ALGUMAS BREVES ANOTAÇÕES SOBRE CONCEITOS DO DIREITO URBANÍSTICO
Rogério Tadeu Romano
I – DEFINIÇÃO DO DIREITO URBANÍSTICO E PRINCÍPIOS NORTEADORES
O art. 182 da Constituição Federal figura como marco dessa disciplina jurídica. Neste artigo, observamos que a Constituição consagrou o direito de propriedade, subordinando-o ao exercício de sua função social, ou seja, da propriedade, que deve ser exercida de maneira a oferecer o melhor proveito a toda coletividade. Ensinou José Afonso da Silva que o Direito Urbanístico trata do ramo do Direito que estuda o conjunto de legislações reguladoras da atividade urbanística, isto é, aquelas destinadas a ordenar os espaços habitáveis (Direito Urbanístico Brasileiro.ão Paulo. 6º Ed. Editora Malheiros, 2010.).
O Direito Urbanístico é estudado sob a forte influência das novas teorias Geopolíticas ou de Política Ambiental, enfocando-se nos problemas históricos e geográficos das grandes cidades brasileiras como conurbação (extensa área urbana formada por cidades e vilarejos que foram surgindo e se desenvolvendo um ao lado do outro, formando um conjunto), alta densidade demográfica (que causa conflitos de terras) e também problemas ambientais que envolvem o Código de Trânsito Brasileiro, a Lei da Política Nacional do Meio Ambiente, a Lei de Parcelamento do Solo Urbano, demais dispositivos esparsos sobre organização administrativa pública, ambiental, de manejos geográficos das cidades em matéria tributária (impostos municipais vs. função social da propriedade), além da mais importante norma: a Constituição Federal, que dispõe da Política Urbana nos artigos 182 e 183 do referido diploma.
Como disse José Afonso da Silva(Obra citada, 2ª edição, pág. 15) o Direito Urbanístico é uma nova disciplina em franca evolução. Disse ele que o qualificativo urbanístico indica a realidade sobre a qual esse direito incide: o urbanismo. Sendo assim o conceito de urbanismo é estreitamente ligado à cidade e às necessidades conexas com o estabelecimento humano na cidade.
O que é cidade? Ainda segundo José Afonso da Silva(obra citada, pág. 18) para que um centro habitacional seja conceituado como urbano, torna-se necessário preencher no mínimo os seguintes requisitos: a) densidade demográfica específica; b) profissões urbanas como comércio e manufaturas, com suficiente diversificação; c) economia urbana permanente, com relações especiais com o meio rural; d) existência de camada urbana com produção; e) existência de um aglomerado de casas para configurar-se um núcleo urbano.
Disse Edésio Fernandes (A Nova Ordem Jurídico-Urbanística no Brasil. [S.l.]: Revista Magister de Direito Imobiliário, Ambiental e Urbanístico, n.2. pp. 5 – 26 ) que é direito coletivo à participação democrática no processo decisório da ordem urbanística é o direito de todos - individualmente, por intermédio de representantes, eleitos ou através de outras formas de organização de interesses coletivos - de participarem da gestão das cidades".
Recentemente, para tal, foi editado o Estatuto da Cidade, que, como disseram Janaína Rigo Santin e outros (O Direito de Preempção no Estatuto da Cidade), trata da regularização das posses urbanas, até hoje situadas na ambígua fronteira entre o legal e o ilegal; e também uma nova estratégia de gestão que incorpora a ideia de participação direta do cidadão em processos decisórios sobre o destino da cidade.
Para Liana Portilho (A efetividade da função social da Propriedade Urbana à Luz do Estatuto da Cidade. Rio de Janeiro: Temas & Idéias, 2003) “a questão da propriedade urbana é o tema central do Direito Urbanístico, e em virtude disso a função social da propriedade é o principio jurídico-constitucional vetor dessa disciplina”. E prossegue afirmando que: “qualquer intervenção urbanística que se pretenda operar no espaço urbano acaba por esbarrar no direito de propriedade imobiliária, o qual é vinculado, no Brasil, a normas civilistas”. Porém, como disseram Janaína Rigo Santin,Tiago Toniêto e Nairane Decarli (O Direito de Preempção no Estatuto da Cidade) , estas normas, nas quais impera o interesse privado, são relativizadas quando está em questão o cumprimento da função social da propriedade urbana, priorizando-se, portanto, os valores coletivos em detrimento dos valores individuais.
E concluíram Janaína Rigo Santin, Tiago Toniêto e Nairane Decarli (O Direito de Preempção no Estatuto da Cidade):
“No intuito de atingir a função social da cidade e da propriedade urbana, o Estatuto da Cidade enumera poderosos instrumentos para implementar esta nova política urbana, como o plano diretor, o zoneamento ambiental, o imposto predial e territorial urbano progressivo, a desapropriação com pagamento em títulos, o parcelamento, edificação ou utilização compulsórios, o direito de superfície, a usucapião especial de imóvel urbano, a usucapião coletivo, a outorga onerosa e a transferência do direito de construir, o estudo prévio de impacto ambiental e o estudo prévio de impacto de vizinhança, as operações urbanas consorciadas, dentre outros. Tratam-se de novas ferramentas postas à disposição dos gestores públicos municipais a fim de contornar as vicissitudes do processo de crescimento desordenado, injusto e desigual das cidades, bem como planejar um futuro de desenvolvimento sustentável dos Municípios brasileiros.”
Como tal, é regido por princípios.
O primeiro princípio a ser discutido é o da função pública do urbanismo. A ideia por trás desse princípio é o da consagração da necessidade da imposição de normas de ordem pública, em face de comportamentos privados. Ou seja, a realização de um conjunto de restrições do urbanismo, concretizando determinados objetivos, tem sua legitimidade no exercício dessa função pelo Estado.
O segundo princípio é o da conformação da propriedade urbana. O direito urbanístico disciplina o conteúdo do direito de propriedade urbana. Como se viu, quais comportamentos devem ser reprimidos; quais devem ser estimulados; o que pode e o que não pode ser feito, para que a propriedade urbana cumpra sua função social.
O terceiro princípio é da afetação das mais-valias urbanas ao custo da urbanificação. Foi dito anteriormente que a noção de mais-valia urbana decorre da expressão da propriedade urbana, cujo valor não brota exclusivamente de um ato individual do proprietário. Assim, o valor da propriedade urbana decorre da infraestrutura pública, da capitalização realizada por meio de um fundo público. Se a valorização é individualmente apreciada, porém decorre de algo que é coletivo – exemplo: o custo da infraestrutura pública –, é preciso recapturar a mais-valia gerada pela capitalização dessa infraestrutura. Um exemplo de como fazer isso seria por meio de cobrança de contribuição de melhoria.
Por último, o princípio da justa distribuição dos benefícios e dos ônus decorrentes da atividade urbanística. A ideia aqui é justamente de organizar o custeio da infraestrutura do empreendimento. Então, por exemplo, por meio do instituto do Parcelamento do Solo Urbano, o Estado impõe ao particular que se destine uma fração da porção territorial à instalação de equipamentos públicos, à criação de áreas verdes, à cessão de áreas para circulação (vias públicas), etc.
A Lei Federal nº. 10.257, com o nome de Estatuto da Cidade, trata do planejamento urbano municipal.
A grande ênfase dada ao planejamento municipal diz respeito ao desenvolvimento urbano e ao equilíbrio ambiental numa preocupação constante com a necessidade de preservação, para legar às gerações futuras uma cidade que ofereça todas as condições de vida saudável e bem estar aos munícipes.
O documento legal tem como fundamento uma série de reflexões e propostas que tratam de diversos temas nas áreas ambiental, social, econômica e política, constituindo-se num importante mecanismo para a operacionalização do conceito de desenvolvimento sustentável no plano local, apresentando o Plano Diretor como instrumento básico desta política.
O Plano Diretor representa um conjunto de regras básicas de uso e ocupação do solo que orientam e regulam a ação dos agentes sociais e econômicos sobre o território de todo o município, sendo que o Estatuto da Cidade regulamenta, no seu artigo 41, que o Plano Diretor é obrigatório para cidades (Capítulo III, Art. 41 - grifo do autor):
“a) com mais de vinte mil habitantes;
b) integrantes de regiões metropolitanas e aglomerações urbanas;
c) onde o Poder Público municipal pretenda utilizar os instrumentos previstos no § 4º do art. 182 da Constituição Federal;
d) integrantes de áreas de especial interesse turístico;
e) inseridas na área de influência de empreendimentos ou atividades com significativo impacto ambiental de âmbito regional ou nacional”.
Há para as pessoas a acentuação de limitações administrativas no uso do solo. A limitação administrativa, impõe aos proprietários obrigações de não fazer, de abstenção, quanto aos direitos elementares eventualmente subtraídos do domínio ou quanto ao exercício daqueles ainda subsistentes, lembrando que ainda comportam obrigações de fazer porque ligadas à própria conservação da propriedade.
II – ATIVIDADE URBANÍSTICA E O PLANEJAMENTO
Ensinou José Afonso da Silva (Direito Urbanístico Brasileiro, 2ª edição, pág. 26) que a atividade urbanística, assim, consiste na ação destinada a realizar os fins do urbanismo, ação destinada a aplicar os princípios do urbanismo.
Ainda segundo nos disse José Afonso da Silva, lecionou Joseff Wolff que esses momentos são: a) o planejamento; b) a política do solo; c) a urbanização; c) a urbanificação (Intervenção do Poder Público para transformar o meio ambiente urbano -reurbanização-, visando a uma correção dos problemas já mencionados gerados pela urbanização); d) a ordenação das edificações. Para José Luís González-Berenguer Urrutía, ainda nessa linha, a atividade urbanística se referirá aos seguintes aspectos: a) o planejamento; b) o regime do solo; c) a execução das urbanizações e a intervenção no uso do solo e na edificação pelos particulares.
O artigo 21, XX, da Constituição de 1988 declara competir à União instituir diretrizes para o desenvolvimento urbano, inclusive habitação, saneamento básico e transportes urbanos, enquanto que o artigo 182 estabelece que a política de desenvolvimento urbano, executada pelo poder público municipal, conforme diretrizes gerais fixadas em lei, tem por objeto ordenar o pleno desenvolvimento das funções sociais, da cidade e garantir o bem-estar dos habitantes.
Há uma competência concorrente (artigo 24,I, da CF) onde se inserem União Federal, Estados, Distrito Federal e Municípios. Abre-se para os Estados a possibilidade de estabelecer normas de coordenação dos planos urbanísticos no nível de regiões metropolitanas, aglomerações urbanas e microrregiões, constituídas por agrupamentos de municípios limítrofes, para integrar a organização, o planejamento e a execução de funções públicas de interesse comum.
O artigo 21, IX, dá competência à União Federal para elaborar e executar planos nacionais e regionais de ordenação do território e desenvolvimento econômico e social. Confere-se ali competência à União Federal para elaborar e executar planos urbanísticos nacionais e regionais, planos de ordenação, planos de desenvolvimento econômico e social, de forma que essa competência é genérica.
Já o planejamento urbanístico local encontra seu fundamento no artigo 30, VIII, da Constituição. Aí se reconhece a competência do Município para promover, no que couber, adequado ordenamento territorial, mediante planejamento e controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano. Isso não é competência suplementar, como aduziu José Afonso da Silva (obra citada, pág. 50), é competência própria, que não comporta interferência nem da União nem do Estado.
Assim se diz que à União Federal compete editar normas gerais de urbanismo e estabelecer o plano urbanístico nacional e planos urbanísticos microrregionais (artigo 21, XX e XXI, e 24, I, parágrafo primeiro); aos Estados dispor sobre normas urbanísticas regionais (normas de ordenação do território estadual), suplementares das normas gerais estabelecidas pela União (artigo 24, I, parágrafo segundo), o plano urbanístico estadual (plano de ordenação territorial de região estabelecida pelo Estado, que podem ter natureza de planos de coordenação urbanística na área); aos Municípios, cabe estabelecer a política de desenvolvimento das funções sociais da cidade e garantir o bem-estar de seus habitantes (artigo 182), promover o adequado ordenamento do seu território, mediante o planejamento e o controle do uso, do parcelamento e da ocupação do solo urbano, elaborando e executando, para tanto, o plano diretor (artigo 30, VIII). Trata-se de competência municipal própria e não suplementar. São elas, as normas urbanísticas municipais, aquelas que são as mais características.
Longe se está no Brasil, em matéria de ordenação urbanística, de soluções burocráticas, centralizadoras, como as que presidiram a criação do chamado “Projeto Cura” pelo governo federal, em março de 1973. Ali, com objetivo de eliminarem-se terrenos ociosos, seriam fixadas áreas mínimas e máximas de ocupação do solo, havendo obrigatoriedade de um estudo de viabilidade na qual ficassem demonstradas a exequibilidade financeira da execução das obras de infraestrutura de terrenos. Na parte referente à tributação a alíquota do imposto aumentaria na medida em que, no fim de cinco anos, o valor do tributo seria correspondente a 10% do preço do terreno. Eram medidas tomadas no âmbito de uma ditadura militar, por uma Resolução do Conselho do extinto Banco Nacional de Habitação, dentro de uma visão autocrática própria de um regime, à época ditatorial. Ainda concluído o trabalho ali historiado de infraestrutura, os proprietários seriam obrigados a construir seja por recursos próprios ou com financiamento de agentes que operavam com recursos com antigo Sistema Financeiro da Habitação (SFH). Estabelecer o quantitativo de coeficiente de utilização de área por Resolução de Conselho de Empresa Pública Federal que tenha como competência de projetos sobre a urbanização, é flagrantemente inconstitucional, diante da Constituição de 1988.
A Constituição de 1988 prevê que essas decisões no âmbito do direito urbanístico sejam tomadas pelas unidades federativas, no campo determinado pela norma constitucional, com ampla participação da população, desde o interesse local, dos Municípios, regional pelos Estados Membros e genérico da União Federal, mas tendo como instrumento a norma jurídica, lei, com reserva de atuação dos respectivos poderes legislativos federativos.
