1 INTRODUÇÃO
O advento da globalização trouxe inúmeras mudanças no modelo de organização político-social, momento em que os problemas modernos deixaram de ser preocupação nacional e adquiriram um caráter transnacional. Citem-se como exemplo as questões ambientais cuja natureza do bem jurídico protegido não deixa outra opção senão a cooperação.
Com efeito, essa descentralização dos fenômenos naturais expôs os atores estatais a uma nova e inescapável realidade: a influência da sociedade global, consciente e informada, nos centros de decisão política. Nesse ínterim, o Direito, feito pela e para a sociedade, também teve de se adaptar. Se, antes, as decisões nacionais eram competência apenas do Estado, agora teve de desapegar-se dos velhos modelos e abrir espaço aos novos atores, cujo conhecimento técnico, flexibilidade e dinamismo são essenciais à efetividade do Direito Ambiental. E é neste cenário que ascendem as organizações não governamentais (ONGs).
Nesse tocante, o presente trabalho tem por escopo demonstrar como a sociedade civil, unida e organizada sob a forma de ONGs, pode influenciar na construção e na efetividade do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado no Brasil e influenciar na elaboração dos instrumentos jurídicos de proteção ambiental.
Quer-se, assim, despertar o debate acerca de como as ONGs, colocando em prática o princípio da participação popular e atuando em caráter complementar ao Estado, influenciam na criação e na efetividade do sistema jurídico ambiental brasileiro e na tutela ao meio ambiente saudável.
Justifica-se a presente pesquisa pelo seu valor social e jurídico. A relevância social repousa no fato de incitar a sociedade civil a perceber o poder e a capacidade de influenciar na construção e na efetividade do direito ao meio ambiente equilibrado, elevado ao status constitucional. No âmbito jurídico-constitucional é proeminente no sentido de questionar formas de tornar efetivo não apenas os direitos fundamentais ao meio ambiente saudável e à participação social na tomada de decisões, formando um Direito do e para o povo, mas também demonstrar como a efetividade deste ramo do Direito depende de uma abertura real do Estado às reivindicações e ao conhecimento técnico-científico desta parcela da população.
Adotar-se-á como método de abordagem o dialético, posto que se pretende travar uma discussão crítica e objetiva em torno do tema. Quer-se, assim, questionar antigos paradigmas, como o do monopólio estatal nas decisões políticas, demonstrando que a estrutura social não é estática, mas que a história a torna mutável e dinâmica, devendo ser sempre questionada.
Refletir-se-á sobre a importância da atuação da ONGs em caráter complementar ao Estado, e não substitutivo, naquelas áreas onde o poder público é omisso ou atua de forma deficitária, colocando em prática o princípio da participação popular. Finalmente, quer-se com esta pesquisa demonstrar que a efetividade do sistema jurídico ambiental brasileiro e a tutela ao meio ambiente saudável depende da abertura e da participação da sociedade civil.
2 A GLOBALIZAÇÃO E A MUDANÇA DOS ATORES NA NOVA ORDEM JURÍDICA
“Globalização”: o senso comum costuma conectar o vocábulo a fenômenos econômicos. Todavia, este complexo e extenso modelo de organização social de modo algum está afeto apenas a este âmbito. Eduardo Matias, indo além, identifica outras três características marcantes do fenômeno globalizante: a primeira delas, a “revolução tecnológica”, a segunda, o surgimento da “sociedade civil transnacional” e, por último, o “aumento da cooperação entre os Estados.” [1]
Inevitável notar que a globalização trouxe uma série de mudanças de paradigmas, especialmente políticos. É perceptível o progressivo abandono do modelo estatal tradicional, substituindo-o por outro que privilegie a interdependência dos Estados visando à cooperação e à inclusão de novos atores sociais.
Não há de se olvidar que, diante de tamanha transformação social, o Direito brasileiro deve corresponder, igualmente, à nova realidade global. Nesse tocante, escancare-se outra faceta: a conexão e a necessidade de articulação entre Estado e sociedade civil para o desenvolvimento deste novo Direito. Como resultado, há de nascerem leis fruto de ampla participação social e que representem, efetivamente, valores comuns.
