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A sistemática do cumprimento de sentença: peculiaridades e pontos polêmicos

A sistemática do cumprimento de sentença: peculiaridades e pontos polêmicos

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A execução de sentenças sofreu diversas alterações para atender os anseios sociais de eficiência e rapidez dos processos. No entanto, tal evolução deixou lacunas e trouxe dúvidas quanto ao novo procedimento, pontos estes que são o foco deste estudo.

Resumo: O presente trabalho destina-se a versar sobre a sistemática do cumprimento de sentença, introduzido pela Lei 11.232/2005 e seus aspectos mais intrigantes. Busca-se indicar os diversos posicionamentos doutrinários e jurisprudências acerca das questões polêmicas relacionados às condenações ao pagamento de quantia certa, para, ao fim de cada tema, apontar aquele que parece mais condizente com o contexto normativo e social, com ênfase, ainda, no aspecto prático. É certo que a execução de sentenças sofreu diversas alterações para atender os anseios sociais de eficiência e rapidez dos processos. No entanto, tal evolução deixou lacunas e trouxe dúvidas quanto ao novo procedimento, pontos estes que são o foco deste estudo.

Palavras-chave: Cumprimento de sentença, obrigação de pagar quantia certa, pontos polêmicos, entendimento jurisprudencial.


INTRODUÇÃO

A Lei 11.232/2005 inseriu o art. 475-A e seguintes no Código de Processo Civil Brasileiro, introduzindo o processo sincrético como regra para a execução de sentenças judiciais. Ocorre que, no que tange às condenações ao pagamento de quantia certa, o procedimento estabelecido foi completamente novo, e, apesar da digna finalidade de conferir maior celeridade e eficiência às execuções de sentença, trouxe à luz diversos questionamentos.

De fato, o legislador não tratou do tema à exaustão, mantendo diversas lacunas no que tange à aplicação prática do novo regramento. Inicialmente, cumpre estabelecer sua aplicabilidade à execução de sentenças judiciais ou provimentos equiparados proferidos fora do processo em que se busca sua efetivação, como as sentenças penais e as arbitrais.

Superada esta questão, passa-se à análise da adequação da execução provisória ao art. 475-J, principalmente no que tange à incidência da multa de 10% nele estabelecida, tendo em vista sua incompatibilidade com o direito de recorrer. Em seguida, serão abordadas questões relativas à contagem do prazo de 15 dias para cumprimento espontâneo e ao ato de intimação que rende ensejo ao início do prazo, com ênfase no entendimento do Superior Tribunal de Justiça.

Determinado a forma como se inicia o cumprimento de sentença, serão estudados alguns aspectos da defesa do executado por meio da impugnação, notadamente o cabimento da exceção de pré-executividade e a possibilidade de condenação em honorários advocatícios quando do julgamento deste incidente.

Por fim, será estudada a compatibilidade da novidade introduzida pela Lei 11.232/2005, com as disposições relativas aos Juizados Especiais, sejam os Estaduais ou os Federais. Isto porque, as leis que instituíram esta justiça especializada visaram estabelecer um procedimento específico e adequado às causas submetidas à sua jurisdição. Assim, cabe avaliar se o art. 475-J será aplicado às sentenças proferidas no âmbito dos Juizados Especiais e em que termos.

Nota-se, portanto, que não há uma conclusão única para o presente estudo, visto que serão abordados diversos pontos, que gozam de certa independência, apesar de inseridos no mesmo tema. Desta forma, após cada ponto é exposto o entendimento mais correto na visão deste autor.

Não se busca examinar o tema do cumprimento de sentença ao máximo, mas tão somente tratar dos aspectos mais polêmicos e que ensejam discussões mais acirradas entre os operadores do direito.


1. ESPÉCIES DE SENTENÇA E SUA EXECUÇÃO

A Lei nº 11.232/2005 inseriu no Código de Processo Civil Brasileiro a nova sistemática do cumprimento de sentença, conforme previsto nos arts. 475-A e seguintes. Os capítulos referentes à liquidação e ao cumprimento da sentença referem-se obviamente à execução do réu condenado ao pagamento de quantia certa.

De fato, em se tratando de condenações em obrigação de fazer, não fazer ou de dar coisa diversa de dinheiro, a execução continua a se processar segundo o art. 461 e 461-A, conforme expressa previsão do art. 475-I. Com relação a estas espécies de condenação, adota-se o procedimento destinado à obtenção da tutela específica da obrigação, mediante imposição de prazo ao devedor cumulado com a estipulação de multa (astreintes) ou outras medidas coercitivas a critério do juiz.

Somente com a conversão das citadas obrigações em perdas e danos é que será utilizado o rito da liquidação e o cumprimento estipulado no art. 475-J, vez que a obrigação passa a ser de pagamento de quantia certa.

É exatamente neste novo procedimento que residem diversos questionamentos e discussões doutrinárias e jurisprudenciais. Isto porque o legislador não foi diligente o suficiente para regrar de forma exaustiva este rito, deixando lacunas na previsão legal. Tais falhas, seja por descuido do legislador, seja pela infinidade de possibilidades fáticas que surgem na aplicação prática do novo regramento, fizeram surgir variadas teses sobre os mais diversos aspectos deste tema.

Com foco somente nos pontos mais polêmicos, percebe-se que os plúrimos posicionamentos se baseiam em argumentos fortes, o que cria uma situação de teses contraditórias razoavelmente sustentáveis. Assim, no intuito de avaliar qual o entendimento mais adequado, faz-se mister analisá-los segundo os princípios hermenêuticos e o contexto normativo, mas com ênfase no aspecto prático.

Este estudo se limitará a cinco subtemas: 1) os títulos que podem se submeter à execução de sentença, com enfoque na sentença penal condenatória e na execução de astreintes antes do trânsito em julgado; 2) a incidência da multa de 10% em execução provisória; 3) o procedimento inaugural da fase de cumprimento de sentença, com análise do ato de intimação para cumprimento voluntário e o início da contagem do prazo legal; 4) a impugnação contextualizada com a possibilidade de apresentação de exceção de pré-executividade e a condenação em honorários advocatícios e; 5) a compatibilização do cumprimento de sentença com o rito dos Juizados Especiais.


2. TÍTULOS SUJEITOS AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA

2.1. A execução da sentença penal condenatória

Segundo inteligência do art. 387, IV, do Código de Processo Penal, o juiz, ao proferir a sentença condenatória penal, “fixará valor mínimo para reparação dos danos causados pela infração, considerando os prejuízos sofridos pelo ofendido”. Já o art. 475-N, II, do Código de Processo Civil considera título executivo judicial a sentença condenatória penal transitada em julgado.

Daí surgiram diversos questionamentos sobre o rito a ser tomado para fins de execução deste valor. Uma vertente doutrinária adotou o entendimento de que a execução civil desta sentença deveria se dar segundo o rito do art. 652 do CPC, a semelhança de um título executivo extrajudicial, já que foi produzido em outra esfera judicial.

Assim, o executado seria citado para pagar a quantia no prazo de 03 dias e, independente de garantir a dívida, poderia opor embargos, nos quais teria liberdade para alegar qualquer matéria de defesa, somente sendo vedado discutir a ocorrência do ilícito e a existência do dano.

Os defensores desta tesa sustentam, ainda, que submeter a execução da sentença penal condenatória ao rito do art. 475-J do CPC caracterizaria violação ao princípio do contraditório, tendo em vista a reduzida matéria que pode ser alegada em sede de impugnação. Aduzem que, o réu, no curso do processo criminal, não tem oportunidade de produzir provas no sentido de convencer o juiz acerca da real extensão do dano que provocou ou mesmo demonstrar sua inocorrência.

