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Controle judicial de políticas públicas na área da infância e juventude

Controle judicial de políticas públicas na área da infância e juventude

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O Brasil, após profunda evolução jurídica e política, possui, atualmente, um arcabouço legal suficiente para proteger as crianças e os adolescentes. O que falta é a tão desejada e aclamada efetivação dessas normas.

RESUMO: O presente estudo visa a investigar os principais desafios e os caminhos para a efetivação de políticas públicas na área da infância e juventude. Para tanto, expõe-se a evolução jurídica, política e ideológica pela qual passou o Estado brasileiro, desde a criação do Código de Menores de 1927 até o Estatuto da Criança e do Adolescente. Posteriormente, discute-se o controle judicial das políticas públicas, apresentando e rebatendo os principais óbices que teimam em afastar a atuação do poder judiciário na efetivação desses direitos fundamentais.

Palavras-chave: políticas públicas, controle judicial, infância e juventude.

SUMÁRIO: 1. Introdução. 2. Políticas Públicas para a infância e a juventude. 2.1 Doutrina da Situação Irregular. 2.2 Doutrina da Proteção Integral. 2.3 O Estatuto da Criança e do Adolescente. 2.3.1 Sistema de Garantias de Direitos. 2.2.3.1 Promoção 2.2.3.2 Defesa 2.2.3.3 Controle 3. Controle Judicial das Políticas Públicas. 3.1 Supremacia da Constituição. 3.2 Eficácia das normas constitucionais. 3.3 Óbices para o controle judicial de políticas públicas. 3.3.1 Separação dos Poderes 3.3.2 Reserva do Possível 3.3.3 Discricionariedade Administrativa 4. Conclusão.


1.INTRODUÇÃO

Em contraposição ao Estado Absolutista, surge, no séc. XVIII, a primeira face do Estado de Direito: o Estado Liberal. Sob a governança dos burgueses e os ideais iluministas, principalmente da Separação de Poderes, foi propagada a limitação do poder do Estado. O objetivo era resguardar a liberdade do indivíduo contra o arbítrio estatal. Essa época também deu origem ao constitucionalismo clássico, quando foram estabelecidas as primeiras Constituições, as quais tinham por intuito apenas regular a organização política do Estado e os direitos fundamentais de primeira dimensão.[1]

A abstenção total do Estado, a igualdade meramente formal e o excesso de liberdade acabaram por gerar desigualdades sociais. Assim, os burgueses, que tanto se sentiram oprimidos em tempos de Absolutismo, oprimiram impiedosamente a grande massa, legitimados pelo arcabouço jurídico da época.

Profundas mudanças surgiram com o advento do Estado Social, solução encontrada para impedir o avanço das idéias socialistas e acalmar os movimentos sociais. Nessa nova fase do Estado de Direito, reivindicou-se a interferência do Estado no mercado, a consagração do princípio da igualdade material e a busca pela justiça social.   

Nesse contexto, exigiu-se do Estado uma atuação positiva em favor dos grupos sociais que se encontravam à margem da sociedade. Dessa maneira, aparecem os direitos fundamentais de segunda dimensão – sociais, culturais e econômicos -, que, pautados em um ideal de igualdade material, adquirem foros constitucionais, principalmente, no Pós-Segunda Guerra Mundial. Portanto, o Estado Social almejou compatibilizar o sistema capitalismo com a prestação do bem-estar social, elemento do chamado welfare state, justificando a implantação de políticas públicas.

Na segunda metade do século XX, eclode um novo modelo de Estado, o chamado Estado Democrático de Direito, com a finalidade de materializar a igualdade, a justiça social, por meio de uma efetiva participação popular. Ganha destaque a solidariedade, exigindo-se, pois, uma participação coletiva na efetivação, tanto dos direitos de primeira e segunda dimensão, quanto nos de terceira dimensão, que buscam preservar o direito à paz, à autodeterminação dos povos, ao desenvolvimento, ao meio ambiente livre, sadio e equilibrado, à conservação do patrimônio histórico, cultural e paisagístico.      

Nesse Estado Constitucional, envolto pelas teses do neoconstitucionalismo, o qual prega a força normativa da Constituição e a máxima efetividade das normas jurídicas, a função primordial da Administração Pública é a concretização dos direitos fundamentais positivos, por meio de políticas públicas que façam valer as regras e os princípios dispostos na Constituição.

A Constituição brasileira de 1988 determinou no caput do art. 6º que são direitos sociais, além de outros, a proteção à infância, determinando, no art. 5º, §1º, a aplicação imediata dos direitos fundamentais. Dessa maneira, impõe a tarefa aos órgãos estatais de maximizar a eficácia dos direitos da criança e do adolescente e criar condições reais de concretização.

As políticas públicas são instrumentos de materialização desses direitos fundamentais, visto que, pautando-se na essencialidade dos bens jurídicos a serem resguardados, compreendem um conjunto de medidas de natureza governamental que visam a realizar os fins sociais estabelecidos na Constituição. Dessa forma, o presente estudo visa a investigar os principais desafios e os caminhos para a efetivação de políticas públicas na área da infância e juventude.


2.POLÍTICAS PÚBLICAS PARA A INFÂNCIA E A JUVENTUDE

A defesa dos direitos das crianças e dos adolescentes possui duas peculiaridades: forte potencial mobilizador, capaz de articular diversas tendências políticas, religiosas, culturais e intelectuais, atraindo uma militância que não irá se favorecer diretamente com essa política, bem como pressupõe um conjunto de ações que atravessam diversas políticas setoriais.[2]

 Entretanto, analisando a história brasileira e a evolução legislativa, somente a partir dos anos 80 a sociedade começou a exigir transformações nessa seara. Antes, verifica-se uma evidente segregação das políticas para esse segmento. As ações públicas eram ora voltadas aos “menores” – infância pobre, potencialmente perigosa -, ora às “crianças” – oriundas das classes média e alta. Portanto, a gestão das ações sociais, por um longo período, foi marcada pela exclusão da parcela que mais precisava de assistência.[3]

Nesse contexto, para se compreender a situação da infância e adolescência na atualidade, e seu processo de ruptura com o caráter historicamente periférico, é preciso fazer referência à evolução política e legal do país, bem como ao papel do conjunto dos protagonistas vinculados à luta pelas garantias dos direitos a esse grupo social.

