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Contratação de serviços de supervisão e fiscalização de obras com eficiência e celeridade

Contratação de serviços de supervisão e fiscalização de obras com eficiência e celeridade

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Apresentam-se alternativas jurídicas consistentes para a contratação dos serviços de fiscalização e supervisão de obras públicas.

1.O OBJETIVO DESTE TRABALHO

O presente estudo tem a pretensão de contribuir com alternativas jurídicas consistentes para a contratação dos serviços de fiscalização e supervisão de obras públicas.

Acredita-se que a adoção generalizada da modalidade do pregão, atualmente em voga, não é a forma mais adequada para solucionar as dificuldades sistêmicas que assolam o setor. Na busca de uma solução simplista para um problema complexo, essa medida não coloca em risco apenas a qualidade na escolha do contratado, o que já seria desastroso, mas também a sobrevivência de um setor que se sustenta, essencialmente, de mão de obra qualificada.

As soluções que se apresentam a seguir não têm o objetivo de resolver o gargalo nas obras públicas. Esse é um problema muito mais político e econômico do que jurídico.

Por outro lado, quem atua no ramo tem a consciência de que os serviços de supervisão e fiscalização de obras são essenciais para garantir a qualidade e a durabilidade dos empreendimentos. Um modelo de contratação consistente, jurídica e tecnicamente, pode dar melhor tratamento à questão da celeridade nas contratações desses serviços, sem sacrificar a garantia da qualidade.


2. A CONFIGURAÇÃO DO CENÁRIO ATUAL

Desde a edição da Lei Federal nº 8.666, em 21 de junho de 1993, estava assentada a forma de contratação dos serviços de engenharia consultiva em geral. A regra única fora esculpida na combinação dos arts. 13 e 46 da referida lei, impondo-se a contratação pelo tipo técnica e preço.[1]

Com a maturação da Lei Federal nº 10.520, de 17 de julho de 2002, contudo, uma nova vertente doutrinária e jurisprudencial desperta um setor específico da engenharia consultiva.

Falamos em despertar, porque o setor de consultoria especializado em fiscalização e supervisão de obras públicas, para o cenário das licitações, estava mesmo acomodado e adormecido.Durante muito tempo, nada se viu fazer contra os editais mal elaborados para a contratação desse tipo de serviço. Como sói acontecer, o despreparo para o bom uso do tipo de licitação técnica e preço, aliado à má intenção de alguns poucos empresários, acarretou a identificação pelo Controle de diversas licitações com exacerbada subjetividade e/ou direcionamento imoral.

Não se afirma que essa deturpação sistêmica tenha ocorrido apenas no setor da engenharia consultiva. De fato, a má utilização desses modelos criou uma espécie de estigma sobre qualquer licitação que não se regule exclusivamente pelo menor preço.

1.1. Erradicação da subjetividade

A primeira ideia que surgiu para resolver esse problemaé elogiável. É um dever moral afastar a discricionariedade de todo e qualquer processo de seleção pública, mesmo para a contratação de serviços que, essencialmente, impõem certa subjetividade no julgamento.

Ocorre que a orientação firmada, aliada a um excessivo rigor por parte dos órgãos de controle, gerou um radicalismo nãosaudável. O mal da subjetividade excessiva foi erradicado por uma também excessiva objetividade.

Em síntese, resumiram-se os processos licitatórios dos tipos“melhor técnica” e “técnica e preço” a uma avaliação da capacidade técnica dos licitantes; ou seja, uma pontuação do acervo de experiência anterior das empresas e dos profissionais. Essa solução acarretou dois efeitos colaterais: (i) gerou uma reserva ainda maior de mercado às grandes empresas, que têm maior número de acervos técnicos do que as pequenas; e (ii) colocou em descrédito o critério de seleção pela técnica, levando a crer que esse tipo de avaliação poderia ser suprido integralmente na fase de habilitação da licitação.

1.2.  A disseminação do pregão como instrumento moralizador e eficiente

A identificação das inconsistências da modelagem de contratação pelos tipos melhor técnica e técnica e preço surgiu em um momento peculiar da Administração Pública, o da “idolatria” da modalidade do pregão como a solução para todos os problemas das licitações públicas.

Inicialmente concebido como uma velha-nova ideia, o pregão foi elevado a instrumento de eficiência e moralização nas contratações públicas. É moralizador, porque incentiva a irrestrita competitividade, e eficiente, porque é muito mais célere do que todas as outras modalidades.

Esse cenário, motivado principalmente pelo atributo da celeridade, influenciou bastante a doutrina e a jurisprudência para que rapidamente se buscassemsoluções para a ampliação da aplicabilidade daquela modalidade, destinada exclusivamente para contratação de bens e serviços comuns, para quase todos os tipos de serviços de interesse da Administração Pública.

A resposta foi rápida e bastante óbvia: se a limitação para adoção do pregão é a qualificação “comum” para os bens e serviços, bastava-lhes “interpretar” que, a partir de agora, quase tudo é comum.

 


3. APLICAÇÃO DO PREGÃO AOS SERVIÇOS DE SUPERVISÃO E FISCALIZAÇÃO DE OBRAS - A INTENÇÃO POR DETRÁS DA TEORIA

Foi justamente no sentido de corrigir impropriedades encontradas em processos licitatórios do tipo técnica e preço que surgiu um interesse político, e até mesmo ético, de aplicar a modalidade pregão para os serviços de supervisão e fiscalização de obras públicas.

A fundamentação jurídica para tanto não foi nenhuma surpresa: “se é possível licitar serviços comuns de engenharia por pregão, é cabível a modalidade para serviços de supervisão e fiscalização de obras, desde que sejam comuns”.

Provavelmente, será muito difícil encontrar quem defenda, por princípio, que esses serviços possam ser considerados “comuns”, qualquer que seja a acepção dada à palavra.[2]A fiscalização e a supervisão de uma obra exigem da empresa ou profissional responsável uma qualificação técnica tão elevada quanto a dos executores do empreendimento.

Isso ocorre, especialmente,em obras licitadas e contratadas pelo regime de preço global ou empreitada integral, onde o executor tem maior liberdade na formulação de sua proposta e pode, em regra, propor alternativas de execução. É função do supervisor da obra analisar todas as alternativas e soluções propostas, assegurando à Administração a qualidade e durabilidade da obra executada.Mais ainda, é exigido dessas empresas o domínio de todas as metodologias, para diferentes especialidades da engenharia, a fim de que possam supervisionar com qualidade os serviços executados pelo empreiteiro.

