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Considerações sobre as diversas modalidades de inquéritos existentes na legislação pátria

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Apesar da utilização da nomenclatura comum de "inquérito", tais procedimentos possuem, por diversas vezes, finalidades, características e naturezas jurídicas completamente diversas.

Um tema de importante relevância jurídica refere-se à distinção das diversas modalidades de inquéritos existentes na legislação pátria. Apesar da utilização da nomenclatura comum de "inquérito", tais procedimentos possuem, por diversas vezes, finalidades, características e naturezas jurídicas completamente diversas, conforme poderá ser observado a seguir. Por exemplo, antes da publicação e da entrada em vigor da nova Lei de Falências (Lei nº 11.101/05), existia a figura exótica e inusitada do "inquérito judicial", presidido pela autoridade judicial, que se encontrava previsto no Decreto-Lei nº 7.661, de 21 de junho de 1945 (antiga Lei de Falências), que assim dispunha sobre o tema, in verbis: [01]

"Art. 103. Nas vinte e quatro horas seguintes ao vencimento do dobro do prazo marcado pelo juiz para os credores declararem os seus créditos (artigo 14, parágrafo único, n° V) o síndico apresentará em cartório, em duas vias, exposição circunstanciada, na qual, considerando as causas da falência, o procedimento do devedor, antes e depois da sentença declaratória, e outros elementos ponderáveis, especificará, se houver, os atos que constituem crime falimentar, indicando os responsáveis e, em relação a cada um, os dispositivos penais aplicáveis.

§ 1° Essa exposição, instruída com o laudo do perito encarregado do exame da escrituração do falido (art. 63, n° V), e quaisquer documentos, concluirá, se fôr caso, pelo requerimento de inquérito, exames e diligência destinados à apuração de fatos ou circunstâncias que possam servir de fundamento à ação penal (Código de Processo Penal, art. 509).

§ 2º As primeiras vias da exposição e do laudo e os documentos formarão os autos do inquérito judicial e as segundas vias serão juntas aos autos da falência.

Art. 104. Nos autos do inquérito judicial, os credores podem, dentro dos cinco dias seguintes ao da entrega da exposição do síndico, não só requerer o inquérito, caso o síndico o não tenha feito, mas ainda alegar e requerer o que entenderem conveniente à finalidade do inquérito pedido.

Art. 105. Findo o prazo do artigo anterior, os autos serão feitos, imediatamente, com vista ao representante do Ministério Público, para que, dentro de três dias, opinando sobre a exposição do síndico, as alegações dos credores e os requerimentos que hajam apresentado, alegue e requeira o que for conveniente à finalidade do inquérito, ainda que este não tenha sido requerido pelo síndico ou por credor.

Art. 106. Nos cinco dias seguintes, poderá o falido contestar as argüições contidas nos autos do inquérito e requerer o que entender conveniente.

Art. 107. Decorrido o prazo do artigo anterior, os autos serão imediatamente conclusos ao juiz, que, em quarenta e oito horas, deferirá ou não as provas requeridas, designando dia e hora para se realizarem as deferidas, dentro dos quinze dias seguintes, que não poderão ser ultrapassados, determinando expediente extraordinário, se necessário"

Na nova Lei de Falências, não há mais de se falar em inquérito judicial, pois o juiz, sempre que estiver diante de indícios da prática de crime, deverá mandar cópia dos autos ao Ministério Público (titular da ação penal), nos termos do art. 187, § 2º, da Lei nº 11.101/05. Dessa forma, o Ministério Público, assim que intimado da sentença de falência ou que concede a recuperação judicial, cabe-lhe a promoção da ação penal respectiva ou a requisição da abertura de inquérito policial (Lei nº 11.101/05, art. 187). Sendo assim, o novo procedimento penal previsto na Lei nº 11.101/05 assim estabelece, in verbis: [02]

"Art. 183. Compete ao juiz criminal da jurisdição onde tenha sido decretada a falência, concedida a recuperação judicial ou homologado o plano de recuperação extrajudicial, conhecer da ação penal pelos crimes previstos nesta Lei.

Art. 184. Os crimes previstos nesta Lei são de ação penal pública incondicionada.

