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Supremo Tribunal Federal, ativismo judicial e a (in)efetividade dos direitos fundamentais

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04/02/2015 às 07:28
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3 O ATIVISMO JUDICIAL 

Neste capítulo será delineado o tema ativismo judicial, a partir do seu conceito e das posições doutrinárias favoráveis e críticas. Após enfrentaremos a diferença entre ativismo judicial e judicialização da política, e abordaremos a discussão entre as correntes doutrinárias procedimentalistas e substancialistas. 

3.1 CONCEITO

Segundo Leal (2008, p. 18) a origem do termo ativismo judicial é atribuída ao jornalista norte-americano Arthur Schlesinger, quando em um artigo escrito para revista Fortune em janeiro de 1947, cujo titulo é The Supreme Court:1947, utilizou a expressão judicial activism[3].

O artigo de Schlesinger impulsionou o estudo do tema nos Estados Unidos, relacionando-o a atuação da Suprema Corte norte-americana em casos polêmicos, dotados de discussões políticas, embora as discussões sobre os limites da atuação da Suprema Corte já existissem.

No Brasil o tema ganha relevo a partir Constituição Federal de 1988, com teor analítico, que contempla um amplo catálogo de direitos fundamentais, e fortalece o controle de constitucionalidade. Aspectos que dão margem a uma atuação enérgica por parte dos Poderes, sobretudo do Judiciário, pois amplia o seu raio de atuação.

Quanto ao conceito, o ativismo judicial consiste numa conduta emanada do Poder Judiciário, na sua função constitucional de exercer a jurisdição, de dizer o direito diante de uma demanda, pela qual há uma atuação de natureza política em face da ausência de norma aplicável ou pela insuficiência desta diante das necessidades do caso concreto.

Luís Roberto Barroso define as seguintes características do ativismo judicial:

(i) a aplicação direta da Constituição a situações não expressamente contempladas em seu texto e independentemente de manifestação do legislador ordinário; (ii) a declaração de inconstitucionalidade de atos normativos emanados do legislador, com base em critérios menos rígidos que os de patente e ostensiva violação da Constituição; (iii) a imposição de condutas ou de abstenções ao Poder Público, notadamente em matéria de políticas públicas. (BARROSO, 2009, p. 6)

Trata-se, portanto, de uma atuação mais incisiva por parte do Estado Juiz com fundamento na garantia dos direitos insculpidos na Constituição, diante da inércia dos outros poderes.

Em determinadas situações essa atuação ocorre em face da ausência de norma regulamentadora ou de uma omissão inconstitucional, adentrando na esfera de atribuição dos Poderes Executivo e Legislativo.

O Poder Judiciário, quando provocado, não pode ser mero espectador das arbitrariedades, das omissões e das lesões a direitos. Pelo contrário, deve dar efetividade aos direitos fundamentais, sendo efetivo guardião de seus preceitos. É isto que se entende por ativismo judicial.

É certo que o ativismo judicial não é aceito de forma unânime pela doutrina, pois parte dela o vê como algo negativo, concebendo-o de forma pejorativa, como se toda decisão judicial ativista fosse ilegítima. O que gera um dissenso quanto ao seu conceito.

Parte da doutrina crítica o ativismo judicial como um todo, por entender que o Judiciário não é um órgão legitimado democraticamente, por ofender o princípio da separação dos poderes e por promover a denominada “juristocracia” ou “a superioridade do Judiciário” frente os demais poderes.

Dessa maneira entende Ramos (2010, p. 116) para quem o ativismo judicial é a ultrapassagem dos limites da função jurisdicional em detrimento, sobretudo, da função legislativa.

Nesse diapasão Lenio Streck (2013, p. 18) afirma que com as posições ativistas do Poder Judiciário corremos o rico de fragilizar a produção democrática do direito, fazendo com que este seja construído a partir de argumentações teleológicas ou morais.

Para esse renomado doutrinador o único poder credenciado a função criativa no direito é o Poder Legislativo, realizando tal intento pela via do processo legislativo.