De toda sorte a propriedade urbana está submetida aos termos do artigo 182, parágrafo segundo da Constituição, que subordinou o cumprimento de sua função social às exigências da ordenação da cidade expressa no seu plano diretor. É ainda o plano diretor que define os critérios de utilização do solo urbano. Como ensinou José Afonso da Silva (obra citada, pág. 50), isso deriva do artigo 182, parágrafo quarto, quando faculta ao poder público municipal, mediante lei específica para área incluída no plano diretor, exigir, nos termos da lei federal, do proprietário do solo não edificado, subutilizado ou não utilizado que promova seu adequado aproveitamento, sob pena, de sucessivamente, de parcelamento ou edificação compulsórios, imposto progressivo sobre a propriedade predial e territorial urbana no tempo ou desapropriação com pagamento mediante títulos da dívida pública de emissão previamente aprovada pelo Senado Federal, com prazo de até dez anos, em parcelas anuais, iguais e sucessivas, assegurados o valor real da indenização e os juros legais.
Ao oferecer um espaço de gestão compartilhada do poder decisório com a sociedade civil será possível otimizar as decisões jurídico-políticas, ocasionando a eficiente e necessária racionalização de recursos por parte do poder público, o qual investirá prioritariamente nos problemas centrais indicados pelos moradores do Município, como bem concluíram Janaína Rigo Santin,Tiago Toniêto e Nairane Decarli (O Direito de Preempção no Estatuto da Cidade).
Nessa linha de pensar a propriedade urbana poderá ser desapropriada como qualquer outro bem de propriedade privada, mas a Constituição prevê dois tipos de desapropriação para o imóvel urbano. Uma é a desapropriação comum, que pode ser por utilidade pública ou necessidade pública ou por interesse social nos termos dos artigos 5º, XXIV, e 182, § 3º, mediante prévia e justa indenização em dinheiro. A outro é a desapropriação-sanção, que é aquela destinada a punir o não-cumprimento de obrigação ou ônus urbanístico imposto ao proprietário de terrenos urbanos nos termos do já referenciado artigo 182, § 4º.
Já o artigo 183 da Constituição instituiu a chamada usucapião pró-moradia, em favor de quem possuir como sua área urbana de até duzentos e cinquenta metros quadrados, por cinco anos, de forma ininterrupta e sem oposição utilizando-a para sua moradia ou de sua família, desde que não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural, situação essa que não será reconhecida ao mesmo possuidor, mais de uma vez, nem é admissível em relação ao imóvel público.
Há ainda a chamada usucapião coletiva.
III – SISTEMA VIÁRIO E CIRCULAÇÃO
A ABNT traz a definição de “sistema viário” no verbete “rede viária”: “é o conjunto de vias, classificadas, de um sistema de rodovias, ferrovias e/ou de outras formas de transportes”.
A partir desta definição, estabeleceu-se que: “Sistema Viário é o conjunto de vias numa determinada região”.
Os seguintes elementos compõem as vias:
- Pista: parte da via pública utilizada para o trânsito de veículos. Quando a via é dividida por canteiro central, temos uma via com duas pistas.
- Passeio: parte da via pública destinada ao trânsito de pedestres. Quando pavimentado, pode ser chamado de “calçada”;
- Guias e sarjetas: guias (ou meio-fio) são os elementos que delimitam o passeio em relação à pista; a sarjeta é uma faixa de pavimento diferenciado construído na junção da guia com a pista, com as funções de drenagem e acabamento da pavimentação. Pertence à pista.
O sistema viário envolve o chamado sistema de circulação.
Pedro Escribano Collado (Las vias urbanas, 358) ensinou que, “de maneira ampla, e do ponto de vista do usuário, pode definir-se o direito de circulação como a faculdade, enquanto perdure a afetação da via, de deslocar-se através dela de um lugar para outro do núcleo urbano. Enquanto se tratar de um bem afetado, a utilização não constituirá uma mera possibilidade, mas um poder legal exercitável erga omnes. A administração não pode, em consequência, impedir, nem geral nem singularmente, o trânsito de pessoas de maneira estável, a menos que desafete a via, já que, de outro modo, se produziria uma transformação da afetação por meio de uma simples atividade de policia.”
Nessa linha de pensar, a circulação pública pode ser definida mediante três elementos:
1. Um conjunto anônimo e indeterminado de usuários que atuam “iure próprio”, em virtude de um poder legal conferido;
2. Uma atividade ordenadora da administração pública titular da via afetada;
3. Uma via afetada ao uso público.
Pedro E. Collado (obra citada, pág. 31), que estudou o regime jurídico das vias, fundamenta o conceito delas em três conceitos: a) o perímetro urbano, para indicar que elas se situam dentro dele, como marco geográfico onde a via urbana nasce, desenvolve-se, multiplica-se quantitativa e qualitativamente e, em todo momento, presta uma série de funções fundamentais; b) núcleo de serviços públicos essenciais, pois cada via cumpre uma série de serviços para com os habitantes assentados ao longo de seu traçado e em geral com todo aquele que use; c) a suscetibilidade de receber edificações, pois a ideia de uma população assentada ao longo do traçado de uma via de comunicação domina e condiciona a existência e configuração das vias urbanas.
A questão é enfrentada pela Lei 9.503, de 23 de setembro de 1997:
Art. 2º São vias terrestres urbanas e rurais as ruas, as avenidas, os logradouros, os caminhos, as passagens, as estradas e as rodovias, que terão seu uso regulamentado pelo órgão ou entidade com circunscrição sobre elas, de acordo com as peculiaridades locais e as circunstâncias especiais.
Parágrafo único. Para os efeitos deste Código, são consideradas vias terrestres as praias abertas à circulação pública e as vias internas pertencentes aos condomínios constituídos por unidades autônomas.
Parágrafo único. Para os efeitos deste Código, são consideradas vias terrestres as praias abertas à circulação pública, as vias internas pertencentes aos condomínios constituídos por unidades autônomas e as vias e áreas de estacionamento de estabelecimentos privados de uso coletivo. (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015) (Vigência)
Art. 3º As disposições deste Código são aplicáveis a qualquer veículo, bem como aos proprietários, condutores dos veículos nacionais ou estrangeiros e às pessoas nele expressamente mencionadas.
Quanto à situação urbanística, as vias terrestres são urbanas ou extraurbanas. As ruas; as avenidas, são vias urbanas. As estradas e os caminhos são vias extraurbanas. As vias poderão ser públicas ou privadas.
Os princípios e diretrizes do sistema nacional de viação são cogitados na Lei 5.917, de 10 de setembro de 1973:
Art 2º O objetivo essencial do Plano Nacional de Viacao é permitir o estabelecimento da infraestrutura de um sistema viário integrado, assim como as bases para planos globais de transporte que atendam, pelo menor custo, às necessidades do País, sob o múltiplo aspecto econômico-social-político-militar.
Art 3º O Plano Nacional de Viacao será implementado no contexto dos Planos Nacionais de Desenvolvimento e dos Orçamentos Plurianuais de Investimento, instituídos pelo Ato Complementar nº 43, de 29 de janeiro de 1969, modificado pelo Ato Complementar nº 76, de 21 de outubro 1969, e Lei Complementar nº 9, de 11 de dezembro de 1970 obedecidos, especialmente os princípios e normas fundamentais seguintes, aplicáveis a todo o Sistema Nacional de Viação, e inclusive à navegação marítima, hidroviária e aérea:
a) a concepção de um sistema nacional de transportes unificado deverá ser a diretriz básica para os diversos planejamentos no Setor, visando sempre a uma cordenação racional entre os sistemas federal, estaduais e municipais, bem como entre todas as modalidades de transporte;
b) os planos diretores e os estudos de viabilidade técnico-econômica devem visar à seleção de alternativas mais eficientes, levando-se em conta possíveis combinações de duas ou mais modalidades de transporte devidamente coordenadas e o escalonamento de prioridades para a solução escolhida;
c) dar-se-á preferência ao aproveitamento da capacidade ociosa dos sistemas existentes, para, em etapas subsequentes, cuidar-se de sua expansão;
c) dar-se-á preferência ao aproveitamento da capacidade ociosa dos sistemas existentes. (Redação dada pela Lei nº 6.630, de 16.4.1979)
d) a política tarifária será orientada no sentido de que o preço de cada serviço de transporte reflita seu custo econômico em regime de eficiência. Nestas condições, deverá ser assegurado o ressarcimento, nas parcelas cabíveis, das despesas de prestação de serviços ou de transportes antieconômicos que venham a ser solicitados pelos poderes públicos;
e) em consequência ao princípio anterior, será assegurada aos usuários a liberdade de escolha da modalidade de transporte que mais adequadamente atenda às suas necessidades;
f) a execução das obras referentes ao Sistema Nacional de Viação, especialmente as previstas no Plano Nacional de Viacao, deverá ser realizada em função da existência prévia de estudos econômicos, que se ajustem às peculiaridades locais, que justifiquem sua prioridade e de projetos de engenharia final;
g) a aquisição de equipamentos ou execução de instalações especializadas serão precedidas de justificativa, mediante estudos técnicos e econômico-financeiros;
h) a adoção de quaisquer medidas organizacionais, técnicas ou técnico-econômicas no Setor, deverão compatibilizar e integrar os meios usados aos objetivos modais e intermodais dos transportes, considerado o desenvolvimento científico e tecnológico mundial. Evitar-se-á, sempre que possível, o emprego de métodos, processos, dispositivos, maquinarias ou materiais superados e que redundem em menor rentabilidade ou eficiência, face àquele desenvolvimento;
i) tanto os investimentos na infraestrutura como a operação dos serviços de transportes reger-se-ão por critérios econômicos; ressalvam-se apenas, as necessidades imperiosas ligadas à Segurança Nacional, e as de caráter social, inadiáveis, definidas e justificadas como tais pelas autoridades competentes, vinculando-se, porém, sempre aos menores custos, e levadas em conta outras alternativas possíveis;
j) os recursos gerados no Setor Transportes serão destinados a financiar os investimentos na infraestrutura e na operação dos serviços de transporte de interesse econômico. Os projetos e atividades destinados a atender as necessidades de Segurança Nacional e as de caráter social, inadiáveis, definidas como tais pelas autoridades competentes, serão financiados por recursos especiais consignados ao Ministério dos Transportes;
l) os investimentos em transportes destinados a incrementar o aproveitamento e desenvolvimento de novos recursos naturais serão considerados como parte integrante de projetos agrícolas, industriais e de colonização; sua execução será condicionada à análise dos benefícios e custos do projeto integrado e as respectivas características técnicas adequar-se-ão às necessidades daqueles projetos;
m) os investimentos em vias de transportes, portos e aeroportos, nas áreas metropolitanas e demais áreas urbanas, deverão ser coordenados por planos diretores e/ou projetos específicos e compatibilizados com os planos de desenvolvimento urbano, visando obter uma circulação eficiente de passageiros e cargas, garantindo ao transporte terrestre, marítimo e aéreo possibilidades de expansão sem prejuízo da racionalidade na localização das atividades econômicas e das zonas residenciais.
m) os sistemas metropolitanos e municipais dos transportes urbanos deverão ser organizados segundo planos diretores e projetos específicos, de forma a assegurar a coordenação entre seus componentes principais, a saber: o sistema viário, transportes públicos, portos e aeroportos, tráfego e elementos de conjugação visando a sua maior eficiência, assim como a compatibilização com os demais sistemas de viação e com os planos de desenvolvimento urbano, de forma a obter uma circulação eficiente de passageiros e cargas, garantindo ao transporte terrestre, marítimo e aéreo possibilidades de expansão, sem prejuízo da racionalidade na localização das atividades econômicas e das habitações.
O sistema nacional de viação é composto pelo conjunto dos sistemas nacionais: rodoviário, ferroviário, portuário, hidroviário, aeroviário e de transportes urbanos, e compreende:
1. Infraestrutura viária, que abrange as redes correspondentes às modalidades de transporte citadas, inclusive suas instalações acessórias e complementares;
2. Estrutura operacional compreendendo o conjunto de meios e atividades estatais, diretamente exercidos em cada modalidade de transporte e que são necessários e suficientes ao uso adequado da infraestrutura já mencionada.
As rodovias ou trechos de rodovia, já construídos e constantes do Plano Nacional de Viacao aprovado pela Lei nº 4.592, de 29 de dezembro de 1964, e alterações posteriores e que não constem do Plano Nacional de Viacao aprovado por esta lei, passam automaticamente para a jurisdição da Unidade da Federação em que se localizem.
Quanto à situação urbanística, as vias terrestres são urbanas ou extraurbanas. As ruas e as avenidas são vias urbanas. As estradas e os caminhos são vias extraurbanas. Como explicou José Afonso da Silva (Direito urbanístico brasileiro, segunda edição, pág. 165), o termo via é o gênero e indica todo espaço a percorrer para ir de um lugar a outro, enquanto o termo estrada individualiza especificamente uma via destinada ao trânsito e, para tanto, criada pelo homem fora do perímetro urbano ou de área urbanizada.
As vias podem ser públicas ou privadas.
Uma via pública é um meio de acesso terrestre. Pode ser urbana (localizada dentro de uma cidade) ou rural: é o caso da rua, avenida, beco ou viela, calçada, ciclovia, autoestrada.
Via privada é construída para a utilização privada, comum e exclusiva de determinados proprietários, e cujo uso, limitado apenas aos participantes da comunhão incidental dali privada, como explicou Luciano Orusa (La strade pubblilche, pág. 123).
À administração pública é reconhecida uma faculdade geral para regulamentar a circulação, que se define como a competência que determina os meios, através dos quais se exercita o direito de circular em cada via urbana, e as normas que regulam a circulação reconhecida.
Volta-se ao sistema nacional de viação que é constituído pelo conjunto dos sistemas nacionais: Rodoviário, Ferroviário, Portuário, Hidroviário, Aeroviário e de Transportes urbanos.
Ele compreende: a infraestrutura viária, que abrange as redes correspondentes às modalidades de transporte citadas, inclusive as instalações acessórias e complementares; a estrutura operacional, compreendendo o conjunto de meios e atividades estatais, diretamente exercidos em cada modalidade de transporte e que são necessários e suficientes ao uso adequado da infraestrutura mencionada acima. O primeiro é o aspecto estático e o outro dinâmico.
O Sistema Rodoviário Nacional é constituído pelo conjunto dos sistemas rodoviários federal, estaduais e municipais.