Parágrafo único. Decorrido o prazo a que se refere o art. 187, § 1o, sem que o representante do Ministério Público ofereça denúncia, qualquer credor habilitado ou o administrador judicial poderá oferecer ação penal privada subsidiária da pública, observado o prazo decadencial de 6 (seis) meses.

Art. 185. Recebida a denúncia ou a queixa, observar-se-á o rito previsto nos arts. 531 a 540 do Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal.

Art. 186. No relatório previsto na alínea e do inciso III do caput do art. 22 desta Lei, o administrador judicial apresentará ao juiz da falência exposição circunstanciada, considerando as causas da falência, o procedimento do devedor, antes e depois da sentença, e outras informações detalhadas a respeito da conduta do devedor e de outros responsáveis, se houver, por atos que possam constituir crime relacionado com a recuperação judicial ou com a falência, ou outro delito conexo a estes.

Parágrafo único. A exposição circunstanciada será instruída com laudo do contador encarregado do exame da escrituração do devedor.

Art. 187. Intimado da sentença que decreta a falência ou concede a recuperação judicial, o Ministério Público, verificando a ocorrência de qualquer crime previsto nesta Lei, promoverá imediatamente a competente ação penal ou, se entender necessário, requisitará a abertura de inquérito policial.

§1º O prazo para oferecimento da denúncia regula-se pelo art. 46 do Decreto-Lei no 3.689, de 3 de outubro de 1941 - Código de Processo Penal, salvo se o Ministério Público, estando o réu solto ou afiançado, decidir aguardar a apresentação da exposição circunstanciada de que trata o art. 186 desta Lei, devendo, em seguida, oferecer a denúncia em 15 (quinze) dias.

§2º Em qualquer fase processual, surgindo indícios da prática dos crimes previstos nesta Lei, o juiz da falência ou da recuperação judicial ou da recuperação extrajudicial cientificará o Ministério Público.

Art. 188. Aplicam-se subsidiariamente as disposições do Código de Processo Penal, no que não forem incompatíveis com esta Lei." (grifos nossos)

Outra modalidade de inquérito existente na legislação pátria trata-se do denominado inquérito de expulsão de estrangeiro, que se encontra previsto na Lei nº 6.815/80, que assim dispõe: [03]

Art. 65. É passível de expulsão o estrangeiro que, de qualquer forma, atentar contra a segurança nacional, a ordem política ou social, a tranqüilidade ou moralidade pública e a economia popular, ou cujo procedimento o torne nocivo à conveniência e aos interesses nacionais. (Renumerado pela Lei nº 6.964, de 09/12/81)

Parágrafo único. É passível, também, de expulsão o estrangeiro que:

a) praticar fraude a fim de obter a sua entrada ou permanência no Brasil;

b) havendo entrado no território nacional com infração à lei, dele não se retirar no prazo que lhe for determinado para fazê-lo, não sendo aconselhável a deportação;

c) entregar-se à vadiagem ou à mendicância; ou

d) desrespeitar proibição especialmente prevista em lei para estrangeiro.

Art. 66. Caberá exclusivamente ao Presidente da República resolver sobre a conveniência e a oportunidade da expulsão ou de sua revogação. (Renumerado pela Lei nº 6.964, de 09/12/81)

Parágrafo único. A medida expulsória ou a sua revogação far-se-á por decreto.

Art. 67. Desde que conveniente ao interesse nacional, a expulsão do estrangeiro poderá efetivar-se, ainda que haja processo ou tenha ocorrido condenação. (Renumerado pela Lei nº 6.964, de 09/12/81)

Art. 68. Os órgãos do Ministério Público remeterão ao Ministério da Justiça, de ofício, até trinta dias após o trânsito em julgado, cópia da sentença condenatória de estrangeiro autor de crime doloso ou de qualquer crime contra a segurança nacional, a ordem política ou social, a economia popular, a moralidade ou a saúde pública, assim como da folha de antecedentes penais constantes dos autos. (Renumerado pela Lei nº 6.964, de 09/12/81)

Parágrafo único. O Ministro da Justiça, recebidos os documentos mencionados neste artigo, determinará a instauração de inquérito para a expulsão do estrangeiro.