2.1 DOUTRINA DA SITUAÇÃO IRREGULAR

No Brasil, a positivação da temática da infância e da juventude foi concretizada com o Código de Menores de 1927, considerado o primeiro diploma legal de proteção às crianças e aos adolescentes da América Latina, o qual, longe de criar um arcabouço de direitos e garantias aos menores de todas as classes sociais, visou, unicamente, estabelecer diretrizes à infância e à juventude excluídas, no intuito de afastá-las da delinqüência.

Os Juízes de Menores, à época, receberam poderes legais para adotar ações civis, trabalhistas, penais, tutelares e assistenciais nas causas envolvendo crianças e adolescentes. Na verdade, “o juiz dos menores centralizava as funções jurisdicional e administrativa, muitas vezes dando forma e estruturando a rede de atendimento. Enquanto era certa a competência da Vara de Menores, pairava indefinições sobre os limites da atuação do Juiz”[4].

A intervenção do Poder Executivo somente veio a ocorrer em 1938, quando foram criadas diversas entidades federais que tinham o objetivo de realizar ações na seara da infância e juventude, buscando a ordem social pregada pelo então Estado Novo. Dentre elas, destaca-se o Serviço de Assistência ao Menor (SAM), criado pelo Decreto-Lei 3.799/41, o qual, ligado ao Ministério da Justiça, possuía as finalidades de sistematizar e orientar os serviços de assistência a menores, ressocializar os jovens infratores, realizar pesquisas na área da infância e juventude, dentre outros. Entretanto, o SAM logo ficou conhecido pelas atrocidades cometidas contra os menores, através de ações correcionais e repressivas que esbanjavam maus-tratos.

Na década de 60, o SAM foi banido para dar lugar a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor (FUNABEM). Instaurada pelo governo militar, através da Lei 4.513/64, a FUNABEM ficou com a função de definir e implementar a Política Nacional do Bem-Estar do menor. A nível estadual, e totalmente dependentes da seara federal, foram criadas as Fundações Estaduais de Bem-Estar dos Menores (FEBEMs). Essa política, que buscava assegurar programas de integração ao menor carente, por meio de assistência à família, caracterizou-se pela sua centralização decisória, verticalização hierárquica e privilégio do conhecimento altamente especializado, excluindo a participação decisória dos estados, dos municípios e da sociedade civil.[5]

Nos anos 70, tendo em vista o aumento das desigualdades sociais, foi verificado um índice altíssimo de crianças e adolescentes nas ruas, levando, no ano de 1976, à instauração de uma Comissão Parlamentar de Inquérito do Menor na Câmara dos Deputados. Após o diagnóstico deplorável da situação de menor no país, e em meio às pressões da sociedade civil, foi publicado o Código de Menores de 1979. Esse, devido a questões internas – ditadura e Política Nacional do Bem-Estar dos Menores ineficaz – e externas – internacionalmente difundia-se a doutrina da proteção integral da criança -, já surgiu defasado, tendo em vista que insistiu na doutrina da situação irregular, advinda do Código de 1927.

A reviravolta no trata da matéria ocorreu nos anos 80. O contexto político da época, com a luta pela redemocratização do país e o fortalecimento da sociedade civil, não mais poderia suportar a política social do Estado Militar.

A articulação da sociedade em torno do tema da infância e juventude deu origem à Frente Nacional de Defesa dos Direitos das Crianças e Adolescentes, à Pastoral do Menor da CNBB, ao Movimento Nacional de Meninos e Meninas de Rua, à Comissão Nacional Criança e Constituinte e, finalmente, ao Fórum Nacional Permanente de Entidades Não-Governamentais de Defesa dos Direitos da Criança e do Adolescente – Fórum DCA. Esse Movimento Pré-Constituinte formulou as emendas “Criança e Constituinte” e “Criança-Prioridade Nacional”, que foram encaminhadas à Assembléia Nacional Constituinte, acompanhadas das assinaturas de 200.000 adultos e mais de 1.400.000 crianças e adolescentes.[6]

Portanto, somente com a Constituição Federal de 1988[7], construída através de um processo de mobilização social e restabelecimento da democracia, afasta-se a doutrina da situação irregular e adota-se a doutrina internacional de proteção integral às crianças e aos adolescentes.

2.2 DOUTRINA DA PROTEÇÃO INTEGRAL

A Teoria da Proteção Integral da Criança afirma que os menores possuem os mesmos direitos dos adultos; contudo, devido à sua condição de hipossuficiência e vulnerabilidade, fazem jus a uma proteção especial e prioritária.

Essa teoria ganha força e plena aceitação com a aprovação da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança, pela Assembléia Geral das Nações Unidas em 20 de novembro de 1989. Com fundamento na doutrina internacional de proteção integral às crianças e aos adolescentes, afastou-se o caráter assistencialista anteriormente seguido e buscou-se, na elaboração da Constituição Federal de 1988, priorizar a educação em face do trabalho.

Na verdade, a partir da Constituição da República de 1988, há um reconhecimento da criança e do adolescente como cidadãos, ou seja, titulares de direitos fundamentais, rompendo-se, efetivamente, com a visão minimalista do menor como objeto, abarcada pelo revogado Código de Menores. 

O artigo 227, da Carta Magna de 1988, dispõe in verbis:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (...)