Esse posicionamento é conhecido como autocontenção judicial, postura extremamente conservadora que prefere presenciar uma flagrante violação de direitos do que correr o risco de ter uma corte ativista.

Luís Roberto Barroso define essa corrente da seguinte maneira:

(i) evitam aplicar diretamente a Constituição a situações que não estejam no seu âmbito de incidência expressa, aguardando o pronunciamento do legislador ordinário; (ii) utilizam critérios rígidos e conservadores para a declaração de inconstitucionalidade de leis e atos normativos; e (iii) abstêm-se de interferir na definição  das  políticas  públicas. (BARROSO, 2009, p.7)

Favorável ao ativismo judicial, Inocêncio Mártires Coelho (2010) o tem como uma consequência natural do exercício da jurisdição constitucional na construção do direito.

Na mesma linha está Saul Tourinho Leal (2008, p. 146) para quem “não temos um tribunal ativista – no sentido pejorativo do termo – mas sim um tribunal altivo”.

Com isso Leal quer dizer que o Poder Judiciário apenas cumpre sua missão constitucional de guarda dos direitos e garantias fundamentais, reafirmando os dispositivos constitucionais e consagrando a democracia. Nem mais, nem menos.

Assim vimos por sucinta amostragem que estamos longe de um conceito unânime do que seja ativismo judicial. Muito menos em relação a postura a ser adotada pelo Poder Judiciário.

O certo é que o ativismo em si não é ruim, não podemos tachar uma conduta de negativa só pelo fato de ser atuante em determinadas ocasiões. Pelo contrário devemos analisar detidamente os fatos para tirarmos nossas próprias conclusões.

Pois como disse Barroso em entrevista concedida ao portal jurídico CONJUR, “o ativismo judicial é como colesterol tem do bom e do ruim”.[4]Ou seja, nem sempre uma postura ativista é desaconselhável, principalmente quando há uma flagrante ofensa a direitos fundamentais.

3.2 A DISTINÇÃO ENTRE O ATIVISMO JUDICIAL E A JUDICIALIZAÇÃO DA POLÍTICA

É comum a confusão entre os termos ativismo judicial e judicialização da política. Para o bom desenvolvimento do tema é imprescindível à distinção.

A judicialização é uma circunstância fática pela qual há uma procura exponencial pelo Poder Judiciário para solução dos conflitos, impulsionada pelo advento da Constituição de 1988.

O Poder Judiciário passa a ser o palco central das discussões políticas, sociais e morais, pois não se omite a decidir, quando provocado tem o dever dizer o direito.

No Brasil o fenômeno é impulsionado com a Carta de 1988 que albergou um vasto rol de direitos e garantias fundamentais, alargando as possibilidades do controle judicial de constitucionalidade. Somado a isso o fortalecimento das funções essenciais à justiça, como por exemplo, a ampliação do papel do Ministério Público, a criação da Defensoria Pública e da Advocacia-Geral da União.

Sem dúvida a denominada crise de representatividade (falta de credibilidade no Poder Legislativo) contribui sobremaneira para o aumento da procura pelo Poder Judiciário. Os cidadãos insatisfeitos com a atuação do Poder Legislativo ou até mesmo a ausência dela, passam a se socorrer da jurisdição constitucional.

O que se percebe na prática é que o Poder Legislativo tem se acomodado com a atuação do Poder Judiciário de forma que em muitos casos é este último quem assume a responsabilidade de enfrentar questões de relevo para toda sociedade.

Por exemplo, quem enfrentou a discussão sobre a união estável entre casais homossexuais? O Supremo Tribunal Federal, por meio da Ação Direta de Constitucionalidade (ADI) 4277 e da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 132, tema que será abordado no capítulo 5.

Até o momento o Poder Legislativo não tomou uma posição definitiva sobre o tema, embora tramitem no Congresso Nacional diversos Projetos de Lei que versam sobre a questão[5].

Ao passo que o ativismo é uma postura do Poder Judiciário, que utilizando a Hermenêutica Constitucional e com o objetivo de dar efetividade aos direitos e garantias fundamentais, adentra nas atribuições tradicionais dos demais poderes.