Sobre a questão a jurisprudência ainda é omissa, residindo o debate principalmente no âmbito doutrinário. No entanto, este posicionamento não parece o mais acertado. Com efeito, da redação do art. 387, IV, do CPP, extrai-se que o juiz deverá fixar um valor mínimo, o qual deve ser líquido e expresso em moeda. Não cabe ao magistrado, com a nova redação, tão somente reconhecer a existência do dano, mas sim estabelecer o patamar mínimo da indenização.

Assim, definido o valor mínimo da indenização em moeda nacional, é perfeitamente aplicável o rito do art. 475-J do CPC, com a observância do disposto no parágrafo único do art. 475-N. Em outras palavras, na execução da indenização estipulada na sentença condenatória, o executado será citado pessoalmente para pagar o valor no prazo de 15 dias, sob pena de incidência da multa de 10% e expedição de mandado de penhora e avaliação.

Este rito somente será adotado para o valor mínimo já fixado em sentença, ou seja, caso a vítima entenda que seu prejuízo foi superior ao estipulado pelo juiz na seara penal, poderá pugnar pelo adicional mediante o procedimento de liquidação de sentença. Esta é exatamente a previsão do art. 63 do CPP:

Art. 63. Transitada em julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a execução, no juízo cível, para o efeito da reparação do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros.

Parágrafo único. Transitada em julgado a sentença condenatória, a execução poderá ser efetuada pelo valor fixado nos termos do inciso IV do caput do art. 387 deste Código sem prejuízo da liquidação para a apuração do dano efetivamente sofrido.

Assim, para buscar a elevação do valor da indenização deve ser seguido o rito estabelecido nos arts. 475-A e seguintes, processando-se geralmente por arbitramento ou artigos.

Não há que se cogitar, em qualquer das hipóteses, de prejuízo para o executado. Isto porque, na liquidação de sentença para elevação do valor da indenização, o réu poderá se manifestar sobre as provas produzidas, sobre a perícia realizada e sobre os cálculos apresentados, restando assegurado o respeito ao contraditório.

Já na execução da quantia mínima fixada na sentença, o exercício do contraditório é, ao menos, oportunizado no curso do processo penal. De fato, caso o réu reste inconformado com o valor estipulado em sentença, poderá insurgir-se por meio do recurso cabível, no qual pode alegar que o dano causado não existiu ou ainda que foi inferior ao estipulado pelo juiz da causa, da mesma forma que pode impugnar a própria condenação penal e o mérito da ação.

Ressalte-se que durante a instrução criminal, notadamente nos crimes contra o patrimônio, o dano por vezes se insere na própria tipicidade do delito, o que exige averiguação do fato.

Assim, como somente a sentença penal transitada em julgado pode ser utilizada como título executivo, é certo que o réu, ou restou conformado com a sentença e não apresentou recurso, abrindo mão do contraditório, ou teve suas alegações repelidas, não cabendo mais qualquer discussão sobre o valor mínimo.

Superada a questão da discussão sobre a suposta violação ao contraditório, como dito acima, o executado será citado pessoalmente e não meramente intimado na pessoa do seu advogado, pois apesar de se referir a um procedimento de cumprimento de sentença, trata-se de inauguração de nova demanda na seara cível.

No âmbito cível, o processo é novo para o réu, o que demanda sua ciência inequívoca e pessoal. Daí a previsão do parágrafo único do art. 475-N.

2.2. A execução de astreintes

Muito se discute na doutrina acerca do cabimento da execução provisória das astreintes impostas em provimento liminar. Alguns doutrinadores, inclusive embasados em precedentes judiciais, sustentam que a cobrança do valor devido a título de astreinte só seria cabível quando da confirmação da decisão, mediante sentença ou acórdão. Isto porque o art. 475-N só consideraria título executivo judicial as sentenças que condenem a parte ao pagamento de quantia e não as decisões interlocutórias proferidas em cognição sumária.

Assim, desprovida de eficácia executiva, as liminares que fixam astreintes não seriam capazes de ensejar uma execução provisória fundada no art. 475-J.

No entanto, adotar esse entendimento seria o mesmo que eliminar boa parte da eficácia das decisões que visam resguardar situações urgentes. De fato, se um dos fundamentos para concessão de medidas liminares, tenham elas caráter antecipatório ou acautelatório, é a existência do periculum in mora, faz-se mister que o beneficiado com esta decisão goze de instrumentos aptos a garantir o cumprimento imediato do seu comando. Exigir o aguardo da confirmação final da liminar seria o mesmo que autorizar que o demandado a descumpra, vez que não haveriam consequências imediatas decorrentes de sua resistência.

Assim, estaria eliminada a própria finalidade da citada multa, qual seja, inibir a recalcitrância do devedor da obrigação de fazer.

Com base nisso, os Tribunais pátrios tem conferido à liminar descumprida, na qual foi fixada astreinte, o caráter de título executivo judicial passível de execução provisória, nos termos do art. 475-O do CPC, conforme se infere do acórdão abaixo:

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. AÇÃO POPULAR. PLACAS INSTALADAS EM OBRAS PÚBLICAS CONTENDO SÍMBOLO DE CAMPANHA POLÍTICA. REMOÇÃO. ANTECIPAÇÃO DE TUTELA COMINAÇÃO DE MULTA DIÁRIA. ASTREINTES. OBRIGAÇÃO DE FAZER. INCIDÊNCIA DO MEIO DE COERÇÃO. ART. 461, § 4, DO CPC. MULTA COMINADA EM DECISÃO INTERLOCUTÓRIA. EXECUÇÃO. CUSTAS JUDICIAIS. ISENÇÃO. DIVERGÊNCIA INDEMONSTRADA.

1. A tutela antecipada efetiva-se via execução provisória, que hodiernamente se processa como definitiva (art. 475-O, do CPC).

2. A execução de multa diária (astreintes) por descumprimento de obrigação de fazer, fixada em liminar concedida em Ação Popular, pode ser realizada nos próprios autos, por isso que não carece do trânsito em julgado da sentença final condenatória.

3. É que a decisão interlocutória, que fixa multa diária por descumprimento de obrigação de fazer, é título executivo hábil para a execução definitiva. Precedentes do STJ: AgRg no REsp 1116800/RS, TERCEIRA TURMA, DJe 25/09/2009; AgRg no REsp 724.160/RJ, TERCEIRA TURMA, DJ 01/02/2008  e REsp 885.737/SE, PRIMEIRA TURMA, DJ 12/04/2007.

4. É cediço que a função multa diária (astreintes) é vencer a obstinação do devedor ao cumprimento da obrigação de fazer (fungível ou infungível) ou entregar coisa, incidindo a partir da ciência do obrigado e da sua recalcitrância. Precedentes do STJ: AgRg no Ag 1025234/SP, DJ de 11/09/2008; AgRg no Ag 1040411/RS, DJ de 19/12/2008; REsp 1067211/RS, DJ de 23/10/2008; REsp 973.647/RS, DJ de 29.10.2007; REsp 689.038/RJ, DJ de 03.08.2007: REsp 719.344/PE, DJ de 05.12.2006; e REsp 869.106/RS, DJ de 30.11.2006.

5. A 1ª Turma, em decisão unânime, assentou que: a "(...) função das astreintes é vencer a obstinação do devedor ao cumprimento da obrigação de fazer ou de não fazer, incidindo a partir da ciência do obrigado e da sua recalcitrância" (REsp nº 699.495/RS, Rel. Min. LUIZ FUX, DJ de 05.09.05), é possível sua execução de imediato, sem que tal se configure infringência ao artigo 475-N, do então vigente Código de Processo Civil" (REsp 885737/SE, PRIMEIRA TURMA, DJ 12/04/2007).