Infere-se, pois, que a Carta Maior aclara os princípios protetores dos menores, construindo o direito fundamental da criança e do adolescente ao não trabalho e à integridade física, reconhecendo, definitivamente, o direito à preservação da dignidade humana dos menores e a posição especial que os mesmos se encontram no processo de desenvolvimento humano. Conforme assevera Paolo Vercelone[8]:

Reconhece-se formalmente que existe uma categoria de cidadãos – as crianças – que têm seus próprios interesses específicos, os quais nem sempre coincidem – e às vezes contrastam – com os dos adultos. Esta categoria não pode proteger-se por si mesma, não tem força contratual dentro da sociedade, não vota e não protesta. Por conseguinte, os adultos responsáveis – não só os pais, mas também, e sobretudo, aqueles que tomam decisões coletivas que envolvem milhões de crianças (administradores, políticos e aqueles que detêm o poder econômico) – são investidos da responsabilidade de exercitar os direitos fundamentais das crianças em seu lugar.  

O reconhecimento efetivo desses direitos é corroborado com o surgimento da Lei 8.069/1990, o famoso Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o qual nasce em um contexto histórico em que o Brasil, internacionalmente, ratificou a Convenção sobre os Direitos da Criança[9] e, nacionalmente, promulgou a Constituição Democrática de 1988. Portanto, revogou-se o Código de Menores e a Política Nacional de Bem-Estar do Menor.

2.3.O ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE

A Lei 8.069/90, o Estatuto da Criança e do Adolescente, reconhece como base doutrinária, em seu art. 1º, a proteção integral à criança e ao adolescente, bem como estabelece os instrumentos adequados à concretização desses direitos dentro da realidade brasileira.[10]

Para o Estatuto da Criança e do Adolescente considera-se criança a pessoa até doze anos de idade incompletos e adolescente aquela entre doze e dezoito anos de idade. Ressalta-se que o Estatuto buscou eliminar a palavra “menor”, a qual, utilizada pelo antigo Código de Menores, representava crianças e adolescentes oriundos da camada mais excluída da sociedade. Assim, a substituição semântica é uma atitude política de não-discriminação e transformação.

Dessa forma, o Estado brasileiro não pode se eximir, seja por uma legislação internacional acolhida internamente, seja pelos próprios ditames constitucionais, de assistir esses sujeitos de direitos que se encontram em situação de desproteção. Na seara do direito interno, o art. 4º, do ECA, na mesma linha do art. 227, da Constituição Federal, assim prescreve:

Art. 4º É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Parágrafo único. A garantia de prioridade compreende:

a) primazia de receber proteção e socorro em quaisquer circunstâncias;

b) precedência de atendimento nos serviços públicos ou de relevância pública;

c) preferência na formulação e na execução das políticas sociais públicas;

d) destinação privilegiada de recursos públicos nas áreas relacionadas com a proteção à infância e à juventude (grifo nosso).

Portanto, firmou-se como prioridade do Estado a formulação e efetivação de políticas públicas voltadas às crianças e aos adolescentes.

Ressalta-se que, a partir dos anos 80, ocorreram mudanças históricas após crise do Estado de Bem-Estar pós-bélico, tendo em vista a incompatibilidade da estrutura do Estado com a ordem socioeconômica emergente - o neoliberalismo. Passou-se a exigir do Estado menos ingerência, transferindo, pois, à sociedade responsabilidades antes pertencentes ao poder público. Surge, pois, o conceito de sociedade providência ou de bem-estar (em oposição ao conceito de Estado Providência, Estado Social ou de Bem-Estar) pelos teóricos do pluralismo de bem-estar. Para esses, as providências sociais devem ser realizadas de forma combinada entre fontes básicas: o Estado, o mercado e a sociedade. Assim, a sociedade também passou a ser responsabilizada pelo destino da comunidade, cabendo-lhe também realizar serviços, os quais antes eram somente dever do Estado.[11]

2.3.1        Sistema de Garantia de Direitos

Com o advento do Estatuto da Criança e do Adolescente, desenvolveu-se um Sistema de Garantia de Direitos[12] que, através de um conjunto articulado de ações governamentais e não-governamentais, apóia-se em três eixos - promoção, defesa e controle - para efetivar os direitos fundamentais da infância e juventude.

2.3.1.1 Promoção

O eixo da Promoção é consagrado no art. 87 do ECA[13], o qual, além de determinar políticas universais de atendimento às necessidades básicas das crianças e adolescentes, enfatiza a importância de programas assistenciais de proteção especial à parcela infanto-juvenil em risco social. Dentre esses últimos, destacam-se o Programa de Erradicação do Trabalho Infantil – PETI, que visa a eliminar o labor de crianças e adolescentes abaixo de 16 anos; o Programa Sentinela, atualmente designado CREAS, o qual busca combater a exploração e o abuso sexual de meninos e meninas. Ambos foram criados pelo governo federal e buscam atingir uma parcela vulnerável da população.

Como estratégias para a funcionalidade e eficiência das políticas de atendimento, foram determinadas: a municipalização das políticas; a instauração de conselhos municipais, estaduais e nacional dos direitos da criança e do adolescente, órgãos deliberativos e controladores das ações em todos os níveis, sendo assegurada a participação popular paritária; a criação e manutenção de programas específicos; manutenção de fundos nacional, estaduais e municipais vinculados aos respectivos conselhos dos direitos da criança e do adolescente; relação entre os órgãos do Judiciário, Ministério Público, Defensoria, Segurança Pública e Assistência Social, para fins de celeridade no atendimento inicial a adolescente a quem se atribua autoria de ato infracional, mobilização da opinião pública no sentido da indispensável participação dos diversos segmentos da sociedade[14].

Destaca-se nesse ponto a questão da municipalização que, segundo Luís de La Mora, “supera o conceito tradicional de ‘prefeiturização’. Ela aproxima o processo decisório do nível da execução, de tal maneira que em cada localidade sejam criados e mantidos programas em função de suas peculiaridades, garantindo o controle social da qualidade das decisões tomadas e das ações executadas”[15].

 Sendo assim, a redemocratização do Estado brasileiro deu origem a redesenho do seu sistema federativo, o qual investe na descentralização, a fim de fortalecer a capacidade decisória dos estados e municípios, superando a trajetória histórica das políticas públicas brasileiras, que, desde 1930, tiveram uma gestão centralizada pelo governo federal. Além disso, a municipalização é uma estratégia que permite a participação popular na fiscalização das políticas públicas.