Com efeito, tal só há de ocorrer a partir do momento em que o indivíduo, ciente de que o Estado, sozinho, não é capaz de atender a todas as demandas de maneira eficaz, abandona os velhos hábitos de resignação e passa a reivindicar espaço no cenário político e jurídico. Para que o façam de maneira eficaz, muitos optam pela união sob a denominação “organizações não governamentais”, as “ONGs”, instituições estas que vem consolidando o status de representantes da sociedade civil nos espaços políticos. Por seu turno, um dos ramos em que a cooperação entre ONGs e Estados tem sido mais bem sucedida é o ambiental.
2.1 O Estado, a efetividade e a emergência dos novos atores
Eduardo Matias define efetividade como o “[...] grau de eficiência no exercício do poder.” [2] Em linguagem corrente, efetividade é a capacidade de atingir os objetivos a que se propõe - no caso dos Estados, realizarem as funções públicas.
É fácil perceber que a viabilidade de qualquer governo está conexa a esta característica, ou seja, a sua capacidade de responder às demandas, mantendo a ordem social. Nas palavras de Bobbio, “uma sociedade torna-se tanto mais ingovernável quanto mais aumentam as demandas da sociedade civil e não aumenta correspondentemente a capacidade das instituições de a elas responder.” [3]
A prática confirma a teoria. Tantas mudanças desafiaram o modelo tradicional de Estado-nação, exigindo rápidas adaptações na tentativa de atender, efetivamente, as novas solicitações. Muito embora o Estado tenha se mostrado flexível o suficiente para lidar com as novíssimas situações, frustrando aqueles que previam o fim da instituição, ele teve de abrir mão de prerrogativas antes privativas em prol da mencionada efetividade. Deste modo, o Estado tornou-se:
Demasiado grande para as coisas pequenas e demasiado pequeno para as coisas grandes. É grande demais para a maioria das suas atuais funções administrativas [...]. Mas, sobretudo, o Estado é pequeno demais com respeito às funções de governo e de tutela que se tornam necessárias devido aos processos de internacionalização da economia e às interdependências cada vez mais sólidas que, na nossa época, condicionam irreversivelmente a vida de todos os povos da Terra.[4] (grifo nosso)
Pergunta-se: qual a solução para um Estado “pequeno para as coisas grandes”? A resposta mais sensata parece ser a inclusão de novos atores – e assim foi feito. Delineia-se, deste modo, uma nova forma de organização política, como bem retrata Eduardo Matias:
Ao buscarem legitimidade e eficácia, permitindo que entidades não governamentais afetem suas decisões, os Estados estariam abrindo mão de parte de sua autonomia. O sistema que se fortalece não é o sistema interestatal, mas sim um outro sistema, no qual outros atores passam a exercer parte do poder anteriormente exclusivo dos Estados [5]
Inicia-se, por conseguinte, uma era amparada, especialmente, pela ideia de cooperação. Não há de se supor, contudo, que os Estados tenham aberto mão de seus interesses particulares em prol da “harmonia universal” [6], mas o fazem “quando há objetivos conflitantes ou quando metas consideradas importantes não podem ser atingidas a não ser pelo esforço conjunto” [7].
Neste contexto, surge um terreno fértil não apenas para a união dos Estados, mas também para a atuação de atores diversos do Estado, igualmente interessados na consecução do interesse público, a exemplo das organizações não governamentais (ONGs).
2.2 Os atores não estatais: a participação da sociedade civil na política nacional
Ao homem comum, não mais convém a resignação diante da ineficiência do Estado; muito pelo contrário, percebe-se que a democracia participativa não há de ser apenas um mito, um discurso, mas uma realidade.
O exercício pleno da cidadania não mais é garantido apenas pela atuação dos Estados nacionais, mas da própria sociedade civil, por meio de mecanismos e estratégias próprias. Uma nova democracia há de ser formada, levando-se em conta os novos poderes. Nos termos de Liszt Vieira:
Verifica-se, paradoxalmente, que o mesmo processo de globalização que enfraquece o poder dos Estados nacionais fortalece a sociedade, que intensifica o grau de organização do terceiro setor para realizar funções sociais que o Estado deixa de cumprir e que o mercado jamais cumpriu.[8]
Assim sendo, e a guisa de justificar o próprio título deste artigo, os próximos capítulos pretendem demonstrar como a sociedade, unida e organizada sob a denominação de “organização não governamental”, atua no desenvolvimento da governança ambiental. Mais especificamente, retratar-se-á a atuação destas instituições não estatais na elaboração dos instrumentos jurídicos de proteção ao direito ao meio ambiente equilibrado.