Nesse sentido ativismo é contingencial, só é utilizado quando há uma clara omissão por parte dos Poderes Executivo e Legislativo ou quando a um vácuo normativo, onde a norma jurídica não foi capaz de infiltrar. Circunstância que enseja uma tomada de posição por parte do Judiciário diante da inércia dos outros poderes.

Portanto a judicialização é um fato: a procura pelo Poder Judiciário para resolução de questões políticas, sociais e morais contidas na Constituição. O ativismo judicial é uma conduta arrojada por parte do Judiciário diante da omissão por parte dos Poderes Executivo e Legislativo ou de um vácuo normativo.

3.3 CONCEPÇÕES ACERCA DA JURISDIÇÃO CONSTITUCIONAL: PROCEDIMENTALISTAS versus SUBSTANCIALISTAS

A aceitação ou não do ativismo judicial dependerá da concepção adotada pela jurisdição constitucional.

A concepção procedimentalista entende que a intervenção do Poder Judiciário deve cingir-se a fiscalização da regularidade do procedimento, não adentrando nos aspectos materiais da Constituição. O juiz não pode ultrapassar o que diz o texto constitucional ainda que a pretexto de garantir sua integridade.

É o exercício da Jurisdição Constitucional pela defesa do procedimento. Os defensores do procedimentalismo julgam ser antidemocrática qualquer análise do Poder Judiciário para além do texto constitucional.

A concepção substancialista defende uma maior intervenção do Poder Judiciário na defesa dos direitos fundamentais de modo a dar efetividade ao texto constitucional. Esta linha de pensamento se coaduna com a máxima da força normativa da constituição, capitaneada por Konrad Hesse, pela qual as normas constitucionais possuem força cogente, incidem diretamente, possuem plena eficácia.

O Supremo Tribunal Federal vem adotando em célebres casos submetidos a sua jurisdição a concepção substancialista. Podemos citar como exemplo os Mandados de Injunção nº. 670, 708 e 712 em que a Suprema Corte reconheceu a omissão legislativa quanto a regulamentação do art. 37, VII, da Constituição Federal de 1988 e garantiu o direito de greve aos servidores públicos mediante aplicação analógica da Lei n. 7.783/89 (lei de greve).

Caso o STF adotasse a concepção procedimentalistas até o presente os servidores públicos estariam privados do direito fundamental à greve. Mas felizmente a Suprema Corte não adotou a referida posição privilegiando a máxima efetividade do texto constitucional.

Outro exemplo foi o julgamento Conjunto da Ação Direta de Inconstitucionalidade nº. 4277 e da Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental nº. 132 que reconheceram a união estável para casais homoafetivos, concedendo interpretação conforme a Constituição ao art.1723 do Código Civil. Neste caso a Suprema Corte garantiu o direito das minorias homossexuais à luz da Constituição Federal de 1988.

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Portanto nossa posição é favorável à concepção substancialista, pois esse posicionamento é o mais eficaz na proteção dos direitos e garantias fundamentais, privilegiando as minorias (se for necessário para garantia de direitos) em detrimento de eventuais maiorias.


4 O ATIVISMO JUDICIAL E OS DIREITOS FUNDAMENTAIS 

Neste capítulo faremos um breve estudo sobre os direitos fundamentais, pois nosso objetivo é justamente defender a legitimidade do ativismo judicial para garantia destes direitos.

4.1 CONCEITO E CARACTERÍSTICAS DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Antes de partirmos para o conceito é necessário fazer uma breve distinção entre os direitos humanos e os direitos fundamentais.

Direitos Humanos correspondem a um conjunto de direitos consagrados no plano internacional, através de instrumentos jurídicos como Convenções e Tratados internacionais. Quando falamos em direitos fundamentais estamos nos referindo a direitos que não raro são também direitos humanos, mas estão inseridos no ordenamento jurídico interno de cada estado.

Feita esta breve distinção passaremos a tratar do nosso objeto de estudo.

Os direitos fundamentais são uma espécie qualificada de direitos que ocupam um espaço de destaque no ordenamento jurídico em razão da sua importância para pessoa humana. São direitos básicos para uma sobrevivência com um mínimo de dignidade.

