Planos de saúde: quem ganha e quem perde.

06/10/2015 às 20:12
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Os pacientes, por sua vez, recorrem à judicialização da saúde para buscar seus interesses, incorrendo em um alto custo social, pois o sistema de direito torna-se progressivamente mais caro e moroso para resolver um maior número de demandas particulares.

Historicamente a relação entre as operadoras de planos de saúde e os profissionais prestadores de serviços não é totalmente harmônica, o que também pode envolver a qualidade dos tratamentos desempenhados aos pacientes.

 

As reivindicações mais frequentes dizem respeito aos reajustes de honorários dos procedimentos, a menor interferência dos planos na solicitação de exames complementares e a cautela na imposição de glosas (negação do pagamento depois de autorizado e realizado o procedimento pelos profissionais). Pacientes apontam a limitação na cobertura de muitos procedimentos e as elevações de preços.

 

Entendendo que as operadoras são empresas que têm como atividade final gerenciar a prestação de cuidados de saúde, porém com o objetivo de auferir o máximo de lucro, muitas vezes para seus acionistas (e principais clientes), então estes devem naturalmente apoiar decisões como a redução de gastos com a mão de obra dos profissionais, com a demanda de exames e com um mix elevado de intervenções cobertas; tais medidas elevarão os lucros.

 

Neste contexto, é possível identificar três atores com interesses próprios e divergentes. Operadoras querem elevar o lucro reduzindo gastos com honorários e coberturas, profissionais aspiram uma adequada remuneração deduzindo o ganho dos acionistas; pacientes, como consumidores, desejam o máximo de qualidade no atendimento prestado pelos profissionais pelo menor valor pago às operadoras. 

 

As relações observadas remetem à competição descrita pela Teoria dos Jogos (John von Neumann e Oskar Morgenstern, 1944). Nesta, não é possível que todos os atores ganhem ao mesmo tempo, pois sempre que o benefício de um aumentar, será às custas dos outros. Além disso, o equilíbrio de benefícios não é buscado por meio de princípios ético-morais, mas determinado, de modo assimétrico, pelas leis do mercado aberto, considerando variáveis como poder econômico, influência política, necessidade de atenção à saúde, carência de recursos financeiros e assimetria da informação.

 

Como qualquer relação de mercado, mesmo que desigual, esta deve ser tutelada pela norma legal e órgãos reguladores. Neste caso, pela Agência Nacional de Saúde (ANS) em concordância com as partes por meio de contratos de direito civil, ou seja, não existe coerção para aceitação das regras do jogo.

 

Considerando que o vínculo entre profissionais e pacientes não é direto, mas intermediado pelas operadoras, num primeiro momento poderia se pensar que cabe a àqueles, antes de se submeterem à baixa remuneração, analisarem e recusarem. Entretanto a formação essencialmente técnica das grades curriculares das faculdades das profissões da área da saúde, ainda semelhantes àquelas da década de 70 quando o mercado era pouco competitivo e a gestão das clínicas desnecessária, torna os profissionais partes vulneráveis para esta decisão. Sua opção pela busca da intervenção de órgãos de classe para equilibrar as relações muitas vezes se depara com o limitado poder destes.

 

Os pacientes, por sua vez, recorrem à judicialização da saúde para buscar seus interesses, incorrendo em um alto custo social, pois o sistema de direito torna-se progressivamente mais caro e moroso para resolver um maior número de demandas particulares.

 

Nas relações interativas entre os agentes existe a tendência dos jogadores tentarem maximizar seus ganhos, mesmo que esta decisão seja ruim no aspecto coletivo. Do ponto de vista ético, todos deveriam ceder para alcançar um equilíbrio, porém para tomar a decisão, neste caso, os três jogadores priorizam o aspecto econômico em busca do maior ganho material. Esta análise é ditada pela lógica, independente de qualquer julgamento moral, pois, ao tentar entender os conflitos por meio da razão, não há espaço para conceitos subjetivos de “bem” e “mal”.

 

As operadoras ganham o jogo quando possuem maior poder econômico e político em relação às outras partes. Os profissionais sujeitam-se ao jogo porque exercem suas profissões num ambiente no qual a saúde foi socializada pelo grande número de profissionais e consequente redução de honorários. A sociedade depende do jogo quando é tributada em termos elevados, porém não recebe a contrapartida equivalente do Estado em relação aos cuidados de saúde e bem-estar.   

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Sobre a autora
Giorgia Bach Malacarne

Advogada. Especialista em Processo Civil. Atuação em processos da área da saúde. contato: [email protected]

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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