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Divulgação de conversa telefônica de família de Lula e danos morais

05/05/2016 às 09:52
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A ex-primeira-dama Marisa Letícia, o filho e a nora entraram na Justiça contra a União pedindo indenização em virtude da divulgação de suas conversas telefônicas por Sergio Moro.

A ex-primeira-dama e mulher do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Marisa Letícia, o filho dela, Fábio Luís Lula da Silva, e a nora, Renata Moreira entraram na Justiça contra a União por danos morais e pedem indenização. O motivo das ações, segundo a defesa, foi a divulgação de conversas telefônicas entre eles interceptadas na Operação Lava Jato.

Na ação em nome de Marisa, os advogados pedem indenização de "não menos de R$ 100 mil". Na ação em nome de Fábio e Renata, a defesa pede R$ 100 mil para cada um.

Em um dos diálogos, grampeados e divulgados com autorização do juiz Sérgio Moro, da Justiça Federal do Paraná, mostram a ex-primeira-dama chamando de "coxinhas" os opositores do governo Dilma Rousseff.

A defesa alega que a interceptação foi ilegal e, além disso, o material deveria ser mantido em sigilo.

Ainda segundo os advogados da família de Lula, Moro desrespeitou a legislação e "causou danos morais aos autores das ações".

Poderá haver ação de regresso da União Federal contra o juiz Sérgio Moro caso fique provado que agiu por dolo ou por culpa grave. Para tanto, será necessário apurar o fato perante o Conselho Nacional de Justiça, sendo ouvida a Corregedoria competente.

Fala-se em dano moral.

 Louve-me da lição de Sérgio Cavalieri Filho (Programa de Responsabilidade Civil, 9ª edição revista e ampliada, São Paulo, Atlas, pág. 82) para quem se pode conceituar o dano moral por dois aspectos distintos. Em sentido estrito, dano moral é a violação do direito à dignidade. Por essa razão, por considerar a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, da honra e da imagem corolário do direito à dignidade que a Constituição inseriu em seu artigo 5º, V e X, a plena reparação do dano moral.

Sendo assim qualquer agressão à dignidade pessoal que lesiona à honra, constitui dano moral e é indenizável. ¨

É a linha do pensamento trazido pelo Ministro Cézar Peluso, no julgamento do RE 447.584/RJ, DJ de 16 de março de 2007, onde se acolhe a proteção do dano moral como verdadeira tutela constitucional da dignidade da pessoa humana, considerando-a como um autêntico direito à integridade ou incolumidade moral, pertencente à classe dos direitos absolutos.

A lei de interceptação telefônica (9.296/1996) é muito clara quando prevê que todas as gravações serão autuadas em apartado e permanecerão sob sigilo. Tanto o seu conteúdo como as suas transcrições. A lei prevê, inclusive, que todas as gravações que não interessarem às investigações sejam inutilizadas, para não haver nenhum risco de divulgação da intimidade.

A Administração Pública responde objetivamente pelos danos causados por seus agentes, conforme estabelece o artigo 37, parágrafo 6º, da Constituição. O juiz da “lava jato”, ao divulgar o conteúdo dos grampos feitos em aparelhos ligados a Lula, violou o artigo 8º da Lei das Interceptações Telefônicas (Lei 9.296/1996), que determina o sigilo das gravações e transcrições.

Essa responsabilidade independe de culpa do Estado.

Necessário trazer alguns entendimentos com relação a responsabilidade civil do Estado.

Caio Tácito (RDA 55/262) entende cabível a responsabilidade objetiva nos casos de dano anormal, decorrente de atividade lícita do Poder Público, mas lesiva ao particular.

Em posição oposta estão Aguiar Dias (RDA 15/65), Mário Mazagão (Curso de direito administrativo, 6ª edição, RT, 1977, pág. 203) e ainda Hely Lopes Meirelles(Direito administrativo brasileiro, 32ª edição, São Paulo, pág. 2006), todos considerando que desde o texto de 1988, a responsabilidade objetiva é a regra.

