marco da ordem jurídica. Em outras palavras, as fronteiras entre Direito e Moral não são abolidas, e a diferenciação entre eles, essencial nas sociedades complexas, permanece em vigor, mas as fronteiras entre os dois domínios tornam-se muito mais porosas, na medida em que o próprio ordenamento incorpora, no seu patamar mais elevado, princípios de justiça, e a cultura jurídica começa a "levá-los a sério".

Por último, aponta que o foco da teoria está no Poder Judiciário. Assim, o Direito passa a ser analisado “sobretudo a partir de uma perspectiva interna, daquele que participa dos processos que envolvem a sua interpretação e aplicação, relegando-se a um segundo plano a perspectiva externa, do observador”.

Daniel Sarmento, porém, concorda com a crítica de que o excesso de expectativas depositadas no Poder Judiciário pelo neoconstitucionalismo pode conduzir a uma possíveljudiciocracia” caracterizada por um “suposto caráter antidemocrático, na medida em que os juízes, diferentemente dos parlamentares e chefes do Executivo, não são eleitos e não respondem diretamente perante o povo”.

De fato, na democracia “é essencial que as decisões políticas mais importantes sejam tomadas pelo próprio povo ou por seus representantes eleitos e não por sábios ou tecnocratas de toga”. Há um sério risco de se sedimentar a visão de que o grande intérprete da Constituição seria o Poder Judiciário, o que poderia levar a uma “ditadura de toga”.

Entretanto, discorda da crítica que acusa essa teoria de "promover o decisionismo ou de defender a tomada de decisões judiciais puramente emotivas, sem lastro em argumentação racional sólida”. Isso porque um dos objetivos descritos é exatamente “a reabilitação da racionalidade prática no âmbito jurídico, com a articulação de complexas teorias da argumentação, que demandam muito dos intérpretes e sobretudo dos juízes em matéria de fundamentação das suas decisões”.

É certo que, na prática dos Tribunais, há um desvirtuamento no uso dos princípios, os quais são utilizados de forma extremamente vaga e desnecessária, porém coibir isso não deve significar o retrocesso quanto à inaplicabilidade de princípios. Alerta que

O importante é encontrar uma justa medida, que não torne o processo de aplicação do Direito amarrado demais, como ocorreria num sistema baseado exclusivamente em regras, nem solto demais, como sucederia com um que se fundasse apenas em princípios. Penso que é chegada a hora de um retorno do pêndulo no Direito brasileiro, que, sem descartar a importância dos princípios e da ponderação, volte a levar a sério também as regras e a subsunção.

[...] A tendência atual de invocação frouxa e não fundamentada de princípios colide com a lógica do Estado Democrático de Direito, pois amplia as chances de arbítrio judicial, gera insegurança jurídica e atropela a divisão funcional de poderes, que tem no ideário democrático um dos seus fundamentos - a noção básica de que as decisões sobre o que os cidadãos e o Estado podem e não podem fazer devem ser tomadas preferencialmente por quem represente o povo e seja por ele escolhido.

De qualquer forma, apesar da existência de riscos, a abertura principiológica e, assim, o diálogo com a Moral, proporcionados pelo constitucionalismo contemporâneo, no âmbito de um Estado Democrático de Direito, são medidas necessárias para a consolidação da moderna teoria institucional e, a partir disso, a justificação do Direito como um todo imerso em um sistema maior formado pela própria sociedade.

Sarmento sugere que para se conter os excessos é preciso que se tenha um “maior cuidado metodológico, adicionado à adoção de uma diretriz hermenêutica substantiva, que afirme a missão essencial do Direito de assegurar justiça e segurança às pessoas, tratando-as como livres e iguais”, de onde se detecta a necessidade do desenvolvimento de uma teoria da argumentação jurídica que viabilize a realização dos ideais existentes no constitucionalismo contemporâneo.

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Sobre a autora
Renata Espíndola Virgílio

Possui graduação em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (2001), especialização em Direito Processual Civil pela Unicsul (2007) e em Defesa da Concorrência pela Fundação Getúlio Vargas (2010). É Procuradora Federal (Advocacia Geral da União) e mestre em Direito, na linha de processo, pela UnB (2013).<br>

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

VIRGÍLIO, Renata Espíndola. A relação entre a teoria institucional e a teoria da argumentação jurídica:: reflexos no processo jurisdicional democrático. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3950, 25 abr. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27863. Acesso em: 21 nov. 2024.

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