(...)

9. Recurso Especial provido[1]

Assim, a execução provisória da astreinte seguiria o rito do art. 475-J, com os nuances do art. 475-O, no que tange à responsabilidade do exequente e à exigência de caução. Todavia, também se impõe a dispensa da incidência da multa de 10% prevista no art. 475-J, conforme será explicitado a seguir.


3. INCIDÊNCIA DA MULTA DE 10% EM EXECUÇÃO PROVISÓRIA

A finalidade da multa de 10% prevista no art. 475-J é estimular o cumprimento espontâneo da obrigação fixada em sentença, evitando o prolongamento de uma fase executiva que tanto tormento traz aos credores, punindo a resistência indevida do devedor. Vê-se, portanto, que visa estimular um comportamento socialmente adequado e punir uma conduta desleal.

Ocorre que, quando se está diante de uma execução provisória, seja ela de decisão liminar ou de sentença sobre a qual pende o julgamento de recurso desprovido de efeito suspensivo, o cumprimento espontâneo da decisão pelo executado seria conflitante com o desejo de ver a decisão reformada.

Para melhor entender a questão, deve-se adotar o critério sistemático e interpretar o ordenamento jurídico como um todo. Por um lado, o sistema processual prevê meios para a parte vencida impugnar uma decisão judicial da qual discorda, inclusive, contando com previsão constitucional desses direitos (art. 5º, LV, CF/88). Por outro lado, o ordenamento também pune aqueles que não cumprem espontaneamente a obrigação, mediante a instituição da multa do art. 475-J do CPC.

Assim, exigir do devedor o cumprimento espontâneo de uma condenação da qual discorda e contra a qual apresentou recurso, o que torna possível uma futura alteração, configura a exigência de um comportamento contraditório. Tal conduta poderia até configurar uma renúncia tácita do direito de recorrer ou a desistência tácita do recurso já interposto, conforme previsão do art. 503 do CPC, segundo o qual “a parte, que aceitar expressa ou tacitamente a sentença ou a decisão, não poderá recorrer”. O parágrafo único complementa o sentido da norma e estabelece que “considera-se aceitação tácita a prática, sem reserva alguma, de um ato incompatível com a vontade de recorrer”.

Desta forma, um comportamento autorizado e estimulado por uma norma não pode ser coibido por outra, de maneira que a solução para esse dilema é considerar que a multa de 10% somente se aplica aos casos de execução definitiva.

O Superior Tribunal de Justiça também já se debruçou sobre o tema e reconheceu a existência de posições doutrinárias contrárias razoavelmente sustentáveis, conforme se infere de trecho do voto proferido no Recurso Especial 1.100.658/SP:

Cumpre ressaltar, em primeiro lugar, que em razão da omissão do legislador a respeito da questão, parte da mais abalizada doutrina inclinou-se a admitir a incidência da multa do art. 475-J do CPC na execução provisória (vg.,Araken de Assis. Cumprimento da sentença. Rio de Janeiro: Forense, 2006; Alexandre Câmara Freitas. A nova execução de sentença. Rio de Janeiro, 2007; e Cassio Scarpinella Bueno. Variações sobre a multa do caput do art. 475-J do CPC na redação da Lei 11.232/2005. In: Aspectos polêmicos da nova execução 3. São Paulo: RT, 2006.). Ao passo que outra considerável parcela passou a defender a impossibilidade dessa incidência (vg. Carlos Alberto Alvaro Oliveira. A nova execução: comentários à Lei n. 11.232, de 22 de dezembro de 2005. Rio de Janeiro: Forense, 2006; Humberto Theodoro Júnior. As novas reformas do Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Forense, 2006; Ernane Fidélis dos Santos. As reformas de 2005 do Código de Processo Civil: execução dos títulos judiciais e agravo de instrumento. São Paulo: Saraiva, 2006.). E os argumentos de ambos os lados são pertinentes e convencem.[2]

A jurisprudência também apresentava precedentes divergentes, mas parece ter consolidado o entendimento pela inaplicabilidade da multa de 10% à execução provisória. Adotou-se para tanto não só os fundamentos já expedidos acima, mas também a literalidade do art. 475-J, o qual utilizou a expressão “devedor condenado ao pagamento”.

Assim, só se poderia falar em real condenação, caso existisse sentença transitada em julgado, pois pendente recurso contra a decisão, sob a ótica do devido processo legal substancial (art. 5º, LIV, CF/88), seria indevido a utilização da expressão condenado, face a mutabilidade da sentença.

Além disso, para o STJ, o termo “pagamento” implica a quitação da dívida, o que o torna incompatível com o procedimento de execução provisória, no qual há apenas a garantia do débito, estando o levantamento do valor condicionado à prestação de caução, ressalvadas as exceções previstas no §2º do art. 475-O.

Outrossim, se o escopo da execução provisória é precipuamente a garantia da dívida, seu rito conflita com a plena acepção jurídica da palavra “pagamento”, restando incompatível a incidência da multa de 10% neste caso.

Corroborando o dito acima, transcreve-se recente julgado desta Corte Superior:

AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO ESPECIAL. MULTA DO ARTIGO 475-J DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. IMPOSSIBILIDADE DE COMINAÇÃO EM EXECUÇÃO PROVISÓRIA.

1.- Na linha dos precedentes desta Corte a execução provisória de sentença não comporta a cominação da multa prevista no artigo 475-J do Código de Processo Civil. Precedentes.

2.- Tal conclusão é ainda corroborada pelo entendimento de que é o prazo concedido por lei para cumprimento espontâneo da obrigação deve ser contado a partir da intimação feita à parte, por meio de seu advogado, quanto ao trânsito em julgado da condenação e exigibilidade da dívida.

3.- Agravo Regimental a que se nega provimento.[3]

Do exposto acima, percebe-se que o entendimento mais acertado induz à inaplicabilidade da multa de 10% do art. 475-J em sede de execução provisória.


4. FASE INAUGURAL DO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA

4.1. Contagem de prazo

A redação do art. 475-J do CPC mostrou-se insuficiente para esclarecer o exato momento para o início da contagem do prazo de 15 dias para pagamento da condenação imposta em sentença, conforme se infere da transcrição abaixo:

Art. 475-J. Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa ou já fixada em liquidação, não o efetue no prazo de quinze dias, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de dez por cento e, a requerimento do credor e observado o disposto no art. 614, inciso II, desta Lei, expedir-se-á mandado de penhora e avaliação.

De fato, houve uma falha legislativa na elaboração do dispositivo, tornando necessário um esforço interpretativo no sentido de complementar a previsão e permitir sua perfeita aplicação.

Nesse contexto, fundados na finalidade da alteração processual, qual seja, conferir celeridade e efetividade ao trâmite da ação, alguns operadores do direito defendem que o citado prazo de 15 dias tem início com o simples trânsito em julgado da sentença ou acórdão condenatório. Em outras palavras, o início do prazo seria decorrência automática do trânsito em julgado da decisão final, dispensando qualquer ato judicial ou nova intimação.

Ocorre que tal entendimento traz diversos questionamentos e problemas de difícil solução, além de exigir da parte vencida diligências excessivas e desproporcionais. Com efeito, basta imaginar a situação em que o sucumbente não deseja recorrer da sentença, tampouco quer ser punido com a multa de 10% prevista no citado artigo. Para tanto, deverá se certificar da regularidade da intimação da parte contrária, verificar eventual interposição de embargos de declaração no prazo de cinco dias, o que poderia interromper a contagem do prazo processual, e, por fim, averiguar se houve interposição de recurso pela parte vitoriosa.

