A Lei 13.804, de 10 de janeiro/2019, instituiu importantes mudanças no CTB (Código de Trânsito Brasileiro), prevendo a suspensão do direito de dirigir e a cassação da CNH do agente, quando for comprovada a utilização de veículo para fins da prática de contrabando, receptação e descaminho.
Eis o teor da novel alteração:
Art. 2º A Lei nº 9.503, de 23 de setembro de 1997 (Código de Trânsito Brasileiro), passa a vigorar acrescida do seguinte art. 278-A:
“Art. 278-A. O condutor que se utilize de veículo para a prática do crime de receptação, descaminho, contrabando, previstos nos arts. 180, 334 e 334-A do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), condenado por um desses crimes em decisão judicial transitada em julgado, terá cassado seu documento de habilitação ou será proibido de obter a habilitação para dirigir veículo automotor pelo prazo de 5 (cinco) anos.
§ 1º O condutor condenado poderá requerer sua reabilitação, submetendo-se a todos os exames necessários à habilitação, na forma deste Código.
§ 2º No caso do condutor preso em flagrante na prática dos crimes de que trata o caput deste artigo, poderá o juiz, em qualquer fase da investigação ou da ação penal, se houver necessidade para a garantia da ordem pública, como medida cautelar, de ofício, ou a requerimento do Ministério Público ou ainda mediante representação da autoridade policial, decretar, em decisão motivada, a suspensão da permissão ou da habilitação para dirigir veículo automotor, ou a proibição de sua obtenção.”
Com efeito, a primeira parte da lei previu a cassação do documento da habilitação ou a proibição de obtê-la, pelo prazo de 05 (cinco) anos, após o trânsito em julgado de decisão judicial que reconheça a incidência dos delitos de receptação, descaminho ou contrabando.
Nesse ponto, a medida legislativa tem por finalidade coibir a receptação de cargas, transporte irregular de mercadoria estrangeira, entre outros, penalizando motoristas que forem condenados, por terem perpetrado tais delitos.
Destarte, o magistrado, após o respectivo trânsito em julgado da decisão, deverá cientificar a autoridade administrativa de trânsito para a efetivação da imposição das medidas restritivas de direitos ora previstas, que deve ser aplicada, sem prejuízo da incidência de eventuais outras sanções criminais decorrentes da comprovação dos aludidos delitos.
É mais uma medida legislativa que se enquadra na necessidade de impor eficiência ao direito penal, sem olvidar do devido processo legal e demais garantias constitucionais prevista na Lei Maior (Constituição Federal).
De outro lado, foi vetado o dispositivo que previa a cassação (baixa) do CNPJ (Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica) da pessoa jurídica, que transportasse, distribuísse, armazenasse ou comercializasse produtos oriundos dos referidos crimes.
Além disso, a lei previu que o magistrado decrete a suspensão da permissão da habilitação ou a proibição para sua obtenção, a requerimento do MP, representação da autoridade policial ou de ofício.
Nesse ponto, a situação se enquadra nas intituladas medidas alternativas (cautelares) à prisão preventiva, isto é, não havendo fundamentos para a decretação da custódia cautelar, poderá o magistrado impor as medidas alternativas à prisão, em conformidade com o princípio da proporcionalidade.
Vale ressaltar que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) vem admitindo até a imposição da perda do veículo, quando incidir ato doloso do agente, in verbis:
"Dá ensejo à pena de perda do veículo a conduta dolosa do transportador que utiliza veículo próprio para conduzir ao território nacional mercadoria estrangeira sujeita à pena de perdimento, independentemente de o valor do veículo ser desproporcional ao valor das mercadorias apreendidas. De fato, o inciso V do art. 104 do Decreto-Lei 37/1966 dispõe que a pena de perda do veículo é aplicada "quando o veículo conduzir mercadoria sujeita à pena de perda, se pertencente ao responsável por infração punível com aquela sanção". Nessa mesma linha, o inciso V do art. 688 do Decreto 6.759/2009, por sua vez, dispõe que se aplica a pena de perdimento do veículo, por configurar dano ao Erário, "quando o veículo conduzir mercadoria sujeita a perdimento, se pertencente ao responsável por infração punível com essa penalidade". Nesse contexto, até mesmo em atenção ao que dispõe a Súmula Vinculante 10 do STF, não se mostra adequado que se afaste a norma legal em razão da simples comparação entre os valores das mercadorias e do veículo que as transporta, ao pretexto de observância do princípio da proporcionalidade, salvo se declarada sua inconstitucionalidade. Além disso, "na aplicação da lei, o juiz atenderá aos fins sociais a que ela se dirige e às exigências do bem comum" (art. 5º da LINDB). Nesse passo, não há dúvidas de que a legislação aduaneira, ao tratar da pena de perdimento de veículo, é severa em razão de uma finalidade nítida, como coibir a sonegação tributária, por meio do descaminho ou de contrabando. Nessa linha, deve-se entender, como acima assinalado, que a pena de perdimento do veículo (inciso V do art. 688 do Decreto 6.759/2009 e inciso V do art. 104 do Decreto-Lei 37/1966), refere-se à conduta dolosa do transportador na internalização de sua própria mercadoria em veículo de sua propriedade. (STJ, REsp 1.498.870-PR, Rel. Min. Benedito Gonçalves, julgado em 12/2/2015, DJe 24/2/2015).
No mesmo sentido, previa o enunciado da Súmula n. 138, do extinto TFR: "A pena de perdimento de veículo utilizado em contrabando ou descaminho somente é aplicada se demonstrada a responsabilidade do proprietário na prática do delito".
Registre-se que a alteração na legislação vem ao encontro da necessidade de se impor leis mais rígidas no combate à criminalidade, o que ensejará a atuação coordenada e o fortalecimento dos órgãos públicos, a fim de coibir a prática de tais delitos, estimulando a eficiência da atividade persecutória estatal.
Por derradeiro, cumpre registrar que o cidadão terá assegurado o direito de se defender e utilizar todos os meios e recursos previstos no ordenamento jurídico (princípio constitucional do devido processo legal, que abrange o contraditório e a ampla defesa), devendo a respectiva decretação da restrição de direito ser devidamente fundamentada.