Não é, portanto, uma tarefa reduzida à aplicação de manuais ou normas técnicas. Exige experiência e maturidade profissional em pé de igualdade com o executor das obras, para discussões de nível técnico que assegurem a Administração no processo decisório inerente à gestão do empreendimento.

A questão é que, de uma análise sistêmica dos editais de licitação para serviços de supervisão e fiscalização de obras, do tipo técnica e preço, as mesmas incoerências anteriormente destacadas foram identificadas: (i) direcionamento das exigências técnicas; (ii) subjetividade incompatível com a licitação pública; (iii) redução da avaliação da proposta técnica à uma pontuação dos documentos de qualificação técnica; e (iv) não raro, má-qualidade na prestação dos serviços.

Diante desse cenário, passou-se a entender que a solução para tais impropriedades seria eliminar o aspecto técnico da licitação, reduzindo a seleção das empresas e dos profissionais de supervisão e fiscalização à disputa de preços. A melhor forma encontrada para tanto foi a adoção da modalidade do pregão.

A conclusão de quem adota essa corrente não é de todo condenável: ora, se os editais são direcionados, se a avaliação técnica não possui nenhum diferencial em relação à fase de habilitação e, ainda, não representa nenhum ganho de qualidade efetiva, a solução é contratar a empresa que apresentar o menor preço.

O que nos leva a insistir em posicionamento divergente, contudo, é o fato de que essa corrente não soluciona o maior problema que enfrentamos nas contratações públicas ligadas às obras e serviços de engenharia. Com a adoção do pregão, pouco se soluciona a questão do direcionamento da licitação e da má utilização da técnica e preço, e nada é feito em relação à qualidade dos serviços contratados.


4. OPOSIÇÕES À APLICAÇÃO DA MODALIDADE PREGÃO AOS SERVIÇOS DE SUPERVISÃO E FISCALIZAÇÃO DE OBRAS

São dois os principais fundamentos que se opõem à corrente que defende a adoção da modalidade pregão para os serviços de supervisão e fiscalização de obras.

O primeiro, mencionado acima, é quanto ao fato de que essa solução não resolve o principal problema identificado nas licitações para esses serviços: a qualidade na execução. Esse problema somente pode ser resolvido na medida em que exista um empenho efetivo na seleção de profissionais e empresas qualificadas e comprometidas.

O pregão, nesse aspecto, é um fator de enfraquecimento da Administração para esse tipo de seleção.

O segundo aspecto é quanto ao cabimento jurídico dessa extensão do pregão aos serviços em exame, na medida em que a Lei de Licitações expressamente qualifica a supervisão e a fiscalização de obras como serviços técnicos profissionais especializados e, ainda, impõe o tipo de licitação técnica e preço para sua contratação, o que é incompatível com a modalidade do pregão.

1.3. Quanto ao cabimento jurídico

Não pretendemos nos opor à corrente contrária com argumentos de limitação do poder de interpretação das normas jurídicas. No Direito, é cabível a interpretação das normas jurídicas dentro de diversas perspectivas – política, moral, descritiva, histórica, etc.

Tais perspectivas não conflitam com o Estado Democrático, na medida em que, nas lições de Ronald Dworkin, o Direito quase sempre terá respostas corretas para os fatos jurídicos existentes, dos mais simples aos mais complexos, desde que: (i) admita-se que exista mais de uma resposta factível; e (ii) a resposta correta seja aquela que mais atrai o consenso.

A questão cerne que nos provoca, com o máximo respeito aos que entendem de forma diversa, é que, sob a égide da legislação vigente, a extensão da modalidade pregão para os serviços de engenharia consultiva não é factível. Essa interpretação não é cabível, porque afronta o texto legal de tal modo que chega a afastá-lo do mundo jurídico.

Nesse sentido, sim, é inadequada a interpretação da regra jurídica assentada, pois inexiste poder para o jurista afastar a vigência de lei, salvo por intermédio do poder legiferante, atribuído exclusivamente ao Poder Legislativo.[3]

4.1.1. A definição de serviço comum

A norma definiu o que deve ser entendido por “bens e serviços comuns”. São comuns os objetos “cujos padrões de desempenho e qualidade possam ser objetivamente definidos pelo edital, por meio de especificações usuais no mercado”.[4]

A definição se apresenta com extrema infelicidade, pois a existência de especificação usual não representa nenhuma característica que diferencie determinado serviço comum, de um que não o seja. Uma interpretação literal do dispositivo induz à aplicação da modalidade de forma desvinculada da sua finalidade.

Pode-se chegar à conclusão bastante simplória, por exemplo, de que todo e qualquer serviço que seja descritível com objetividade pode ser licitado por pregão, independentemente de sua complexidade – o que não é correto.

Inegavelmente, o objetivo maior do pregão é dar celeridade às aquisições públicas. Para isso, é indispensável que se abdique da complexidade procedimental, em prol da maior agilidade. Justamente por essa razão o pregão foi concebido para contratações mais simples, onde é possível afastar procedimentos mais complexos de análise do produto/serviço e do fornecedor.

Nesse sentido, citamos o seguinte escólio do Ministro Benjamin Zymler:

o objetivo da norma foi tornar viável um procedimento licitatório mais simples, para bens e serviços razoavelmente padronizados, no qual fosse possível à Administração negociar o preço com o fornecedor sem comprometimento da viabilidade da proposta. No pregão a aferição da qualidade do licitante só é procedida no final do certame e apenas em relação à proposta vencedora. O pressuposto é de que os serviços são menos especializados, razão pela qual a fase de habilitação é relativamente simples. De outra forma, a Administração poderia se ver forçada a, freqüentemente, desclassificar a proposta de menor preço, se não confirmada a capacidade técnica do fornecedor.[5]

Esse conceito demonstra a men legis[6] adotada na concepção do pregão – objeto indispensável para a interpretação das normas jurídicas.

Também é incabível a afirmação de que a expressão “serviço comum” não está relacionada à complexidade, mas sim à rotina de contratação. Quando se abdica da avaliação técnica criteriosa do licitante, essa conduta está ligada à qualidade técnica do serviço, e não à constância com que esse serviço é licitado.