Por esta razão Jorge Miranda (2000, p. 52) nos ensina que os direitos fundamentais são direitos alçados a um grau de importância que incorporam os valores básicos da sociedade.

Em face de sua importância os direitos fundamentais normalmente encontram-se insculpidos na maioria dos textos constitucionais dos países considerados democráticos, a exemplo das constituições portuguesa e alemã. Devido ao grau de superioridade que as constituições possuem perante todo o ordenamento jurídico interno e também a proteção que os textos constitucionais possuem no que tange a impossibilidade de retrocesso como, por exemplo, o estabelecimento de cláusulas pétreas e o direito a um processo de emenda constitucional rígido.

Assim entende Dimoulis e Medeiros, in verbis:

Direitos fundamentais são direitos públicos-subjetivos de pessoas (físicas ou jurídicas), contidos em dispositivos constitucionais e, portanto, que encerram caráter normativo supremo dentro do estado, tendo como finalidade limitar o exercício do poder estatal em face da liberdade individual. (DIMOULIS e MARTINS, 2012, p. 40). 

Por isso os direitos fundamentais correspondem a um produto do constitucionalismo, pois estão diretamente associados à luta pela proteção dos direitos da pessoa em face do estado.

O que nos leva a considerar que não há estado de direito sem a previsão e a garantia dos direitos fundamentais, pois do contrário teremos um estado autoritário. Um estado só é de direito quando seu poder possui limites, e esses limites correspondem aos direitos fundamentais.

Sarlet, Marinoni e Mitidiero (2009, p. 187) também conceituam os direitos fundamentais sob o aspecto da fundamentalidade formal e material.

O conceito da fundamentalidade formal diz respeito aos direitos fundamentais constantes do texto da Constituição. É, portanto, uma visão exegética dos direitos fundamentais.

Pela insuficiência do conceito retro apresentado surge o conceito da fundamentalidade material, que parte de uma análise contextual dos direitos fundamentais de acordo com o seu conteúdo, ainda que não constante expressamente no Texto constitucional.

Assim pode haver direitos humanos não expressos no texto constitucional, nos termos do art.5º, § 2º, da Constituição Federal de 1988.

Dessa forma podemos considerar como constantes do bloco de direitos fundamentais além dos direitos presentes no Título II da Constituição Federal de 1988 – incluído os direitos sociais e políticos – outros dispositivos constitucionais.

Finalmente, os direitos fundamentais possuem características que realçam o grau de importância destes direitos. Com base na classificação esboçada por Alexandre de Moraes (2011, p. 22):

São direitos imprescritíveis, inalienáveis, irrenunciáveis, invioláveis, universais (abrange todos os indivíduos), efetivos (impõe ao estado o dever de efetiva-los), interdependentes (possuem conexão logica entre direitos e garantias) e complementares (não devem ser interpretados de forma isolada).

4.2 GERAÇÕES, DIMENSÕES, CATEGORIAS OU ESPÉCIES DE DIREITOS FUNDAMENTAIS 

A doutrina especializada tece críticas acerca da fragmentação dos direitos fundamentais em “gerações”. Sob a alegação de que estes se conjugam, de modo que os direitos de liberdade (civis e políticos) e os direitos de igualdade (econômicos, sociais e culturais) fazem parte de um único conjunto. Assim entendem Dimoulis e Martins (2012, p. 560 et. segs.).

Não obstante a relevância dos argumentos, entendemos que a divisão dos direitos fundamentais em gerações não tem o condão de segregar estes direitos sob um enfoque evolutivo. No qual um direito posterior exclui ou supera o anterior. Esse não é o objetivo.

Absolutamente, essa divisão é meramente exemplificativa, não tendo a pretensão de engessar a evolução dos direitos fundamentais, e muito menos nega-los. Dito isto passaremos a adotar o termo gerações.

Paulo Bonavides (2008, p. 562 et segs.) inspirado nas lições de Karel Vasak introduz no Brasil a teoria das gerações dos direitos fundamentais.

