Capa da publicação Jogos lotéricos sob suspeição: será o fim daquela "fezinha"?

Jogos lotéricos sob suspeições

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29/05/2019 às 15:05
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XII – CONSIDERAÇÕES FINAIS

Segundo o entendimento da Caixa, mais precisamente do Setor de Loterias, o ganhador do prêmio da loteria tem o direito da não divulgação do seu nome, mantendo-se no anonimato. Em primeiro lugar, como qualquer jogo de azar, deve-se partir da premissa de que faz parte do risco os jogos de loterias. Assim, quem não quer sofrer esse risco, não jogue! Em segundo lugar, trata-se de um serviço público, previsto por lei e nesse sentido a publicidade é obrigatória, inexistindo, portanto, até o presente momento qualquer dispositivo legislativo concedendo essa faculdade ao ganhador de prêmio em manter-se no anonimato.

Por outro lado, há o Decreto-Lei nº 204, DE 27/02/1967, que dispõe sobre a finalidade e a conveniência no ramo da exploração loteria, cuja atividade legislativa é privativa da União, com o fito de atendimento social.

Diante das regras da precitada legislação, observam-se os seguintes:

“Art. 9º. Cada bilhete, ou fração consignará no reverso, além de outros dizeres”:

“III) – as assinaturas das autoridades responsáveis pela emissão”;

“IV) – local apropriado para receber o nome e endereço do possuidor que desejar o bilhete nominativo”.

“Art. 12. (...)”.

“§ 1º. Os prêmios relativos a bilhetes ou frações nominativos somente serão pagos ao respectivo titular, devidamente identificado”.

“§ 2º. Somente mediante ordem judicial deixará de ser pago algum prêmio ao portador ou ao titular do bilhete ou fração premiado”.

No que pertine ao direito ao anonimato, relativo ao ganhador de prêmio lotérico, existem dois projetos de lei em tramitações na Câmara dos Deputados com este desiderato. O primeiro é o PL nº 232, de 2003, que dispõe, especificamente, sobre a veiculação de imagens de ganhadores de prêmios lotéricos e de sua prévia identificação através do número do CPF (Cadastro de Pessoa Física). Atualmente, este projeto de lei se encontra na Mesa da Câmara dos Deputados, com o despacho de “desarquivado, nos termos do art. 105, do RICD”, datado de 21/02/2019.

De acordo com os preceitos do PL nº 232, de 2003, há o estabelecimento do amplo direito ao anonimato dirigido ao apostador, nos termos seguintes:

“Art. 1º. É garantido ao acertador de qualquer tipo de jogo ou aposta, realizado ou autorizado pela Loteria Federal e/ou Loterias Estaduais, o direito a permanecer no anonimato não sendo permitido o uso do seu nome e da sua imagem em anúncios publicitários e informativos sobre o que trata”.

“Art. 2º. É nulo de pleno direito qualquer registro em bilhetes lotéricos e de apostas e/ou semelhantes que imponham como condições para o recebimento de prêmios que o ganhador participe da divulgação e/ou propaganda sobre os referidos produtos”.

“Art. 3º. A inobservância a presente lei implica na punição do infrator com multa que corresponda a 10% (dez por cento) do valor total do prêmio.”

“Parágrafo único - em caso de reincidência, a Casa Lotérica ou a instituição credenciada pelas Loterias oficiais, o respectivo registro de funcionamento cancelado”.

O segundo é o PL nº 472, de 2007, dispondo sobre a exploração lotérica estadual, onde, em seu artigo 1º, autoriza os Estados Federados e o Distrito Federal a explorarem loterias como modalidade de serviço público, no âmbito dos seus territórios, observadas as condições estabelecidas nesta Lei. Atualmente, este projeto de lei encontra-se na Comissão de Finanças e Tributação (CFT) da Câmara dos Deputados, cujo despacho informa a devolução do projeto pelo relator, sem manifestação.