Tal observação tem ainda maior relevância quando se tem em mente que o Judiciário brasileiro vive uma situação de evidente sobrecarga e deficiência de pessoal. Todos que vivenciam o cotidiano forense têm ciência de que, muitas vezes, a aposição da certidão de trânsito em julgado nos autos não se dá imediatamente após o transcurso in albis do prazo para interposição de recurso. É certo também que, enquanto tal documento não for inserido no processo, não se tem certeza quanto à imutabilidade da decisão, vez que pode haver um recurso interposto, recebido em secretaria, mas ainda não juntado aos autos. De fato, somente com a referida certidão a parte passa a ter segurança de que o seu prazo para pagar a condenação teve início, segundo a tese ora analisada, pois esta goza de fé pública e, até prova em contrário, garante que não houve impugnação da decisão judicial.

Assim, adotar este posicionamento seria exigir que a parte vencida e conformada com a decisão, consultasse constantemente os autos em cartório para verificar a ocorrência do trânsito em julgado para então cumprir o comando da sentença.

Não se desconhece que eventual pagamento antes mesmo do trânsito em julgado configuraria mera renúncia ao prazo recursal e quitação da parcela incontroversa do débito, em face da vedação da reformatio in pejus. Todavia, posteriores alterações da sentença demandariam novas ações do devedor e cuidado redobrado, o que não se mostra razoável.

Outra dificuldade é encontrada quando existem recursos na ação que levaram o processo para instâncias superiores situadas em domicílio diverso das partes, o que dificulta a consulta aos autos.

Por fim, existe ainda a problemática do valor a ser pago, tendo em vista que, por vezes, é necessária sua atualização e tais cálculos nem sempre se mostram fáceis, notadamente em condenações que datam de muito tempo, o que é comum em processos judiciais, sendo tarefa do credor apresentar a memória de cálculo do valor atualizado do débito quando da formulação do pedido de execução (art. 475-B do CPC).

Cientes dessa situação, outra parcela da doutrina, bem como a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, adotaram o entendimento de que o início da contagem do prazo de 15 dias para cumprimento espontâneo da condenação teria início com a intimação da parte vencida para tanto, após o trânsito em julgado da decisão judicial.

Portanto, verificada a imutabilidade da decisão, cabe ao juiz determinar a intimação da parte sucumbente para cumprir o comando da sentença ou acórdão, quando do retorno dos autos ao juízo de origem, somente então tendo início o prazo legal cujo desrespeito pode ensejar o pagamento da multa prevista em lei. Por sua clareza, é relevante a reprodução de um dos julgados do STJ:

AGRAVO REGIMENTAL NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. TELECOM. SUBSCRIÇÃO COMPLEMENTAR DE AÇÕES. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. MULTA DO ART. 475-J DO CPC.

1. Após a baixa dos autos à origem e aposição do "cumpra-se" pelo juízo processante da execução, a imposição da cominação de 10% (dez por cento) sobre o montante da condenação, prevista no art. 475-J do CPC, depende do trânsito em julgado da sentença e da respectiva intimação da parte, na pessoa do seu advogado (REsp nº 940.274/MS, Relator o Ministro João Otávio de Noronha, DJ 31/5/2010).

2. Agravo regimental a que se nega provimento, com aplicação de multa de 5% sobre o valor atualizado da causa (CPC, art. 557, § 2º), ficando a interposição de novos recursos condicionada ao prévio recolhimento da penalidade imposta.[4]

Como se vê, a adoção da tese acima sana os defeitos apontados sobre o primeiro entendimento analisado, conferindo maior segurança à parte vencida e mostrando-se mais adequado aos ditames do devido processo legal, além de ser mais consentâneo com a realidade do Judiciário brasileiro. É certo que a aplicação e interpretação do direito nunca podem ser dissociadas do contexto fático em que se insere, sob pena de aniquilar sua efetividade.

4.2. O ato de intimação

Do julgado transcrito alhures, percebe-se que os tribunais pátrios adotaram a posição de que a intimação para o cumprimento de sentença pode ser realizada na pessoa do advogado da parte vencida. Em uma ação com patronos constituídos nos autos tal questão não gera maiores dúvidas, vez que o causídico possui poderes para tanto, bem como, por ter sido escolhido pela parte, presume-se que haja perfeita comunicação entre eles.

Ocorre que nem sempre as partes constituem advogados, além de por vezes serem assistidas por Defensor Público ou curador especial.

Nos termos do art. 322 do CPC “contra o revel que não tenha patrono nos autos, correrão os prazos independentemente de intimação, a partir da publicação de cada ato decisório”. Tal regra tem perfeita aplicação durante o curso do processo de conhecimento, quando houve citação real, mas deve ser vista com cautela no que tange à fase de execução de sentença. Com efeito, a intimação para cumprir o comando da decisão judicial não configura mero ato processual, mas sim um ato material de satisfação da dívida reconhecida pelo Poder Judiciário.

Assim, nestes casos, boa parte da doutrina tem defendido a intimação pessoal do devedor para cumprir espontaneamente a sentença e, somente após o decurso do prazo de 15 dias, seria possível a aplicação da multa de 10%. De fato, o intuito do legislador ao fixar esta penalidade foi incentivar o cumprimento espontâneo da obrigação e punir aqueles que se negam a atender ao dispositivo de uma decisão judicial definitiva proferida em um processo, no qual, ao menos em tese, seus argumentos de defesa foram analisados e superados.

Portanto, punir aquele que nem mesmo tomou ciência do trânsito em julgado da decisão tampouco teve a oportunidade de adimplir a obrigação espontaneamente, se mostra incompatível com a mens legislatoris.

Por outro lado, quando se está diante de processos que se iniciaram por meio de uma citação ficta, como a realizada por edital ou por hora certa, a lei determina que seja nomeado curador especial ao réu, nos termos do art. 9º, II, do CPC. Assim, não se aplica o art. 322 do mesmo diploma, pois há um advogado nos autos, o qual deve ser intimado de todos os atos processuais. Ocorre que tal causídico, em geral um defensor público, obviamente não possui contato com a parte que representa, o que torna desprovida de qualquer efeito sua intimação para fins de cumprimento da sentença pelo réu. Daí também se defender que nestes casos é necessária a intimação pessoal do réu para os fins do art. 475-J, no intuito de garantir efetividade ao processo e lhe assegurar a oportunidade de cumprir espontaneamente a condenação.

No entanto, no âmbito da jurisprudência do STJ, o posicionamento mais atual, ao menos da 3ª Turma, parece reconhecer como desnecessária a intimação do réu revel citado por edital para incidência da multa de 10%, conforme recente julgado transcrito abaixo:

PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. INÍCIO DO PRAZO PARA O CUMPRIMENTO VOLUNTÁRIO DA DECISÃO. RÉU REVEL, CITADO FICTAMENTE. INTIMAÇÃO PARA A FLUÊNCIA DO PRAZO ESTABELECIDO NO ART. 475-J DO CPC. DESNECESSIDADE.

1. A Corte Especial firmou o entendimento de que o prazo estabelecido no art. 475-J do CPC flui a partir do primeiro dia útil seguinte à data da publicação de intimação do devedor na pessoa de seu advogado. A Corte afirmou que não há no CPC regra que determine a intimação pessoal do executado para o cumprimento da sentença, devendo, portanto, incidir a regra geral no sentido de que o devedor deve ser intimado na pessoa dos seus advogados por meio do Diário da Justiça (arts. 234 e 238 do CPC) .