Para o renomado doutrinador a primeira geração diz respeito aos chamados direitos de liberdade (direitos civis e políticos advindos do séc. XVIII), são os chamados direitos de resistência oponíveis ao estado (subjetivos), tendo por titular o indivíduo. Impõe ao estado um dever de não fazer, constituído em prestações negativas. A exemplo do direito a propriedade, à vida, a liberdade de crença, de manifestação do pensamento, de locomoção, liberdade de associação, etc.

A segunda geração fica a cargo dos direitos sociais, culturais, econômicos e coletivos que dominaram o séc. XX. Está presente na maioria das constituições dos países democráticos sob a forma de normas programáticas, fator que não afasta a aplicabilidade imediata de seus preceitos, podendo gerar omissões inconstitucionais. Constituem em prestações positivas (obrigações de fazer por parte do estado). Como o direito ao trabalho, a moradia, ao lazer, a educação, a seguridade e assistência social, etc.

A terceira geração é representada pelos chamados direitos metaindividuais. Compreende o direito a fraternidade, consubstanciado no desenvolvimento, meio ambiente, função social da propriedade, comunicação dentre outros (rol exemplificativo). Tendo como destinatária precípua toda a humanidade.

Essas são as três tradicionais gerações de direitos fundamentais, porém como é dever do direito acompanhar a evolução da sociedade foram surgindo outras gerações.

A exemplo da quarta geração que surge a partir da ideia de globalização dos direitos fundamentais, advindas do pós-segunda guerra mundial. Simboliza a busca pelo reconhecimento de direitos humanos a pessoa humana, independente de sua origem. São direitos fundamentais de quarta geração a democracia, a informação e o pluralismo.

Bonavides (2008, p. 579) assinala ainda a quinta geração de direitos fundamentais, fundada no direito a paz, objetivo de toda humanidade, pois a história mundial nos revela o custo de uma guerra e nos faz crer que não há como dar continuidade a luta pela efetivação de direitos se vivemos em um estado de beligerância. A verdade é que temos que rever o conceito de paz e refletir sobre o imperialismo das grandes nações.

Este é um retrato da luta inacabada pela efetivação de direitos. Sabemos que não estamos perto do fim, agora a luta é pela efetividade dos direitos fundamentais.

4.3 A EFETIVIDADE DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

A Constituição Federal de 1988 foi a primeira a tratar de maneira específica da eficácia dos direitos fundamentais. E essa ênfase do Poder Constituinte não foi à toa, todos sabiam da dificuldade na aplicação dos direitos fundamentais.

Daí a necessidade de se ter um dispositivo na constituição versando exclusivamente sobre essa questão, in verbis:

Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:

(...)

§ 1º - As normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata.

Dispositivo este que não obstante a clareza com que foi redigido suscitou e ainda suscita muitos questionamentos relacionados ao alcance da norma.

Parte da doutrina entende que o referido dispositivo não deve ser levado ao pé da letra, pois normas programáticas e de eficácia limitada não poderiam ter aplicação imediata ante a insuficiência prática.

Desta corrente, fazem parte: André Ramos Tavares, Celso Ribeiro Bastos e Manoel Gonçalves Ferreira Filho.

Para André Ramos Tavares:

Não há como pretender a aplicação imediata, irrestrita, em sua integridade, de direitos não definidos de maneira adequada, cuja própria hipótese de incidência ou estrutura ficam por meio de lei. (TAVARES, 2003, p. 524)

Nesse diapasão Celso Ribeiro Bastos (1989, p. 393) explica que a regra do art. 5º, § 1º, da Constituição Federal de 1988 cede em duas ocasiões, quais sejam: quando a Constituição condicionar expressamente o exercício do direito a lei ou quando o preceito constitucional for destituído de elementos mínimos que assegurem a sua aplicação.

Assevera, por último, Manuel Gonçalves Ferreira Filho (2012, p. 1.402) para quem somente as normas de eficácia plena têm aplicação imediata.

São favoráveis a aplicação direita e imediata: Ingo Wolfgang Sarlet, Lenio Luiz Streck, George Marmelstein, Eros Roberto Grau e Jorge Miranda.