3 O UNIVERSO DAS ORGANIZAÇÕES NÃO GOVERNAMENTAIS AMBIENTALISTAS E O PRINCÍPIO DA PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA
3.1 O princípio da participação democrática na defesa do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado
A Constituição Federal de 88, democrática e cidadã, optou pelo Estado Democrático de Direito como regime de governo, como bem demonstra seu Preâmbulo. Nesta esteira, reza o artigo 1º da Carta Maior: “todo o Poder emana do povo”. Inerente ao sistema democrático, foram disponibilizados ao cidadão alguns instrumentos jurídico-processuais que garantam a participação popular na proteção aos interesses transindividuais.
Nesta sociedade que não mais aceita conviver tão somente com uma democracia representativa, cunhou-se o termo “princípio da participação democrática”, referindo-se à garantia constitucional que permite ao cidadão (em grupo ou individualmente) intervir na tomada de decisões de interesse público.
Tenha-se em mente que, apesar de não exclusivo, esse preceito constitucional é um dos princípios fundamentais do Direito Ambiental, em especial pela própria natureza difusa do bem jurídico protegido, que exige uma ação cooperativa, e pela incapacidade dos governos de protegerem, sozinhos, a degradação do meio ambiente. O mesmo ainda serve como base de legitimação da atuação das organizações não governamentais na luta por seus interesses.
O princípio em comento, também conhecido como princípio democrático ou da cooperação, encontra-se insculpido no artigo 225 da Constituição Federal brasileira, juntamente ao direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, que assim dispõe:
Todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso comum do povo e essencial à sadia qualidade de vida, impondo-se ao Poder Público e à coletividade o dever de defendê-lo para as gerações futuras como direito e dever de todos.
Desta feita, a Constituição ressalta o caráter difuso do bem jurídico protegido, que demanda a soma de esforços entre o Estado e a sociedade para a proteção do meio ambiente não somente no presente, mas assegurando a preservação desse bem para as futuras gerações. Neste sentido, Rodrigues elucida com eloquência a importância do princípio em tela explicando que:
O princípio da participação constitui um dos postulados fundamentais do Direito Ambiental. Embora ainda pouco difundido em nosso país, a verdade é que tal postulado se apresenta na atualidade como sendo uma das principais armas, senão a mais eficiente e promissora, na luta por um ambiente ecologicamente equilibrado. Entretanto, é um princípio cujas diretrizes atuam esperando um resultado a longo prazo, porém com a vantagem inescondível de atacarem as bases dos problemas ambientais: a consciência ambiental. Isso faz desse postulado algo extremamente sólido e com perspectivas altamente promissoras em relação ao meio ambiente. [9]
Por conseguinte, ao permitir a participação do cidadão nas tratativas políticas, a Constituição automaticamente assegura o respeito a outros princípios constitucionais, como a cidadania e a dignidade humana, tornando reais e legítimos os anseios da população atingida.
Por sua vez, o princípio em comento, como bem propõe esse trabalho, é essencial para a proteção de outro preceito já acima mencionado: o direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, considerado por parte da doutrina como um direito fundamental, já que constitui uma garantia fundamental à qualidade de vida e, consequentemente, à garantia de uma vida digna. [10] Salvaguarda, assim, o direito à vida e à dignidade da pessoa humana. Em consonância com a onda verde global, a Constituição consagrou esse direito com o objetivo de proteção do homem por meio do uso racional dos recursos naturais. Resumindo bem a ideia, Alves Junior discorre:
Conclui-se, portanto, que após anos (e por que não se dizer de séculos), de omissões legislativas pátrias com a finalidade de proteção do meio ambiente, após a promulgação da Constituição Federal de 1988, acompanhando uma onda ideológica mundial de salvaguarda ambiental, o ordenamento jurídico brasileiro se sistematizou e ordenou a legislação nacional vigente com tal intuito, tendo como guia o disposto no artigo 225 da Lei Maior, contando, hoje, com diversos instrumentos legais nas esferas federal, estadual e municipal, para a preservação deste bem indisponível e que se tornou um verdadeiro direito fundamental do ser humano, bem esse, por determinação constitucional, objeto de responsabilidade de amparo por parte do Estado e de toda a sociedade.[11]
Fica demonstrada, assim, não somente a importância prática da inclusão do artigo 225 na Constituição Federal de 88, mas as diversas implicações jurídicas e políticas decorrentes da consagração constitucional do direito ao meio ambiente equilibrado, em consonância com a demanda global por mudanças.