2.3.1.2 Defesa

Já o eixo de Defesa objetiva a “responsabilização do Estado, da sociedade e da família, pelo não-atendimento, atendimento irregular ou violação dos direitos individuais ou coletivos das crianças e dos adolescentes”[16].

Dessa maneira, organismos públicos e/ou sociedade civil – Ministério Público, Poder Judiciário, Defensoria Pública, Conselhos Tutelares, associações legalmente constituídas, dentre outros - tornam-se legitimados a assegurarem os direitos da criança e adolescente, seja por meio de ações judiciais, seja através de procedimentos administrativos, seja pela mobilização social.

Dos organismos referidos, enfatiza-se o papel do Ministério Público, o qual, a partir da Constituição de 88, abandonou sua atuação eminentemente “parecerista”, para atuar também como órgão agente, desvinculado dos demais poderes do Estado, cabendo “promover o inquérito civil e a ação civil pública, para a proteção do patrimônio público e social, do meio ambiente e de outros interesses difusos e coletivos”. (Artigo 129, Inciso III, CF/88).

O próprio ECA determina que compete ao Ministério Público promover o inquérito civil e a ação pública para a proteção  dos interesses individuais, difusos, coletivos relativos à infância e à adolescência (art. 201, V), elencando como matéria dessas ações, dentre outras, o não oferecimento ou oferecimento irregular de serviço de assistência social visando à proteção à família, à maternidade, à infância e à adolescência, bem como ao amparo às crianças e aos adolescentes que dele necessitam (art. 208, VI).

Dessa maneira, as ações civis públicas são um relevante instrumento de implementação dos direitos fundamentais da infância e juventude.

2.3.1.3  Controle Social

O último eixo, Controle Social, tem o intuito de fiscalizar o cumprimento dos preceitos legais, através da vigilância de organismos governamentais e não governamentais. Conforme Maurílio Matos e Alessandra Mendes[17]:

Controle social se refere à participação da sociedade civil na elaboração, implementação e fiscalização das políticas públicas, em que se compreende que o público deve ser uma expressão do conjunto das necessidades postas pelos diferentes segmentos da sociedade e não território apenas daqueles que, por diferentes motivos, alcançam a hegemonia em determinados governos.

Antes, com influência do Estado Moderno, a expressão controle social foi entendida como controle do Estado ou dos empresários sobre a população. Atualmente, está ligada à forma de participação da população na elaboração e fiscalização das políticas públicas.

Rodriane Souza assevera que “a participação pode ser entendida como processo social, no qual o homem se descobre enquanto sujeito político, capaz de estabelecer uma relação direta com os desafios sociais”[18].

Dessa maneira, esclarece a autora que, no Brasil, nas décadas de 50 e 60, houve uma participação comunitária, a qual era compreendida como a sociedade completando o Estado, havendo um incentivo, por parte deste, do voluntariado e da solidariedade. No contexto de 1970, desenvolveu-se uma participação popular, que significa a luta e a contestação da população ao regime opressor da época; a população passa a combater o Estado. Já nos anos 80, instaura-se a participação social, quando a sociedade, buscando efetivar os direitos sociais, passa a disputar o poder do Estado, adentrando no aparelho estatal.[19]

Os Conselhos Tutelares, inovação do Estatuto da Criança e do Adolescente, são exemplos dessa última participação, haja vista que os próprios representantes da comunidade são responsáveis por discutir, elaborar e fiscalizar a política social em cada esfera do governo[20].


3. CONTROLE JUDICIAL DAS POLÍTICAS PÚBLICAS

Expõe-se que a participação social é um importante instrumento de fiscalização da atividade executiva. Entretanto, não é o único. Infere-se que, por influência da doutrina do neoconstitucionalismo, tem ocorrido uma ampliação do controle do Poder Judiciária para a efetivação das políticas públicas, chamada de “judicialização da política”.

O fundamento da judicialização da política reside, assim, no primado da supremacia da Constituição. Exige-se, pois, do administrador que adapte as opções públicas aos objetivos e princípios estabelecidos na Constituição, sendo controláveis as omissões e ações irregulares do poder público[21].

3.1 SUPREMACIA DA CONSTITUIÇÃO

A tradição positivista, fazendo nítida separação entre direito e moral, utiliza, consoante afirma Castanheira Neves, o seguinte método jurídico: “o legislador cria o direito positivo, o jurista com seu pensamente exclusivamente jurídico conhece-o na sua estrutura lógico-dogmática e aplica-o lógico-formalmente ou lógico-dedutivamente”.[22]

Essa concepção jurídico-formalista ainda ronda a doutrina e a jurisprudência brasileiras, contribuindo para a percepção de que não cabe o controle das políticas públicas pelo Judiciário.

Entretanto, a partir da Constituição de 1988, sob influência das idéias neoconstitucionalistas desenvolvidas após a Segunda Guerra Mundial, instauram-se três idéias fundamentais acerca da aplicação do direito: a supremacia da Constituição, a expansão da jurisdição constitucional e o desenvolvimento de uma nova hermenêutica jurídica[23].

Sobre o primeiro ponto, tem-se que as constituições atuais possuem um forte caráter normativo, expressando um conteúdo material de valores e opções políticas que deve ser exercido pelo poderes. Segundo Konrad Hesse “a Constituição converter-se-á em força ativa se fizerem-se presentes, na consciência geral – particularmente, na consciência dos principais responsáveis pela ordem constitucional -, não só a vontade de poder (Wille zur Macht), mas também a vontade de Constituição (Wille zur Verfassung)”.[24] Significando essa “vontade de Constituição” nada mais do que a vontade de concretização da ordem constitucional.

Dessa maneira, o que se extrai da normativa constitucional não é uma “promessa vã, uma promessa inútil”. É uma resposta normativa à realidade que queremos mudar.[25]

No meio acadêmico, duas correntes – procedimentalista e substancialista - vêm debatendo acerca do papel das Constituições e, conseqüentemente, da maior ou menor possibilidade de controle judicial das políticas públicas.