Art. 69. O Ministro da Justiça, a qualquer tempo, poderá determinar a prisão, por 90 (noventa) dias, do estrangeiro submetido a processo de expulsão e, para concluir o inquérito ou assegurar a execução da medida, prorrogá-la por igual prazo. (Renumerado pela Lei nº 6.964, de 09/12/81)

Parágrafo único. Em caso de medida interposta junto ao Poder Judiciário que suspenda, provisoriamente, a efetivação do ato expulsório, o prazo de prisão de que trata a parte final do caput deste artigo ficará interrompido, até a decisão definitiva do Tribunal a que estiver submetido o feito.

Art. 70. Compete ao Ministro da Justiça, de ofício ou acolhendo solicitação fundamentada, determinar a instauração de inquérito para a expulsão do estrangeiro. (Renumerado pela Lei nº 6.964, de 09/12/81)

Art. 71. Nos casos de infração contra a segurança nacional, a ordem política ou social e a economia popular, assim como nos casos de comércio, posse ou facilitação de uso indevido de substância entorpecente ou que determine dependência física ou psíquica, ou de desrespeito à proibição especialmente prevista em lei para estrangeiro, o inquérito será sumário e não excederá o prazo de quinze dias, dentro do qual fica assegurado ao expulsando o direito de defesa. (Renumerado pela Lei nº 6.964, de 09/12/81)

Art. 72. Salvo as hipóteses previstas no artigo anterior, caberá pedido de reconsideração no prazo de 10 (dez) dias, a contar da publicação do decreto de expulsão, no Diário Oficial da União. (Renumerado pela Lei nº 6.964, de 09/12/81)

Art. 73. O estrangeiro, cuja prisão não se torne necessária, ou que tenha o prazo desta vencido, permanecerá em liberdade vigiada, em lugar designado pelo Ministério da Justiça, e guardará as normas de comportamento que lhe forem estabelecidas. (Renumerado pela Lei nº 6.964, de 09/12/81)

Parágrafo único. Descumprida qualquer das normas fixadas de conformidade com o disposto neste artigo ou no seguinte, o Ministro da Justiça, a qualquer tempo, poderá determinar a prisão administrativa do estrangeiro, cujo prazo não excederá a 90 (noventa) dias.

Art. 74. O Ministro da Justiça poderá modificar, de ofício ou a pedido, as normas de conduta impostas ao estrangeiro e designar outro lugar para a sua residência. (Renumerado pela Lei nº 6.964, de 09/12/81)

Art. 75. Não se procederá à expulsão: (Renumerado e alterado pela Lei nº 6.964, de 09/12/81)

I - se implicar extradição inadmitida pela lei brasileira; ou (Incluído incisos, alíneas e §§ pela Lei nº 6.964, de 09/12/81)

II - quando o estrangeiro tiver:

a) Cônjuge brasileiro do qual não esteja divorciado ou separado, de fato ou de direito, e desde que o casamento tenha sido celebrado há mais de 5 (cinco) anos; ou

b) filho brasileiro que, comprovadamente, esteja sob sua guarda e dele dependa economicamente.

§ 1º. não constituem impedimento à expulsão a adoção ou o reconhecimento de filho brasileiro supervenientes ao fato que o motivar.

§ 2º. Verificados o abandono do filho, o divórcio ou a separação, de fato ou de direito, a expulsão poderá efetivar-se a qualquer tempo (...) (grifos nossos)

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Além disso, cumpre destacar que os dispositivos da Lei 6.815/80 foram regulamentados pelo Decreto nº 86.715/81, que nos seus artigos 100 a 109 disciplina o inquérito administrativo de expulsão. De acordo com a legislação em comento, compete à Polícia Federal, mediante portaria, instaurar o inquérito de expulsão mediante requisição do Ministro da Justiça. Dessa forma, em atendimento ao princípio do devido processo legal, notifica-se ao expulsando da instauração do inquérito com designação de dia e hora para o interrogatório, com antecedência mínima de dois dias úteis (art.103, §1º). Não sendo encontrado o estrangeiro, será notificado por edital publicado no Diário oficial da União por 10 dias, por duas vezes (art. 103, §2º). Atendida notificação o estrangeiro será interrogado, identificado e fotografado, podendo indicar provas que desejar produzir e indicar seu defensor (art. 103, §4º). Não comparecendo ou não indicando defensor, será acionada a Defensoria Pública da União. Tanto o expulsando quanto o defensor tem o prazo de seis dias, "que correm em cartório", para ter vista dos autos e formular defesa (art. 103, §§ 6º e 7º). [04]