As rodovias federais poderão ser: radiais (que partem da Capital Federal, em qualquer direção, para liga-la às Capitais Estaduais ou a pontos periféricos importantes do país); rodovias longitudinais (as que se orientam na direção geral norte-sul); rodovias transversais (as que se orientam na direção geral este-oeste); rodovias diagonais (as que se orientam nas direções gerais Nordeste-sudoeste e nordeste-sudeste); ligações (as que, em qualquer direção e não se enquadrando nas categorias precedentes, ligam pontos importantes de duas ou mais rodovias federais ou que permitam o acesso a instalações federais de importância, a ponto da fronteira, a estâncias hidrominerais, a cidades tombadas pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional, a pontos de atração turística, ou aos principais terminais marítimos fluviais, ferroviários ou aeroviários, constantes do Plano Nacional de Viacao. Por sua vez, há as rodovias estaduais que são fiscalizadas pelos Departamentos Estaduais.
Do que se tem notícia, o Estado de São Paulo possui um sistema ferroviário estadual. Não há município que o possua.
A teor do artigo 14 da Lei nº 9.503/97 compete aos Conselhos Estaduais de Trânsito - CETRAN e ao Conselho de Trânsito do Distrito Federal - CONTRANDIFE:
I - cumprir e fazer cumprir a legislação e as normas de trânsito, no âmbito das respectivas atribuições;
II - elaborar normas no âmbito das respectivas competências;
III - responder a consultas relativas à aplicação da legislação e dos procedimentos normativos de trânsito;
IV - estimular e orientar a execução de campanhas educativas de trânsito;
V - julgar os recursos interpostos contra decisões:
a) das JARI;
b) dos órgãos e entidades executivos estaduais, nos casos de inaptidão permanente constatados nos exames de aptidão física, mental ou psicológica;
VI - indicar um representante para compor a comissão examinadora de candidatos portadores de deficiência física à habilitação para conduzir veículos automotores;
VII - (VETADO)
VIII - acompanhar e coordenar as atividades de administração, educação, engenharia, fiscalização, policiamento ostensivo de trânsito, formação de condutores, registro e licenciamento de veículos, articulando os órgãos do Sistema no Estado, reportando-se ao CONTRAN;
IX - dirimir conflitos sobre circunscrição e competência de trânsito no âmbito dos Municípios; e
X - informar o CONTRAN sobre o cumprimento das exigências definidas nos §§ 1º e 2º do art. 333.
XI - designar, em caso de recursos deferidos e na hipótese de reavaliação dos exames, junta especial de saúde para examinar os candidatos à habilitação para conduzir veículos automotores. (Incluído pela Lei nº 9.602, de 1998)
Dos casos previstos no inciso V, julgados pelo órgão, não cabe recurso na esfera administrativa.
Julyer Modesto de Araújo em comentário sobre o CNT disse:
“O artigo 29, inciso I, estabelece que “a circulação far-se-á pelo lado direito da via, admitindo-se as exceções devidamente sinalizadas”; o descumprimento a esta norma geral de circulação e conduta caracterizará a infração de trânsito do artigo 186, em um de seus incisos.
O inciso I é aplicável às vias que possuem duplo sentido de circulação, quando o condutor transita com seu veículo pela faixa mais à sua esquerda (a qual deve ser ocupada pelos veículos que se deslocam em sentido contrário).
A única possibilidade de se utilizar o lado esquerdo da via, quando esta for de mão dupla (independente se há ou não sinalização horizontal), é pelo trecho estritamente necessário para a realização de ultrapassagem e desde que, obviamente, não se trata de local com proibição desta manobra (caso contrário, terá cometido uma das infrações do artigo 203).
Também obriga o artigo 186, inciso I, que, ao realizar a ultrapassagem, o condutor respeite a preferência do veículo que transitar em sentido contrário (sob pena de responder pela infração do artigo 191, se forçar passagem entre o que está sendo ultrapassado e o que vem em sentido contrário).
O inciso II aplica-se às vias com sentido único de direção, devendo estar sinalizadas com uma das seguintes placas de regulamentação: R-3 (sentido proibido); R-24a (sentido de circulação da via/pista); R-24b (passagem obrigatória); e R-33 (sentido de circulação na rotatória). O CNT de 1966 trazia uma redação mais adequada para esta infração, que indica bem qual foi a conduta praticada: “transitar em sentido oposto ao estabelecido”.
Uma situação que costuma gerar dúvida é sobre o enquadramento correto para o condutor que transita na mão contrária de um dos lados do canteiro central, tendo em vista que, neste caso, a VIA é de mão dupla, mas cada lado possui uma mão de direção: de acordo com o Manual Brasileiro de Fiscalização de Trânsito (Resolução do Conselho Nacional de Trânsito n. 371/10), deve ser aplicada a multa do inciso II, desde que exista a placa R-24a de cada lado do canteiro, já que o seu significado é “sentido de circulação da via ou PISTA.”
É a legislação urbanística no Brasil, ditada pelo Código das Cidades (lei geral) e pelas leis municipais, que configura o espaço destinado à circulação de veículos ou de pedestres, ou como todo logradouro destinado a circulação de veículos e de pedestres.
Há vários tipos de vias:
Vias Urbanas: São as ruas, avenidas ou caminhos abertos à circulação pública, situadas nas áreas urbanas, caracterizado principalmente por possuírem imóveis edificados.
Vias de Trânsito Rápido: São vias caracterizadas por acessos especiais, com trânsito livre, sem interseções em nível, sem acessibilidade direta aos lotes lindeiras e sem travessia de pedestres em nível.
Via Arterial: Via caracterizada por interseções em nível, geralmente controlada por semáforo, com acessibilidade direta aos lotes lindeiras e às vias secundárias e locais, possibilitando o trânsito entre as regiões da cidade.
Via Coletora: Via destinada a coletar e distribuir o trânsito que tenha necessidade de entrar ou sair das vias de trânsito rápido ou arteriais, possibilitando o trânsito dentro das regiões da cidade.
Via Local: Via caracterizada por interseções em nível não semaforizadas, destinada apenas ao acesso local ou a áreas restritas.
. Vias Rurais: São as estradas e rodovias, situadas fora das áreas urbanas.
RODOVIAS - Via Rural Pavimentada.
ESTRADAS - Via Rural não Pavimentada.
A velocidade máxima permitida para a via será indicada por meio de sinalização, obedecidas suas características técnicas e as condições de trânsito.
Onde não existir sinalização regulamentadora, a velocidade máxima será de(site Trânsito ideal):
• Nas Vias Urbanas:
Vias de Trânsito Rápido 80 km/hora. Vias Arteriais 60 km/hora. Vias Coletoras 40 km/hora. Vias Locais 30 km/hora.
• Nas Rodovias:-
110 km/hora para automóveis, camionetas e motocicletas.
90 km/hora para ônibus e micro-ônibus. 80 km/hora para os demais veículos.
• Nas Estradas: 60 km/hora
A velocidade mínima não poderá ser inferior à metade da velocidade máxima estabelecida a todos os tipos de via, porém o condutor deverá observar constantemente as condições físicas da via, do veículo, da carga, as condições meteorológicas, a intensidade do trânsito, não obstruindo a marcha normal dos demais veículos em circulação.
A via para circulação de pedestres é destinada ao trânsito de pessoas a pé, apenas, proibindo inclusive o estacionamento de veículos. Sua largura varia entre cinco e oito metros. É curta e seu comprimento corresponde mais ou menos a vinte vezes a sua largura. Não dá acessos a lotes, porque é traversa de interior de quarteirão.
O Código Nacional de Trânsito, no artigo 68, determina:
É assegurada ao pedestre a utilização dos passeios ou passagens apropriadas das vias urbanas e dos acostamentos das vias rurais para circulação, podendo a autoridade competente permitir a utilização de parte da calçada para outros fins, desde que não seja prejudicial ao fluxo de pedestres.
§ 1º. O ciclista desmontado empurrando a bicicleta equipara-se ao pedestre em direitos e deveres.
§ 2º. Nas áreas urbanas, quando não houver passeios ou quando não for possível a utilização destes, a circulação de pedestres na pista de rolamento será feita com prioridade sobre os veículos, pelos bordos da pista, em fila única, exceto em locais proibidos pela sinalização e nas situações em que a segurança ficar comprometida.
§ 3º. Nas vias rurais, quando não houver acostamento ou quando não for possível a utilização dele, a circulação de pedestres, na pista de rolamento, será feita com prioridade sobre os veículos, pelos bordos da pista, em fila única, em sentido contrário ao deslocamento de veículos, exceto em locais proibidos pela sinalização e nas situações em que a segurança ficar comprometida.
§ 4º. Os pedestres poderão utilizar-se da pista de rolamento, observadas as normas dos § 1º e § 2º, quando se deslocarem transportando objetos que atrapalhem a circulação dos demais pedestres. (VETADO)
§ 5º. Nos trechos urbanos de vias rurais e nas obras de arte a serem construídas, deverá ser previsto passeio destinado à circulação dos pedestres, que não deverão, nessas condições, usar o acostamento.
§ 6º. Onde houver obstrução da calçada ou da passagem para pedestres, o órgão ou entidade com circunscrição sobre a via deverá assegurar a devida sinalização e proteção para circulação de pedestre.
IV - O USO DO SOLO URBANO
Os parágrafos do artigo 2º da lei nº 6.766/79 definem o loteamento e o desmembramento. O Loteamento consiste na subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes. O Desmembramento, por outro lado é a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com aproveitamento do sistema viário existente, desde que não implique a abertura de novas vias e logradouros públicos, nem prolongamento, modificação ou ampliação dos já existentes. O loteamento diferencia-se do desmembramento na exata medida em que, neste, não há falar-se em abertura ou prolongamento de vias de circulação e, tampouco, de logradouros públicos, tais como as praças e ruas.
Gleba é a porção de terra que não tenha sido submetida a parcelamento sob a égide da Lei nº 6.766/79, o que equivale dizer que estaremos diante de uma gleba se a porção de terra jamais foi loteada ou desmembrada sob a vigência da nova Lei.
Temos ainda conceitos importantes com relação ao sistema viário urbano:
Logradouro (também logradouro, sobretudo em Portugal) é um termo que designa um terreno ou um espaço anexo a uma habitação, usado para serventia da casa, ou ainda qualquer espaço público comum que pode ser usufruído por toda a população e reconhecido pela administração de um município, como largos, praças, jardins, parques, entre outros;
Rua: via pública urbana, ladeada de casas, prédios, muros ou jardins;
Avenida: via pública urbana ampla, mais larga do que a rua, ger. arborizada ou provida de outros guarnecimentos ou a principal via de acesso a uma casa de campo, a um parque etc., ladeada por árvores; alameda;
Praça: área pública sem construções, local aberto, área urbana arborizada ou ajardinada;
Largo: é uma praça despida de ornamentos;
Beco; rua estreita e curta, sem passeio, sem edificação que se abra para ela, por vezes sem saída;
Travessa: rua estreita e curta, que atravessa o meio do quarteirão ligando outras vias;
Alinhamento: Linha que define o limite entre o imóvel e o logradouro público. Ele se opera em duas fases, que são definidas pelo estabelecimento do plano de alinhamento (um plano urbanístico especial, que depende de lei); atos de alinhamento individual de cada propriedade, que é emitido por meio de alvará no momento da edificação. O alinhamento é tarefa do Município, que ainda o utiliza para instrumento adequado no traçado das vias públicas;
Área non aedificante; Área na qual a legislação em vigor nada permite construir ou edificar. Trata-se de uma verdadeira limitação administrativa;
Calçada: Parte da via, normalmente segregada e em nível diferente, não destinada à circulação de veículos, reservada ao trânsito de pedestres e, quando possível, à implantação de mobiliário, sinalização e vegetação;
Equipamentos urbanos: São as construções e instalações, móveis e imóveis, destinados à prestação dos serviços públicos ou à utilização de interesse coletivo. Por exemplo: Escolas, creches, hospitais, áreas de lazer, entre outros.;
Faixa de rolamento: Faixa longitudinal da pista, destinada ao deslocamento de uma única fila de veículos;
Faixa livre: Área do passeio, calçada, via ou rota destinada exclusivamente à circulação de pedestres;
Faixa marginal de proteção: Faixa de terra necessária à proteção, à defesa, à conservação e à operação de sistemas fluviais e lacustres, determinada em projeção horizontal, que permita a variação livre dos níveis das águas e a proteção da vegetação ciliar;
Inclinação longitudinal: É a inclinação da pista de rolamento e/ou calçada em direção às extremidades das mesmas;
Inclinação transversal: É a inclinação da pista de rolamento e/ou calçada em direção aos bordos com objetivo de conduzir as águas pluviais para fora das mesmas, ou assegurar a estabilidade de veículos nas curvas de raios reduzidos;
Logradouro Público: Espaço de propriedade municipal, destinado ao trânsito público, oficialmente reconhecido, aceito e identificado por uma denominação;
Lote: Parcela autônoma de terreno resultante de loteamento, desmembramento ou remembramento, cuja testada é adjacente a logradouro público reconhecido;
Meio-fio: Arremate entre o plano do passeio e o da pista de rolamento de um logradouro.
Criam-se vias públicas urbanas por três processos fundamentais: pela execução de plano de arruamento mediante o parcelamento do solo em quadras ou por meio de abertura de vias de circulação pela abertura de rua isolada em execução de obras de ampliação do sistema viário; pela oficialização da via particular.
Nivelamento: é ato do direito urbanístico mediante o qual a administração fixa de maneira unilateral o nível das vias públicas em relação às propriedades lindeiras. É a fixação da cota correspondente aos diversos pontos característicos da via urbana, a ser observada por todas as construções nos seus limites com domínio público (alinhamento);
O arruamento é forma de parcelamento do solo prevista na Lei 6.766/79.
Considera - se infraestrutura urbana:
I - sistema de abastecimento de água e esgotamento sanitário;
II - sistema de drenagem de águas pluviais;
III - sistema de energia elétrica;
IV - sistema viário.
Na lição de Hely Lopes Meirelles (Direito Municipal Brasileiro, 1977, pág. 630), o zoneamento urbano consiste na repartição da cidade e das áreas urbanizáveis segundo a sua precípua destinação de uso e ocupação do solo. Trata-se de instrumento legal de que dispõem as municipalidades para controlar o uso do solo povoado, as densidades da população, a localização e dimensão, o volume dos edifícios e suas utilizações específicas, em prol da comunidade.
O zoneamento estabelece as áreas residenciais, comerciais e industriais; delimita os locais de utilização específica, como feiras, mercados, estacionamento de veículos; dispõe sobre a construção e tráfego no perímetro urbano, disciplina as atividades coletivas ou individuais que de qualquer modo afetem a vida na cidade.
Há o entendimento de que o zoneamento deve evitar súbitas e frequentes modificações de uso, que venham trazer instabilidade no mercado imobiliário.