Aliás, se assim o fosse, não existiria mais nenhum serviço “não comum” no mundo jurídico. Mesmo os mais complexos serviços técnicos especializados deixariam de ser assim considerados, abrindo-se mão da avaliação técnica criteriosa do executor, a partir do momento em que a Administração Pública passasse a contratá-los com certa frequência.

Projetos de engenharia, por exemplo, poderiam passar a ser licitados por pregão, na medida em que é bastante frequente a sua contratação pela Administração Pública. A jurisprudência, no entanto, é firme na inaplicabilidade dessa modalidade para a licitação de tais serviços de engenharia.[7]

Por essa razão, parece-nos que a definição de serviço comum estáintimamente ligada à complexidade do serviço objeto da contratação.

4.1.2. Qualificação legal dos serviços como de natureza técnica profissional especializada

No nosso entendimento, não existe espaço para entender que serviços de supervisão e fiscalização de obras são serviços comuns. A Lei nº 8.666/1993 traz definição expressa de que tais serviços são de natureza técnica profissional especializada:

Art. 13.  Para os fins desta Lei, consideram-se serviços técnicos profissionais especializados os trabalhos relativos a:

I - estudos técnicos, planejamentos e projetos básicos ou executivos;

II - pareceres, perícias e avaliações em geral;

III - assessorias ou consultorias técnicas e auditorias financeiras ou tributárias;

IV - fiscalização, supervisão ou gerenciamento de obras ou serviços;[8]

Ora, por certo que serviços técnicos especializados, por sua própria definição, não poderiam ser considerados comuns.

Em distinção conceitual, Hely Lopes Meirelles asseriu que serviços técnicos especializados

[...] são prestados por quem, além da habilitação técnica e profissional – exigida para os serviços técnicos profissionais em geral – aprofundou-se nos estudos, no exercício da profissão, na pesquisa científica, ou através de cursos de pós-graduação ou de estágios de aperfeiçoamento.[9]

Na mesma linha de raciocínio, em definição de singular objetividade e clareza, Marçal Justen Filho expõe:

A especialização significa a capacitação para exercício de uma atividade com habilidades que não estão disponíveis para qualquer profissional. A especialização indica uma capacitação maior que a usual e comum e produzida pelo domínio de uma área restrita, com habilidades que ultrapassam o conhecimento da média dos profissionais necessários ao desenvolvimento da atividade em questão. O especialista é aquele prestador de serviço técnico profissional que dispõe de uma capacitação diferenciada, permitindo-lhe solucionar problemas e dificuldades complexas.[10]

Desse modo, e em linha de coerência com o exposto, não há como entender que serviços dessa natureza sejam considerados comuns. Se a lei definiu que se tratam de serviços técnicos profissionais especializados, não há margem para interpretação contrária.

4.1.3. Tipo de licitação, definido por lei, incompatível com a modalidade pregão

Outro aspecto legal que evidencia a inaplicabilidade da modalidade pregão para a contratação dos serviços de supervisão e fiscalização de obras é a obrigatoriedade de adoção do tipo técnica e preço, estabelecida no art. 46 da Lei nº 8.666/1993. Esse tipo de licitação é incompatível com a modalidade pregão, o que afasta sua aplicabilidade.

A interpretação conjunta desse dispositivo com o art. 13 da Lei nº 8.666/1993, portanto, não apenas afasta o cabimento da modalidade pregão para os serviços de engenharia consultiva, na medida em que os define como não comuns.

Nem mesmo há que se aventar a possibilidade de derrogação por lei posterior, tendo em vista que o escopo da Lei nº 10.520/2002 não adentrou na especificidade dos serviços de engenharia consultiva, ao passo que a Lei nº 8.666/1993 o fez, tornando-se lei especial. Nesse caso, somente caberia derrogação expressa, e não presumida.

1.4.  Inviabilidade técnica da modalidade

Sob o aspecto técnico, as oposições não se restringem à modalidade pregão, mas ao critério de seleção do executor dos serviços exclusivamente voltado ao menor preço.

A licitação direcionada ao menor preço, mesmo que haja robustez nas exigências de habilitação técnica dos licitantes, não assegura para a Administração a contratação dos melhores profissionais ou empresas – condição essencial para o sucesso quando se trata de engenharia consultiva.

Notem que o argumento aqui posto não pretende se reduzir à interpretação literal ou restrita da lei, mas se expande para as razões técnicas que demonstram a inviabilidade do critério do menor preço para contratações de serviços de consultoria em engenharia. Por que a lei opta pelo tipo técnica e preço para tais serviços? Essa não é uma pergunta que se responde com silogismos.

O fato é que, neste segmento, é essencial para o sucesso que o executor tenha o poder de fazer ingerências de caráter técnico nas soluções que venham a ser adotadas. Não basta garantir que este seja capaz de reproduzir manuais e normas técnicas, mas é necessário avaliar a qualificação do executor para contribuir com o desenvolvimento dos serviços, definir rumos, propor alternativas.

Nos serviços de supervisão e fiscalização, por exemplo, o executor tem de avaliar propostas de alterações de projetos, propor soluções alternativas e até mesmo elaborar projetos complementares, caso necessário. Esse não é um trabalho reprodutor de manuais, limitado a estes, mas baseado em norma técnicas.

Por essa razão, a avaliação técnica das propostas é essencial para garantir uma boa contratação.

Em setembro de 2011, a InternationalFederation of Consulting Engineers – FIDIC[11] lançou estudo específico a respeito da forma de seleção mais adequada para contratação de serviços de consultoria em engenharia.[12]

No mencionado estudo – paradigma mundial do setor – foram apontadas diversas desvantagens na adoção da contratação de serviços de consultoria exclusivamente pelo critério de preço.Os argumentos gerais apresentados pela FIDIC como desvantagens do modelo são que:

a) os resultados obtidos em estudos independentes comprovam que os resultados auferidos com base nesse tipo de contratação tendem a ser bastante inferiores;

b) na maioria das vezes, o menor valor não representará o melhor executor para o serviço nem satisfará o projeto plenamente; e

c) o critério de preços desencoraja consultores de maior qualificação, com diferentes experiências e conhecimentos aprofundados.