Sabe-se que os elementos que compõem a estrutura e delineiam o perfil da responsabilidade objetiva do Estado compreendem: a) a alteridade do dano; b) a causalidade material entre o evento damni e o comportamento positivo(ação) ou negativo(omissão) do agente público; c) a oficialidade da atividade causal e lesiva, imputável a agente do Poder Público, que tenha, nessa condição funcional, incidido em conduta comissiva ou omissiva, independente de licitude ou não do comportamento funcional(RE 109.615 – 2, Relator Ministro Celso de Mello, DJU de 2 de agosto de 1996); d) ausência de causa excludente da responsabilidade funcional estatal(RTJ 55/503; RTJ 71/99; RTJ 991/3.777).

No julgamento do RE 580.252/MS, o Ministro Relator Teori Zavascki destacou que  o artigo 37, § 6º, da Constituição Federal é preceito normativo autoaplicável, de modo que ocorrendo o dano e estabelecido o seu nexo causal com a atuação da Administração ou dos seus agentes, nasce a responsabilidade civil do Estado.

É o que se lê da Lei em tela:

 Art. 8° A interceptação de comunicação telefônica, de qualquer natureza, ocorrerá em autos apartados, apensados aos autos do inquérito policial ou do processo criminal, preservando-se o sigilo das diligências, gravações e transcrições respectivas.

Parágrafo único. A apensação somente poderá ser realizada imediatamente antes do relatório da autoridade, quando se tratar de inquérito policial (Código de Processo Penal, art.10, § 1°) ou na conclusão do processo ao juiz para o despacho decorrente do disposto nos arts. 407, 502 ou 538 do Código de Processo Penal.

 Art. 9° A gravação que não interessar à prova será inutilizada por decisão judicial, durante o inquérito, a instrução processual ou após esta, em virtude de requerimento do Ministério Público ou da parte interessada

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Há o entendimento de que o texto legal não permite exceções.
 Não haveria espaço para que o interesse público pudesse sobrepujar a garantia individual do sigilo. Aplica-se a devida proporcionalidade sempre em favor da defesa dessa garantia.

Não se pode expor, de forma indevida, a privacidade de interlocutores que têm suas conversações objeto de interceptação mesmo que judicial.

O Poder Judiciário tem que exercer seu papel com prudência, com serenidade, com racionalidade, sem protagonismos, porque é isso que a sociedade espera de um juiz.

Necessário cuidado do juiz na revelação desses fatos privados à sociedade.

É crime, segundo o artigo 325 do Código Penal, revelar fato de que tem ciência, em relação ao cargo, e que deva permanecer em segredo ou facilitar-lhe a revelação.

O elemento subjetivo é o dolo, mas não se exige um dolo específico.

A ilicitude da conduta é sintetizada pela expressão, “sem autorização”.

Pelo principio da especialidade, aplica-se o artigo 10 da Lei 9.296/98, onde se diz:

Art. 10. Constitui crime realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática, ou quebrar segredo da Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei.

Pena: reclusão, de dois a quatro anos, e multa.

Não se pode quebrar segredo de justiça com objetivos não autorizados em lei.

No modelo constitucional que temos, desde 1988, é razoável entender que há um direito do indivíduo de excluir do conhecimento de terceiros aquilo que a ele, só a ele, é pertinente e que diz respeito ao seu modo de ser exclusivo, seu way of life, no âmbito de sua vida privada.
 Para René Ariel Dotti (Proteção da vida privada e liberdade de informação, São Paulo, 1980), a intimidade se caracteriza como “a esfera secreta da vida do indivíduo na qual este tem o poder legal de evitar os demais”. Adriano de Cupis (Riservatezza e segretto, 1969, pág. 115) ensina que a intimidade é o modo de ser da pessoa que consiste na exclusão do conhecimento de outrem de quanto se refira à pessoa mesma.

 Aguarda-se um pronunciamento do Judiciário na matéria.

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Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. Divulgação de conversa telefônica de família de Lula e danos morais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4691, 5 mai. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/48731. Acesso em: 28 dez. 2024.

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