Zoneamento, é um tradicional instrumento do planejamento urbano, profundamente difundido durante o século XX, caracterizado pela aplicação de um sistema legislativo (normalmente em nível municipal) que procura regular o uso e ocupação do solo urbano por parte dos agentes de produção do espaço urbano, tais como as construtoras, incorporadoras, proprietários de imóveis e o próprio Estado.
Essencial no zoneamento a questão do uso, como se lê:
a) usos conformes: são todos aqueles permitidos para o local pelas normas legais pertinentes. Para Hely Lopes Meirelles (obra citada, pág. 633) tais usos uma vez instalados geram direito adquirido e mesmo que se alter posteriormente o zoneamento, podem continuar na situação em que se encontravam no momento da lei;
b) usos tolerados: são aqueles que o zoneamento não reconhece como conformes nem repudia como desconforme, mas os admite por liberalidade e precariamente em condições especiais. Tais usos são exercidos mediante alvará de autorização (que não é licença), dado o seu caráter precário, sendo que sua continuidade dependerá sempre do juízo de conveniência e oportunidade da Prefeitura;
c) usos desconformes: são aqueles que a lei considera incompatíveis com o local. Se sobreviverem ao zoneamento poderão ser impedidos sumariamente e sem qualquer indenização; se antecederem, se constituem em pré-ocupação com direito adquirido à sua permanência e continuidade nas condições originárias, sem possibilidade de ampliação da atividade ou de renovação das construções, instalações ou equipamentos desconformes ou de transferência voluntária a terceiros.
Normalmente, as leis de zoneamento restringem o tipo de estrutura a ser construída em um dado local com base em:
- Função: as diferentes zonas limitam uma dada área da cidade para certo tipo de estrutura. Zonas podem ser, normalmente, residenciais, comerciais, industriais ou mistas. Zonas residenciais permitem a ocupação do solo urbano somente para uso residencial, zonas comerciais apenas para uso comercial e zonas industriais apenas para uso industrial. Zonas mistas permitem o uso de residencial e comercial (e eventualmente o industrial de baixa incomodidade) do terreno.
- Taxa de ocupação e Coeficiente de aproveitamento: diferentes zonas limitam o número de pavimentos que as estruturas a serem construídas podem vir a ter. Tal limite surge da divisão entre o coeficiente de aproveitamento máximo estipulado para uma região e a taxa de ocupação do lote urbano definido para ela.
- Gabarito: corresponde à limitação efetiva do tamanho das construções (expressa, normalmente, em números absolutos).
- Número de ocupantes: as várias zonas limitam a construção de estruturas baseado no número de habitantes ou trabalhadores a ocupar a área. Por exemplo, ruas próximas a grandes shopping-centers e arranha-céus podem ficar congestionadas por causa do grande número de pessoas que entram e saem da dada estrutura. Também chamado zoneamento por densidade.
Zoneamento urbano e ambiental é um método de proteção a territórios particulares. Há basicamente o zoneamento ambiental, zoneamento industrial e zona de reserva ambiental. O zoneamento ambiental objetiva controlar a utilização do solo e definir as atividades permitidas nele. Ocorre sob intervenção do Estado, que legalmente busca o desenvolvimento integrado com a proteção ambiental, o dito desenvolvimento ecologicamente sustentável.
De especial interesse o conceito de adensamento: Fenômeno associado ao crescimento populacional das cidades, que resulta no uso intensivo do espaço urbano.
O Coeficiente de Aproveitamento é um número que, multiplicado pela área do lote, indica a quantidade máxima de metros quadrados que podem ser construídos em um lote, somando-se as áreas de todos os pavimentos.
Existem dois tipos de CA: básico e máximo. O CA básico garante o direito básico de uso da propriedade. O CA máximo permite um uso adicional – estabelece um potencial construtivo adicional.
A zona residencial destina-se à moradia, respeitando requisitos especiais de salubridade, segurança e tranquilidade para o bem-estar de seus habitantes.
As zonas comerciais são as destinadas ao comércio varejista e atacadista, sendo conveniente que aquele permaneça nas proximidades das áreas residenciais ou mesmo em determinados setores destas, para abastecimento das moradias, e o outro atacadista, fora e recuado dos bairros de habitação, pelos inconvenientes que oferece em razão do transporte a granel, com tráfego constante e ruidoso.
As zonas industriais são as representadas pelas fábricas e atividades conexas, devendo situar-se distante dos bairros residenciais pelos inconvenientes naturais que acarretam. As Prefeituras têm aberto os chamados distritos industriais, fora do perímetro da cidade, mas erigidos em área urbana para nela concentrar atividades deste cunho.
As zonas mistas são aquelas de ocupação promíscua - residência, comércio, indústria e outras e para as quais não há utilização específica.
Nesse ponto, trago à discussão a questão da apropriação pública do solo urbano, tema discutida em outros países, como a França, no programa comum do governo de esquerda. Na matéria, sintetizou José Afonso da Silva (obra citada, pág. 76) quando sintetizou para uma política urbana: a) a apropriação pública da mais-valia decorrente da atividade urbanística em geral; b) municipalização do direito de construir (direito de edificar) pela apropriação pública dessa faculdade; c) o estabelecimento do direito de preempção de compra em favor dos Municípios de terrenos urbanos no momento de sua alienação; d) estabelecimento do direito de superfície, para que os Municípios possam por contrato, outorgar a particulares o direito de construir sobre terrenos municipais, onde sua edificabilidade for aconselhável, vedada por isso a privatização de tais terrenos; em certo sentido já existe a possibilidade de aplicação de concessão de uso prevista no artigo 7º do Decreto-lei, de 25 de fevereiro de 1967; e) controle de valores de terrenos urbanos, para evitar a especulação imobiliária. Aliás, num sistema capitalista adotado pela Constituição Federal tal opção não pode ser adotada uma vez que não há controle de preços.
V - O DIREITO DE PREEMPÇÃO
Observe-se que como direito de preempção, entende-se a preferência do Poder Público na aquisição de imóvel urbano, o qual deverá ser oferecido ao Município em igualdade de preço e condições de pagamento estabelecidas pelo proprietário e o terceiro proponente (comprador). Para Janaína Rigo Santin,Tiago Toniêto e Nairane Decarli (O Direito de Preempção no Estatuto da Cidade) tem-se que:
“Como um dos importantes instrumentos positivados no Estatuto da Cidade pelo legislador federal para cumprimento da função social da propriedade urbana e da função social da cidade o presente artigo elenca o direito de preempção, previsto em seu artigo 25, o qual “confere ao Poder Público Municipal preferência para aquisição de imóvel urbano objeto de alienação onerosa entre particulares”. Diógenes Gasparini faz uma análise desse instituto de maneira mais detalhada, abordando algumas expressões terminológicas sinônimas do direito de preempção: [...] “direito de preferência” ou “direito de prelação” são expressões verbais sinônimas. Todas expressam os mesmos fatos e indicam uma restrição ao poder de disposição que o proprietário tem sobre a coisa móvel ou imóvel, na medida em que deve, antes da alienação do bem que lhe pertence, oferecê-lo, em igualdade de condições, a certa pessoa, consoante determinado por lei ou contrato, em primeiro lugar na satisfação de seus interesses, quando outras desejam disputar sua primazia. É instituto tradicional do direito civil (2002, p. 192). Como direito de preempção entende-se a preferência do Poder Público na aquisição de imóvel urbano, o qual deverá ser oferecido ao Município em igualdade de preço e condições de pagamento estabelecidas pelo proprietário e o terceiro proponente (comprador). É preciso que o proprietário de imóvel sujeito ao direito de preempção, antes de efetivar a venda, comunicar a sua intenção de se desfazer do imóvel e as condições da proposta da terceira pessoa interessada. Para usufruir deste direito será necessária uma regulamentação em âmbito municipal, tendo em vista a competência do Município para legislar sobre assuntos de interesse local (art. 30 da Constituição Federal de 1988).”
Ainda disseram Janaína Rigo e outros (obra citada, RJLB, Ano 3 (2017), nº 3):
O direito de preempção será exercido conforme o disposto no art. 27 do Estatuto da Cidade, sendo que “o proprietário deverá notificar sua intenção de alienar o imóvel, para que o Município, no prazo máximo de trinta dias, manifeste por escrito seu interesse em comprá-lo”. Não havendo manifestação por parte do Poder Público, poderá ser realizada a alienação para terceiros, desde que nas mesmas condições da proposta apresentada ao Município, conforme disposto no parágrafo 3º do artigo 27. Concretizada a alienação onerosa, o vendedor ficará obrigado a apresentar para o Município cópia do respectivo instrumento de compra e venda num prazo não superior a trinta dias (parágrafo 4ºdo art. 27). Ressalva-se que, conforme o artigo 27, parágrafo 5º, será nula a alienação processada em condições diversas da proposta apresentada, possibilitando ao Município “adquirir o imóvel pelo valor da base de cálculo do IPTU ou pelo valor indicado na proposta apresentada, se este for inferior àquele” (art. 27, parágrafo 6º). Deve-se observar que, a que, ao exercer o Direito de Preferência, o Município deverá agir de acordo com as finalidades regidas no Estatuto, buscando melhorar as condições de vida dos seus munícipes. Ou seja, o ato de adquirir o imóvel através do direito de preempção deve estar enquadrado em uma ou mais das hipóteses descritas no art. 26 do Estatuto, sob pena de improbidade do Prefeito (art. 52, III). Assim, o Poder Público poderá utilizar-se do direito de preempção sempre que necessitar de áreas destinadas às seguintes finalidades: regularização fundiária; programas habitacionais de interesse social; constituição de reserva fundiária; ordenamento e direcionamento da expansão urbana; implantação de equipamentos urbanos e comunitários; criação de espaços públicos de lazer, áreas verdes, unidades de conservação ou proteção de áreas de interesse ambiental, histórico, cultural ou paisagístico, nos termos do artigo 26 do Estatuto da Cidade. Ou seja, conforme o parágrafo único desse artigo, além da previsão no Plano Diretor, será necessária edição de lei municipal específica para regular o direito de preempção, a qual deverá indicar cada área da cidade que incidirá o ato de preempção, bem como enquadrar em uma ou mais das finalidades anteriormente citadas”. Dir-se-á que essa determinação do Poder Público não poderá ser vazia de conteúdo.”
Se o prefeito se utilizar do instituto da preempção de forma diversa da lei poderá estar incurso em conduta de improbidade estabelecida pela Lei 8.429/92 (artigo 12).
O inciso VII do mesmo artigo 52 responsabiliza prefeito que adquirir imóvel objeto de direito de preempção pelo valor da proposta apresentada quando esta for, comprovadamente, superior ao preço de mercado.
Cabe ao Plano Diretor definir as áreas em que deverá incidir o direito de preempção, sendo fundamental a sua existência para que o poder público municipal possa fazer uso desse instituto jurídico em prol do interesse coletivo e da função social da cidade, limitando de modo racional o uso e ocupação dos imóveis urbanos. Dessa maneira estar-se-á priorizando um desenvolvimento sustentável para as cidades, suprindo as necessidades mais urgentes da população.
VI - O DIREITO DE SUPERFICIE E OUTROS INSTITUTOS URBANISTICOS
Caio Mário da Silva Pereira (Instituições de direito civil, direitos reais, volume IV, 2005, pág. 243) assim o descreveu:" O ‘direito de superfície’ é um desses institutos que os sistemas jurídicos modernos retiram das cinzas do passado, quando não encontram fórmulas novas para disciplinar relações jurídicas impostas pelas necessidades econômicas ou sociais. [...] O direito de superfície caracteriza-se como um instrumento real sobre coisa alheia, e se apresenta como um desdobramento da propriedade ".
Caio Mário da Silva Pereira salientou que há um desdobramento da propriedade, de modo que o direito de superfície faz surgir um direito real autônomo, na medida em que o superficiário detém a propriedade do edifício ou da plantação que constrói ou semeia, mantendo-se ao mesmo tempo, a propriedade do solo na esfera jurídica do cedente ou fundieiro.
A IV Jornada de Direito Civil promovida pelo Conselho da Justiça Federal aprovou o seguinte enunciado:"321 — Art. 1.369. Os direitos e obrigações vinculados ao terreno e, bem assim, aqueles vinculados à construção ou à plantação formam patrimônios distintos e autônomos, respondendo cada um dos seus titulares exclusivamente por suas próprias dívidas e obrigações, ressalvadas as fiscais decorrentes do imóvel"
O direito de superfície é uma concessão atribuída pelo proprietário do terreno a outrem, para construção e utilização durante certo tempo, salvo para realização de obra no subsolo a não ser que inerente ao objeto da concessão, que pode ser gratuita, ou mediante pagamento de valor fixo à vista ou parcelado.
Pela utilização, o superficiário deverá pagar todos os encargos e tributos que incidam sobre o imóvel como um todo, terreno mais construção, como se proprietário fosse.
Esse direito pode ser transferido a terceiros, sem qualquer necessidade de autorização do concedente (proprietário do terreno), transferindo-se também por sucessão. O concedente apenas possui direito de preferência na eventual alienação do direito de superfície, visando, primordialmente, a consolidação da propriedade. Igualmente, o superficiário tem preferência na aquisição do terreno em caso de sua venda pelo concedente.
Uma vez finda a concessão, a construção passará a ser propriedade do concedente. Essa incorporação dar-se-á independentemente de indenização, a não ser que as partes convencionem em contrário no contrato de concessão.
Antes do prazo, a concessão pode se rescindir em caso de destinação diversa ao terreno que porventura venha a ser dada pelo superficiário.
No direito romano, a superfície nasceu para corrigir determinadas consequências do conceito romano de domínio que as novas transformações do instituto tornaram-se antieconômicas.
Os romanos entendiam que tudo que estava sobre o solo se incorporava necessariamente, por direito natural, ao seu proprietário: superfícies solo cedit.
Assim, não poderiam conceber a propriedade da construção separada da propriedade do solo.
Mas, entretanto, quando o número de propriedades particulares se rarefez, introduziu-se o uso de conceder a particulares o direito de edificar no solo público e gozar da construção, de forma perpétua ou não. O particular tinha apenas o uso do edifício e a faculdade de o transferir, devendo pagar um aluguel anual (solarium, pensio) ou um quantia única. Esse uso foi generalizado entre as cidades.
Propriedade-família-religião foi a trilogia da cidade antiga.
A superfície originava-se de um contrato de locação do solo, ficando o supeficiário armado com uma actio conducti contra o proprietário do edifício, o qual era o proprietário do solo.