   Diante do exposicionado, vislumbra-se que, enquanto as maiores loterias do mundo empregam sistemas de seguranças, relativas às identificações obrigatórias dos ganhadores, visando a obstar os cometimentos de fraudes e de lavagens de dinheiros, os parlamentares brasileiros usam e abusam do seu poder de legislar, para facilitar essas investidas criminosas, como muito bem demonstrado na criação do Projeto de Lei nº 232, de 2003, de autoria do deputado Bernardo Ariston (PSB/RJ), atualmente filiado ao Partido Socialista Brasileiro, que além da garantia ao apostador o pleno anonimato, proíbe a inscrição de identificação do jogador no verso do bilhete e ainda impõe penalidade com aplicação de multa e, no caso de reincidência o cancelamento do funcionamento da Casa Lotérica ou de instituições credenciadas pelas loterias oficiais, na hipótese de descumprimento das regras estabelecidas pelo projeto.

No que pertine as denúncias formuladas pelo senador Álvaro Dias, observa-se, diante de todo o exposicionado, que há indícios veementes da prática de fraude e de lavagem de dinheiro, não tão com relação aos sorteios propriamente ditos, ou seja, atinente ao sistema utilizado nos sorteios da Caixa, com referências as bolas e ao globo em acrílico utilizado, embora no pretérito tenha ocorrido a utilização de bolas em madeiras escolhidas e mergulhadas em água, com o fim de torná-las mais pesadas para, consequentemente, serem as premiadas, ato esse descoberto por peritos criminais, mas tão somente após a divulgação dos números sorteados, com a apresentação do ganhador para receber o seu prêmio. Presume-se ser esse é o momento crucial em que o aliciamento se desenvolve pela permuta do cartão ao portador, por quantum superior ao valor do prêmio, cujo valor total da premiação deverá servir para a lavagem de dinheiro sujo.

A título de conhecimento, o criador desse sistema de sorteio lotérico foi o artista cearense, nascido na cidade de Quixadá/CE, Jacinto Sousa, meu avô. Conta à história que ele após inventar o sistema, apresentou-o ao seu amigo Pedro Wilson Mendes, advogado e político, como este tinha uma sociedade com o proprietário da Loteria do Ceará, fez uma proposta de compra do material inventado. Porém, Jacinto Sousa não aceitou a proposta, doando o invento ao amigo Pedro Wilson Mendes, passando, daí em diante, a ser utilizados nas extrações das loterias do Ceará.

Quanto às controvérsias nas legislações pertinentes às loterias, regulamentando ou não a obrigação da identificação do jogador premiado, realmente existem, haja vista que o Decreto-Lei nº 204, de 1967, estabelece em seus artigos 9º e 12, a obrigação da identificação do proprietário do bilhete e o pagamento do prêmio somente com a identificação do ganhador aposta no verso bilhete, respectivamente.

  E, na mesma inteligência o Projeto de Lei nº 412, de 2017, ampliando o alcance desta legislação às loterias estaduais e municipais em geral, no pertinente a publicidade do nome do ganhador, seu domicílio e o seu CPF, abolindo de uma vez por todas o anonimato. Contudo, em sentido contrário, o Projeto de Lei nº 232, de 2003, que continua em tramitação na Câmara dos Deputados, até a presente data, coibindo a identificação do jogador premiado.

É intuitivo concluir, pois, que a presença do interesse particular de alguns parlamentares em implantar o anonimato em todas as regras das loterias brasileiras, em desrespeito aos princípios constitucionais previstos no artigo 37 da Constituição Federal de 1988, com ênfase aos princípios da publicidade e da moralidade administrativa.

Nesse sentido, ratifica-se que todas as entidades da Administração Pública Direta e Indireta precitadas, envolvidas com jogos de loterias estão obrigadas a respeitarem os princípios constitucionais avistáveis no artigo 37, in casu, mormente o da publicidade e o da moralidade. Aquele, não resta a menor dúvida da obrigação de divulgar a identidade da pessoa que ganhou o prêmio da loteria, uma vez que se trata de um serviço público que necessita ser divulgada a toda população, principalmente porque não há previsão legislativa impedindo essa divulgação, prevalecendo, portanto, a previsão constitucional.