A conclusão geral do estudo é de ser considerada em destaque:

PIPs (SELECTION PRATICES INCORPORATING PRICE) might save money at the beginning but will, without doubt, affect the design’s quality and the overall time and cost of construction and/or operation of the project. The initial cost of the design is outweighed by the final project performance that results from good design solutions.[13]

Ou seja, não apenas se apontou que a contratação de serviços de consultoria pelo critério de preço poderá representar um custo bem maior no futuro, com maus resultados, como se defendeu que a despesa maior inicial com uma boa contratação significará uma economia no final do empreendimento.

Tal conclusão não nos parece distante da realidade vivenciada pela Administração Pública brasileira nos últimos anos. Muitos empreendimentos têm saído pelo dobro do custo inicial em decorrência de falhas de projeto, falhas na supervisão das obras, etc. Um exemplo disso são as obras de transposição do rio São Francisco, que, por problemas de projetos e supervisão, tiveram diversas paralisações e, em grande parte, tiveram que ser relicitadas pelo Governo Federal.[14]

Dentre os aspectos específicos que a FIDIC aponta como desvantagem para o resultado da contratação pelo critério de preço, vale destacar os seguintes:

a)  valor reduzido representa uma reengenharia na execução dos serviços. Uma contratação de qualidade necessita de tempo adequado, o que certamente é sacrificado quando a empresa tem que reduzir seus custos significativamente;

b) valor reduzido representa utilização de profissionais de menor qualidade – a consultoria é basicamente representada por mão de obra. Há somente umamaneirade reduzir preços nesse tipo de serviço: diminuiros valores pagos aos trabalhadores. Profissionais de alta qualificação não aceitam trabalhar por baixos salários;

c)  o critério de menor preço afeta o desenvolvimento do País e do setor – as contratações pela disputa de preços forçam as empresas a enxugar seus custos, o que significa menor investimento em capacitação, pesquisas, novas tecnologias, etc. Ao longo prazo, as empresas do setor se tornam obsoletas e o mercado fica inapto a corresponder ao desenvolvimento do País;

d)  o domínio das melhores técnicas de mercado resulta em maior economia para o Contratante. A adoção de novas tecnologias e de técnicas mais apuradas, muitas vezes, representa maior economia para o momento da construção do empreendimento;e

e) projeto incompleto e inadequado e falhas na documentação são os maiores contribuintes para derrapagens de tempo. Além disso, a adoção de consultores menos qualificados representará a falta de experiência e know-how para lidar com os problemas que surgirão a partir do desenho inadequado.

Nesse sentido, parece-nos que a interpretação de que as licitações de consultoria de engenharia determinam o exame técnico das propostas não apenas se configura como a mais aderente à literalidade da lei, mas também à realidade dos fatos que a norma regula. Não se trata de tecnicismo puro.


5. DUAS SOLUÇÕES PARA GARANTIR A QUALIDADE E A EFICIÊNCIA

A primeira solução que se apresenta é, talvez, a mais óbvia, mas também a mais complexa. É necessário conceber regras para uma licitaçãolegítima, por técnica e preço, que atenda as exigências da jurisprudência do Controle e, mais ainda, que garanta a efetividade.

A equação do maior tempo gasto na realização do processo licitatório torna-se vantajosa em face da maior eficiência na execução dos serviços. Deve-se ter em mente o tempo gasto na conclusão do empreendimento, e não das contratações necessárias para a sua execução.

A segunda solução é a utilização, quando cabível, da modalidade mais em voga no cenário das licitações: o Regime Diferenciado de Contratações – RDC.

O RDC, além de trazer regras que tornam o processo mais célere e eficiente, permite que a Administração adote regras e procedimentos que garantem uma avaliação criteriosa das propostas técnicas, sem perda de muito tempo.

É claro que o âmbito deste trabalho não nos permite exaurir a matéria que as duas soluções acima proporcionam. No sentido de contribuir com os profissionais dedicados ao tema, contudo, especialmente aqueles encarregados da dura missão de concretizar os programas governamentais de desenvolvimento, apresentamos, a seguir, os mais importantes aspectos que, no nosso entendimento, podem contribuir significativamente para o sucesso dessa empreitada.

1.5. Utilização do tipo técnica e preço – é possível uma avaliação técnica do licitante, totalmente objetiva?

A redação da Lei de Licitações não contribui com o tipo de licitação técnica e preço. O art. 46, §1º, inciso I, que trata desse tipo de licitação, estabelece que para o julgamento das propostas técnicas os critérios devem ser “definidos com clareza e objetividade no instrumento convocatório”.

Do mesmo modo, os artigos 44 e 45 da Lei estabelecem expressamente a necessidade do critério objetivo para julgamento das propostas.

A preocupação do legislador foi tamanha com a obrigatoriedade do critério objetivo que até mesmo quando se trata da possibilidade de avaliação das metodologias de execução, para obras complexas e de grande vulto, está inserida a necessidade de critérios objetivos de julgamento.[15]

Nesse sentido, o grande vilão das licitações pelo tipo técnica e preço tem sido a necessidade de definição de critérios objetivos para o julgamento das propostas.

Mesmo que ainda exista boa vontade e simpatia com esse tipo de licitação, não há como fugir desse importante dilema: como estabelecer critério objetivos para o julgamento de propostas eminentemente técnicas, onde o que se pretende avaliar é a melhor aptidão dos licitantes para a execução de determinado objeto? Como julgar quem é melhor sem o mínimo de subjetividade na escolha?

A Lei define os critérios de avaliação das propostas técnicas da seguinte maneira: (i) capacitação e a experiência do proponente; (ii) qualidade técnica da proposta, compreendendo metodologia, organização, tecnologias e recursos materiais a serem utilizados nos trabalhos; e (iii) qualificação das equipes técnicas a serem mobilizadas para a sua execução.[16]

Dois problemas decorrem dessa definição.

5.1.1. Avaliação de proposta técnica não é repetição da qualificação técnica prevista na fase de habilitação

O primeiro problema é quanto à capacitação e experiência do proponente e das equipes técnicas a serem mobilizadas.

Em muito se confunde esse critério de avaliação como uma espécie de repetição da qualificação técnica, ou como uma qualificação técnica mais rigorosa. Ou seja, faz-se uma avaliação da qualificação técnica da empresa e dos profissionais sem as limitações inseridas no art. 30, tais como número mínimo de atestados, limitações de tempo, de espaço, etc.

A repetição torna um tanto inútil a avaliação da proposta técnica no certame, pois a avaliação de atestados de experiência anterior já está superada na fase de habilitação.