3.2 Os meios de atuação das ONGs: destemor para influenciar as políticas estatais ambientais
Na última década, a ordem política presenciou um aumento meteórico no número e na participação das ONGs. Dada a vasta gama de áreas de atuação e formatos e a ausência de uma definição oficial, abranger todas as ONGs em um só conceito, certamente, não é tarefa fácil.
Para efeito desse trabalho, usar-se-á como base a definição proposta por Guido Soares. Para ele, as ONGs são:
[...] entidades criadas por atos de particulares, com ou sem a interveniência de órgãos oficiais, e constituídas segundo a lei de um Estado determinado que, em geral, as sedia. Suas finalidades, geralmente, prendem-se a interesses profissionais privados e locais, mas, em especial, em matéria cientifica e de proteção do meio ambiente, por força dos interesses globais de pesquisa, difusão de conhecimentos e necessidades de ganharem mais poderes de convencimento, acabam elas por ramificar-se pelo mundo todo, com a constituição de filiais ou entidades associadas em outros países diferentes de suas sedes.[12]
Os Estados, sofrendo pelo despreparo de seus membros ou simplesmente omissos, deixaram espaço para a inserção das ONGs no processo decisório em matéria ambiental. Em rede ou engajadas individualmente em suas causas, elas, atores agora poderosos e influentes, “fazem acontecer”.
Carecendo de poder coercitivo – este a disposição dos Estados e tradicionalmente associado à influência política - a atuação das ONGs, sem armas, costuma dar-se paralelamente às reuniões oficiais e limita-se, de modo geral, ao uso de meios consensuais. Nesse sentido, destacando o poder dos Estados e a influência das ONGs, Rafael Villa completa:
[…] a existência da coação, condição necessária embora não suficiente do poder político, representa a diferença entre poder e influência: um ator tem poder de mando, em última instância, na medida em que controla a coerção física; quando carece desta, mas se vale de meios consensuais para conseguir o objetivo de encontrar obediência nas vontades alheias, tem influência. [13]
Destas referências, infere-se que às ONGs, além dos instrumentos processuais, como a ação ordinária de conhecimento, e dos remédios constitucionais, como a ação popular (art. 5º, LXXIII da CF) e o mandado de segurança (art. 5º, LXIX e LXX da CF) resta o expediente da influência, persuadindo os representantes governamentais, aqueles com o poder formal de tomar decisões, e a sociedade. Nesta última, cria-se, em especial, a educação e a consciência ambiental na base, podendo gerar, por exemplo, a iniciativa popular nos procedimentos legislativos (art. 61, caput e § 2º da CF), o que confere maior legitimidade ao processo legislativo. Ressalte-se, oportunamente, o rompimento da ideia tradicional de que a ação seria um direito apenas subjetivo de agir em juízo visando interesses próprios. Agora, pode-se litigar em nome próprio sobre direito alheio, coletivo, como o fazem as ONGs.
É de se notar que estas instituições cooperam para a efetividade de todo o processo de criação e efetivação das leis ambientais, desde o apoio popular e a seleção dos temas que merecem figurar nas discussões formais, até a efetiva implementação.
Acrescentem-se outras três importantes funções realizadas pelas ONGs: a primeira delas, a de críticos – atividade comumente realizada com êxito por meio do uso da mídia desvinculada da opinião estatal; em segundo, a de tentar mudar o jeito que as pessoas pensam sobre questões concernentes à preservação ambiental; e, por último, as ONGs esforçam-se para influenciar a política estatal diretamente, fornecendo opções políticas. [14] Vale ratificar que tal intento só é possível em virtude da posse de conhecimentos técnicos e de um corpo de experts em sua composição.
4 O PAPEL DAS ONGS NA CRIAÇÃO E EFETIVIDADE DO DIREITO AMBIENTAL
Como introduzido, o aumento da complexidade dos problemas estimulou a emergência dos atores não estatais nas tratativas políticas. Com efeito, as ONGs, dominando informações exclusivas e com expressivo poder político, aliadas às garantias constitucionais que permitem e estimulam a participação da sociedade civil, passaram a influenciar expressivamente o processo regulatório no âmbito da proteção do meio ambiente.