2. A particularidade presente na hipótese dos autos, consistente no fato de o executado ter sido citado fictamente, sendo decretada a revelia e nomeado curador especial.

3. Como na citação ficta não existe comunicação entre o réu e o curador especial, sobrevindo posteriormente o trânsito em julgado da sentença condenatória ao pagamento de quantia, não há como aplicar o entendimento de que prazo para o cumprimento voluntário da sentença flui a partir da intimação do devedor por intermédio de seu advogado.

4. Por outro lado, entender que a fluência do prazo previsto no art. 475-J do CPC dependerá de intimação dirigida pessoalmente ao réu - exigência não prevista pelo CPC - fere o novo modelo de execução de título executivo judicial instituído pela Lei 11.232/05. Isso porque a intimação pessoal traria os mesmos entraves que à citação na ação de execução trazia à efetividade da tutela jurisdicional executiva.

5.  O Defensor Público, ao representar a parte citada fictamente, não atua como advogado do réu - papel esse que exerce na prestação da assistência jurídica integral e gratuita aos economicamente necessitados, nos termos do art. 134, § 1º da CF -  mas apenas exerce o dever funcional de garantir o desenvolvimento de um processo équo, apesar da revelia do réu e de sua citação ficta. Portanto, não pode ser atribuído ao Defensor Público - que atua como curador especial - o encargo de comunicar a condenação ao réu, pois não é advogado da parte.

6. O devedor citado por edital, contra quem se inicie o cumprimento de sentença, não está impedido de exercer o direito de defesa durante a fase executiva, pois o ordenamento jurídico coloca a sua disposição instrumentos para que ele possa se contrapor aos atos expropriatórios.

7. Na hipótese de o executado ser representado por curador especial em virtude de citação ficta, não há necessidade de intimação para a fluência do prazo estabelecido no art. 475-J do CPC.

8.  Negado provimento ao recurso especial.[5]

Data máxima vênia, ouso discordar do entendimento desta Corte Superior, especialmente porque parece equivocado afirmar que a determinação de intimação pessoal do réu em casos como este traria os mesmos entraves da citação na antiga ação de execução. Ora, quando se determina a citação por edital em um processo, significa, ao menos em tese, que foram esgotadas todas as tentativas de localização do réu e de obtenção do seu endereço correto e paradeiro.

Assim, resta claro que, em ações que exigem uma citação ficta, pouco se sabe sobre o réu, o que impossibilita o desenvolvimento de um feito executivo, ainda que se dispense sua intimação para fins de cumprimento espontâneo da condenação. De fato, um mandado de penhora e avaliação não terá qualquer eficácia se não se tem conhecimento do endereço da parte. Os únicos atos de constrição que poderiam ser praticados pelo juiz, e somente se informado nos autos o número do CPF da parte executada, seria o bloqueio de ativos em contas bancárias, bloqueio de veículos ou penhora sobre imóveis, por meio dos sistemas BACENJUD, RENAJUD e INFOJUD.

Todavia, na prática, via de regra, nem estes atos são possíveis, pois, se o número de CPF do réu consta dos autos, tal elemento seria utilizado para fins de obtenção de seu endereço junto ao cadastro dos órgãos públicos, como DETRAN, Justiça Eleitoral e Receita Federal. Portanto, é de se presumir que realmente muito pouco se sabe sobre o promovido.

Dessa forma, não cabe dizer que a intimação pessoal do réu configuraria um entrave desnecessário e incompatível com o rito do cumprimento de sentença, pois, na prática, a fase de execução nem poderia ter início sem a localização do réu, em face da impossibilidade de se realizar uma execução forçada sem um mínimo de dados do executado.

Com efeito, a mera incidência da multa de 10% sobre o valor da condenação, dispensando-se a prévia intimação para pagamento espontâneo, não seria suficiente para superar o obstáculo da dificuldade de localização do réu e garantir o prosseguimento da execução, além de não atender a finalidade da multa, qual seja, punir aqueles que não cumprem de forma voluntária a obrigação reconhecida pelo Judiciário.

Importante ressaltar que própria a 3ª Turma, apesar do recente julgado colacionado acima, já adotou o mesmo entendimento aqui defendido em meados de 2010, conforme se infere do acórdão abaixo:

DIREITO PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. MULTA DO ART. 475-J DO CPC. RÉU-REVEL, CITADO FICTAMENTE NA AÇÃO DE CONHECIMENTO. CIÊNCIA DO CURADOR ESPECIAL ACERCA DO TRÂNSITO EM JULGADO DA CONDENAÇÃO. INSUFICIÊNCIA. PRÉVIA INTIMAÇÃO DO EXECUTADO. NECESSIDADE. REALIZAÇÃO DA INTIMAÇÃO POR MEIO FICTO. POSSIBILIDADE.

- Nas citações fictas (com hora certa ou por edital) não há a certeza de que o réu tenha, de fato, tomado ciência de que está sendo chamado a juízo para defender-se. Trata-se de uma presunção legal, criada para compatibilizar a obrigatoriedade do ato citatório, enquanto garantia do contraditório e da ampla defesa, com a efetividade da tutela jurisdicional, que ficaria prejudicada se, frustrada a citação real, o processo fosse paralisado sine die.

- Diante da precariedade da citação ficta, os revéis assim incorporados à relação processual não se submetem à regra do art. 322 do CPC, sendo-lhes dado um curador especial, consoante determina o art. 9º, II, do CPC.

- Dadas as circunstâncias em que é admitido no processo, o curador de ausentes não conhece o réu, não tem acesso a ele, tampouco detém informações exatas sobre os fatos narrados na petição inicial, tanto que o parágrafo único do art. 302 do CPC não o sujeita à regra de impugnação especifica, facultando a apresentação de defesa por negativa geral.

- Tendo em vista que a própria lei parte do pressuposto de que o réu-revel, citado por hora certa ou por edital, não tem conhecimento da ação, determinado lhe seja dado um curador especial, bem como ante à absoluta falta de comunicação entre curador e réu-revel, não há como presumir que o revel tenha tido ciência do trânsito em julgado da decisão que o condena e, por via de consequência, não há como lhe impor, automaticamente, a multa do art. 475-J do CPC.

- Para efeitos de incidência da multa do art. 475-J do CPC, é inviável considerar suficiente a ciência do curador especial acerca do trânsito em julgado da condenação, não apenas pela já mencionada falta de comunicação dele com o revel, mas também porque a multa constitui sanção imposta àquele que voluntariamente deixa de cumprir a sentença, comportamento que não pode ser imputado ao curador de ausentes, visto que o revel mantém sua capacidade material, isto é, sua livre manifestação de vontade, bem como sua condição de parte substancial no processo.

- A imposição da multa do art. 475-J do CPC ao réu-revel implicaria responsabilizá-lo objetivamente pelo não pagamento, já que não há como lhe imputar a culpa pela conduta, a qual pressupõe ciência acerca da condenação e a consequente resistência em cumpri-la. Mesmo com o advento do CC/02, a regra no direito civil brasileiro continua sendo a responsabilidade subjetiva, consoante se depreende da análise dos seus arts. 186 e 927, de modo que a incidência da responsabilidade objetiva depende de expressa previsão legal, inexistente no caso do art. 475-J do CPC.

- Nas hipóteses em que o cumprimento da sentença voltar-se contra réu-revel citado fictamente, a incidência da multa de 10% do art. 475-J do CPC exigirá sua prévia intimação, nos termos do art. 238 e seguintes do CPC.