Já uma exigência de atestados de experiência anterior pode contribuir com a avaliação da proposta técnica sim. Por exemplo, pontuar uma experiência mais próxima do que 50% do quantitativo exigido na habilitação ou até mesmo comprovações de experiência anterior em condições de prazo, duração e localidade podem ser determinantes na qualidade técnica do licitante para executar o que se pretende executar.

Por exemplo, para a contratação dedeterminados serviços de longa duração, o próprio TCU tem admitido que se estabeleçam exigências de atestados de experiência anterior com limitações de tempo mínimo de duração, como requisito de habilitação[17] e pontuação[18].

O que não pode ocorrer nesse tipo de avaliação é que se estabeleçam exigências de comprovação de experiência anterior em condições excessivamente rigorosas e sem nenhum amparo técnico razoável. Isso dá origem a critérios subjetivos antijurídicos, na medida em que ofendem o princípio da busca pela proposta mais vantajosa – o que defendemos ser o imponderável axioma das contratações públicas.

5.1.2. Avaliação da qualidade técnica da proposta com critérios lacunosos de julgamento

A avaliação da qualidade técnica da proposta, muitas vezes, representa outro grave problema nas licitações do tipo técnica e preço.

Os critérios de avaliação da proposta devem ser ligados ao objeto em licitação. Assim, comumente avalia-se o conhecimento dos objetivos da Administração por parte do licitante, o conhecimento da região e do local onde serão executados os serviços por meio de um memorial descritivo.

O fato é que quando se avalia esse tipo de conhecimento, especialmente por meio de memorial descritivo ou outras formas textuais de exposição de conhecimento, é inevitável a subjetividade. Note-se que a pontuação desse tipo de conhecimento é realizada por notas estabelecidas previamente pelo edital, conforme critérios também previamente estabelecidos pelo edital – tudo a fim de afastar a subjetividade do julgamento. Exemplo:

a) estabelece-se o objeto da avaliação na proposta – “tecnologias empregadas”;

b)  estabelece-se o critério de julgamento – “informações e análises completas sobre o tema, com abordagem coerente e objetiva, padrão de apresentação adequado”; e

c) estabelece-se a pontuação – “zero para quem não atender o quesito, 5 para quem atender parcialmente o quesito e 10 para quem atender plenamente o quesito”.

Não afirmamos que os critérios definidos acima estão totalmente equivocados. Há que se reconhecer, no entanto, que tanto os critérios de julgamento acabam ficando muito vagos, como a pontuação estabelecida se ampara em conceitos onde a subjetividade é inafastável.

Por exemplo, no momento de formular uma proposta técnica com base no critério acima desenvolvido, o que representaria uma informação completa, com abordagem coerente e objetiva sobre as tecnologias empregadas em um serviço de engenharia consultiva? O que representaria “atender parcialmente” esse critério?

Assim, não há como negar razão ao Controle quando questiona a subjetividade em uma licitação do tipo técnica e preço, especialmente, considerando o fato de que, em um certame acirrado, a pontuação parcial em apenas um quesito pode significar a vitória de uma empresa ou de outra.

A experiência jurídica confirma que a utilização de conceitos vagos, lacunosos, na norma, acarreta insegurança jurídica, pois abre espaço irrestrito para interpretações diversas para casos semelhantes. Essa insegurança jurídica dá ensejo à iniquidade no julgamento – o que não é desejável em uma licitação pública.

5.1.3. Subjetividade e motivação – uma solução para a legitimidade do procedimento

Uma solução viável para preservar a legitimidade desse tipo de julgamento não pode estar voltada exclusivamente para a definição dos critérios de avaliação das propostas técnicas.

A uma, porque é inevitável a subjetividade em um julgamento de proposta técnica. Como demonstramos, pretender a objetividade estrita nesse tipo de licitação corrompe-o a uma mera repetição da qualificação técnica. Pior, com a inserção de critérios de avaliação que naquela etapa seriam considerados abusivos, porquanto desnecessários.

A duas, porque, nesse tipo de licitação, é desejável alguma subjetividade por parte da Administração Pública, a fim de que esta possa efetivamente selecionar aquela empresa que tem maior qualidade técnica para a execução dos serviços ou da obra pretendida.[19] Ora, se o legislador abre espaço para considerar no julgamento do certame a proposta técnica dos licitantes, é óbvio que lhe parece importante considerar esse elemento de forma expressiva no certame – não meramente protocolar.

Assim, critérios como “melhor abordagem”, “utilização de tecnologias mais adequadas”, “emprego de metodologia mais eficiente de execução” devem ser avaliados pela Administração no certame, por mais subjetividade que tais critérios possam implicar no julgamento.

A solução que identificamos, portanto, deve abrangera definição dos critérios de julgamento, de modo a torná-los razoáveis, mas também preocupar-se com a definição razoável e adequada dos julgadores e da forma de julgamento.

A subjetividade no julgamento desse tipo de licitação somenteécontrolável na medida em que se impõe que a avaliação das propostas seja realizada por equipe técnica também especializada e que cada pontuação seja devidamente motivadano processo.

Ao contrário do que muitos pensam, o preenchimento de tabelas com pontuações pré-definidas não soluciona a subjetividade excessiva na licitação. Na verdade, a impulsiona, na medida em que a comissão não se obriga a justificar porque uma empresa atingiu cinquenta por cento da questão, ao passo que a outra atingiu cem por cento.

A motivação do ato administrativo é importante porque é o único aspecto controlável, de modo que, exigindo da comissão um julgamento técnico e motivado, todas as partes do processo ficarão confortáveis. Os licitantes saberão os motivos das suas notas e das notas dos concorrentes, e, assim, poderão se insurgir contra o resultado de maneira transparente.

A qualificação dos membros da comissão que procederá com o julgamento das propostas também é importante, poisassim será possível atribuir as notas com base técnica, sem riscos de futuros questionamentos por parte dos órgãos de controle.

Por fim, os órgãos de controle ficam mais balizados na análise do processo, pois dali já podem avaliar se a licitação foi julgada com critérios técnicos razoáveis ou não.

Nesse sentido, defendemos que a expressão legal mais correta não seria “critérios objetivos”, pois essa exigência é irreal. No intuito de dar maior segurança jurídica aos gestores responsáveis pela condução de processos licitatórios, o ideal seria impor que os editais de licitação do tipo técnica e preço estabeleçam a obrigatoriedade de que “as propostas técnicas sejam avaliadas por critérios técnicos vinculados ao objeto do certame, devidamente justificados”.