O pretor concedeu ao superficiário um interdito especial, que era análogo ao uti possidetis, o interdito de superficiebus, que protegia a posse de quem quer que tivesse o gozo do edifício, autorizado que era por um contrato de locação do solo.
No direito de Justiniano, o direito do superficiário é quase absoluto. O superficiário não tem obrigações perante o proprietário e o pagamento do solarium parece tão ser essencial à superfície, como ensinou Ebert Chamoun (Instituições de direito romano, 1968, pág. 278).
Extingue-se a superfície pela destruição do imóvel, confusão dos titulares, resgate, prescrição extintiva, ocorrendo, neste caso a usucapio libertatis. Entendeu-se que a decadência não tinha aplicação na superfície.
Domenico Simoncelli (Nuovo digesto italiano) cuidou do antigo direito de superfície, conhecido e desenvolvido em Roma, e, a seu ver, assumiria a propriedade horizontal o caráter de uma verdadeira propriedade superficiária, como conjunto imobiliário situado sobre o solo, cujo proprietário é pessoa distinta de quem tem o gozo e se alinharia entre os iura in re aliena.
A enfiteuse tinha precedentes históricos muito antigos.
Pode remontar à possessio do ager públicus, que era dividido e entregue a cidadãos, vendido ou passível de livre ocupação. Remonta a locatio dos agri vectigales. Os agri vectigales eram as terras do Estado, dos municípios, e dos colégios de sacerdotes dadas em locação perpétua ou a longo prazo, mediante um aluguel chamado vectigal.
Ao locatário, concedeu-se igualmente uma ação real, análoga à rei vindicatio. Ele era considerado possuidor e adquiria os frutos para a mera separação, como o proprietário, mas perdia o seu direito se deixasse de pagar o vectigal.
Diverso era o ius perpetuum, que era uma locação perpétua, que se apresentava com semelhanças à enfiteuse, a ponto de ser com ela, por volta do século IV ou V, confundida. Era, a princípio, perpétua, mas revogável por falta de pagamento do aluguel. Seu objeto eram as terras que pertenciam ao domínio privado do Estado e, mais tarde, às próprias terras privadas. Originava-se das cidades gregas, onde era praticado pelo menos cinco séculos antes de Cristo.
A enfiteuse atingia as terras do Estado e depois de particulares.
Justiniano fundiu a locação do ager vectigales com a enfiteuse, conservando este último nome para designar o instituto em que ele introduziu modificações substanciais. Tornou-se um direito real alienável, transferido a herdeiros, onerável por outros direitos reais, como servidão ou hipoteca, usufruto ou subenfiteuse.
O enfiteuta era considerado possuidor e, como o proprietário, adquiria os frutos com a simples separação. Tinha o pleno gozo do imóvel, mas não podia deteriorá-lo.
Justiniano impôs ao enfiteuta a obrigação de notificar o proprietário da alienação, dos ius emphyteuticum e de lhe dar preferência em condições iguais. Essa preferência o proprietário devia exercer em dois meses, ficando o enfiteuta livre para alienar àquele o direito de receber um quinquagésimo do preço, ou seja, dois por cento. Na idade média, deu-se a essa expressão o nome de laudêmio.
A enfiteuse podia ser constituída por contrato, no qual era lícito alterar os direitos e as obrigações normais salvo, a do cânon; por ato de última vontade, como o legado e a doação causa mortis e pela prescrição. Sabe-se que a donatio causa mortis podia ser feita fora do testamento, dispensava a capacidade de testar (o filho-família podia doar mortis causa a seu pai) e independia da adição da herança, bastando, para aperfeiçoar-se, a morte do testador.
A sua revogação, a princípio, somente era possível se determinada por uma cláusula expressa, em que se previsse a pré-morte do donatário ou a convalescença do doador. Todavia, segundo ensinou Ebert Chamoun (Instituições de direito romano, 1968, pág. 520), no Baixo Império, em virtude do movimento de aproximação das doações mortis causae com os legados, a cláusula de revogação era sempre subentendida e elas são plenamente revogáveis ao arbítrio do doador, escapando à disciplina das doações e introduzindo-se no sistema das disposições testamentárias, acostando-se aos legados, nos quais acabam por assimilar-se.
As ações que o enfiteuta podia intentar para defender os seus direitos eram, no direito de Justiniano, todas as ações inerentes à propriedade, concedidas como utiles; a utilis rei vindicatio, a actio confessória utilis e a actio negatória.
A enfiteuse cessava pelos mesmos modos que a superfície e ainda pela decadência.
Dir-se-á que a enfiteuse é um instituto caduco. Por certo é, havendo censuras da doutrina a sua prática e sua inconveniência na rotina administrativa. Até 10 de janeiro de 2003 (fim da vigência do Código Civil de 1916), a enfiteuse era considerada um direito real, no entanto, com a vigência do Código Civil de 2002, em 11 de janeiro daquele ano, a enfiteuse saiu do rol dos direitos reais que são previstos no artigo 1.225 do novo Código.
Registre-se que, na esfera federal, permanece em vigência, na matéria, o Decreto-lei nº 9.760, de 5 de setembro de 1946, lei especial, naquilo que dispõe sobre o instituto do aforamento (artigos 99 e seguintes). Hoje, são utilizados o direito real de uso e ainda o direito real de superfície.
A concessão do direito real de uso é o contrato pelo qual a Administração transfere a utilização, remunerada ou gratuita, de terreno público ao particular, como direito real resolúvel, para fins específicos de urbanização, industrialização, edificação, cultivo, ou qualquer outra exploração de interesse social, consonante já se lia do artigo 7º do Decreto-lei nº 271, de 28 de fevereiro de 1967, que a instituiu no sistema jurídico brasileiro.
A concessão de uso, como direito real, adere ao bem e o acompanha em todas as mutações, sendo alienável por ato inter vivos e transferível por sucessão legitima e testamentária. Atual a lição de Lopes Meirelles (obra citada, pág. 377) no sentido de que tal concessão substitui de forma vantajosa a maioria das alienações de terrenos públicos.
Para tanto, a concessão de direito real depende de lei autorizativa e de concorrência, pois importa na alienação de parcela do domínio público, razão pela qual deve ser registrada tanto para a sua constituição como para seu cancelamento. Desde a inscrição da concessão, o concessionário fruirá plenamente do terreno para os fins estabelecidos no contrato e responderá por todos os encargos, civis, administrativos e tributários que venham a incidir sobre o imóvel e suas rendas.
Resolve-se a concessão antes de seu termo se o concessionário der ao terreno destinação diversa da estabelecida no contrato ou descumprir cláusula resolutória do ajuste, perdendo as benfeitorias que houver feito no imóvel (artigo 7º, §§ 1º e 3º). O instituto está previsto no Código das Cidades (artigo 4º, V, g) como instrumento de política urbana.
Na dissolução de união estável, os direitos de concessão de uso em imóvel público recebido pelo casal em decorrência de programa habitacional de baixa renda podem ser submetidos à partilha. No caso dos bens públicos, apesar de não haver alteração da titularidade do imóvel, a concessão tem repercussão econômica que justifica a divisão patrimonial.
O entendimento foi adotado pela Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao negar recurso especial no qual um dos cônjuges defendia a impossibilidade de divisão do imóvel recebido de forma gratuita. Para o recorrente, a meação exigiria titularidade onerosa do negócio, mas o patrimônio em discussão havia sido concedido de forma precária pelo governo por meio de plano de habitação para a população carente.
Diversa é a cessão de uso, que consiste na transferência gratuita da posse de um bem público de uma entidade ou órgão para outro, a fim de que o cessionário o utilize segundo a sua normal destinação, por certo tempo ou indeterminado. É ato de colaboração entre as entidades públicas, em que aquela que tem bem desnecessário aos seus serviços cede o uso a outra que o está precisando, nas condições estabelecidas no respectivo termo de cessão, não se confundindo com forma de alienação, sendo modalidade de utilização de bens públicos não aplicados ao serviço direto do cedente, na lição de Caio Tácito (RDA 32/482).
Como tal, não exige autorização legislativa e se faz com o simples termo e anotação cadastral, sendo ato ordinário da Administração. Quando, porém, a cessão é para outra entidade, necessário se torna lei autorizativa da Câmara, para legitimar sua transferência de posse (não domínio) do bem municipal e estabelecer as condições em que o Prefeito pode fazê-la. É ato administrativo interno.
Outro instrumento previsto é a concessão de uso do espaço aéreo sobre superfície de terrenos públicos ou particulares, tomada em projeção vertical, nos termos e para os fins previstos no artigo 7º e na forma que for regulamentada. É instituto mediante o qual se atribui, à pessoa diversa do proprietário, o direito real de utilização do solo. Como tal, é ainda previsto no artigo 5º do Estatuto das Cidades. Trata-se de especial direito real de construir e não de forma de servidão pessoal.
No Estatuto da Cidade, o direito de superfície permite de acordo com o artigo 21 o uso do solo, do subsolo e do espaço aéreo:"Artigo 21. O proprietário urbano poderá conceder a outrem o direito de superfície do seu terreno, por tempo determinado ou indeterminado, mediante escritura pública registrada no cartório de registro de imóveis. § 1o O direito de superfície abrange o direito de utilizar o solo, o subsolo ou o espaço aéreo relativo ao terreno, na forma estabelecida no contrato respectivo, atendida a legislação urbanística".
O Código Civil, na medida em que permite sua concessão também para imóveis rurais, teve maior amplitude quando cotejado ao Estatuto da Cidade. No entanto, de acordo com aquele, apenas o uso do solo estaria abarcado pela concessão de tal direito, devendo o uso do subsolo e do espaço aéreo estar previsto ou no instrumento de concessão ou ser uma decorrência da natureza desta."Artigo 1.369. O proprietário pode conceder a outrem o direito de construir ou de plantar em seu terreno, por tempo determinado, mediante escritura pública devidamente registrada no Cartório de Registro de Imóveis. Parágrafo único. O direito de superfície não autoriza obra no subsolo, salvo se for ine-rente ao objeto da concessão".
Maria Helena Diniz (Código civil anotado, 2008, pág. 931), por sua vez, admite a coexistência de ambos os diplomas e assim escreve sobre o tema: “O direito de superfície não autoriza que se faça obra em sub-solo, exceto se isso for inerente ao objeto da concessão feita (p. ex., abertura de poço artesiano e canalização de suas águas até o local das plantações) ou para atender a legislação urbanística (Lei 10.257/2001, arts. 21 a 24)”.
Como ensina José Afonso da Silva (Direito Urbanístico Brasileiro, 6ª edição, pág. 404), à luz das ilações de Giovanni Balbi (Il diritto de superfície, pág. 30 a 49), o instituto assume dois aspectos:
a) O superficiário torna-se proprietário de uma construção existente; se a construção existe, o direito de superfície constitui-se mediante a alienação de propriedade da construção, e não do solo; não haverá direito de superfície se a propriedade da construção pertencer ao proprietário do solo;
b) Direito de superfície como direito de construir um edifício (prédio, casa etc) em solo alheio (concessão ad aedificandum), que é, assim, o contrato pelo qual o proprietário do solo permite à outra parte construir sobre o solo, com o atendimento, tácito ou expresso, de que o edifício se torne propriedade do construtor.
Assim, a superfície se destacará do solo e constituirá um direito de propriedade em separado; o concessionário do ius aedificandi adquirirá a propriedade da superfície, do direito de edificar, e o edifício se tornará sua propriedade. Assim, mediante o direito de superfície, dá-se a separação do direito de construir do direito de propriedade do solo, na conformidade da convenção entre o concedente (superficiente) e o superficiário (concessionário).
No direito público, o direito de superfície consiste na possibilidade de utilização de terrenos urbanos de propriedade pública por particulares.
O Estatuto das Cidades concebe o direito de superfície como um contrato segundo o qual o proprietário urbano poderá conceder a outrem, gratuita ou onerosamente, o direito de superfície do seu terreno, por tempo determinado ou indeterminado, mediante escritura pública registrada no Cartório de Registro de Imóveis (artigo 21), abrangendo o direito de utilizar o solo, o subsolo ou o espaço aéreo relativo ao terreno, na forma estabelecida no respectivo contrato, atendida a legislação urbanística.
Por sua vez, o contrato de superfície extingue-se pelo advento de seu termo, ou por sua rescisão, em decorrência do descumprimento das obrigações contratuais assumidas pelo superficiário, entre as quais está o fato do superficiário dar ao terreno destinação diversa daquela para a qual fora concedida. A extinção do contrato reveste o proprietário no pleno domínio do terreno, bem como nas acessões e benfeitorias nele introduzidas, o que independe de indenização, salvo disposição contratual em contrário.
São negociáveis tanto o terreno concedido em superfície, como o direito de superfície. Se o proprietário do terreno quiser aliená-lo, nada impede que o faça, desde que dê preferência ao superficiário em igualdade de condições à oferta de terceiro.
Os encargos ou tributos que incidirem sobre a propriedade superficiária (sobre o terreno sobre o qual pesa o direito de superfície) são de integral responsabilidade do superficiário, que ainda responde pelos encargos e tributos que incidem sobre a área objeto da concessão do direito de superfície, salvo se as disposições do respectivo contrato estabelecerem outro sentido.
A abertura de rua isolada processa-se pela execução do projeto de obras públicas de criação de novas vias de circulação ou prolongamento das existentes. A via, como ensinou José Afonso da Silva (obra citada, pág. 182) deverá ser construída em terreno de propriedade da municipalidade, executora do projeto, o que confere a natureza pública à área.
Por sua vez, a oficialização da via particular é o meio pelo qual a Prefeitura aceita, declara ou reconhece como oficial uma via particular de uso público. José Afonso da Silva (obra citada, pág. 182) ensinou que a legislação urbanística costuma definir a via de circulação como o espaço destinado à circulação de veículos ou pedestres, sendo que: a) via particular é a via de propriedade privada, ainda que aberta ao uso público; b) via oficial é a via de uso público, aceita, declarada ou reconhecida como oficial pela Prefeitura. Por certo, José Afonso da Silva (obra citada) não admite rua particular, no sistema jurídico vigente; as que ainda houver, ou serão resultantes de sistemas passados e ultrapassados ou provenientes de vias internas em propriedades particulares, que o interesse público requer sejam integradas no sistema viário urbano por meio de oficialização.