- Persistindo a circunstância ensejadora da citação ficta do réu, nada impede que sua intimação para pagar seja realizada por igual meio. Nessa situação, ainda que perdure dúvida quanto à real ciência do revel sobre a condenação, sobressai a necessidade de uma prestação jurisdicional efetiva, tendente à pacificação social e capaz de conferir segurança jurídica às relações negociais. Do contrário, estar-se-ia, mesmo que indiretamente, fomentando a inadimplência e o descaso com a Justiça, incentivando a revelia deliberada, pois, ao invés de integrar o polo passivo e responder ao processo, seria mais vantajoso para o devedor ocultar-se, evitando ser cientificado da existência da ação e da condenação, com o que, além de não incorrer nas despesas com a nomeação de patrono para defendê-lo, ainda ficaria isento do pagamento da multa do art. 475-J do CPC. Assim, eximir o devedor da multa do art. 475-J do CPC, nas hipóteses em que sua revelia for confirmada na fase de cumprimento da sentença, apenas o estimulará a se ocultar desde o início da ação, furtando-se das citações e intimações reais (por mandado ou pelo correio), pois, além de não suportar a referida sanção, também se verá livre daquelas despesas inerentes ao comparecimento em juízo para se defender.

Recurso especial a que se nega provimento.[6]

Como bem foi explanado acima, dispensar a intimação para fins de cumprimento espontâneo seria o mesmo que atribuir responsabilidade objetiva ao executado, quando nem mesmo teve a oportunidade de pagar voluntariamente a dívida, aplicando-lhe como punição a multa de 10% prevista em lei.

Assim, defende-se aqui a intimação pessoal do réu revel citado regularmente, mas sem patrono constituído nos autos, bem como do réu revel citado de forma ficta a quem tenha sido nomeado curador especial, seja ele advogado escolhido pelo juízo ou um defensor público, para os fins do art. 475-J, tendo em vista os argumentos já elencados acima.

Superada as questões de contagem de prazo e sobre o ato de intimação, passa-se a analisar a defesa do executado nesta fase processual por meio do instituto da impugnação prevista nos arts. 475-J, §1º, e 475-L, ambos do CPC.


5. IMPUGNAÇÃO AO CUMPRIMENTO DE SENTENÇA

5.1. Impugnação e exceção de pré-executividade

Antes de analisar o instituto da impugnação, cabe aqui versar sobre o cabimento da exceção de pré-executividade no contexto do cumprimento de sentença.

Tal incidente não possui previsão legal e é fruto da produção jurisprudencial, sendo cabível nas diversas espécies de execução, desde que destinado a suscitar questão de ordem pública, passível de ser conhecida de ofício pelo magistrado, bem como quando se tratar de questão unicamente de direito ou questão de fato que não demande dilação probatória.

Este instrumento surgiu no contexto da antiga legislação relativa aos embargos do devedor, a qual exigia a garantia do juízo para posterior apresentação de embargos. Assim, o executado, para argumentar as matérias citadas acima, poderia ingressar com esta exceção independente de apresentar garantia do valor da execução, tampouco existindo prazo próprio para tanto.

Todavia, em face da nova redação do art. 736 do CPC, introduzida pela Lei nº 11.382/2006, a qual autorizou o ajuizamento dos embargos independente de garantia, tal instituto teria perdido parte da sua razão de existir, sendo mais aplicável ao contexto das execuções fiscais.

Já no contexto do cumprimento de sentença, a questão deve ser melhor analisada, visto que o art. 475-J, §1º, do CPC estabelece que o prazo para impugnação começa a fluir da intimação acerca do auto de penhora e avaliação. Assim, a rigor, somente após a constrição do seu patrimônio, o executado poderia se opor à execução, ainda que para alegar questões de ordem pública, como pagamento e inexigibilidade do título.

Tal previsão impõe a prévia garantia da dívida para apresentação de impugnação, o que torna a exceção de pré-executividade perfeitamente aplicável à fase de cumprimento de sentença, seja para se manifestar antes da realização da penhora, seja para suscitar as matérias cabíveis ainda que transcorrido o prazo para apresentação da impugnação.

A impugnação, por sua vez, é um incidente de fundamentação vinculada, estando limitado às matérias enumeradas no art. 475-L do CPC, o que não ocorre com a exceção de pré-executividade.

5.2. Honorários advocatícios na impugnação

Tanto no julgamento da impugnação quanto na decisão relativa à exceção de pré-executividade discutiu-se sobre o cabimento de condenação em honorários advocatícios. É certo que o magistrado sempre deve levar em consideração o trabalho desenvolvido pelo advogado no acompanhamento da causa, sendo-lhe devidos os respectivos honorários sucumbenciais por aquele que deu ensejo à demanda.

É exatamente sob a perspectiva da causalidade que se deve avaliar quando será cabível a condenação da parte vencida ao pagamento de honorários, não se limitando tal disposição ao julgamento do processo de conhecimento ou à decisão que põe fim ao processo.

De fato, o causídico executa trabalho também na fase de execução. O advogado do credor, por exemplo, atua na busca por bens penhoráveis, na solicitação de diligências ou na resposta à impugnação do executado. Já o patrono do devedor age na defesa dos interesses deste, na busca da execução pelo método menos gravoso ou no respeito às limitações legais relativas aos bens impenhoráveis.

Assim, não restam dúvidas que cabe a condenação em honorários na fase executória. Todavia, quando se trata de julgamento de incidentes dentro da execução, a questão deve ser vista com cautela. Nesse contexto, existem três julgamento possíveis: totalmente procedente, parcialmente procedente ou totalmente improcedente.

Para alguns doutrinadores a condenação em honorários caberia em qualquer das três hipóteses, vez que, em cada caso, haveria trabalho do advogado da parte vencedora, o qual deveria ser recompensado. Todavia, este não parece ser o entendimento mais adequado.

Com efeito, no caso de julgamento totalmente improcedente, a fase executiva continuará em todos os seus termos, não havendo que se falar em desconsideração do trabalho do causídico. Ao final da demanda, cabe ao juiz avaliar todo o trabalho desempenhado, inclusive na resposta à impugnação, e, então, arbitrar os honorários devidos, os quais deverão incidir sobre eventuais bens penhorados ou quantias bloqueadas. Isto porque, aquele que deu causa ao processo executivo, em sua totalidade, foi o devedor.

Por outro lado, quando há julgamento parcialmente procedente ou procedência total, a causalidade inverte-se, passando a ser do credor. Pode ocorrer, por exemplo, deste ter demandado quantia acima da efetivamente devida por erro na planilha de cálculo. Nesta hipótese, resta claro que a insurgência do devedor tem fundamento e seu advogado deve ser remunerado.

Este também é o entendimento pacífico do Superior Tribunal de Justiça, conforme julgado abaixo:

PROCESSUAL CIVIL. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA. IMPUGNAÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. IMPROCEDÊNCIA. NÃO CABIMENTO. CORREÇÃO MONETÁRIA SUSCITADA APENAS NOS SEGUNDOS EMBARGOS. POSSIBILIDADE DE APRECIAÇÃO. MATÉRIA DE ORDEM PÚBLICA.

1. Recurso especial de GH Informações Ltda. - Na impugnação ao cumprimento de sentença, somente será fixada verba honorária se houver acolhimento, ainda que parcial, das alegações. Se a impugnação for julgada improcedente como no caso concreto, não haverá condenação em honorários advocatícios. Posição consolidada na seara do artigo 543-C do Código de Processo Civil e da Resolução STJ 8/2008, no julgamento do REsp 1134186/RS, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, Corte Especial, DJe 21/10/2011.