Ademais, concluída a instrução, o inquérito deverá ser remetido relatado em 11 dias para a Divisão de Medidas Compulsórias do Departamento de Estrangeiros da Secretaria Nacional de Justiça do Ministério da Justiça, que por sua conta, o encaminhará com parecer ao Ministro da Justiça que submeterá ao Presidente da República. Isto tudo quanto dispõe os artigos 105 e 106 do referido decreto regulamentar. Por fim, compete ao chefe do Executivo Federal decretar a expulsão do estrangeiro ou revogá-la segundo seus critérios de conveniência e oportunidade (art. 66 da lei 6.815/80). [05]

Também é importante destacar queo inquérito de expulsão de estrangeiro tem a natureza jurídica de processo administrativo destinado à apuração de ilícito administrativo, sendo assegurados os princípios do contraditório e da ampla defesa. Dessa maneira, não se confunde com o inquérito policial, que tem natureza jurídica de procedimento administrativo inquisitivo destinado a apuração de infrações criminais. [06]

Outra modalidade de inquérito prevista na legislação é o chamado inquérito para apuração de falta grave, que tem previsão legal nos artigos 853 a 855 da Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT) e que se destina a apuração de falta grave que autoriza a resolução do contrato de trabalho do empregado estável por iniciativa do empregador. Em suma, o inquérito judicial para a apuração de falta grave nada mais é do que uma ação constitutiva negativa necessária para apuração de falta grave. Dessa forma, em nada se confunde com o inquérito policial, pois não tem o objetivo de apurar indícios de autoria e materialidade de infrações penais, mas sim de mero descumprimento de deveres trabalhistas. [07]

Também não se pode deixar de mencionar o inquérito policial militar. Pode-se afirmar que o inquérito militar é o procedimento administrativo destinado a apuração de crimes militares. De acordo com o art. 144, § 4º, da CF/88, os crimes militares devem ser apurados pelas autoridades militares e seus auxiliares (art. 144, § 4º, in fine, da CF/88). Dessa maneira, ao se tomar conhecimento da prática de um crime militar, o comandante da unidade a qual pertence o militar, por meio de portaria, determinará a abertura de inquérito policial militar (IPM) e determinará a nomeação de um oficial para apurar a autoria e a materialidade do fato investigado. Caso o autor do ilícito seja conhecido, o oficial militar nomeado deverá possuir posto ou patente acima do indiciado. A tramitação do inquérito policial militar encontra-se prevista no Código de Processo Penal Militar (CPPM - Decreto nº 1.002/69), que assim estabelece: [08], [09]

Art. 9º O inquérito policial militar é a apuração sumária de fato, que, nos termos legais, configure crime militar, e de sua autoria. Tem o caráter de instrução provisória, cuja finalidade precípua é a de ministrar elementos necessários à propositura da ação penal.

Parágrafo único. São, porém, efetivamente instrutórios da ação penal os exames, perícias e avaliações realizados regularmente no curso do inquérito, por peritos idôneos e com obediência às formalidades previstas neste Código.

Modos por que pode ser iniciado

Art. 10. O inquérito é iniciado mediante portaria:

a) de ofício, pela autoridade militar em cujo âmbito de jurisdição ou comando haja ocorrido a infração penal, atendida a hierarquia do infrator;

b) por determinação ou delegação da autoridade militar superior, que, em caso de urgência, poderá ser feita por via telegráfica ou radiotelefônica e confirmada, posteriormente, por ofício;

c) em virtude de requisição do Ministério Público;

d) por decisão do Superior Tribunal Militar, nos têrmos do art. 25;

e) a requerimento da parte ofendida ou de quem legalmente a represente, ou em virtude de representação devidamente autorizada de quem tenha conhecimento de infração penal, cuja repressão caiba à Justiça Militar;

f) quando, de sindicância feita em âmbito de jurisdição militar, resulte indício da existência de infração penal militar.

