Interessante é o caso do usufruto judicial na execução por quantia certa, que se distingue do direito real previsto de forma taxativa na lei civil. Mais se identifica com um direito real temporário que muito se assemelha à anticrese.
O pagamento ao exequente (recebimento do crédito) com usufruto é, como o próprio nome já diz, uma forma de pagamento em execução judicial, ao lado da entrega de dinheiro e da adjudicação. Segundo Luiz Fux:
Essa terceira modalidade de pagamento distingue-se das anteriores porquanto é paulatina, operando-se pro solvendo e não pro soluto como a entrega do dinheiro ou coisa. O exeqüente, nesta espécie de pagamento reserva-se o direito de ‘receber o resultado da expropriação econômica do bem’, por isso, no ‘direito alienígena’ o instituto tem a denominação de ‘adjudicação de rendimentos’ ou ‘administração forçada’, como preferiam os antigos processualistas nacionais.
A forma de recebimento do crédito exeqüendo efetiva-se mediante recolhimento gradativo dos frutos dos bens penhorados, deduzindo-se do crédito exeqüendo. Como se pode observar, o instituto mais se parece com a ‘anticrese’ do que com o usufruto. De toda sorte, institui-se um direito real processual temporário.
Identifica-se o instituto como forma de pagamento na execução, mediante a qual se confere judicialmente ao exeqüente direito real temporário sobre o bem penhorado, até que os frutos ou rendimentos do bem satisfaçam o crédito executado.
Do ponto de vista do devedor, o usufruto judicial também não deixa de ser, como prevê o CPC (art. 647, IV), uma "forma de expropriação", pois, com a instituição do usufruto, o executado perde boa parcela do seu direito real sobre o imóvel penhorado, restando-lhe apenas a nua propriedade, como será mais alentadamente desenvolvido em momento oportuno.
O usufruto judicial, ao contrário do que já sustentou a clássica doutrina de Celso Neves, não é "negócio jurídico processual", posição que tinha como argumento de sustentação a necessidade de concordância de ambas as partes. Bastante pertinente nesse sentido é a crítica de Barbosa Moreira [eis que não se tem aqui acordo, pois cabe à decisão judicial baseada no art. 716, do CPC, e não às partes, a instituição de usufruto judicial].
Com a nova redação do art. 722, do CPC, pela Lei 11.382/06, tal posicionamento se justifica menos ainda, pois a lei não mais prevê a concordância do executado quanto à instituição do usufruto judicial, mas tão-só a sua manifestação, em respeito ao contraditório.
Importante observar também que o pagamento ao credor com usufruto de imóvel não se confunde com a penhora de direito de usufruto nem com a penhora de rendimentos ou créditos (ex.: a penhora de crédito de aluguel), pois o usufruto judicial não é penhora, a qual já incide sobre o bem e não sobre direitos (sejam reais ou pessoais).
Essas as linhas já dadas pelo CPC de 1973. Já sob o Código de Processo Civil de 2015 a adjudicação surge com a primazia dentre as formas de satisfação do credor.
Através deste instituto, não se expropria o bem, mas apenas o direito de fruir do bem por determinado período de tempo.
A sua constituição independe de registro na matrícula do imóvel.
Somente o exequente pode requerer que lhe seja atribuído o usufruto do bem penhorado.
Requerido o usufruto, o executado terá oportunidade para se manifestar, podendo alegar que o usufruto não é idôneo a satisfazer o crédito, ou que existe outro meio igualmente idôneo, mas que lhe traz menor gravame.
Em sendo viável o usufruto, o juiz nomeará perito para avaliar os frutos e rendimentos que o bem pode gerar, bem como para estimar o tempo necessário para a quitação da dívida executada, composta pelo principal, juros, custas e honorários advocatícios. O laudo do perito poderá ser impugnado pelas partes em prazo fixado pelo juiz.
Deferido o usufruto, em caso de imóvel, mandará o juiz expedir carta para a averbação do usufruto na matrícula do imóvel. Devem constar da carta a identificação do imóvel e as cópias do laudo pericial e da decisão. Porém, os efeitos do usufruto perante terceiros são produzidos antes mesmo desta averbação, que tem validade a partir da publicação da decisão que concedeu o usufruto.
Ao decretar o usufruto, o juiz nomeará administrador, que será investido de todos os poderes que concernem ao usufrutuário da coisa, podendo este administrador ser o próprio credor, desde que haja concordância do executado.
Os frutos e rendimentos do bem serão entregues ao administrador que repassará ao credor até a satisfação do crédito.
Quitada integralmente a dívida, seus acessórios e os consectários processuais, extingue-se o usufruto, restituindo-se todos os poderes sobre a coisa ao respectivo titular.
É diverso o usufruto como direito real, que se distancia da forma instrumental.
a) É direito real sobre coisa alheia: sendo direito real, tem oponibilidade erga omnes e, em consequência, direito de sequela, o que permite ao titular, usufrutuário, buscar a coisa nas mãos de quem estiver, de forma injusta, para dela usar e gozar como lhe é assegurado. A defesa de seu direito é feita por meio de ação real. Assim leciona Rodrigues (2006, p. 297):
Recai diretamente sobre a coisa, não precisando seu titular, para exercer seu direito, de prestação positiva de quem quer que seja. Vem munido do direito de sequela, ou seja, da prerrogativa concedida ao usufrutuário de perseguir a coisa nas mãos de quem quer que injustamente a detenha, para usá-la e desfrutá-la como lhe compete. É um direito oponível erga omnes e sua defesa se faz através de ação real.
b) É um direito temporário: consoante dispõe o Código Civil o usufruto se extingue pela renúncia ou morte do usufrutuário (art. 1.410, I); pelo termo de sua duração (art. 1.410, II); pelo decurso do prazo de trinta anos da data em que se começou a exercer, se instituído em favor de pessoa jurídica (art. 1.410, III); e pela cessação do motivo de que se origina (art. 1.410, IV).
Deve o direito de usufruto ser temporário, pois, do contrário, seria prejudicial à expectativa do nu-proprietário de recuperar a propriedade plena, não mais despojada dos elementos que lhe dão conteúdo.
Esse caráter transitório decorre de seu conteúdo intuitu personae, pois a única finalidade do usufruto é beneficiar pessoas determinadas. Tanto assim o é que, falecendo o usufrutuário, o direito não se transmite aos herdeiros, ainda que o usufruto tenha sido instituído por prazo certo e a morte tenha ocorrido antes do termo de duração.
O prazo máximo de trinta anos de duração do direito, se o titular for pessoa jurídica, explica-se pela imprevisibilidade de sua duração. Apesar de jamais ser perpétuo, o que, frise-se, desconfiguraria o instituto, o direito pode ser vitalício, isto é, durar a vida inteira do usufrutuário.