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Condenação por dano moral nas ações de improbidade administrativa

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3 A CONDENAÇÃO POR DANO MORAL NAS AÇÕES DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – Posição da Doutrina e da jurisprudência

Através da súmula 227, do STJ, confirmou-se o cabimento da indenização do dano moral contra pessoa jurídica, não existindo qualquer dúvida no direito contemporâneo.

Pablo Stolze (2009, p.80) afirma que: "se é certo que jamais uma pessoa jurídica terá vida privada, mais evidente ainda é que ela pode e deve zelar pelo seu nome e imagem perante o público alvo, sob pena de perder largos espaços na acirrada concorrência de mercado."

Em sentido idêntico, sem fazer restrição quanto à natureza jurídica da pessoa jurídica afetada, Sílvio De Salvo Venosa (2009, p. 295 e 296) afirma:

“Durante muito tempo a doutrina mais antiga, com base na ofensa dos direitos personalíssimos refutou a ideia de possibilidade de dano moral à pessoa jurídica. Em princípio, todo dano que possa sofrer a pessoa jurídica terá um reflexo patrimonial.
... Em se tratando de pessoa jurídica, o dano moral de que é vítima atinge seu nome e tradição de mercado e terá sempre repercussão econômica, ainda que indireta”.

Fazzio Júnior (2001, p. 305) afirma que "quando o sujeito passivo é ente da administração indireta ou fundacional, pode ter sua imagem seriamente lesionada pela atuação do prefeito. Não é só de dano ao erário que cuida a LIA".

O referido autor não vê por que não possa o Ministério Público promover ação civil pública para conseguir o ressarcimento de dano moral causado por ato de improbidade do prefeito contra, por exemplo, empresa pública ou fundação pública municipal.

A jurisprudência pátria admite a possibilidade de condenação por dano moral decorrente de ato de improbidade administrativa5.

O STJ já afirmou ser perfeitamente cabível o dano moral contra a pessoa jurídica de direito público:

ADMINISTRATIVO. IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. DANO AO ERÁRIO. MULTA CIVIL. DANO MORAL. POSSIBILIDADE. PRESCRIÇÃO. 1. Afastada a multa civil com fundamento no princípio da proporcionalidade, não cabe se alegar violação do artigo 12, II, da LIA por deficiência de fundamentação, sem que a tese tenha sido anteriormente suscitada. Ocorrência do óbice das Súmulas 7 e 211/STJ. 2. "A norma constante do art. 23 da Lei nº 8.429 regulamentou especificamente a primeira parte do § 5º do art. 37 da Constituição Federal. À segunda parte, que diz respeito às ações de ressarcimento ao erário, por carecer de regulamentação, aplica-se a prescrição vintenária preceituada no Código Civil (art. 177 do CC de 1916)" REsp 601.961/MG, Rel. Min. João Otávio . de Noronha, DJU de 21.08.07. 3. Não há vedação legal ao entendimento de que cabem danos morais em ações que discutam improbidade administrativa seja pela frustração trazida pelo ato ímprobo na comunidade, seja pelo desprestígio efetivo causado à entidade pública que dificulte a ação estatal. 4. A aferição de tal dano deve ser feita no caso concreto com base em análise detida das provas dos autos que comprovem efetivo dano à coletividade, os quais ultrapassam a mera insatisfação com a atividade administrativa. 5. Superado o tema da prescrição, devem os autos retornar à origem para julgamento do mérito da apelação referente ao recorrido Selmi José Rodrigues e quanto à ocorrência e mensuração de eventual dano moral causado por ato de improbidade administrativa. 6.

Recurso especial conhecido em parte e provido também em parte. (STJ - REsp: 960926 MG 2007/0066794-2, Relator: Ministro CASTRO MEIRA, Data de Julgamento: 18/03/2008, T2 - SEGUNDA TURMA, Data de Publicação: DJe 01/04/2008)

Assim, de acordo com a doutrina majoritária e com o STJ (Resp 960926/MG, 2ª Tuma, j. 18/03/2008), é possível a condenação do agente público ao ressarcimento dos danos morais quando a sua conduta ímproba causa desprestígio à entidade pública lesada.