2. Recurso especial da Ordem dos Advogados do Brasil Seção do Rio Grande do Sul - OAB/RS - Na instância ordinária, é cediço que matéria de ordem pública - correção monetária e respectivos expurgos - pode ser postulada a qualquer tempo e conhecida de ofício, o que possibilita seja debatida apenas nos segundos embargos, por não se submeter à preclusão.

3. Foi exatamente o que ocorreu na espécie, em que o Tribunal de origem, nos segundos declaratórios, determinou a inclusão dos expurgos inflacionários.

4. Recursos especiais não providos.[7]

Tal posicionamento é aplicável a qualquer incidente em feitos executivos, inclusive à exceção de pré-executividade, porventura apresentada.


6. CUMPRIMENTO DE SENTENÇA E JUIZADOS ESPECIAIS

6.1. Compatibilização dos ritos

Ao longo dos anos nossa legislação processual, bem como a material, sofreu diversas alterações, as quais aparentemente consistiram em uma fase de amadurecimento do pensamento jurídico, na busca de um processo mais célere e efetivo. A própria instituição dos Juizados Especiais, por meio da Lei n. 9.099/95, é prova disso. Todavia, a referida justiça especializada foi criada antes da introdução da sistemática do cumprimento de sentença no codex processual civil, ou seja, quando ainda vigia a execução da sentença por meio de processo de execução autônomo com nova citação do devedor.

Diante disso, a compatibilização das alterações introduzidas pela Lei n. 11.232/05 com as disposições da Lei n. 9.099/95 exigem certo esforço interpretativo, no sentido de garantir que ambos os ritos sejam respeitados, levando em conta os diversos princípios hermenêuticos.

No que tange à execução de sentença, assim dispõe a Lei dos Juizados Especiais:

Art. 52. A execução da sentença processar-se-á no próprio Juizado, aplicando-se, no que couber, o disposto no Código de Processo Civil, com as seguintes alterações:

(...)

III - a intimação da sentença será feita, sempre que possível, na própria audiência em que for proferida. Nessa intimação, o vencido será instado a cumprir a sentença tão logo ocorra seu trânsito em julgado, e advertido dos efeitos do seu descumprimento (inciso V);

IV - não cumprida voluntariamente a sentença transitada em julgado, e tendo havido solicitação do interessado, que poderá ser verbal, proceder-se-á desde logo à execução, dispensada nova citação;

(...)

IX - o devedor poderá oferecer embargos, nos autos da execução, versando sobre:

a) falta ou nulidade da citação no processo, se ele correu à revelia;

b) manifesto excesso de execução;

c) erro de cálculo;

d) causa impeditiva, modificativa ou extintiva da obrigação, superveniente à sentença.

Da redação legal, percebe-se que o legislador, ainda em 1995, buscou introduzir o processo sincrético no âmbito dos juizados especiais, para fins de execução de sentença. No entanto, o texto da lei se mostra conflitante, em determinados pontos, com a sistemática do art. 475-J e seguintes do CPC.

De fato, prima facie, surgem logo os seguintes questionamentos: é exigível a intimação do devedor para cumprir espontaneamente o comando da sentença, para só então ter início o prazo de 15 dias previsto art. 475-J? A defesa do executado será impugnação ou embargos? Qual o prazo desta defesa e qual matéria poderá ser arguida?

Sobre o tema já existem alguns enunciados do Fórum Nacional de Juizados Especiais, os quais dirimem algumas dessas dúvidas, conforme transcrito abaixo:

ENUNCIADO 97 – O artigo 475, "J" do CPC – Lei 11.323/2005 – aplica-se aos Juizados Especiais, ainda que o valor da multa somado ao da execução ultrapasse o valor de 40 salários mínimos (aprovado no XIX Encontro – Aracaju/SE)

ENUNCIADO 105 - Caso o devedor, condenado ao pagamento de quantia certa, não o efetue no prazo de quinze dias, contados do trânsito em julgado, independentemente de nova intimação, o montante da condenação será acrescido de multa no percentual de 10% (aprovado no XIX Encontro – Aracaju/SE)

ENUNCIADO 106 - Havendo dificuldade de pagamento direto ao credor, ou resistência deste, o devedor, a fim de evitar a multa de 10%, deverá efetuar depósito perante o juízo singular de origem, ainda que os autos estejam na instância recursal (aprovado no XIX Encontro – Aracaju/SE)

ENUNCIADO 142 (ALTERA o ENUNCIADO 104): Na execução por título judicial o prazo para oferecimento de embargos será de quinze dias e fluirá da intimação da penhora. (Aprovado no XXVIII FONAJE – BA – 24 a 26 de novembro de 2010)

A aplicabilidade do art. 475-J ao rito dos Juizados Especiais não gera maiores discussões, em face da incidência subsidiária do Código de Processo Civil. Ocorre que a contagem do prazo para incidência da multa de 10% parece dispensar a prévia intimação da parte para cumprimento do comando da sentença. Isto porque o próprio art. 52, III, estabelece que a parte deve cumprir o dispositivo da decisão judicial tão logo ocorra seu trânsito em julgado.

Apesar da literalidade da lei e da clareza do Enunciado 105 do FONAJE, também é certo que os motivos ensejadores da intimação para cumprimento voluntário da sentença, conforme entendimento pacífico no STJ, também existem em sede de Juizados Especiais.

De fato, a esta justiça especializada também se aplicam as observações feitas no tópico “contagem de prazo”, pois também demandaria o acompanhamento do processo para ciência acerca da ocorrência do trânsito em julgado da decisão judicial.

Todavia, o rito especial estabelecido visa a celeridade e simplicidade do trâmite processual para causas de reduzida complexidade e baixo valor. Nesse contexto, a informalidade do rito, combinada à necessidade de comparecimento pessoal das partes, garantiria um contato direto entre as partes e ciência quanto ao comportamento da parte adversa. Portanto, estaria justificada a dispensa da intimação, sendo o início do prazo para cumprimento espontâneo da decisão decorrência automática do trânsito em julgado da sentença.

Ressalte-se, por fim, que, com relação à sentença homologatória de acordo, não cabe qualquer discussão nesse sentido, já que a mesma é irrecorrível, nos termos do art. 41 da Lei 9.099/95, ocorrendo o trânsito em julgado no exato momento da intimação das partes acerca de seu conteúdo, tendo início imediato o prazo de 15 dias do art. 475-J do CPC, salvo estipulação diversa na avença.

No tocante à discussão acerca do cabimento de impugnação ou embargos em sede de execução de sentença, deve ser aplicada à espécie o princípio da especialidade. Com efeito, o art. 52, IX, da Lei nº 9.099/95 trata de forma completa acerca da defesa do executado, não havendo que se falar em aplicação subsidiária do CPC ou de revogação, em razão do art. 475-J ser norma mais recente.

Tal entendimento é o adotado no Enunciado 142 do FONAJE, o qual parece mais adequado ao propósito da norma.

6.2. Competência para instauração do cumprimento de sentença

Questão interessante versa sobre a competência para instauração do procedimento de execução de sentença no âmbito dos Juizados Especiais, sejam os Estaduais ou os Federais, estes últimos regulados pela Lei nº 10.259/01.

Isto porque as leis específicas trazem limitações no que tange às partes que podem ajuizar ações nos Juizados Especiais, assegurando legitimidade a algumas entidades tão somente para figurar no polo passivo, mas nunca no polo ativo.

O art. 8º da Lei nº 9.099/95 prevê o seguinte:

Art. 8º Não poderão ser partes, no processo instituído por esta Lei, o incapaz, o preso, as pessoas jurídicas de direito público, as empresas públicas da União, a massa falida e o insolvente civil.