(...)

Art. 15. Será encarregado do inquérito, sempre que possível, oficial de pôsto não inferior ao de capitão ou capitão-tenente; e, em se tratando de infração penal contra a segurança nacional, sê-lo-á, sempre que possível, oficial superior, atendida, em cada caso, a sua hierarquia, se oficial o indiciado.

(...)

Prazos para terminação do inquérito

Art 20. O inquérito deverá terminar dentro em vinte dias, se o indiciado estiver prêso, contado esse prazo a partir do dia em que se executar a ordem de prisão; ou no prazo de quarenta dias, quando o indiciado estiver sôlto, contados a partir da data em que se instaurar o inquérito.

Prorrogação de prazo

1º Êste último prazo poderá ser prorrogado por mais vinte dias pela autoridade militar superior, desde que não estejam concluídos exames ou perícias já iniciados, ou haja necessidade de diligência, indispensáveis à elucidação do fato.

O pedido de prorrogação deve ser feito em tempo oportuno, de modo a ser atendido antes da terminação do prazo.

Diligências não concluídas até o inquérito

2º Não haverá mais prorrogação, além da prevista no § 1º, salvo dificuldade insuperável, a juízo do ministro de Estado competente. Os laudos de perícias ou exames não concluídos nessa prorrogação, bem como os documentos colhidos depois dela, serão posteriormente remetidos ao juiz, para a juntada ao processo. Ainda, no seu relatório, poderá o encarregado do inquérito indicar, mencionando, se possível, o lugar onde se encontram as testemunhas que deixaram de ser ouvidas, por qualquer impedimento.

Dedução em favor dos prazos

3º São deduzidas dos prazos referidos neste artigo as interrupções pelo motivo previsto no § 5º do art. 10. (...)

Relatório

Art. 22. O inquérito será encerrado com minucioso relatório, em que o seu encarregado mencionará as diligências feitas, as pessoas ouvidas e os resultados obtidos, com indicação do dia, hora e lugar onde ocorreu o fato delituoso. Em conclusão, dirá se há infração disciplinar a punir ou indício de crime, pronunciando-se, neste último caso, justificadamente, sobre a conveniência da prisão preventiva do indiciado, nos termos legais. (...)

Arquivamento de inquérito. Proibição

Art. 24. A autoridade militar não poderá mandar arquivar autos de inquérito, embora conclusivo da inexistência de crime ou de inimputabilidade do indiciado" (grifos nossos)

Cumpre destacar, ainda, a existência de inquérito judicial nos casos de autoridades com foro por prerrogativa de função. A Constituição Federal de 1988 estabelece que algumas autoridades públicas, em razão da importância de seus cargos e funções exercidas, detêm o chamado "foro por prerrogativa de função", ou seja, são julgadas perante um foro especial. Dessa maneira, por exemplo, os parlamentares federais, no caso de cometimento de infrações penais, são julgados perante o STF. Já os Governadores dos Estados são julgados pelo STJ, entre outros. Firmou-se o entendimento de que a garantia de foro por prerrogativa de função estende-se até mesmo para a chamada fase pré-processual. Dessa forma, a investigação do envolvimento de autoridades com foro especial obedece ao trâmite disciplinado, em regra, por meio dos regimentos internos dos tribunais. [10]

Para melhor exemplificar a questão, é interessante mencionar que o STF disciplinou o trâmite dos inquéritos em que se investigam autoridades com foro de prerrogativa de função nos artigos 230 a 232 do regimento interno do STF (RISTF), que assim dispõe: [11]

Art. 230. A denúncia nos crimes de ação pública, a queixa nos de ação privada, bem como a representação, quando indispensável ao exercício da primeira, obedecerão ao que dispõe a lei processual.