VII - A OUTORGA ONEROSA DO DIREITO DE CONSTRUIR
Segundo Bruno Felin, Laura Azeredo, Luana Betti e Priscila Pacheco (O que é a outorga onerosa do direito de construir e como ela ajuda a tornar as cidades mais justas e rentáveis)"a OODC desempenha um papel duplo no planejamento das cidades: além de um instrumento de gestão do território, configura-se também como um instrumento de financiamento – já que, via de regra, é uma cobrança, e por isso costuma gerar polêmica quando aplicada.
Para orientar o uso e a ocupação do solo urbano, o PD utiliza um mecanismo chamado Coeficiente de Aproveitamento (CA). Quando esse coeficiente é 1, o dono de um terreno de 100 metros quadrados pode construir até 100 metros quadrados (uma vez a área do terreno). Se o coeficiente for 2, ele pode construir até 200 metros quadrados no mesmo espaço (duas vezes a área do terreno)."
Como já se disse existem dois tipos de CA: básico e máximo. O CA básico garante o direito básico de uso da propriedade. O CA máximo permite um uso adicional – estabelece um potencial construtivo adicional. A Outorga Onerosa do Direito de Construir nada mais é que uma concessão emitida pelo poder público para que o proprietário do imóvel construa acima do coeficiente básico estabelecido mediante o pagamento de uma contrapartida financeira. Ou seja, se um terreno está localizado em uma área de CA básico 1 mas que permite um CA máximo de 4, o dono precisa adquirir o direito de construir a mais, se assim desejar, não podendo ultrapassar o CA máximo estabelecido para aquela região.
Disseram ainda Bruno Felin, Laura Azevedo, Luana Betti e Priscila Pacheco (obra citada) que:
A OODC não é:
-
cobrada de quem já tem seu imóvel construído
-
cobrada de quem vai construir área igual ou menor à área do terreno
-
obrigatória ou compulsória
A OODC é:
-
cobrada de novos empreendimentos que desejam construir acima do CA básico
-
geralmente investida em infraestrutura urbana
-
um instrumento de gestão do território urbano, com potencial para induzir o crescimento de forma eficiente – por exemplo, em áreas próximas a eixos de transporte
-
um mecanismo que auxilia para a efetivação do planejamento estratégico da cidade
VIII - TRANSFERÊNCIA DO DIREITO DE CONSTRUIR
A Transferência do Direito de Construir confere ao proprietário de um lote a possibilidade de exercer seu potencial construtivo em outro lote, ou de vendê-lo a outro proprietário. Deve ser utilizada, portanto, em áreas que o Poder Público tenha, por qualquer motivo, interesse em manter com baixa densidade. As áreas que podem receber o potencial construtivo devem ser aquelas em que a densificação seja desejável ou, ao menos, tolerável.
O Estatuto da Cidade, no seu artigo 35 estabelece que esse instrumento pode ser utilizado em áreas que o Poder Público considere necessárias para:
- implantação de equipamentos urbanos e comunitários;
- preservação, quando o imóvel for considerado de interesse histórico, ambiental, paisagístico, social ou cultural;
- servir a programas de regularização fundiária, urbanização de áreas ocupadas por população de baixa renda e habitação de interesse social.
IX - USUCAPIÃO COLETIVO
Silvio de Salvo Venosa (Usucapião Coletivo no novo Código Civil, in Migalhas) ensinou:
"O Estatuto da Cidade (Lei nº 10.257/2001) introduz em nosso ordenamento mais uma modalidade de usucapião, no artigo 10:"A áreas urbanas com mais de duzentos e cinqüenta metros quadrados, ocupadas por população de baixa renda para sua moradia, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, onde não for possível identificar os terrenos ocupados por cada possuidor, são suscetíveis de serem usucapidas coletivamente, desde que os possuidores não sejam proprietários de outro imóvel urbano ou rural.
A lei cria, portanto, modalidade de usucapião coletivo, atendendo à pressão social das ocupações urbanas. Possibilita que a coletividade regularize a ocupação, sem os entraves e o preço de uma ação individual de usucapião. Como já apontamos em outro artigo, a ocupação de terrenos sempre foi a modalidade mais utilizada pela população urbana. A lei exige que a área tenha mais de 250 metros quadrados, com ocupação coletiva, sem identificação dos terrenos ocupados. Na prática, até que os terrenos podem ser identificados. Ocorre que essa identificação se mostra geralmente confusa ou inconveniente nesse emaranhado habitacional. Note também que a área deve ser particular, pois a Constituição da República é expressa em proibir o usucapião de terras públicas."
Lembrou ainda Silvio de Salvo Venosa (obra citada) que o artigo 1.228, parágrafo 4º do novo Código Civil, admite que o proprietário pode ser privado do imóvel que reivindica, quando este consistir em extensa área, na posse ininterrupta e de boa-fé, por mais de cinco anos, de considerável número de pessoas, e estas nela houverem realizado em conjunto ou separadamente, obras e serviços considerados pelo juiz de interesse social e econômico.
Busca-se, em ambas as situações, o sentido da função social da propriedade.
Ainda disse Silvio de Salvo Venosa, em conclusão:
"O artigo 12 do Estatuto da Cidade dispõe sobre a legitimidade para a propositura da ação de usucapião especial urbana, referindo-se tanto ao usucapião individual (artigo 9º) como ao usucapião coletivo (artigo 10). Nessas premissas, atribui-se legitimidade: I - ao possuidor, isoladamente ou em litisconsórcio originário ou superveniente; II - aos possuidores, em estado de composse; e III - à associação de moradores da comunidade regularmente constituída, como substituto processual, desde que devidamente autorizada pelos associados. O mesmo artigo dispõe sobre a participação obrigatória do Ministério Público nesses processos e concede assistência judiciária gratuita, inclusive perante o cartório de registro de imóveis.
O dispositivo do artigo 13 desse estatuto é de grande importância: menciona que o usucapião especial de imóvel urbano pode ser alegado como matéria de defesa. Quanto a isso não há novidade, pois qualquer modalidade de prescrição aquisitiva pode ser invocada como matéria de defesa a fim de paralisar ação reivindicatória. O artigo 13 acrescenta, porém, que a sentença que reconhecer essa aquisição por usucapião valerá como título para registro no cartório imobiliário. Desse modo, sob tal premissa, não haverá necessidade de ação própria. Essa solução poderia ser estendida a todas as formas de usucapião, com pequenas alterações no seu procedimento. O artigo 14 estabelece que o rito para o usucapião urbano é o sumário. Nesse aspecto, não cremos que tenha havido aqui a melhor solução. Sempre que o processo sumário necessitar de perícia, como é o caso do usucapião, a sua principal vantagem, que é a celeridade, cai por terra. A matéria é nova e complexa e requer profundo estudo doutrinário. Quanto à prática, os tribunais indicarão no futuro as melhores soluções sociais, seguindo o desiderato da lei."
X - A CONCESSÃO DE USO, PERMISSÃO DE USO E AINDA A AUTORIZAÇÃO DE USO
Discutem-se a concessão de uso, permissão de uso e ainda a autorização de uso.
Ora, haveria uma permissão de uso, que é ato negocial, unilateral, discricionario e precário, através do qual a administração faculta ao particular a utilização individual de determinado bem público nas condições por ela fixadas. Como ato negocial a permissão pode ser com ou sem condições, gratuita ou remunerada, por tempo certo ou indeterminado conforme o estabelecido no termo de outorga. Mas entenda-se: tal permissão deverá ser no interesse da coletividade e não só para o particular. A revogação, no interesse da administração, se fará, em geral, sem indenização, salvo se a outorga de permissão dispuser o contrário, sendo esse idêntico ou da outorga e das condições nela previstas.
Como ensinou Hely Lopes Meirelles (Direito municipal brasileiro, 1977, pág. 373), a permissão (não depende de lei autorizativa ou licitação, que podem ser impostos por lei orgânica do municipio)é um meio-termo entre a informal autorização (de cunho discricionário, unilateral, precário, que não geram privilégios contra a administração, dispensam lei autorizativa e licitação para tal, de cunho transitório) e a concessão de uso, onde há o transpasse contratual e estável da utilização do bem público a um particular para que esse o explore por conta e risco (boxe de um mercado, de um logradouro turístico), conferindo exclusividade de uso.
A autorização de uso para fins urbanísticos, que foi regulada pela Medida Provisória nº 2.220 /01, pode ser concedida a quem, preenchidos os demais requisitos legais, possua imóvel público por mais de 5 anos, utilizando-o para fins comerciais. Trata-se de autorização de uso especial, prevista no artigo 9º da MP 2.220 /01, que diz:
"Art. 9o É facultado ao Poder Público competente dar autorização de uso àquele que, até 30 de junho de 2001, possuiu como seu, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, até duzentos e cinquenta metros quadrados de imóvel público situado em área urbana, utilizando-o para fins comerciais.
§ 1o A autorização de uso de que trata este artigo será conferida de forma gratuita.
§ 2o O possuidor pode, para o fim de contar o prazo exigido por este artigo, acrescentar sua posse à de seu antecessor, contanto que ambas sejam contínuas.
§ 3o Aplica-se à autorização de uso prevista no caput deste artigo, no que couber, o disposto nos arts. 4o e 5o desta Medida Provisória.
Art. 9o É facultado ao Poder Público competente dar autorização de uso àquele que, até 30 de junho de 2001, possuiu como seu, por cinco anos, ininterruptamente e sem oposição, até duzentos e cinquenta metros quadrados de imóvel público situado em área urbana, utilizando-o para fins comerciais."
Note-se que a autorização especial de uso é uma faculdade da Administração, ou seja, não é um direito subjetivo do possuidor, diferente do que ocorre com a concessão especial de uso.
É, pois, ato discricionário, precário e unilateral "pelo qual a Administração consente na prática de determinada atividade individual incidente sobre um bem público, como ensinou Hely Lopes Meirelles (Direito Administrativo Brasileiro . 35 ed. São Paulo: Malheiros, 2009, pág 532.)
São requisitos da autorização especial: Imóvel público Área: até 250 metros quadrados Local do imóvel: área urbana Posse do imóvel: mais de 05 anos até 30/07/2001 Utilização do imóvel: fins comerciais
Por certo, a definição do modelo de assentamento urbano permite a intervenção do município no sentido de impor às construções tipos adequados à paisagem urbana. Daí porque se fala em restrições ao direito de construir, verdadeiras limitações administrativas, de tal forma que se busque a harmonia estética e arquitetônica entre os prédios e a paisagem.
XI - O LOTEAMENTO E A UTILIZAÇÃO DO SOLO
Dita a Lei Federal n.º 6.766/79 que o parcelamento do solo urbano somente pode ser levado a efeito mediante loteamento ou desmembramento (artigo 2º,"caput"). O loteamento vem disciplinado no § 1º do seu artigo 2º, que determina" considera-se loteamento a subdivisão de gleba em lotes destinados a edificação, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos ou prolongamento, modificação ou ampliação das vias existentes ". A diferença básica entre o loteamento e o desmembramento é que neste último há o aproveitamento do sistema viário existente, sem a abertura de novas vias e logradouros públicos, nem prolongamento, modificação ou ampliação dos já existentes (art. 2º, § 2º, da Lei Federal n.º 6.766/79).
Com o loteamento ou o desmembramento, a gleba parcelada perde sua individualidade e gera lotes com acesso direto a via ou logradouro público. Não há, na legislação federal, limite máximo de área a ser objeto de parcelamento do solo. Tal limite, no entanto, poderá ser estabelecido pela legislação estadual ou municipal, modo a atender às peculiaridades regionais e locais (art. 1º, parágrafo único, da Lei Federal n.º 6.766/79).
Lote é o terreno servido de infraestrutura básica cujas dimensões atendam aos índices urbanísticos definidos no plano diretor ou lei municipal para a zona em que se situe. Diverso é o desdobro. O desdobro é a divisão da área do lote para formação de novo ou de novos lotes. Estes devem atender às exigências mínimas de dimensionamento e índices urbanísticos para sua edificação. Gleba é a área que ainda não foi objeto de arruamento ou loteamento. O loteamento deve ser objeto de aprovação pelo Município e, após isso, objeto de registro.
Há diferença entre o loteamento irregular e o loteamento clandestino. O loteamento irregular é aquele que possui aprovação do Poder Público, registrado ou não, mas que o loteador não providenciou sua execução ou a execução se deu em desconformidade com o ato de aprovação ou as normas aplicáveis. É clandestino o loteamento quando não possui a aprovação do poder público e/ou o registro no Cartório de Registro de Imóveis (CRI) competente, resultando inviabilizada a matrícula e individualização dos respectivos lotes.
O parcelamento e ocupação do solo tem como objetivo desenvolver as atividades urbanas, bem como a concentração equilibrada de pessoas e, tal parcelamento e ocupação deve ser estimulado e orientado pelo poder municipal para o bom desenvolvimento urbano, rural e industrial do próprio município, mediante controle do uso e aproveitamento do solo.
Os requisitos em tela constam dos incisos do artigo 4º da lei de parcelamento do solo e dele constam a previsão, dentre outros, de critérios concernentes ao tamanho do lote (área mínima de 125 m2 e frente mínima de 5 m) e à urbanização consciente (proporcionalidade à densidade de ocupação prevista).
As áreas destinadas a sistemas de circulação, a implantação de equipamentos urbano e comunitário, bem como a espaços livres de uso público, serão proporcionais à densidade de ocupação prevista pelo plano diretor ou aprovada por lei municipal para a zona em que se situem. O registrador não tem mais, como anteriormente, o dever de fiscalizar a porcentagem de 35% de áreas públicas prevista até a alteração introduzida pela Lei 9.785, de 29.01.1999.
Em relação ao percentual mínimo, que anteriormente à Lei nº 9.785/1999 era de 35% da área, veja-se o que diz a redação atual do § 1º, do art. 4º da Lei nº 6.766/79:
" A legislação municipal definirá, para cada zona em que se divida o território do Município, os usos permitidos e os índices urbanísticos de parcelamento e ocupação do solo, que incluirão, obrigatoriamente, as áreas mínimas e máximas de lotes e os coeficientes máximos de aproveitamento. (Redação dada pela Lei nº 9.785, de 1999)”
A legislação prevê, também, os casos em que não será permitido o parcelamento do solo, abrangendo nos incisos do parágrafo único do artigo 6º itens tais quais terrenos alagadiços ou sujeitos a inundações, terrenos aterrados com material nocivo à saúde pública e áreas de preservação ecológica, de forma a patrocinar a função social da propriedade.