Visando aceitação social, a norma não se esgota enquanto mero instrumento legal, mas há de ser, também, necessária, justa e legítima. Sem almejar esgotar o tema e dada a delimitação necessária do artigo, os parágrafos seguintes tratarão do papel das ONGs na militância de seus membros para que as normas já prescritas sejam cumpridas e tornem-se efetivas e na prevenção de danos futuros. Nos termos de Rocha Loures:
São, assim, manifestações claras do exercício desse princípio [da participação popular], amparadas pelo texto constitucional e exercidas através de mecanismos de pressão e controle sobre as autoridades públicas, na busca pela efetividade do Direito tutelar do ambiente, as seguintes: a) participação popular no processo legislativo, desde a fase de discussões até a aprovação final do projeto, e através dos mecanismos constitucionais de democracia direta (referendo, plebiscito e iniciativa popular); b) participação direta na gestão ambiental por meio de tais organismos, sejam de caráter consultivo ou deliberativo, federais, estaduais, distritais ou municipais; c) e, finalmente, utilização séria e em massa de instrumentos jurídico-processuais de tutela do ambiente, com base na chamada legitimação processual extraordinária. [15]
Com grande repercussão, e compilando a ideia das etapas e possibilidades perseguidas pelas ONGs judicialmente, analise-se o caso que debateu a liberação dos transgênicos no Brasil, assunto já em discussão antes da assinatura do Protocolo de Cartagena sobre Biossegurança, o qual entrou em vigor no país em 2004.[16] Em resumo, em 1998, o Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (IDEC), assistido pela ONG Greenpeace e pelo Instituto Brasileiro do Meio ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (IBAMA), ajuizou ação cautelar (n. 1998.34.00.027681-8) e ação civil pública (n. 1998.34.00.027682-0) na tentativa de impedir que a União Federal autorizasse o plantio, a comercialização e o consumo da soja transgênica Roundup Ready e demais espécies antes de estudo de impacto ambiental. [17] Os juízes da 6ª Vara da Seção Judiciária do Distrito Federal julgaram favoravelmente às ONGs em ambas as ações. Em resposta à cautelar, a comercialização das sementes Roundup Ready foi suspensa em primeira e segunda instância por uma liminar, argumentando-se que “[...] antes da liberação comercial, seria necessário o Estudo Prévio de Impacto Ambiental e Relatório de Impacto no Meio Ambiente, conforme prevê a Constituição Federal no artigo 225”; com motivação semelhante, o juiz da ação civil pública determinou que a liberação dos transgênicos deveria ser “[...] precedida de Estudo Prévio de Impacto Ambiental, avaliação de riscos à saúde humana e rotulagem plena dos produtos contendo transgênicos e derivados, de acordo com o Código de Defesa do Consumidor.” [18]
Tal situação, porém, fora alterada com a sanção da Lei 11.105 de 2005, que, não sem gerar polêmica e receber duras críticas, regulamenta o uso de organismos geneticamente modificados. A referida Lei assim dispõe:
Art. 35. Ficam autorizadas a produção e a comercialização de sementes de cultivares de soja geneticamente modificadas tolerantes a glifosato registradas no Registro Nacional de Cultivares - RNC do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.
Art. 36. Fica autorizado o plantio de grãos de soja geneticamente modificada tolerante a glifosato, reservados pelos produtores rurais para uso próprio, na safra 2004/2005, sendo vedada a comercialização da produção como semente. [19]
Mas nem tudo fora perdido. Diante deste novo cenário, outra vitória foi alcançada pelas ONGs integrantes da Campanha “Por um Brasil livre de transgênicos.” [20] Em fevereiro de 2010, importante sentença se pronunciou acerca da obrigatoriedade de rotular os produtos que contenham organismos geneticamente modificados. Ciente, cabe ao consumidor optar por consumir estes produtos ou não. Em mais detalhes:
O Juiz da 3ª Vara Federal do Piauí, Régis de Souza Araújo, julgou procedente ação civil pública do Ministério Público Federal contra a União e a Bunge Alimentos (2007.40.00.000471-6), confirmando a antecipação de tutela anteriormente deferida que determinou a obrigatoriedade da rotulagem de produtos alimentícios contendo organismo geneticamente modificado (OGM), independentemente do percentual existente em seu conteúdo.[21]
Do exposto, conclui-se que muito embora haja momentos em que o confronto seja admitido, como o judicial acima mencionado, o objetivo principal das ONGs não é construir um ambiente de conflito, mas de cooperação. Deste modo, a primeira opção jamais será a busca por sanções ao Estado que descumpriu o pactuado, mas de compreensão, na tentativa de entender os reais motivos para tal, assegura a garantia de ser ouvido.