Art. 231. Distribuído inquérito sobre crime de ação pública, da competência originária do Tribunal, o Relator encaminhará os autos ao Procurador-Geral, que terá quinze dias para oferecer a denúncia ou requerer o arquivamento. Se o indiciado estiver preso, o prazo será de cinco dias.

§ 1º As diligências complementares ao inquérito podem ser requeridas pelo Procurador-Geral ao Relator, interrompendo o prazo deste artigo, se deferidas.

§ 2º As diligências complementares não interrompem o prazo para oferecimento de denúncia, se o indiciado estiver preso.

§ 3º Na hipótese do parágrafo anterior, se as diligências forem indispensáveis ao oferecimento da denúncia, o Relator determinará o relaxamento da prisão do indiciado; se não o forem, mandará, depois de oferecida a denúncia, que se realizem em separado, sem prejuízo da prisão e do processo.

§ 4º O Relator tem competência para determinar o arquivamento, quando o requerer o Procurador-Geral.

Art. 232. Se o inquérito versar sobre a prática de crime de ação privada, o Relator determinará seja aguardada a iniciativa do ofendido ou de quem por lei esteja autorizado a oferecer queixa.

Parágrafo único. Verificando a extinção da punibilidade, ainda que não haja iniciativa do ofendido, o Relator, após ouvir o Procurador-Geral, pedirá dia para julgamento, independentemente de revisão. (grifos nossos)

Ainda no que se refere aos inquéritos para apurar crimes cometidos, em tese, por autoridades com foro por prerrogativa de função no STF, LENART (2010) sintetiza com propriedade o atual entendimento do Excelso Pretório sobre a competência para a instauração de inquérito policial e para o indiciamento de autoridades com foro de prerrogativa de função. Cita-se trecho de manifestação do ilustre autor: [12]

"O estado atual das discussões no âmbito do STF pode ser sumarizado da seguinte forma:

i) a outorga de competência originária para processar e julgar determinadas Autoridades ("detentoras de foro por prerrogativa de função") não se limita ao processo criminal em si mesmo, mas, à base da teoria dos poderes implícitos, estende-se à fase apuratória pré-processual, de tal modo que cabe igualmente à Corte – e não ao órgão jurisdicional de 1ª instância - o correlativo controle jurisdicional dos atos investigatórios (STF: Rcl. 2349/TO, T2, DJ 05.08.2005 – Rcl. 1150/PR, Tribunal Pleno, DJ 06.12.2002); (...)

iii) à Polícia Judiciária – Polícia Federal, Polícias Civis e, em casos restritos, Polícias Militares e das diversas Armas – falta atribuição para instaurar de ofício inquérito policial ou policial militar contra Autoridade sujeita à competência penal originária de Tribunal – "foro por prerrogativa de função";

Sobre a impossibilidade de lavratura de ato de prisão em flagrante, veja-se o item 4, infra.

iv) só ao órgão de execução do Ministério Público em atuação junto à Corte competente para supervisionar as apurações se reconhece legitimidade para requerer a instauração de inquérito contra o detentor de "foro de prerrogativa de função";

v) caso qualquer pessoa, Polícia Judiciária, órgão da Administração Pública ou órgão de execução do Ministério Público (que não oficie junto à Corte com competência para autorizar o início e fiscalizar o andamento das investigações) tenha notícia da suposta prática de ilícito criminal por parte de Autoridade sujeita à competência originária de Tribunal – "detentor de foro por prerrogativa de função" – deverá remeter imediatamente as peças de informação à Corte competente, abstendo-se de promover qualquer ato investigatório;

vi) qualquer ato investigatório, assim como o indiciamento, levado a efeito pela Polícia Judiciária sem autorização do Tribunal competente constitucionalmente para autorizar e fiscalizar as investigações é inválido e, em princípio, insuscetível de convalidação; (...)