O loteador deverá solicitar à Prefeitura a definição das diretrizes para o uso do solo, traçado dos lotes, do sistema viário, dos espaços livres e das áreas reservadas para equipamento urbano e comunitário. Em anexo ao requerimento, deve ser apresentado a planta do imóvel. Ficam dispensados dessa etapa os Municípios com menos de cinquenta mil habitantes e aqueles cujo plano diretor contiver diretrizes de urbanização para a zona em que se situe o parcelamento poderão dispensar, por lei, essa etapa de fixação de diretrizes. O prazo de validade das diretrizes é de 04 (quatro) anos.
O loteador apresentará o projeto na Prefeitura, acompanhado de certidão atualizada da matrícula da gleba (título de propriedade), expedida pelo Cartório de Registro de Imóveis competente, de certidão negativa de tributos municipais e do competente instrumento de garantia. Apresentará o conteúdo do projeto e ainda:
a) desenhos
b) memorial descritivo
c) cronograma de execução das obras (com duração máxima de quatro anos).
O projeto será aprovado pelo Município, por meio da expedição de Decreto Municipal.
A lei municipal definirá os prazos de aprovação do projeto. Em caso de omissão, os prazos serão de 90 (noventa) dias para a aprovação e de 60 (sessenta dias) para aceitação ou recusa fundamentada das obras de urbanização. Após a aprovação do projeto (publicação do Decreto Municipal), o loteador deverá submetê-lo a registro imobiliário (Cartório de Registro de Imóveis). O prazo será de 180 (cento e oitenta) dias, contados da aprovação do projeto pela Prefeitura, por meio da publicação do Decreto Municipal.
A Lei de loteamentos disciplina as hipóteses de conduta penal:
Art. 50. Constitui crime contra a administração pública:
I – dar início, de qualquer modo, ou efetuar loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos, sem autorização do órgão público competente, ou em desacordo com as disposições desta lei ou das normas pertinentes do Distrito Federal, Estados e Municípios;
II – dar início, de qualquer modo, ou efetuar loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos sem observância das determinações constantes do ato administrativo de licença;
III – fazer, ou veicular em proposta, contrato, prospecto ou comunicação ao público ou a interessados, afirmação falsa sobre a legalidade do loteamento ou desmembramento do solo para fins urbanos, ou ocultar fraudulentamente fato a ele relativo.
Pena: reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa de 5 (cinco) a 50 (cinquenta) vezes o maior salário mínimo vigente no país.
Parágrafo único. O crime definido neste artigo é qualificado, se cometido:
I – por meio de venda, promessa de venda, reserva de lote ou quaisquer outros instrumentos que manifestem a intenção de vender lote em loteamento ou desmembramento não registrado no registro de imóveis competente;
II – com inexistência de título legítimo de propriedade do imóvel loteado ou desmembrado, ressalvado o disposto no artigo 18, §§ 4º e 5º, desta Lei, ou com omissão fraudulenta de fato a ele relativo, se o fato não constituir crime mais grave. (NR) (Redação dada ao inciso pela Lei nº 9.785, de 29.01.1999, DOU 01.02.1999)
Art. 51. Quem, de qualquer modo, concorrer para a prática dos crimes previstos no artigo anterior desta lei incide nas penas a estes cominadas, considerados em especial os atos praticados na qualidade de mandatário de loteador, diretor ou gerente de sociedade.
Art. 52. Registrar loteamento ou desmembramento não aprovado pelos órgãos competentes, registrar o compromisso de compra e venda, a cessão ou promessa de cessão de direitos, ou efetuar registro de contrato de venda de loteamento ou desmembramento não registrado.
Pena: detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos, e multa de 5 (cinco) a 50 (cinquenta) vezes o maior salário mínimo vigente no país, sem prejuízo das sanções administrativas cabíveis.
Discute-se com relação à área pública que deve haver no loteamento. A matéria foi tratada por João Baptista Galhardo, em sua obra “O Registro do Parcelamento do Solo Para Fins Urbanos”, IRIB/safE, Porto Alegre, 2004, p. 33-34:
“10. Áreas públicas
As áreas destinadas a sistemas de circulação, a implantação de equipamentos urbano e comunitário, bem como a espaços livres de uso público, serão proporcionais à densidade de ocupação prevista pelo plano diretor ou aprovada por lei municipal para a zona em que se situem.
11. Fiscalização da proporcionalidade
O registrador não tem mais, como anteriormente, o dever de fiscalizar a porcentagem de 35% de áreas públicas prevista até a alteração introduzida pela Lei 9.785, de 29.01.1999 [p. 511].”
De toda sorte, o financiamento do espaço público pode ser objeto de arrecadação do IPTU, de contribuições de melhoria, como meio de aporte municipal e ainda por financiamentos. Esclareço aqui que, com a incorporação do BNH à Caixa Econômica Federal, em novembro de 1986, perdeu-se um instrumento importante para tal, seja nos programas habitacionais para áreas de interesse social de população de baixa renda e para cooperativados (com recursos do FGTS) nos programas com recursos do Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo, via empréstimos e financiamentos, e nos programas de Saneamento Básico (PLANASA) e ainda de cidades de porte médio, através da Carteira de Desenvolvimento Urbano, ainda com recursos do Banco Mundial.
Mas é preciso lembrar que os primeiros planos de habitação popular tiveram a marca de ocupação das camadas mais pobres da população em periferias, como que as isolando dos demais centros, como a zona sul do Rio de Janeiro, que ficaram como espaço da chamada classe média alta, com valorização excessiva do metro quadrado. Essa foi a marca do BNH, com seus programas sociais de habitação e infraestrutura local, na linha já traçada na antiga Guanabara, no governo Lacerda.
Aliás, a Fundação da Casa Popular foi o primeiro órgão federal brasileiro na área de moradia com a finalidade de centralizar a política de habitação, criado em 1º de maio de 1946, durante o governo do presidente Eurico Gaspar Dutra, embora as primeiras gestões para sua criação tenham acontecido no governo de Getúlio Vargas. Esta fundação é tida como precursora do Banco Nacional da Habitação (BNH), criado em 1964.
O drama da pobreza expõe nas cidades um câncer social de cada vez mais difícil solução. A concentração da pobreza não se restringe às áreas periféricas como acontece na maioria das cidades pelo mundo afora. A ocupação informal de morros e margens de rios se tornou uma parte indissociável dos bairros cariocas desde o início do século passado. Na medida em que as facções criminosas encontraram nesses territórios, o lócus ideal para implantar os seus rentáveis negócios, outros tipos de crime começaram a ser praticados simultaneamente. A relação promíscua com a banda podre da polícia estimulou a formação de milícias poderosas.
XII - A DESAPROPRIAÇÃO COMO INSTRUMENTO DE DESENVOLVIMENTO DO ESPAÇO URBANO
Sabe-se que a desapropriação, a teor do artigo 5º, XXIV, da Constituição Federal, é modalidade de intervenção do estado na propriedade, mediante o qual se transfere a propriedade de determinado bem de um particular para a Administração mediante prévia e justa indenização. Para tanto será necessária a observância de um procedimento administrativo, a comprovação de necessidade ou utilidade pública ou interesse social e o pagamento de indenização prévia, justa em dinheiro com as ressalvas de hipóteses previstas na Constituição.
Mas, com a realização da desapropriação é possível que as áreas afetadas por ela sofram valorização decorrente dessa intervenção, de modo que há instrumentos pelos quais o Poder Público pode se beneficiar dessa mais valia. Fala-se em desapropriação de área contigua e desapropriação por zona. A esse respeito tem-se o artigo 4º do Decreto-lei 3.365/41:
Art. 4o A desapropriação poderá abranger a área contígua necessária ao desenvolvimento da obra a que se destina, e as zonas que se valorizarem extraordinariamente, em consequência da realização do serviço. Em qualquer caso, a declaração de utilidade pública deverá compreendê-las, mencionando-se quais as indispensáveis à continuação da obra e as que se destinam à revenda.
A Lei autoriza o desapropriante a declarar de utilidade pública as áreas contíguas àquelas necessárias à obra ou serviço propriamente ditos. Concluída a obra principal, terá o Poder Público condições para saber quais as áreas adjacentes indispensáveis à sua complementação, desapropriando-a, uma vez que já haviam sido abrangidas pelo decreto declaratório de utilidade pública.
Será o caso do exemplo que a doutrina dá quando na construção de um porto, o Poder Público tenha a necessidade de desapropriar áreas que irão servir diretamente a essa construção como as que se compreendam na faixa destinada ao futuro cais.Outro é o conceito da desapropriação por zona.
O STJ, no julgamento do REsp 1092010, diferenciou os instrumentos que o Estado pode se valer para trazer para o erário público os valores decorrentes da valorização. Assim decidiu o Tribunal:“ Na desapropriação, direta ou indireta, quando há valorização da área remanescente não desapropriada em decorrência de obra ou serviço público, dispõe o Estado de três instrumentos legais para evitar que a mais valia, decorrente da iniciativa estatal, locuplete sem justa causa o patrimônio de um ou de poucos: a desapropriação por zona ou extensiva, a cobrança de contribuição de melhoria e o abatimento proporcional, na indenização a ser paga, da valorização trazida ao imóvel”. A utilização de cada um desses instrumentos legais varia de acordo com a forma que se deu a valorização imobiliária. Novamente reproduzindo o julgado mencionado, o STJ diferencia as formas de valorização da seguinte forma:
“A valorização imobiliária decorrente da obra ou serviço público pode ser geral, quando beneficia indistintamente um grupo considerável de administrados, ou especial, que ocorre quando o benefício se restringe a um ou alguns particulares identificados ou, pelo menos, identificáveis. A mais valia geral subdivide-se em ordinária e extraordinária. A primeira tem lugar quando todos os imóveis lindeiros à obra pública se valorizam em proporção semelhante. A segunda, diferentemente, toma parte quando algum ou alguns imóveis se valorizam mais que outros, atingidos pela mais valia ordinária”.
Quando estamos diante de uma valorização geral e extraordinária o Estado tem a sua disposição da chamada desapropriação por zona ou extensiva, expressamente prevista no Decreto 3.365/41. Esta forma de desapropriação caracteriza-se pela inclusão das áreas contíguas àquelas de que o poder público efetivamente necessita para a realização de obra pública, a fim de que o poder público utilize a área para a realização de obras futuras ou se beneficie da valorização dessas áreas contíguas em função da execução da obra.
Daí porque, nos casos em que seja previsível a valorização extraordinária das zonas próximas às obras ou serviços a serem executados pelo Poder Público, permite a lei posa o mesmo declarar a utilidade pública das áreas atingidas por estas zonas, para fins de desapropriação.
Assim, a desapropriação dos terrenos adjacentes destina-se, tanto a permitir a realização integral de grandes planos de obras públicas, como facilitar a revenda dos terrenos assim adquiridos, a amortização das vultosas quantias nelas despendidas pelo Estado. Consideram os autores que a desapropriação por zona é uma espécie de substituto da contribuição de melhoria. Isso porque o Estado ao invés de cobrar do beneficiário um tributo correspondente ao aumento de valor, que a obra pública acarrete aos imóveis adjacentes, chama estes imóveis ao seu patrimônio pelo preço antecedente à realização da obra, e, alienando-os, posteriormente, beneficiando-se com a diferença entre o preço da aquisição e o de revenda.
Mas a valorização haverá de ser extraordinária e futura, pois deverá ocorrer após a execução das obras ou serviços pela Administração, devendo ser prevista pelo expropriante, de modo que a declaração de utilidade pública, além das áreas estritamente necessárias àquelas obras e serviços deverá abranger àquelas beneficiadas pela mais-valia. Sendo assim, quando do inicio das obras, as zonas previstas de valorização extraordinária já deverão ter sido declaradas de utilidade pública para futura desapropriação pelo Poder Público.
Vem a pergunta: Se a declaração de utilidade pública não fizer referência às áreas contiguas ou às de valorização extraordinária, fica o Poder Público impedido de desapropriá-las posteriormente? Ora, se a declaração de utilidade pública for omissa no tocante às áreas contíguas necessárias à complementação da obra e, concluída esta verificar a indispensabilidade de áreas adjacentes à referida complementação, nova declaração de utilidade pública poderá ser editada pela Administração, abrangendo as chamadas áreas contiguas.
E se a desapropriação for por zona e a declaração for omissa? Bem ensinou Miguel Seabra Fagundes (Da desapropriação no direito brasileiro, pág.. 106) desde que a declaração silencie sobre as zonas supervalorizadas, no ato declaratório, da área principal, estende-se que a Administração Pública achou inconveniente (razões de mérito administrativo), usar da faculdade que lhe outorgou a lei.
Tem-se a desapropriação para urbanização. Objetiva a desapropriação para urbanização a melhoria das cidades, alterando-lhes o traçado e as vias públicas, a fim de lhes dar maior facilidade de utilização, renovando bairros, que se revelam obsoletos, criando, se for o caso, núcleos industriais e de serviços, permitindo a revenda de áreas que sejam excedentes e desnecessárias ao Poder Público, bem como a alienação das áreas incluídas no perímetro em que vai se situar o núcleo industrial, cuja implantação tenha sido planejada pelo expropriante, com fins urbanísticos.
XIII - LICENÇA PARA CONSTRUÇÃO
A licença para construir é o ato administrativo pelo qual o Executivo, exercitando competência vinculada, libera a construção de determinada obra, por verificar e proclamar a consonância entre um projeto de construção e o direito de construir legalmente garantido.
Lúcia Valle Figueiredo CoIlarile (Disciplina urbanística da propriedade. Tese de doutoramento na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, edição restrita, 1979, p. 73), traz em abono desta assertiva, citando a lição de Italo di Lorenzo (Dirirto urbanístico.Torino, UTET, 1973, p. 581), de acordo com o qual, a licença edilícia remove, com eficácia real e não pessoal, um limite ao exercício de uma faculdade, visando a uma ou mais coisas, portanto introduz modificações jurídicas no âmbito de uma res e não já, apenas, com relação a um sujeito."