Em complemento, seria louvável que o edital estabelecesse a necessidade de que a “pontuação técnica atribuída nas propostas dos licitantes, deve ser acompanhada da motivação expressa pela equipe avaliadora”.

5.1.4. Definindo critérios de pontuação técnica mais adequados

Embora a redação da Lei de Licitações não tenha sido muito precisa, é verdade que o art. 46, §1º, inciso I, destaca importantes aspectos a serem considerados no julgamento das propostas técnicas – tornando o procedimento mais transparente.

Esse dispositivo estabelece que a avaliação das propostas técnicas poderá conter critérios que considerem “a capacitação e a experiência da proponente, a qualidade técnica da proposta e a qualificação das equipes técnicas a serem mobilizadas para sua execução”.

A capacitação e a experiência da proponente e a qualificação de suas equipes técnicas não se confunde com os requisitos de habilitação para o certame, por mais que a redação induza a esse entendimento.

É que como a habilitação é um requisito eliminatório, a própria Constituição e a lei adotaram postura mais rigorosa quanto aos limites dessas exigências. Já no julgamento da proposta técnica, como se trata de uma etapa classificatória e dentro de um contexto de avaliação mais criterioso, é possível que a Administração estabeleça requisitos de avaliação mais robustos, desde que tenham aderência ao objeto licitado e representem, efetivamente, um ganho de eficiência para o contrato.

Nesse âmbito de avaliação, é possível pontuar, por exemplo, tempo de experiência e quantidade de projetos semelhantes já executados pelo proponente. Qualificações profissionais, como títulos de especialização, também podem ser avaliados na pontuação técnica.

É no terceiro critério sugerido pelo legislador, contudo, que reside a maior possibilidade de ganho na avaliação das propostas técnicas. Note-se que dispõe a lei sobre avaliação da qualidade da proposta técnica compreendendo “metodologia, organização, tecnologias empregadas e recursos materiais a serem utilizados nos trabalhos”.

Neste ponto, além de se poder acrescentar grande ganho de qualidade na contratação, a Administração terá mais facilidade para estabelecer critérios mais objetos de avaliação. Por exemplo, é possível que se estabeleça como critério de pontuação a utilização de tecnologias que impliquem em maior durabilidade, menor consumo de energia ou de outros recursos naturais. Recursos materiais que utilizem insumos recicláveis ou que permitam algum outro tipo de aproveitamento.

Todos esses critérios são avaliados de forma bastante objetiva e tem efeito direto na qualidade do licitante e do produto ou serviço por ele ofertado.

1.6. A utilização do Regime Diferenciado de Contratações – maior liberdade para definição de critérios de seleção dos licitantes

Com o advento da Lei Federal nº 12.462, de 04 de agosto de 2011, foi instituído o Regime Diferenciado de Contratações Públicas, com foco inicial nos grandes eventos esportivos que serão sediados no Brasil. Posteriormente, esse regime foi ampliado para as obras do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC, de iniciativa do Governo Federal.[20]

Não é foco deste trabalho uma explanação mais detalhada sobre as características desse regime, mas é cabível que apontemos algumas características especificamente voltadas para o nosso objetivo – tornar mais eficiente a forma de contratação de serviços de supervisão e fiscalização de obras públicas.

5.2.1. Redução de tempo na realização do procedimento – inversão de fases e unificação da fase recursal

Uma grande desvantagem do tipo de licitação técnica e preço é a necessidade de maior tempo para a realização dos julgamentos. Há que se fazer um exame criterioso das propostas técnicas das empresas, além das fases de habilitação e de julgamento do preço.

Com o RDC, a unificação da fase recursal é um elemento que dá maior celeridade ao processo licitatório, pois, especialmente no tipo técnica e preço, elimina a perda de prazos com duas fases recursais desnecessárias, que podem ser superadas ao final do procedimento.[21]

A unificação da fase recursal dá considerável ganho de celeridade para o processo.

5.2.2. Maior aderência às regras do setor privado

O RDC permite a aplicação subsidiária da Lei Federal nº 8.666/1993 e traz em sua redação importantes menções às regras do setor privado, que podem contribuir substancialmente para a melhoria na seleção do contratado.

Um exemplo disso é a expressa menção do art. 4º, onde se estabelece como diretriz do procedimento “condições de aquisição, de seguros e de pagamento compatíveis com as do setor privado, inclusive mediante pagamento de remuneração variável conforme desempenho”.

5.2.2.1. Condições de garantia como critério de seleção de qualidade

As regras de seguros e garantias no setor privado são muito mais rigorosas do que as estabelecidas na Lei Federal nº 8.666/1993.Por exemplo, no setor privado, normalmente se exige uma garantia maior do que 5 a 10% do valor do contrato – o que seria vedado pelo art. 56, §2º, da Lei de Licitações.

Essa permissibilidade, além de dar maior segurança quanto à execução do objeto licitado, é um excelente parâmetro de avaliação das licitantes. Notem que, para obter garantias em patamares de 20%, chegando a até 100% do valor do contrato, a empresa licitante terá que obter uma reputação irretocável no mercado, pois o risco financeiro da operação de seguro será bem maior para a própria seguradora.

Assim, o simples fato de a empresa apresentar uma garantia de execução em patamar mais elevado já servirá como excelente demonstração de que se trata de uma empresa séria e de qualidade.

5.2.2.2. Pagamento variável conforme o desempenho da contratada

Dispõe o art.10 do RDC que nas contratações de obras e serviços de engenharia “poderá ser estabelecida remuneração variável vinculada ao desempenho da contratada, com base em metas, padrões de qualidade, critérios de sustentabilidade ambiental e prazo de entrega”.

Essa regra permite que a Administração incentive a qualidade na prestação dos serviços, inclusive com a previsão de bonificações, ao mesmo tempo em que desestimula a má execução, com possibilidade de retenções e glosas de valores a depender do desempenho do contratado.

5.2.3.Possibilidade de julgamento de propostas alternativas no tipo técnica e preço

Uma inovação relevante do RDC é a permissão de que os licitantes apresentem propostas com metodologias alternativas de execução.

