A condenação de Lula (3x0) pelo TRF-4, Porto Alegre (24.01.2018) trará consequências diversas. A primeira é que não é bom ser pessimista demais, ainda que o realismo assim se nos imponha. Duas outras são mais previsíveis:
1. A sensação de que a lava jato continuará. A mídia fará seus jogos, mas o senso comum assim pensará. Pode acontecer ou poderá ser mantido, este sentimento, por algum tempo. Até por anos. A barganha da mídia viria nas próximas emendas constitucionais. O mercado teria pavimentado o apoio popular.
2. A segunda previsão, já encenada em 2016, será o crescimento exponencial do fascismo: nas instituições, nas ruas e na vida privada. Basta lembrar que já se foi o Estado Laico, por ordem do STF. Nas ruas, e é uma estatística a ser contabilizada, a violência será mais volumosa do que agora.
Neste caso, há uma hipérbole que cresce e unifica a contínua violência política com a crescente violência social. Além do fato de que as cinco maiores fortunas pessoais equivalem à renda de metade da população, alguns fenômenos são facilmente observáveis: feminicídio, homofobia e racismo. Peças de teatro e shows populares foram cancelados por ordem judicial. Os clérigos da lei já pagam o dízimo às suas igrejas partidárias. E, no lugar do controle sobre o secretismo do Poder Político, prospera a censura. Todos esses números estarão aos olhos no restante de 2018.
Isto é, são crimes que crescem e não diminuem no Brasil pós-2016. Para a resistência, é o patamar do padrão civilizatório que desmontou. Quem lutava pela Revolução Burguesa (leia-se Estado de Direito), agora se agarra nos últimos lastros do processo civilizatório: é o que também se chama de barbárie. Na mesma esteira do trabalho escravo e dos crimes ambientais. Para a resistência, também foi desmontado o Estado Ambiental que se fortalecia no Estado Democrático de Direito. Já desconhecemos a denominada Terceira Geração de direitos. Ou não há reconhecimento, no sentido jurídico da expressão.
O epicentro deste fascismo, no entanto, corresponde à chamada “Mexicanização”: na economia sem direitos fundamentais (ALCA) e na cartelização do crime organizado: tráfico de todo gênero. Os criminosos de todos os tipos não têm receio do Estado; afinal, “se ninguém manda, mando eu”. Outros números a serem checados são de roubo a carga, roubo a bancos (novo cangaço), mesmo com 10 mil militares no Rio de Janeiro. O RJ é o Brasil amanhã?
Há que se frisar que o crime organizado ressoa a 1970. Não há novidades no RJ, a não ser o recado dado em 2016: “vale tudo por dinheiro” (e poder). A forte sensação de gangsterismo não é à toa e nem passageira. É o que se chamava antigamente de Estado Paralelo. Todavia, as redes sociais darão conta disso. Ainda que o poder social de resistência seja quase pífio, uma vez que é sonora a desnaturalização da Política: “o azar de quem não gosta de política, é que há os que adoram”. Contudo, em tempos de redes sociais, as mazelas serão bem ditas.
Este caso, entretanto, não se confunde com o Estado de Exceção - que é uma forte regulamentação da Política (está até na CF88) -, mas é equiparado à racionalidade expandida do fascismo. Racionalidade do poder do mais forte e que nos diz agir em favor do Estado Moderno.
Nesta Razão de Estado (de exceção), a justificativa do Estado forte (mais segurança) vem da retenção, exclusão da Política. Por isso, sempre, "a questão de política é uma questão de polícia". Ou seja, mais universidades serão invadidas pelas polícias, mais grupos de estudos marxistas serão atacados por ação cominada do Judiciário e do Ministério Público. Professores e reitores deverão ser algemados, alunos enquadrados na tipologia de organização criminosa. Tudo isso já ocorreu no pós-2016.
No outro lado da equação "despolitizada", a guerra entre PCC e CV, apenas iniciada, produzirá uma enxurrada de GLOs (Garantia de Lei e Ordem): o mecanismo de exceção que tipifica o atual nível do Estado de Emergência Institucional ou só relata a qualidade das políticas públicas nacionais.
É óbvio que, diante da violência uniforme (sensação eterna de insegurança), decresce a Política. Cresce a polícia: o manu militari constitucional. Também crescerá ainda mais o apelo por Intervenção Militar e, para não ser Golpe Militar, haveria emenda constitucional.
No México de 2017 houve forte resistência, até porque o tráfico corrompeu às forças armadas nas áreas ocupadas. Também na França, aterrorizada, o Estado de Emergência foi barrado. Porém, diferente daqui, lá na França, a Política é forte: desde 1789. Na Argentina ainda há enfrentamento, apesar de a direita ter vencido.
Com a condenação de Lula (de toda a esquerda) e da Política - "todos são bandidos" -, a resistência seria vencida na TV. Basta ver que o Estatuto do Desarmamento está na mira do Congresso Nacional: e a bancada da bala aumentará a militarização social. Quem é o "cidadão de bem" armado? É o homem médio em sua vida comum, agora eivado de ódio e pronto para alvejar seus inimigos. O magistrado não é um homem médio, pelo que retém da lei, e porque tem porte de armas. Alguns até atiram com fuzis no Facebook e no Twitter.
Assim, crescem o fascismo e seu suporte jurídico: Estado de Emergência.
O que deveremos ver, então, no quadro da “Mexicanização”, é o poder nu: “quem pode mais, chora menos”. Por fim, a lógica política inclina à sugestão de que o fascismo levará à “Mexicanização”. O emprego da exceptio, da violência institucional, é ato contínuo, mas mero recurso de “acréscimo de poder”.
Porque vem daí sua justificativa para existir: no fascismo, a violência se combate com violência; enfrentamento policial, milicianos, grupos de extermínio – tanto faz, o que conta é o resultado. Ou o Estado se une a ela, como fez a Máfia de Mussolini contra os trabalhadores. Nos dois casos, como o recurso é a violência, a solução do “Estado de Direito” é criminalizar as relações sociais.
Aliás, a pobreza hedionda sempre foi combatida. No entanto, cinicamente; pois, vigora(va) o “crime de vadiagem” e não a socialização das riquezas. Também não é à toa e nem por desvio de função que o STF julga “furto de chocolates” ou de pães. Furto. Veja-se bem.
De certo modo, pode-se dizer que este é cálculo político da violência. Se o desencantamento do mundo (“desmagificação”) gerou o Estado de Direito, na mesma sorte trouxe o Estado de Emergência e a exceção à Política.
Aprendemos no fascismo que nem todos são animais políticos. Alguns são apenas bestializados, domesticados, adestrados para olhar para o outro lado. Só que é o outro lado em que não há o(a) Outro(a).