          A concepção procedimentalista, encabeçada por Habermas, em suma, pressupõe que a Constituição não é uma ordem prévia de valores a serem desvendados pelos juristas, mas sim é um espaço que deve instrumentalizar os meios de participação dos cidadãos, a fim de estes elaborem o destino da comunidade.[26]

          A corrente substancialista, por sua vez, defendida no Brasil por Lênio Streck, compreende que a Constituição traz os valores e as políticas que irão reger a convivência da sociedade, destarte, resta ao Judiciário a função de assegurar a implementação dos dispositivos constitucionais.

Percebe-se, pois, que, pela via substancialista, há uma maior aceitação da atividade judiciária no controle de políticas públicas. Ao realizar o juízo de constitucionalidade de políticas públicas, o Judiciário acaba por garantir a prevalência da Constituição.

Nesse sentido, a Constituição brasileira de 1988, coerente com as linhas do constitucionalismo contemporâneo, não é um simples instrumento de governo que define competências e organiza processos, mas sim um plano normativo global que pronuncia metas, fins e programas a serem concretizados pelo Estado e pela Sociedade.[27]

3.2 EFICÁCIA DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS

Na seara dos direitos fundamentais, a questão da efetividade vem ganhando extrema importância. Ingo Sarlet aduz que há um enorme “desafio de outorgar à ordem constitucional e, de modo, especial, aos direitos fundamentais nela consagrados sua plena operatividade e eficácia, como condição para sua efetividade”.[28]

José Afonso da Silva ainda é um dos juristas brasileiros mais citados, quando o tema é eficácia. Pare ele, eficácia jurídica “diz respeito à aplicabilidade, exigibilidade ou executoriedade da norma, como possibilidade de sua aplicação jurídica”[29] e a eficácia social da norma refere-se à sua efetividade no plano social. Dessa forma, analisar a efetividade de uma norma significaria medir a extensão em que seu objeto é alcançado, relacionando-se ao produto final.

Aferir, portanto, a efetividade das normas jurídicas, está intimamente relacionada com a aferição da realização do próprio Direito, isto é, a coincidência das prescrições das regras jurídicas com a efetiva subordinação dos fatos a elas. Quanto mais se observa essa efetivação no plano social, mais o Direito cumpre seu intuito.

O jurista Paulo Bonavides, analisando a questão da efetividade das normas constitucionais, entende que um dos maiores problemas do Direito Constitucional da nossa época está “em como juridicizar o Estado Social, como estabelecer e inaugurar novas técnicas e institutos processuais para garantir os direitos sociais básicos, a fim de fazê-los efetivos"[30].

Em relação à eficácia jurídica, tem-se que, com a introdução do art. 5º, §1º, na Constituição Federal, todas as normas que veiculam direitos fundamentais possuem aplicabilidade imediata e devem ser observadas pelos aplicadores do Direito, sob pena de haver mandados de injunção e ações de inconstitucionalidade por omissão intentados.

Há de se ressaltar que o ordenamento jurídico brasileiro não faz diferenças entre o regime dos direitos sociais e dos direitos individuais, como acontece, por exemplo, na Constituição Portuguesa[31]. Portanto, o dispositivo acima referido tem igual alcance para os direitos prestacionais e para os direitos de defesa.[32]

Portanto, caso o executivo não cumpra as determinações constitucionais, cabe ao Judiciário, por meio principalmente das ações coletivas, interferir na vida política e administrativa para realização social dos Direitos Fundamentais.

O próprio Supremo Tribunal Federal julgou recentes ações no sentido de efetivação dos direitos fundamentais, principalmente dos direitos sociais. Veja-se parte da ementa da decisão que julgou improcedente recurso extraordinário interposto pelo Município de Santo André, mantendo o pleito do Ministério Público Estadual de São Paulo para a construção de creches e pré-escolas:

E M E N T A: RECURSO EXTRAORDINÁRIO - CRIANÇA DE ATÉ SEIS ANOS DE IDADE - ATENDIMENTO EM CRECHE E EM PRÉ-ESCOLA - EDUCAÇÃO INFANTIL - DIREITO ASSEGURADO PELO PRÓPRIO TEXTO CONSTITUCIONAL (CF, ART. 208, IV) - COMPREENSÃO GLOBAL DO DIREITO CONSTITUCIONAL À EDUCAÇÃO - DEVER JURÍDICO CUJA EXECUÇÃO SE IMPÕE AO PODER PÚBLICO, NOTADAMENTE AO MUNICÍPIO (CF, ART. 211, § 2º) - RECURSO IMPROVIDO. (STF. Segunda Turma. RE-AgR 410715/SP. Relator Min. Celso de Mello. DJ 03-02-2006).

3.3 ÓBICES PARA O CONTROLE JUDICIAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS

Embora haja precedentes jurisprudenciais sobre o tema, o assunto ainda é bastante controvertido. Diversos óbices são apresentados para impedir a cobrança pelo Poder Judiciário de políticas públicas que sejam capazes de concretizar os direitos fundamentais pelo Poder Executivo.

3.3.1 Separação dos Poderes

O primeiro óbice apontado assevera que a interferência do Poder Judiciário na execução de política públicas ofenderia o Princípio da Separação dos Poderes. Não prospera tal assertiva, haja vista a necessidade de readaptação do referido princípio ao contexto atual.

O princípio da separação dos poderes, como hoje se estrutura, foi sistematizado pelo filósofo Montesquieu no séc. XVII, embora este tenha se inspirado no inglês John Locke. O objetivo do filósofo francês, em meio à difusão iluminista, foi organizar o poder em órgãos distintos, como funções diferentes, a fim de limitá-lo e preservar a liberdade dos indivíduos. Dessa forma, para evitar as arbitrariedades cometidas no Estado Absolutista, foi instituída essa divisão rígida: o Legislativo cria as Leis (maior relevância), o Executivo as põe em prática e o Judiciário as aplica.[33]

O modelo clássico apresentado por Montesquieu serviu à época do Estado Liberal; no atual Estado Constitucional, quando se reivindica efetivação das normas constitucionais, a ingerência do Poder Judiciário deve ocorrer nos casos em que os demais poderes não atuem ou atuem de forma insuficiente no cumprimento de suas funções típicas. Note-se que não se trata de uma intervenção desmedida, mas sim coerente com a própria Constituição, a qual, além de vincular seus Poderes aos seus preceitos, requer a harmonia e colaboração entre eles.