§ 1  Somente serão admitidas a propor ação perante o Juizado Especial: (Redação dada pela Lei nº 12.126, de 2009)

I - as pessoas físicas capazes, excluídos os cessionários de direito de pessoas jurídicas; (Incluído pela Lei nº 12.126, de 2009)

II - as microempresas, assim definidas pela Lei no 9.841, de 5 de outubro de 1999; (Incluído pela Lei nº 12.126, de 2009)

III - as pessoas jurídicas qualificadas como Organização da Sociedade Civil de Interesse Público, nos termos da Lei no 9.790, de 23 de março de 1999; (Incluído pela Lei nº 12.126, de 2009)

IV - as sociedades de crédito ao microempreendedor, nos termos do art. 1º da Lei n. 10.194, de 14 de fevereiro de 2001. (Incluído pela Lei nº 12.126, de 2009)

Portanto, as pessoas jurídicas que não se enquadrem como microempresas poderão figurar somente no polo passivo, lhe sendo vedada a legitimidade ativa. Ocorre que, apesar de ser incabível a reconvenção, é lícito ao réu formular pedido contraposto, nos termos do art. 31 da Lei nº 9.099/95.

Assim, caso este pedido contraposto seja julgado procedente, surge a possibilidade da parte promovida requerer a execução da decisão, o que traz a tona a questão da competência. Na mesma situação encontram-se as sociedades de economia mista de qualquer esfera e as empresas públicas não federais, no âmbito dos Juizados Estaduais, bem como a União, autarquias, fundações e empresas públicas federais, no âmbito do Juizado Especiais Federais (art. 6º da Lei nº 10.259/01).

O cerne do debate consiste em estabelecer se o demandado, ao requerer a execução da condenação referente ao julgamento procedente do pedido contraposto, passaria a ocupar o polo ativo da demanda.

Em que pese as vozes dissonantes, não há que se falar em inversão de polos e consequente ausência de competência dos Juizados Especiais, por dois motivos. Primeiro, o art. 3º, §1º, I, da Lei nº 9.099/95 e o art. 3º da Lei nº 10.259/01, estabelecem a competência dos Juizados para execução de suas sentenças, o que constitui, na visão deste pesquisador, competência funcional absoluta. De fato, a redação legal é clara e não traz limitações, parecendo inaplicáveis as restrições referentes aos que podem ocupar o polo ativo na fase de conhecimento.

Segundo, como já explicitado alhures, a nova sistemática processual instituiu um processo sincrético, no qual a execução da sentença constitui mera fase do processo, não caracterizando nova ação, dispensando, portanto, nova citação.

Assim, o simples fato do ato de provocação ser oriundo do ocupante do polo passivo não parece suficiente para retirar a competência dos Juizados Especiais, tampouco parece conflitar com as disposições acerca da legitimidade das partes. Isto porque o demandado não irá dar início a novo processo com uma ação autônoma, mas tão somente irá pugnar pelo desfecho de uma demanda já instaurada.

Sobre o tema, o Superior Tribunal de Justiça já teve a oportunidade de se manifestar, nos seguintes termos:

PROCESSO CIVIL. COMPETÊNCIA. EXECUÇÃO DE HONORÁRIOS EM FAVOR DO INSS. TÍTULO EXECUTIVO JUDICIAL FORMADO NO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL CÍVEL. FASE DE CUMPRIMENTO DA SENTENÇA NO JUIZADO.

1. Ao executar as suas próprias sentenças, o Juizado Especial Federal Cível observa regra de competência funcional absoluta. 2. A sentença proferida no Juizado Especial Federal Cível não precisa de um processo autônomo para sua efetivação, mas tão-somente que seja instaurada uma nova fase no processo já em curso. 3. A mera inauguração da fase de cumprimento de sentença por ente público federal não tem o condão de tornar incompetente o Juizado Especial Federal Cível que proferiu a decisão exequenda. 4. Impor ao ente público a obrigação de ajuizar ação autônoma perante a Justiça Federal para executar os honorários advocatícios arbitrados pelo Juizado Especial Federal Cível, parece violar a garantia constitucional da economia e celeridade processual (artigo 5º, inciso LXXVIII, da Constituição Federal). 5. Conflito conhecido para determinar a competência do Juizado Especial Federal de Santa Cruz do Sul/RS, o suscitante, para proceder à execução dos honorários advocatícios que arbitrou em prol de ente público federal.[8]

Desta feita, percebe-se, como bem colocado pelo acórdão transcrito acima, que tal entendimento vem também atender aos ditames de celeridade e economia processual, tão visados por toda sociedade.


CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme exposto acima, a execução de sentenças é um tema que evoluiu bastante nos últimos tempos, no intuito de lhe conferir celeridade e efetividade, mas as alterações legislativas apresentaram diversas lacunas, notadamente quanto ao procedimento a ser adotado, o que gerou o surgimento das diversas correntes doutrinárias e jurisprudenciais expostas acima.

Como visto, em sua grande maioria, cada entendimento apresenta argumentos fortes e razoavelmente sustentáveis, o que dificulta a pacificação dos temas referentes ao cumprimento de sentença. No entanto, buscou-se apontar, dentro das polêmicas existentes, as teses que se mostram mais adequadas ao contexto normativo e social, sempre com grande atenção ao aspecto prático.

Diante disso, percebe-se que o cumprimento de sentença é um tema que ainda permite diversas reflexões, estando muito distante de uma definição exata sobre seu procedimento.

No entanto, a solução mais perfeita das celeumas aqui tratadas passa também por uma complementação legislativa, a qual, infelizmente, sempre tende a ser mais demorada e não acompanhar as necessidades dos jurisdicionados e operadores do direito.


REFERÊNCIAS

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Notas

[1] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Primeira Turma. Processual Civil. Execução provisória. Recurso Especial 1098028 / SP. Relator Ministro Luiz Fux. Brasília, DF, 09 de fevereiro de 2010.

[2] BRASIL, Superior Tribunal de Justiça. Processual Civil. Execução provisória. Recurso Especial 1.100.658/SP. Relator Ministro Humberto Martins.

[3] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Terceira Turma. Processual Civil. Execução provisória. Agravo Regimental nos Embargos de Declaração no Recurso Especial 1229705 / PR. Relator Ministro Sidnei Beneti. Brasília, DF, 19 de abril de 2012.

[4] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Quarta Turma. Processual Civil. Cumprimento de sentença. Agravo Regimental nos Embargos de Declaração no Agravo de Instrumento 1348410 / RS. Relatora Ministra Maria Isabel Gallotti. Brasília, DF, 27 de março de 2012.

[5] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Terceira Turma. Processual Civil. Cumprimento de Sentença. Recurso Especial 1189608 / SP. Relator Ministra Nancy Andrighi. Brasília, DF, 18 de outubro de 2011.

[6] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Terceira Turma. Processual Civil. Cumprimento de Sentença. Recurso Especial 1009293 / SP. Relatora Ministra Nancy Andrighi. Brasília, DF, 06 de abril de 2010.

[7] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Segunda Turma. Processual Civil. Impugnação. Honorários Advocatícios. Recurso Especial 1269351 / RS. Relator Ministro Castro Meira. Brasília, DF, 08 de maio de 2012.

[8] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Terceira Seção. Processual Civil. Cumprimento de Sentença. Juizado Especial. Conflito de Competência 74992 / SP. Relatora Ministra Maria Thereza de Assis Moura. Brasília, DF, 04 de junho de 2009.


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ARAÚJO, Eduardo Barbosa de. A sistemática do cumprimento de sentença: peculiaridades e pontos polêmicos. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3516, 15 fev. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23726. Acesso em: 26 abr. 2024.