Dispõe o art. 20, §1º, inciso II, que o tipo técnica e preço será utilizado nos projetos e serviços que“possam ser executados com diferentes metodologias ou tecnologias de domínio restrito no mercado, pontuando-se as vantagens e qualidades que eventualmente forem oferecidas para cada produto ou solução”.

Ou seja, é possível que se avalie diferentes soluções técnicas no mesmo certame, pontuando-se cada vantagem aferida. Essa avaliação é essencial ao processo de seleção por técnica e preço, pois é o critério decisivo para selecionar o melhor licitante, dentro da necessidade da Administração.

Será possível alcançar, inclusive, alternativas de eficiência e economia não pensadas pela Administração na concepção inicial do objeto.


6.APONTAMENTOS FINAIS

É uma convicção do autor que o pregão não é a modalidade adequada para a contratação de serviços de engenharia consultiva.

Esse setor é peculiarmente sensível ao preço da contratação; sensibilidade esta totalmente voltada para a qualidade na execução dos serviços.Isso não decorre, contudo, da ganância dos empresários do ramo. Decorre que os serviços de consultoria estão 99% atrelados ao custo da mão de obra.

O custo de mão de obra qualificada é bem mais caro do que o custo da mão de obra não qualificada.Além disso, a mão de obra é um custo de volatilidade influenciado pelo aquecimento ou desaquecimento do mercado.

Por essa razão, entendemos que a avaliação da qualidade técnica prestigia aquelas empresas que têm por tradição e objetivo a prestação de serviços de qualidade, com emprego de mão de obra qualificada, investimento em pesquisas em novas tecnologias e metodologias.

Dentro desse prisma, o tipo técnica e preço é o mais adequado para seleção desses serviços, garantindo não apenas a qualidade nos serviços, mas a continuidade e comprometimento do setor de consultoria em engenharia.

A sistemática desse tipo de licitação, se bem empregada, prestigia a experiência e, principalmente, o domínio da técnica pelos participantes. A disputa da licitação guiada por esse critério não abandona totalmente o fator preço, mas se inclina preponderantemente pela capacitação dos licitantes.[22]

É inegável que a competição, nesse ambiente, atinge um número menor de participantes. Mas a ponderação entre a busca pelo menor preço e pela qualidade em determinados tipos de serviços é um ato essencialmente político, que cabe apenas ao legislador.

Não se nega que este trabalho é de cunho pouco acadêmico. Também não é de todo impessoal. É fruto, soberanamente, da experiência profissional do autor, como advogado atuante no setor, e contaminado, sim, pelos anseios dos comprometidos empresários que trabalham pelo desenvolvimento do País.

Não raro temos sido chamados para auxiliar no saneamento de sucessivos fracassos de projetos – que têm sua origem em licitações mal formuladas – com sérios apontamentos de prejuízo ao erário.

A oportunidade que o cenário mundial dá ao Brasil neste momento não pode ser desperdiçada com atropelos. O desenvolvimento nacional não pode ser conduzido pela pressa, pelo amadorismo nem pela visão de curto prazo.


Notas

[1]BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 22 jun. 1993.

Art. 13.  Para os fins desta Lei, consideram-se serviços técnicos profissionais especializados os trabalhos relativos a:

I - estudos técnicos, planejamentos e projetos básicos ou executivos;

II - pareceres, perícias e avaliações em geral;

III - assessorias ou consultorias técnicas e auditorias financeiras;

III - assessorias ou consultorias técnicas e auditorias financeiras ou tributárias;

IV - fiscalização, supervisão ou gerenciamento de obras ou serviços;

V - patrocínio ou defesa de causas judiciais ou administrativas;

VI - treinamento e aperfeiçoamento de pessoal;

VII - restauração de obras de arte e bens de valor histórico.

[...]

Art. 46.  Os tipos de licitação "melhor técnica" ou "técnica e preço" serão utilizados exclusivamente para serviços de natureza predominantemente intelectual, em especial na elaboração de projetos, cálculos, fiscalização, supervisão e gerenciamento e de engenharia consultiva em geral e, em particular, para a elaboração de estudos técnicos preliminares e projetos básicos e executivos, ressalvado o disposto no § 4º do artigo anterior.

[2] Não é à toaque, embora se diga que é material pacificado, diversos acórdãos do TCU ainda divergem a adoção do pregão de forma generalizada aos serviços de supervisão e fiscalização de obras.

[3] Nesse sentido, cumpre destacar a lição do saudoso mestre Carlos Maximiliano, em :Em geral, a função do juiz, quanto aos textos, é dilatar, completa e compreender, porém não alterar, corrigir, substituir. Pode melhorar o dispositivo, graças à interpretação larga e hábil; porém não – negar a lei, decidir o contrário do que a mesma estabelece. A jurisprudência desenvolve e aperfeiçoa o Direito, porém, como que inconscientemente, com o intuito de o compreender e bem aplicar. Não cria, reconhece o que existe, não formula, descobre e revela o preceito em vigor e adaptável à espécie. Examina o código perquirindo das circunstâncias culturais e psicológicas em que ele surgiu e se desenvolveu o seu espírito; faz a crítica dos dispositivos em face da ética e das sociais, interpreta a regra com a preocupação de fazer prevalecer a justiça ideal (richtiges Recht), porém tudo procura achar e resolver com a lei, jamais com a intenção descoberta de agir por conta própria, proeter ou contra legem. (MAXIMILIANO, Carlos. Hermenêutica e Aplicação do Direito. Rio de Janeiro: Forense, 1994, p. 80. Grifos não constam do original).

[4]BRASIL. Lei nº 10.520, de 17 de julho de 2002.Institui, no âmbito da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, nos termos do art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, modalidade de licitação denominada pregão, para aquisição de bens e serviços comuns, e dá outras providências. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil, 18 jul. 2002, retificado em 30 jul. 2002. Art. 1º, parágrafo único.

[5] BRASIL. Tribunal de Contas da União. Processo TC nº 003.709/2002-4. Decisão nº 557/2002 –Plenário Relator: Ministro Benjamin Zymler. Brasília, 22 de maio de 2002. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 07 jun. 2002.

[6]Mens legis é um brocardo latino que se refere ao “espírito da lei”, conceito que coloca a norma como ente autônomo e independente da vontade do legislador. Não se busca o que pretendeu o legislador ao elaborar a norma, mas sim o seu alcance diante da realidade e das necessidades atuais da sociedade.