viii) cabe à Polícia Federal, com prévia autorização do Tribunal, investigar as pessoas sujeitas à competência originária de STF, STJ, TRFs, TREs. À Polícia Civil dos Estados Membros cabe, também com prévia autorização dos Tribunais de Justiça, investigar pessoas sujeitas à competência originária dessa Corte – Membros do Ministério Público Estadual, Juízes de Direito, Prefeitos e Deputados Estaduais – exceto no tocante às infrações penais de interesse federal -, entre outros;

ix) os fenômenos processuais da conexão e da continência podem levar à alteração para "maior" do órgão jurisdicional competente. Assim, se pesa contra Prefeito a suspeita da prática de crime em conluio com Ministro de Estado, a competência para autorizar o início das apurações será do STF – juiz natural, em matéria criminal, dos Ministros de Estado. Ao Supremo, e somente a ele, será dado decidir sobre possibilidade e conveniência do desmembramento do inquérito com relação aos agentes cujo juiz natural está no 1o grau de jurisdição. (grifos nossos)

Outra modalidade de inquérito existente na legislação pátria é o chamado inquérito civil público (art. 129, III, da CF/88) que nada mais é do que um procedimento administrativo de natureza inquisitiva destinado a apuração de eventual lesão a interesses metaindividuais. Cabe destacar que se trata de um procedimento facultativo e prévio ao ajuizamento da ação civil pública (ACP) prevista na Lei nº 7.347/85 e no art. 129, III, da CF/88. [13], [14]

Durante a tramitação do inquérito civil público, pode ser formalizado um termo de compromisso de ajustamento e conduta (TAC) entre o Ministério Público e o investigado no intuito de cessar a conduta lesiva. Esse compromisso, assim como o arquivamento do inquérito civil, dependem de homologação do Conselho Superior do Ministério Público (art. 9º, § 3º, da Lei 7.347/85). Além disso, o encerramento do inquérito civil é formalizado por meio de um relatório final, que pode concluir pelo seu arquivamento ou pela propositura da ação civil pública. [15]

Além disso, o inquérito civil difere do inquérito policial, pois o inquérito civil é um procedimento destinado a fornecer subsídios para o ajuizamento da ação civil pública, enquanto o inquérito policial destina-se a apuração de infrações penais para fornecer elementos para o ajuizamento de ação penal. Além disso, a titularidade do inquérito civil é do Ministério Publico, ao passo que a presidência do inquérito policial é atribuição exclusiva do Delegado de Polícia. [16]

No que se refere ao inquérito civil público, é oportuno recordar o julgamento do RE 464.893, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 20/05/2008, Segunda Turma, DJE de 1º/8/2008STF, que assim estabeleceu: [17]

"Ministério Público. Oferecimento de denúncia com base em inquérito civil público. Viabilidade. Recurso desprovido. Denúncia oferecida com base em elementos colhidos no bojo de inquérito civil público destinado à apuração de danos ao meio ambiente. Viabilidade. O Ministério Público pode oferecer denúncia independentemente de investigação policial, desde que possua os elementos mínimos de convicção quanto à materialidade e aos indícios de autoria, como no caso (art. 46, § 1°, do CPP)." (RE 464.893, Rel. Min. Joaquim Barbosa, julgamento em 20-5-2008, Segunda Turma, DJE de 1º-8-2008.) (grifos nossos)

Por fim, não se pode deixar de se citar o mais importante e corriqueiro inquérito existente na legislação pátria. Trata-se do inquérito policial que se encontra previsto no Código de Processo Penal (CPP). O inquérito policial pode ser definido, em síntese, como o procedimento administrativo inquisitivo e célere (vide art. 5º, LXXVIII, da CF/88) de caráter informativo e preparatório da ação penal que se desenvolve por meio da prática de um conjunto de atos, diligências e investigações policiais formalizadas e ordenadas em um só processado, com o objetivo de comprovar a existência de uma infração penal, sua materialidade e sua autoria. [18], [19]

Sobre os autores
Bruno Fontenele Cabral

Delegado de Polícia Federal. Mestre em Administração Pública pela UnB. Professor do Curso Ênfase e do Grancursos Online. Autor de 129 artigos e 12 livros.

Débora Dadiani Dantas Cangussu

Bacharelanda em Direito pelo Centro Universitário UNIEURO

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CABRAL, Bruno Fontenele; CANGUSSU, Débora Dadiani Dantas. Considerações sobre as diversas modalidades de inquéritos existentes na legislação pátria. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2982, 31 ago. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/19889. Acesso em: 17 nov. 2024.

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