Este, por sua vez, incumbe aos mesmos órgãos públicos, através de seus agentes públicos, a prezarem pela transparência, lealdade e da boa-fé e, na presença de indícios de cometimento de transgressão funcional por parte de agente público, no exercício de suas atividades, obrigar-se-á a quem de direito instaurar sindicância e inquérito administrativo, expondo-se às consequências de responder pela omissão.

Daí a necessidade da imposição de intensificar a fiscalização no setor da Caixa, encarregado de pagar os prêmios das loterias, identificando detalhadamente o ganhador, com o fito de evitar qualquer tipo de tentativa de fraude e a consequente lavagem de dinheiro, uma vez que tais ações ilícitas não se restringem ao ambiente externo da Caixa, pela impossibilidade da identificação do ganhador, antes mesmo deste adentrar no recinto da Caixa.

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Destarte, necessário se faz o retorno das cartelas de todas as modalidades de jogos lotéricos da Caixa, constando no verso destas o espaço para a identificação completa do jogador, com o nome, endereço, CPF e assinatura visível, excluindo a modalidade da cartela ao portador, obrigando da Caixa a pagar o prêmio somente ao ganhador. Essas medidas preventivas e necessárias são as únicas que evitarão quaisquer tentativas de fraudes e de lavagens de dinheiro.

Com relação à decisão da votação do parlamento de excluir o COAF do Ministério da Justiça, mantendo-o no Ministério da Economia, não traz nenhuma perda ou derrota para o Governo Federal, uma vez que o COAF continua sob o comando deste. No entanto, a importância dele sob o comando do Ministério da Justiça, não haveria mais as intermediações das ações fiscalizadoras, estas seriam informadas diretamente a Polícia Federal, para as providências de estilo, proporcionando maior agilidade na persecutio criminis. Porém, diante da possibilidade da Medida Provisória nº 870/2019 perder a sua eficácia na data de 03 de junho de 2019, em razão do escasso tempo, é melhor deixar a medida ser votada no Senado no estado em que ela está, evitando assim a perda da sua validade, na hipótese de qualquer alteração na MP.

Por outro lado, embora os agentes políticos não devam obediência aos princípios previstos no artigo 37 da Constituição Federal, principalmente no que tange ao princípio da moralidade, deveria existir previsibilidade nas regras internas dos parlamentares, no que pertine à escolha dos membros de comissões em geral, proibindo de atuarem aqueles que estejam respondendo a processos criminais, principalmente aos delitos praticados contrários a boa-fé e pela improbidade em seus atos, conforme ocorreu com os membros da comissão que debateram a MP 870/2019, onde a maioria dos parlamentares está envolvida na Operação Lava Jato da Polícia Federal, conforme consta do meu trabalho com o título: “O Interesse Estratégico pelo COAF”, publicado na data de 13/05/2019, pela Revista Jus Navigandi. 


XIII – REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS  

Constituição Federal de 1988 – Brasília/DF.

El País – edição de 12/12/2016.

Folha de Londrina – Edição de 27/02/2007.

Folha de São Paulo – Edição de 27/02/2007.

Jornal GGN – Edição de 07/09/2018.

Lei nº 8.112/1990 – 6ª Edição – Brasília - Comentada – 2001.

More Horiz – Redação Veja - Edição de 13/05/2019.

Portal HD – Por Fernanda Krakoviscs – Edição de 14/05/2019.

Resumo de Direito Administrativo – 12ª Edição – 2002.

TAGS – Por Eduardo - Edição de 11/08/2015.

TAGS – Por Álvaro Dias – Edição de 30/11/2015.

TAGS – Edição de 04/04/2016.

TAGS – Edição de 27/03/2017.

TAGS – Edição de 18/04/2017.

TAGS – Por Sebastião Tadeu Ribeiro - Edição de 29/01/2018

TAGS – Por João Pedroso de Campos – Edição de 19/12/2017.

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Sobre o autor
Jacinto Sousa Neto

Advogo nas área de direito civil, trabalhista e em procedimentos administrativos (sindicância e processo administrativo), além disso sou escritor e consultor jurídico.

Informações sobre o texto

Este texto foi publicado diretamente pelos autores. Sua divulgação não depende de prévia aprovação pelo conselho editorial do site. Quando selecionados, os textos são divulgados na Revista Jus Navigandi

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