Um pensamento renovado acerca do Princípio da Separação dos Poderes deve deixar de pressupor, como aduz Nuno Piçarra, “uma classificação material das funções estaduais, aspirando a uma validade científica universal e intemporal”, tendo em vista que a busca pela efetivação dos direito fundamentais exige “a solidariedade activa de todos os órgãos de produção e aplicação do Direito, vinculados que estão aos mesmos objectivos (...)”[34].

 Por isso, mostra-se necessária uma ampliação do juízo de constitucionalidade das leis e dos atos do Poder Público para alcançar as políticas públicas.

3.3.2 Reserva do Possível

A alegação da “reserva do possível”, teoria advinda da Alemanha, determina que a efetivação dos direitos sociais está condicionada à suficiência dos recursos econômicos.[35] Dessa forma, entes estatais usam e abusam dos argumentos da “falta de dinheiro”.

Essas argüições também devem ser refutadas. Os instrumentos jurídicos alienígenas, que fazem sucesso no seu ordenamento jurídico pátrio, como é o caso da reserva do possível, não podem ingressar no ordenamento jurídico brasileiro, sem que haja uma devida avaliação, adaptação e moldura às peculiaridades nacionais[36]. Caso assim não seja possível, devem ser descartados, pois se não forem pelos legisladores, juristas ou administradores, serão pela sociedade.

Para lograr o objetivo constitucional de reduzir as desigualdades sociais e promover o bem de todos (art. 3º, CF), o Estado deve disponibilizar gastos públicos consideráveis e previsões orçamentárias para a efetivação dos direitos fundamentais. Assim não fazendo,   deve-se forçar o Estado a cumprir a lei orçamentária ou a contemplar no orçamento dotações específicas e necessárias para tal finalidade, de forma que sejam realizados os direitos sociais. Ademais, é preciso acabar com a idéia de que o orçamento é um instrumento autorizativo, e expandir a compreensão que o orçamento é lei, portanto, deve ser respeitada[37].

Frise-se que o Ministro Celso de Mello, em decisão na ADPF nº 45-DJ 04/05/2004, afirmou que:

A cláusula da ‘reserva do possível’, ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível, não pode ser invocada pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade.

Robert Alexy[38] afirma que no confronto entre dois princípios de direitos fundamentais, a solução se dará por meio da ponderação, que faz parte do princípio da proporcionalidade. Deve-se seguir, então, três passos para alcançar a racionalidade: o primeiro analisa o grau de não-cumprimento ou prejuízo de um princípio, o segundo verifica o cumprimento do princípio em sentido contrário, por fim, compara-se se o cumprimento do princípio em sentido contrário justifica o não-cumprimento ou prejuízo do outro.

Desenvolvendo essas regras metodológicas, tem-se que se de um lado há a necessidade de elaboração de políticas públicas para afastar crianças e adolescentes da prostituição infantil (Princípio da Proteção Absoluta) e se de outro lado as verbas disponíveis estão destinadas exclusivamente ao pagamento de dívida pública externa, entende-se que uma decisão racional, com pretensão de correção, haveria de considerar maior intensidade à proteção daquelas crianças, em face de uma responsabilidade contratual. Dessa forma, o argumento da reserva do possível não pode subsistir em prejuízo da dignidade da pessoa humana.

3.3.3 Discricionariedade Administrativa

Utiliza-se ainda, para evitar a efetivação de políticas públicas, o argumento da discricionariedade administrativa, ou seja, caberia ao Poder Executivo deliberar onde investiria os recursos disponíveis, não cabendo, pois, ao Judiciário interferir no mérito da escolha. 

Pela tradicional doutrina de Hely Lopes Meireles, os atos administrativos podem ser classificados quanto o grau de liberdade dos administradores em: vinculado ou discricionário. O primeiro determina que o administrador deve ficar adstrito ao enunciado da lei, o qual estabelece um único comportamento possível a ser seguido em situações concretas; já o  segundo garante ao administrador uma liberdade de escolha, podendo realizar um juízo de conveniência e oportunidade, conhecido como mérito administrativo[39]. Conforme esse pensamento, o Poder Judiciário poderia rever o ato discricionário sob o aspecto da legalidade, mas não poderia examinar o mérito do ato administrativo.

No entanto, essa distinção, embora bem aceita nos tribunais brasileiros, há de ser questionada. Segundo Andreas Krell[40], não há uma diferenciação qualitativa entre o ato vinculado e o ato discricionário, o que há é uma oscilação da intensidade vinculatória ou discricionária, de acordo com o grau da densidade mandamental das expressões contidas nos dispositivos jurídicos.

Com as idéias neoconstitucionalistas, os princípios ganham importância, direcionando a interpretação do ordenamento jurídico e limitando os atos estatais[41]. Dessa maneira, em regra, realmente o Poder Judiciário não pode intervir na conveniência e oportunidade de outro Poder; contudo, havendo violação de dispositivo constitucional, pode e deve intervir.

Dessa maneira, decisões políticas contrárias aos preceitos constitucionais ou atitudes omissas perante as determinações fundamentais da Constituição devem ser combatidas, haja vista que, nesses casos, a margem de discricionariedade diminui, dando lugar a uma obrigatoriedade de prestação.  


4.CONCLUSÃO

Ao analisar a temática das políticas públicas na área da infância e juventude, observa-se que o Brasil, após profunda evolução jurídica e política, possui, atualmente, um arcabouço legal suficiente para proteger as crianças e os adolescentes. O que falta, embora não seja uma novidade esta assertiva, é a tão desejada e aclamada efetivação dessas normas.