Hely Lopes Meirelles também esclarece este ponto, elucidando que"aderindo ao terreno. a licença para construir ou lotear transmite-se automaticamente aos sucessores com a só alienação do imóvel, não sendo lícito à Prefeitura opor-se à expedição ou transferência do alvará ao novo proprietário ou compromissário comprador (Direito de construir. 3. ed. refundida, Ed. Rev. dos Tribunais)
Sérgio de Andréia Ferreira, professor da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, professa lição em que sublinha os mesmos traços, ao dizer:"A primeira, a licença de caráter vinculado, envolve direito subjetivo oponível à própria Administração, a última, a autorização ou permissão, eminentemente discricionária, é precária e revogável"(Direito administrativo didático. 1978. p.252). O funcionamento das bancas de jornal, no solo das ruas, envolve permissão administrativa, discricionária, de cunho revogável, mas que comporta inclusive ações possessórias. A autorização de uso é eminentemente revogável e tem cunho de discricionariedade.
O Supremo Tribunal Federal, no R.E. 85 002-SP, em que foi relator o Ministro Moreira Alves, concluiu justamente pela impossibilidade de suprimir sic et simpliciter a licença antes concedida, negando mesmo que se pudesse fazê-lo com indenização a posteriori. A ementa do acórdão, embora mencione"revogaçãoemotivo de conveniência", está reportada a hipótese em que houve superveniência de lei. Seu teor é o seguinte:
"Licença de construção. Revogação. Fere direito adquirido a revogação de licença de construção por motivo de conveniência, quando a obra já foi iniciada. em tais casos não se atinge faculdade jurídica o denominado direito de construir que integra o conteúdo do direito de propriedade o direito de propriedade que o dono do solo adquiriu om relação ao que já foi construído, com base na autorização válida o Poder Público. Há, portanto, em tais hipóteses o direito adquirido, nos termos da súmula 473.Recurso extraordinário conhecido e provido"(RTJ, V. 79. p. 1.016 e seg.).
Licença para construir válida configura um verdadeiro direito adquirido.
Ademais, o Poder Público responde pelos danos patrimoniais causados pela anulação de licenças ilegitimamente concedidas,se o lesado não concorreu para a produção do vício. É indenizável o dano causado em decorrência de nivelamento da rua, quando as casas ficam em nível inferior ao leito carroçável.
XIV - LOTEAMENTO FECHADO
Estudiosos, como Luiz Fernando Janot (Em busca da cidadania esquecida, O Globo, dia 29.7.2017), alertam que "aproveitando-se do vácuo existente na segurança pública, difundiu-se a ideia de que a segurança privada poderia ser uma alternativa viável para suprir a ineficiência do poder público. Em paralelo, setores do mercado imobiliário adotaram os grandes condomínios residenciais fechados como paradigma para suas incorporações. No contraponto dessa tendência, a professora Beatriz Jaguaribe afirma que “a aceitação desses condomínios vem coroar uma atitude antiurbana que busca o refúgio do privado contra a incursão da urbe descontrolada”.
A Barra da Tijuca foi precursora deste tipo de moradia no Rio de Janeiro. Pelos idos dos anos 80, o urbanista Lucio Costa, preocupado com o desvirtuamento do seu plano-piloto para essa região, reagiu à obsessão dos incorporadores em adotar esse modelo de condomínio residencial. Considerava que eles seriam, no futuro, responsáveis pelo enfraquecimento das relações sociais nos espaços públicos."
Com o loteamento fechado acaba-se por buscar uma cidadania perdida. São uma espécie de loteamento que deve ser objeto de legislação federal própria. Tema de importância no direito urbanístico é o condomínio fechado. Observe-se que há conflitos urbanísticos evidentes, inclusive, no que concerne às vias internas que, muitas vezes, não correspondem ao da legislação municipal.
Sobre ele, destaco as ilustres opiniões arroladas abaixo.
Álvaro Pessoa (O loteamento e o condomínio no desenvolvimento urbano, In Boletim Informativo do Departamento de Assistência Jurídica e Consultiva dos Municípios, 1978) disse que "as questões que emergem da modalidade de expansão urbana denominada condominial são sobretudo as seguintes: ocorrência de praças e ruas particulares (não são logradouros públicos); possibilidade de bloquear o acesso ao condomínio aos comuns do povo, através de portão ou portaria dividindo solo público ou privado; e, por último, mas não menos importante, impedir a passagem para a praia através do imóvel particular de propriedade do condomínio".
Hely Lopes Meirelles (Loteamento Fechado, Revista de Direito Imobiliário nº 9 - janeiro-junho de 1982, São Paulo, RT.) ensinou:
"Os loteamentos especiais estão surgindo especialmente nos arredores das grandes cidades, visando descongestionar as metrópoles. Para esses loteamentos não há, ainda, legislação superior específica que oriente sua formação, mas nada impede que os Municípios editem normas urbanísticas adequadas a essas urbanizações. E tais são os denominados ‘loteamentos fechados’, ‘loteamentos integrados’, ‘loteamentos em condomínio’, com ingresso só permitido aos moradores e pessoas por eles autorizadas e com equipamentos e serviços urbanos próprios, para auto-suficiência da comunidade. Essas modalidades merecem prosperar. Todavia, impõem-se um regramento legal prévio para disciplinar o sistema de vias internas (que em tais casos são bens públicos de uso comum do povo) e os encargos de segurança, higiene e conservação das áreas comuns e dos equipamentos de uso coletivo dos moradores, que tanto podem ficar com a Prefeitura como com os dirigentes do núcleo, mediante convenção contratual e remuneração dos serviços por preço ou taxa, conforme o casos".
Para José Afonso da Silva (Direito Urbanístico Brasileiro, 1ª ed., São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 1981, pp. 400-402):
"A denominação de ‘loteamento fechado’ vem sendo atribuída a certa forma de divisão de gleba em lotes para edificação, que, embora materialmente se assemelhe ao loteamento, na verdade deste se distancia no seu regime como nos seus efeitos e resultados. Não se trata, por isso de instituto do parcelamento urbanístico do solo, ainda que possa ser considerado uma modalidade de urbanificação, porque se traduz num núcleo populacional de caráter urbano. Modalidade especial de aproveitamento do espaço, não pode o Direito Urbanístico desconhecê-la, a despeito de reger-se por critérios do Direito Privado entre nós, sob forma condominial.‘ Então o chamado ‘loteamento fechado’ constitui modalidade especial de aproveitamento condominial de espaço para fins de construção de casas residenciais térreas ou assobradadas ou edifícios. Caracteriza-se pela formação de lotes autônomos com áreas de utilização exclusiva de seus proprietários, confinando-se com outras de utilização comum dos condôminos. O terreno, assim ‘loteado’, não perde sua individualidade objetiva, conquanto sofra profunda transformação jurídica...‘O regime jurídico dessa modalidade de desenvolvimento urbano, como acabamos de indicar é o Direito Privado, com base no art. 8º da Lei 4.591/64, com natureza jurídica, como visto, de condomínio privado."
Ainda sobre o tema, preleciona Caio Mário da Silva Pereira, autor da Lei de Condomínios, que anota:
"Diversamente da propriedade horizontal típica, em que a cada unidade se vincula apenas a cota ideal do terreno e partes comuns, aqui existe uma unidade autônoma, uma parte de terreno edificado, uma parte de terreno reservado como de utilidade exclusiva para jardins ou quintal e ainda a fração ideal sobre o que constitui o condomínio. ‘Discriminar-se-ão, ainda, as áreas que se constituem em passagem comum para as vias públicas ou para as partes utilizadas entre si, ou os caminhos de acesso à praia, a ponte, a lugar aprazível"
O Registrador Imobiliário, Elvino Silva Filho, que foi, durante muitos anos, Oficial do 1º Cartório de Registro de Imóveis de Campinas, SP. tem por seguinte definição de loteamento fechado:
"O loteamento fechado consiste na subdivisão de uma gleba em lotes destinados a edificação ou formação de sítios de recreio, com abertura de novas vias de circulação, de logradouros públicos, devendo ser essa gleba cercada ou murada em todo o seu perímetro de modo a manter sob controle o acesso aos lotes.
Atente-se, antes de mais nada, a que o loteamento fechado é um loteamento comum, aprovado o projeto pela Prefeitura Municipal, consequentemente devendo ser registrado no Registro de Imóveis, em cumprimento aos requisitos previstos na Lei 6.766, de 19.12.79.
O adquirente do lote de terreno será proprietário de um imóvel perfeitamente individuado, numerado e localizado com as suas características e confrontações. Consequentemente, poderá edificar no lote adquirido e exercer todos os direitos compreendidos no direito de propriedade. Algumas restrições, porém, se impõem ao seu direito de propriedade, as quais ele deve, previamente conhecer e a elas se submeter, pela circunstância de adquirir um lote de terreno em um loteamento fechado.
Dessas restrições podemos destacar, desde logo, seu direito de acesso ao lote adquirido, o qual é controlado em uma portaria ou portão de ingresso ao loteamento, e também sua contribuição para a manutenção das vias de comunicação e logradouros constantes do loteamento. A grande questão quer surge no loteamento fechado está, exatamente, nas vias de circulação e nos logradouros públicos.
Dissemos acima que a Prefeitura Municipal, ao aprovar um projeto de loteamento fechado, deverá fazê-lo nos mesmos moldes, nos mesmos termos e com as mesmas exigências como o faz com um loteamento comum. Muito embora o loteamento fechado esteja localizado, na maioria das vezes, fora do perímetro urbano, destinando-se à formação de chácaras ou sítios de recreio, não se pode desprezar a circunstância de ele vir, algum dia, a integrar o perímetro urbano. A municipalidade ao aprová-lo, deverá localizá-lo dentro de seu plano de expansão urbanística, fornecendo as diretrizes para o uso do solo previsto no art. 6º da Lei 6.766/79."
Disse Celso Marini (Loteamentos fechados, Ius Navigandi) que:
"A permissão, ou a concessão de uso pela Prefeitura Municipal das vias e praças e espaços livres, nos loteamentos fechados, aos proprietários dos lotes, gera para eles a obrigação de mantê-los e conservá-los, além de outras obrigações decorrentes do uso em comum desses espaços livres, tais como coleta de lixo, rede elétrica e de iluminação, pavimentação, rede de água e esgotos, etc.
Outras obrigações ainda surgem pela própria circunstância de ser um loteamento fechado, tais como a manutenção de portaria, serviços de vigilância e segurança, rede telefônica de comunicação interna, etc. Esses serviços comuns aos proprietários dos lotes custam dinheiro e necessitam ser administrados e, consequentemente, regulamentados.
É nesse ponto - no regulamento da vida comunitária do uso das vias e espaços livres - que o loteamento fechado se assemelha ao condomínio, ensejando a expressão adotada nas leis municipais"administração das áreas comuns sob regime de condomínio". O regulamento do uso dessas vias e espaços livres assemelha-se, portanto, e muitíssimo, à convenção de condomínio prevista no artigo 9º da Lei 4.591, de 16.12.64.
O regulamento da vida comunitária do loteamento fechado é, assim, fundamental para a existência desse tipo de loteamento."
"Loteamento fechado" é uma criação da sociedade que não tem escopo em legislação federal, cabendo a União, quando for o caso, legislar sobre a matéria, matéria que deve ser enfocada em legislação federal própria, pois é matéria de direito civil, privativa da União, como é a de condomínios e incorporações que pode ser utilizada por analogia, nos casos permitidos
Poderá o Município, dentro da política urbanística que adote, revogar tal licença com relação ao espaço interno das vias, a bem da conveniência e da oportunidade administrativa? Poder-se-ia entender que tal não poderá ser feito, pois se está diante de direito adquirido à licença de obra. Seria caso de desapropriação, desde que nos limites da lei, com indenização devida, prévia e justa. Razões de conveniência não se opõem a direitos. Ademais o regime jurídico é de direito privado, não de direito administrativo.
XV – ZONA ESPECIAL DE TURISMO
Segundo a Lei nº. 6.513 (Capítulo I, Art. 1º):
“Consideram-se de interesse turístico as Áreas Especiais e os Locais instituídos na forma da presente Lei, assim como os bens de valor cultural e natural, protegidos por legislação específica, e especialmente:
I - Os bens de valor histórico, artístico, arqueológico ou pré-histórico;
II - as reservas e estações ecológicas;
III - as áreas destinadas à proteção dos recursos naturais renováveis;
IV - as manifestações culturais ou etnológicas e os locais onde ocorram;
V - as paisagens notáveis;
VI - as localidades e os acidentes naturais adequados ao repouso e a prática de atividades recreativas, desportivas ou de lazer;
VII - as fontes hidrominerais aproveitáveis;
VIII - as localidades que apresentam condições climáticas especiais;
IX - outros que venham a ser definidos, na forma desta lei.”
Mais adiante, a mesma Lei apresenta o conceito de “Áreas Especiais de Interesse Turístico” e os “Locais de Interesse Turístico”, colocando que (Lei nº. 6.513 Capítulo I):
“Artigo 3º - Áreas Especiais de Interesse Turístico são trechos contínuos do território nacional, inclusive suas águas territoriais, a serem preservadas e valorizadas no sentido cultural e natural, e realização de planos e projetos de desenvolvimento turístico.
Artigo 4º - Locais de Interesse Turístico são trechos do território nacional, compreendidos ou não em Áreas Especiais, destinados por sua adequação ao desenvolvimento de atividades turísticas, e à realização de projetos específicos, e que compreendam”
Áreas de especial interesse turístico são trechos contínuos do território nacional, inclusive suas águas territoriais, a serem preservados e valorizados no sentido cultural e natural e destinados à realização de planos e projetos de desenvolvimento turístico, artigo terceiro da Lei 6.513/77.
As áreas especiais de interesse turístico prioritárias são aquelas de alta potencialidade turística, que devem ou possam ser objeto de planos e programas de desenvolvimento do turismo, em virtude do próprio fluxo de turistas. Veja-se o artigo 4º daquela norma que disciplina a matéria:
Art. 4º - Locais de Interesse Turístico são trechos do território nacional, compreendidos ou não em Áreas especiais, destinados por sua adequação ao desenvolvimento de atividades turísticas, e à realização de projetos específicos, e que compreendam:
I - bens não sujeitos a regime específico de proteção;
Il - os respectivos entornos de proteção e ambientação.
§ 1º - Entorno de proteção é o espaço físico necessário ao acesso do público ao Local de Interesse Turístico e à sua conservação, manutenção e valorização.
§ 2º - Entorno de ambientação é o espaço físico necessário à harmonização do local de Interesse Turístico com a paisagem em que se situar.
Uma vez destinada a área, ou o local como de interesse turístico, incidem as restrições, quanto ao uso e a ocupação do solo e a preservação, do entorno dos imóveis indicados, da propriedade ou propriedades envolvidas, impondo aos proprietários, a responsabilidade de conservação, segurança e higiene dos bens.