[7] BRASIL. Tribunal de Contas da União. Processo TC nº 014.017/2012-1. Acórdão nº 2760/2012–Plenário. Relatora: Ministra Ana Arraes. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 10 out. 2012.

[8]BRASIL. Lei de Licitações e Contratos Administrativos e outras normas pertinentes.Organização dos textos e índice por J. U. JACOBY FERNANDES. 13. ed. amp., rev. e atual. Belo Horizonte: Fórum, 2012.

[9] MEIRELES, Hely Lopes.  Curso de Direito Administrativo. 32. ed. São Paulo: Malheiros, 2006, p. 257.

[10] JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos. São Paulo: Dialética, 2012, p. 200. Grifos não constam do original.

[11] Fundada em 1913, a FIDIC é incumbida de promover e implementar os objetivos estratégicos da indústria de consultoria de engenharia, em nome de suas associações-membros, e difundir informações e recursos de interesse para os seus membros. Hoje, a associação FIDIC cobre mais de 80 países.

[12] Denominado QualityBasedConsultantSelectionGuide.

[13] Em português: “PIPs pode economizar dinheiro no início, mas, sem dúvida, afetam a qualidade do design e o tempo global e custo de construção e/ou operação do projeto. O custo inicial do projeto é superado pelo desempenho do projeto final, que resulta de um bom desenho de soluções.”

[14] Conforme nota do próprio Ministério da Integração Nacional, essa obra passou de R$ 4,6 bilhões para R$ 8,2 bilhões, em números de 2012:

http://www.integracao.gov.br/visualizar-noticias;jsessionid=8e8068c766b277c1cbd254520825?p_p_id=620_INSTANCE_7Q0k&p_p_lifecycle=0&p_p_state=maximized&p_p_mode=view&_620_INSTANCE_7Q0k_struts_action=%2Fjournal_mi%2Fview&_620_INSTANCE_7Q0k_groupId=10157&_620_INSTANCE_7Q0k_articleId=141041&_620_INSTANCE_7Q0k_version=1.0

[15]BRASIL. Lei nº 8.666, de 21 de junho de 1993. Regulamenta o art. 37, inciso XXI, da Constituição Federal, institui normas para licitações e contratos da Administração Pública e dá outras providências. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil, Poder Executivo, Brasília, DF, 22 jun. 1993. Art. 30.  A documentação relativa à qualificação técnica limitar-se-á a:

[...]

§ 8º  No caso de obras, serviços e compras de grande vulto, de alta complexidade técnica, poderá a Administração exigir dos licitantes a metodologia de execução, cuja avaliação, para efeito de sua aceitação ou não, antecederá sempre à análise dos preços e será efetuada exclusivamente por critérios objetivos.

[16]Art. 46.  Os tipos de licitação "melhor técnica" ou "técnica e preço" serão utilizados exclusivamente para serviços de natureza predominantemente intelectual, em especial na elaboração de projetos, cálculos, fiscalização, supervisão e gerenciamento e de engenharia consultiva em geral e, em particular, para a elaboração de estudos técnicos preliminares e projetos básicos e executivos, ressalvado o disposto no § 4º do artigo anterior. (Redação dada pela Lei nº 8.883, de 1994)

§ 1º  Nas licitações do tipo "melhor técnica" será adotado o seguinte procedimento claramente explicitado no instrumento convocatório, o qual fixará o preço máximo que a Administração se propõe a pagar:

I - serão abertos os envelopes contendo as propostas técnicas exclusivamente dos licitantes previamente qualificados e feita então a avaliação e classificação destas propostas de acordo com os critérios pertinentes e adequados ao objeto licitado, definidos com clareza e objetividade no instrumento convocatório e que considerem a capacitação e a experiência do proponente, a qualidade técnica da proposta, compreendendo metodologia, organização, tecnologias e recursos materiais a serem utilizados nos trabalhos, e a qualificação das equipes técnicas a serem mobilizadas para a sua execução;

[17]BRASIL. Tribunal de Contas da União. Processo TC nº 019.549/2010-5, Acórdão nº 2939/2010 – Plenário. Relator: Ministro Aroldo Cedraz. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF,03 nov. 2010.

[18]BRASIL. Tribunal de Contas da União. Processo TC nº 010.632/2011-5. Acórdão nº 1288/2011 – Plenário. Relator:Ministro José Múcio Monteiro. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF,18 maio 2011.

[19]A subjetividade inerente ao tipo técnica e preço, aliás, já vem sendo reconhecida pelo Tribunal de Contas da União em alguns julgados. (TCU. Acórdão nº. 1542/2012-Plenário. Processo TC nº 037.751/2011-5. relatpr: Min. Valmir Campelo).

[20]BRASIL. Lei nº 12.722, de 3 de outubro de 2012.Altera as Leis nos 10.836, de 9 de janeiro de 2004, 12.462, de 4 de agosto de 2011, e 11.977, de 7 de julho de 2009; dispõe sobre o apoio financeiro da União aos Municípios e ao Distrito Federal para ampliação da oferta da educação infantil; e dá outras providências.Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 4 out. 2012.

[21]BRASIL. Lei nº 12.462, de 4 de agosto de 2011. Institui o Regime Diferenciado de Contratações Públicas – RDC. Diário Oficial da União [da] República Federativa do Brasil, Brasília, DF, 05 ago. 2011.

Art. 27. Salvo no caso de inversão de fases, o procedimento licitatório terá uma fase recursal única, que se seguirá à habilitação do vencedor.

Parágrafo único. Na fase recursal, serão analisados os recursos referentes ao julgamento das propostas ou lances e à habilitação do vencedor.

[22] Fala-se capacitação, porque é importante a distinção com o conceito de capacidade técnica. No âmbito da capacitação, a capacidade técnica é apenas um dos elementos de avaliação. A capacitação abrange, além disso, características únicas de cada licitante. Quando se fala em capacitação, é possível que se avalie, por exemplo, determinados certificados de aprimoramento, emprego de padronizações do processo produtivo e outros fatores que demonstrem que o licitante, além da experiência anterior, possui um bom domínio da solução buscada.


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Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

COSTA JÚNIOR, Álvaro Luiz Miranda. Contratação de serviços de supervisão e fiscalização de obras com eficiência e celeridade. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3704, 22 ago. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/25155. Acesso em: 25 abr. 2024.