Infere-se que aceitar o papel do Poder Judiciário no controle de políticas públicas é essencial para garantir a máxima eficácia social dos direitos das crianças e dos adolescentes, bem como estimular os governantes à realização dos fins constitucionais.

A coercibilidade judicial é uma grande arma que a sociedade tem em mãos para assegurar a observância dos direitos fundamentais. Entretanto, ela somente ganha força com a coercibilidade social, isto é, a mobilização e a participação das comunidades organizadas, a fim de requerer das autoridades públicas ações positivas.

É preciso, além de se reivindicar a realização dos direitos fundamentais, exigir políticas sociais eficientes, capazes de serem preventivas, retributivas, geradoras de oportunidade e emancipatórias.[42]

Contudo, tem-se que a falta de integração entre os entes federativos, o enfoque predominante em políticas macroeconômicas de desenvolvimento em face das políticas sociais, a impregnação de práticas assistencialistas, as dificuldades em se promover a descentralização, a descontinuidade dos programas e a falta de planejamento são alguns empecilhos à funcionalidade dos projetos.

Portanto, o Estado brasileiro possui um grande desafio em torno, não só das questões referentes às crianças, mas a todo o sistema que o rodeia. Entretanto, o projeto de sociedade já está consolidado desde a promulgação da Constituição de 1988. Assim, o que se espera do Poder Executivo é que o ponha em prática, que o Poder Legislativo elabore projetos de lei coerentes com a realidade social e as diretrizes constitucionais e que o Poder Judiciário faça valer a aplicação das prescrições legais.  O pedido é simples; o pôr em prática, no Brasil, é sempre mais complexo.


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Notas

[1] A primeira dimensão corresponde aos direitos individuais, civis e políticos, impondo ao Estado uma abstenção de interferência da esfera privada dos cidadãos.

[2] MARTINS, Aline de Carvalho. Conselhos de direitos: democracia e participação popular. In: SALES, Mione Apolinário; MATOS, Maurílio Castro; LEAL, Maria Cristina (Org.). Política social, família e juventude: uma questão de direitos, 2 ed. São Paulo: Cortez, 2006, p. 197.

[3] Ob. Cit., p. 197.

[4] AMIN, Andréa Rodrigues. Doutrina da Proteção Integral. In: MACIEL, Kátia Regina Ferreira Lobo Andrade (Org). Curso de Direito da Criança e do Adolescente: aspectos teóricos e práticos. 3 ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2008, p. 13.

[5] ARAÚJO, Maria Cristina R. Nolasco de. A descentralização da Política Social para a criança e o adolescente em Maceió: uma alternativa democrática? Dissertação de Mestrado, Universidade Federal de Pernambuco, 1997, p.89.

[6] GARCÍA, Margarida Bosch. Um sistema de garantia de direitos – fundamentação (A). In: Sistema de garantia de direitos. Um caminho para a proteção integral. Centro Dom Helder Câmara de Estudos e Ação Social. Recife: CENDHEC, 1999. Disponível em <www.criancaeadolescente2007.com.br/ biblioteca/documentos/10032007185846.doc>. Acesso em: 28 de julho de 2008, p.2.

[7] Segundo Mônica Alencar, “na década de 1980, enquanto países centrais assistiam ao avanço da hegemonia neoliberal, o Brasil experimentava um pacto social democrático que se explicitou na Constituição de 1988; esta nasceu sob o signo de uma forte contradição”. (Transformações econômicas e sociais no Brasil dos anos 1990 e seu impacto no âmbito da família. In: SALES, Mione Apolinário; MATOS, Maurílio Castro; LEAL, Maria Cristina (Org.). Política social, família e juventude: uma questão de direito.2 ed. São Paulo: Cortez, 2006, p. 66).  

[8] VERCELONE, Paolo. Comentário ao artigo 3º do Estatuto da Criança e do Adolescente. In: CURY, Munir (Org.). Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado: comentários jurídicos e sociais, 9. ed. São Paulo: Malheiros, 2008, p. 38.

[9] A Convenção sobre os Direitos das Crianças foi promulgada em 21 de novembro de 1990, através do Decreto nº 99.710.

[10] SOUZA, Sérgio Augusto Guedes Pereira de. Os Direitos da Criança e os Direitos Humanos, Porto Alegre: safE, 2001. p. 130.

[11] PEREIRA-PEREIRA, Potyara Amazoneida.  Mudanças estruturais, política social e papel da família: crítica ao pluralismo de bem-estar. In: SALES, Mione Apolinário; MATOS, Maurílio Castro; LEAL, Maria Cristina (Org.). Política social, família e juventude: uma questão de direitos, 2 ed. São Paulo: Cortez, 2006, p. 34.

[12] A teoria do Sistema de Garantia de Direitos foi elaborada por Wanderlino Nogueira Neto e vem sendo desenvolvida pelo Centro Dom Helder Câmara de Estudos e Ação Social.

[13] Art. 87. São linhas de ação da política de atendimento:

I - políticas sociais básicas;

II - políticas e programas de assistência social, em caráter supletivo, para aqueles que deles necessitem;

III - serviços especiais de prevenção e atendimento médico e psicossocial às vítimas de negligência, maus-tratos, exploração, abuso, crueldade e opressão;

IV - serviço de identificação e localização de pais, responsável, crianças e adolescentes desaparecidos;

V - proteção jurídico-social por entidades de defesa dos direitos da criança e do adolescente.

[14] Vide art. 88 do ECA.

[15] LA MORA, Luís de. Comentário ao artigo 88 do Estatuto da Criança e do Adolescente. In: CURY, Munir (Org.). Estatuto da Criança e do Adolescente Comentado: comentários jurídicos e sociais, 9. ed. São Paulo: Malheiros, p. 312.

[16] GARCÍA, Margarida Bosch. Um sistema de garantia de direitos – fundamentação (A). In: Sistema de garantia de direitos. Um caminho para a proteção integral, 1999. p.5.