Isso porque o STJ consolidou o entendimento de que as pessoas jurídicas podem sofrer dano moral (súmula 227) e a defesa da probidade administrativa tem natureza de direito difuso, passível de tutela por meio de ação civil pública, sendo que a Lei 7.347/1985 prevê expressamente em seu art. 1º a possibilidade de reparação dos danos morais.

Todavia, hodiernamente, revendo seu posicionamento, o Superior Tribunal de Justiça, decidiu que não é possível que um ente público seja indenizado por dano moral sob a alegação de que sua honra ou imagem foram violadas6.

É importante consignar que tal matéria não encontra-se pacificada, tendo em vista que ainda não foi submetida ao Plenário da Corte.


4 OS SUJEITOS PASSIVOS DO DANO MORAL RESULTANTE DE ATO DE IMPROBIDADE

Em que pese tratar-se de matéria controvertida, o ato de improbidade administrativa, em tese, enquanto prática prejudicial ao patrimônio público, pode ensejar a configuração de um dano extrapatrimonial que alcançará tanto a pessoa jurídica de direito público quanto a própria coletividade.

4.1 A ADMINISTRAÇÃO PÚBLICA

Ocorrendo danos morais decorrentes de atos de improbidade, um dos sujeitos passivos é a própria Administração Pública, seja ela direta ou indireta, uma vez que tais atos maculam o direito que possui a Administração Pública de ver respeitados, os princípios constitucionais e interferem negativamente em sua reputação, respeitabilidade e confiabilidade perante o cidadão administrado.

Havendo dano moral causado à Administração Pública por ato de improbidade administrativa, eventual condenação em dinheiro deverá reverter à pessoa jurídica lesada,tal qual preceitua o art. 18 da Lei n. 8.429/1992 .

4.2 A COLETIVIDADE

Uma dificuldade pertinente à reparação do dano moral coletivo é constatada pelo fato de a Lei n. 8.429/1992 somente abordar os danos causados ao patrimônio das pessoas jurídicas referidas em seu art. 1º , o que poderia não incluir o dano moral causado à coletividade. Para contornar o obstáculo, segundo Garcia e Alves (2011, p. 537), "deve-se observar que o patrimônio público, de natureza moral ou patrimonial, em verdade, pertence à própria coletividade, o que, ipso facto, demonstra que qualquer dano causado àquele erige-se como dano causado a esta".

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O reconhecimento do dano moral enquanto dano in actio ipsa, o que dispensa a demonstração da efetiva dor e sofrimento, exigindo, apenas, a prova da conduta tida como ilícita, é um claro indicativo da possibilidade de sua defesa no plano transindividual, volvendo o montante da indenização em benefício de toda a coletividade, que é vista em sua inteireza, não dissecada numa visão anatômica, pulverizada entre os indivíduos que a integram.

Para que seja demonstrada a existência e a possibilidade de reparação do dano moral coletivo, sequer é preciso recorrer à figura dos danos punitivos ("punitive damages").

Danos à moralidade e probidade, além do prejuízo de ordem material, que é medido valorando o custo estimado para a recomposição do status quo, causam evidente comoção no meio social, sendo passíveis de caracterizar um dano moral coletivo.

De toda forma, por ter a defesa da probidade administrativa natureza de DIREITO DIFUSO, cabe dano moral coletivo, argumento também utilizado pela STJ.

A indenização do dano moral causado à coletividade por ato de improbidade administrativa não deve reverter à pessoa jurídica lesada, nesse caso deve-se aplicar o disposto no art. 13 da Lei nº 7.347/85 (“Havendo condenação em dinheiro, a indenização pelo dano causado reverterá a um fundo...”).