Ingo Wolfgang Sarlet (2010, p. 269) nos ensina que os direitos fundamentais são presumidamente de eficácia plena, porém reconhece a existência de direitos de baixa densidade normativa que ensejam certa graduação da sua aplicabilidade, o que não retira a eficácia da norma jurídica.

Jorge Miranda (2000, p. 311) salienta que os direitos fundamentais não dependem do legislador infraconstitucional para ter eficácia jurídica, sustentando com base na conhecida expressão atribuída a Hebert Krüger segundo a qual: “não são os direitos fundamentais que se movem no âmbito da lei, mas a lei que deve mover-se no âmbito dos direitos fundamentais”.

Para George Marmelstein (2008, p. 293) a aplicação imediata dos direitos fundamentais é consequência natural da supremacia desses direitos, pois não teria sentido estabelecer condições para aplicação dos direitos fundamentais a uma incerta regulamentação legislativa.

Entendemos, data vênia aos posicionamentos em contrário, desarrazoado o entendimento de que existem direitos fundamentais que não podem ser aplicados, pois na constituição não existem palavras vazias, o constituinte foi claro ao dispor que os direitos fundamentais possuem aplicação imediata.

Ainda que seja uma norma de eficácia contida ou limitada, não deixa de ser uma norma dotada de alguma eficácia jurídica, cabendo ao intérprete extrair todos os elementos hábeis a conceder a eficácia necessária para o bem da efetividade da norma, ainda que para isso tenha que adotar posturas ativistas.

Já que o art. 5º, XXXII, que trata da defesa do consumidor, antes da edição da Lei nº. 8.078/90 era uma norma de eficácia limitada e nem por isso impediria o estado de efetivar sua aplicação. Por exemplo: um juiz reconhecer a vulnerabilidade de um consumidor diante de um caso concreto ou a administração Pública criar um órgão específico para defesa do consumidor.

Portanto, a ausência da edição de um ato legislativo não inviabiliza a eficácia jurídica dos direitos fundamentais. Admitimos que em determinados casos a edição de uma lei que complemente ou que complete as diretrizes estabelecidas pelo constituinte é relevante para efetividade dos direitos, mas não é imprescindível para sua aplicação.

4.4 O ATIVISMO JUDICIAL COMO GARANTIA DOS DIREITOS FUNDAMENTAIS

Em nosso entendimento o ativismo judicial enquanto conduta proativa do Poder Judiciário se justifica na medida excepcional em que for utilizado para garantia dos direitos fundamentais.

Não se justifica termos uma Constituição repleta de direitos se não podemos bem utilizá-los. É necessário que o Judiciário, quando provocado atue de forma efetiva tal como um “oráculo constitucional” de modo a dar eficácia aos seus dispositivos.

Caso contrário teremos uma Constituição simbólica, na perspectiva de Marcelo Neves (2007, p. 23), segundo o qual em brilhante tese sustenta que na dogmática jurídica há um predomínio do simbolismo em detrimento da função jurídico instrumental.

O desafio contemporâneo do direito é a sua eficácia, pois analisando toda a história do constitucionalismo constatamos que a luta pela consagração dos direitos nos rendeu diversos frutos, o que nos falta é efetivá-los. Devemos nos afastar ao máximo do fetichismo do discurso formalista e nos voltar para função social do direito.

Nesse sentido a falta de eficácia dos dispositivos constitucionais leva-nos a descrença do próprio sistema jurídico, de sorte que não podemos consentir com a mera declaração de direitos, mas proporcionar à luz da Constituição a eficácia dos direitos fundamentais.

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Sobre o autor
Matheus Gomes dos Santos

Estagiário no Ministério Público Federal, Procuradoria da República no Rio Grande do Norte, Graduando em Direito pela Universidade Potiguar –UnP.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SANTOS, Matheus Gomes. Supremo Tribunal Federal, ativismo judicial e a (in)efetividade dos direitos fundamentais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 20, n. 4235, 4 fev. 2015. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/30563. Acesso em: 7 nov. 2024.

Mais informações

Artigo apresentado à Universidade Potiguar – UnP, como parte dos requisitos para obtenção do título de Bacharel em Direito.

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