[17] MATOS, Maurílio Castro de; MENDES, Alessandra Gomes. Uma agenda para os Conselhos tutelares. In: SALES, Mione Apolinário; MATOS, Maurílio Castro; LEAL, Maria Cristina (Org.). Política social, família e juventude: uma questão de direitos, 2 ed. São Paulo: Cortez, 2006, p. 246.

[18] SOUZA, Rodriane de Oliveira. Participação e controle social. In: SALES, Mione Apolinário; MATOS, Maurílio Castro; LEAL, Maria Cristina (Org.). Política social, família e juventude: uma questão de direitos, 2 ed. São Paulo: Cortez, 2006, p. 170.

[19] SOUZA, Rodriane de Oliveira. Participação e controle social. In: SALES, Mione Apolinário; MATOS, Maurílio Castro; LEAL, Maria Cristina (Org.). Política social, família e juventude: uma questão de direitos, 2 ed. São Paulo: Cortez, 2006, p. 173-175.

[20] Embora os Conselhos Tutelares seja extremamente relevantes para democracia participativa, verificam-se infelizmente diversos problemas nesses órgãos: número insuficiente; conselheiros despreparados; preferência pelo atendimento, em face das fiscalizações; e falta de estrutura.

[21] MOREIRA, Eduardo Ribeiro. Neoconstitucionalismo - A Invasão da Constituição, São Paulo: Método, 2008. P. 137

[22] NEVES, A. Castanheira. Metodologia Jurídica – Problemas Fundamentais. Coimbra: Coimbra Editora, 1993 p.28.

[23]BARROSO, Luís Roberto. Neoconstitucionalismo e constitucionalização do Direito. O triunfo tardio do Direito Constitucional no Brasil, Jus Navigandi, Teresina, ano 9, n. 851, 1 nov. 2005. Disponível em: <http://jus.com.br/revista/texto/7547>. Acesso em 20 de julho 2008, p. 4.

[24] HESSE, Konrad.  A força normativa da Constituição, trad. Gilmar Ferreira Mendes. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1991, p. 19.

[25] CLÈVE, Clemerson Mèrlin. Desafio da efetividade dos Direitos Fundamentais Sociais. Disponível na Internet: < http://www.mundojuridico.adv.br/sis_artigos/artigos.asp?Codigo =441>. Acesso em 30 de Agosto de 2008,  p.1.

[26] APPIO, Eduardo. Controle Judicial das Políticas Públicas no Brasil, Curitiba: Juruá, 2005, p. 40-41.

[27] CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de Direito Constitucional, 2ª ed. Salvador: JusPodivum, 2008, p. 135.

[28] SARLET, Ingo Wolfgang. Eficácia dos Direitos Fundamentais, 6. ed. rev. atual. e ampl. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006, p. 243.

[29] SILVA, José Afonso da. Aplicabilidade das normas constitucionais, 6. ed. 3ª tiragem. São Paulo: Malheiros, 2004 p.66.

[30] BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional, 4ª ed. São Paulo: Malheiros Editores, 1993, p.299.

[31] Vide ANDRADE, José Carlos Vieira de. Os Direitos Fundamentais na Constituição Portuguesa de 1976, 3ª. ed., Coimbra: Almedina, 2004, p. 385ss.

[32] CLÈVE, Clemerson Mèrlin. Desafio da efetividade dos Direitos Fundamentais Sociais. Disponível na Internet: < http://www.mundojuridico.adv.br/sis_artigos/artigos.asp?Codigo =441>. Acesso em 30 de Agosto de 2008, p.3.

[33] CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de Direito Constitucional, 2ª ed. Salvador: JusPodivum, 2008, p. 500-504.

[34] PIÇARRA, Nuno. A separação dos poderes como doutrina e princípio constitucional, Coimbra: Coimbra Editora,1989, p. 26-27.

[35] Cf. KRELL, Andreas J. Direitos Sociais e Controle Judicial no Brasil e na Alemanha. Os (des) caminhos de um Direito Constitucional “Comparado”, Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 2002. p. 52.

[36] Ob. Cit., p. 54.

[37] CLÈVE, Clemerson Mèrlin. Desafio da efetividade dos Direitos Fundamentais Sociais. Disponível na Internet: < http://www.mundojuridico.adv.br/sis_artigos/artigos.asp?Codigo =441>. Acesso em 30 de Agosto de 2008. p.4

[38] ALEXY, Robert. Direitos Fundamentais, Ponderação e Racionalidade, Revista de Direito Privado, nº 24. São Paulo: RT, out/dez 2005, p. 339-340.

[39] MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro, 32ª edição. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 168.

[40] KRELL, Andreas J. Discricionariedade administrativa e proteção ambiental - O controle dos conceitos jurídicos indeterminados e a competência dos órgãos ambientais: um estudo comparativo, Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2004. p. 22-23.

[41] Ob. Cit, p. 54.

[42] DEMO, Pedro. Política social, educação e cidadania, 8 ed. Campinas: Papirus, 1994. P. 21-23.


ABSTRACT: The present study it aims at to investigate the main challenges and the ways for the implementation of public policies in the area of infancy and youth. For in such a way, it is exposed legal evolution, ideological politics and for which passed the Brazilian State, since the creation of the Code of Minors of 1927 until the Statute of the Child and the Adolescent. Subsequently, it discusses the judicial control of public policy, presenting and rebutting the main obstacles that insist on removing the performance of the judiciary in the realization of these rights.

Key Words: public policies, judicial control, infancy and youth.


Autor

  • Sofia Vilela de Moraes e Silva

    Sofia Vilela de Moraes e Silva

    graduação em Administração com habilitação em comércio exterior pela Faculdade de Alagoas , graduação em Direito pela Universidade Federal de Alagoas e mestrado em Direito pela Universidade Federal de Alagoas . Atualmente é doutoranda em Direito pela Universidade Federal de Pernambuco e bolsista da CAPES.

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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

SILVA, Sofia Vilela de Moraes e. Controle judicial de políticas públicas na área da infância e juventude. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 17, n. 3301, 15 jul. 2012. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/22200. Acesso em: 24 abr. 2024.