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Os atos de improbidade administrativa violam os princípios da Administração Pública e têm como consequências, além de enriquecimento ilícito de alguma pessoa ou da provocação de dano ao patrimônio público, um dano moral, qual seja, o dano à legitimidade da Administração Pública.

Atualmente o direito à indenização por dano moral está consagrado no artigo 5º da Constituição Federal. Apesar disso, continua sendo um tema controvertido, sobretudo em relação aos critérios para quantificação desta indenização e a sua possível banalização, havendo inclusive aqueles que afirmam existir uma indústria do dano moral.

A reparação do dano moral causado à Administração Pública decorrente da prática de ato de improbidade administrativa pode ser pleiteada, mas se deve observar o princípio da proporcionalidade, de modo a não se desconsiderar que algumas violações a princípios atinentes à improbidade administrativa podem se dar com menor carga de intencionalidade e com repercussão econômica pouco significativa. Sendo assim, é preciso aferir até quanto é compensatória e produtiva a busca pela reparação.

Os valores de ordem não material, tais quais a legitimidade, a respeitabilidade, a honorabilidade, a dignidade, a boa imagem, são juridicamente tutelados e, quando violados, ensejam podem ensejar a caracterização de um dano que deve ser integralmente reparado, em que pese entendimento recente do STJ repelindo tal entendimento.

Por fim, em relação aos sujeito ativos do DANO MORAL RESULTANTE DE ATO DE IMPROBIDADE, há controvérsias se eventual condenação em dinheiro deverá reverter à pessoa jurídica lesada, tal qual preceitua o art. 18 da Lei n. 8.429/1992, ou, se não deve reverter à pessoa jurídica lesada, nesse caso devendo-se aplicar o disposto no art. 13 da Lei nº 7.347/85 (“Havendo condenação em dinheiro, a indenização pelo dano causado reverterá a um fundo...”).


REFERÊNCIAS

BRASIL. Lei nº 8.924, de 1996. Brasília: Senado Federal, 1996.

_______. Decreto-Lei 200/1967. Brasília, em 25 de fevereiro de 1967. In http://www.planalto.gov.br/CCivil/Decreto-Lei/Del0200.htm

CONSTITUIÇÃO DA REPUBLICA FEDERATIVA DO BRASIL. Texto promulgado em 05 de outubro de 1988. In www.senado.gov.br/sf/legislacao/const/.

DELGADO, Rodrigo Mendes.O valor do dano moral. 2.ed. São Paulo: JHMIEVRO, 2004.

GARCIA, Emerson; ALVES, Rogério Pacheco. Improbidade Administrativa, Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2004.

DI PIETRO, Maria Sylvia, Direito Administrativo, 29.ed. São Paulo: Forense, 2016.

FILHO, José Dos Santos Carvalho, Manual de Direito Administrativo, 30. ed. Rio de Janeiro: Atlas, 2016.

FROTA, Pablo Malheiros da Cunha. Danos morais e a pessoa jurídica. São Paulo: Método, 2008.

MATTOS, Mauro Roberto Gomes de. O limite da improbidade administrativa. Niterói: Ímpetus, 2009.

NETO, Luiz Gonzaga Pereira. Os agentes políticos e sua responsabilização à luz da Lei nº 8.429.Pernambuco: Nossa Livraria Editora: 2008.

_______________________. Imbrobidade Administrativa. 2.ed.Pernambuco: Nossa Livraria Editora: 2011.

SILVA, Almiro do Couto e. Notas Sobre o Dano Moral no Direito Administrativo. Revista Eletrônica de Direito do Estado, nº 18. Acesso em 25 de julho de 2016.

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Sobre a autora
Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARAÚJO, Jéssica Samara Freitas. Condenação por dano moral nas ações de improbidade administrativa. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 21, n. 4781, 3 ago. 2016. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/50968. Acesso em: 24 abr. 2024.

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