Pretende este estudo demonstrar de forma cabal a plena plausibilidade jurídica da aposentadoria especial aos 25 (vinte e cinco) anos de serviço/contribuição do servidor público que tenha exercido suas atividades sob exposição de agentes nocivos á saúde, caracterizando-se a insalubridade ou a periculosidade no exercício de suas funções.
O tema era ainda controvertido, pela inexistência de Lei que regulamentasse a matéria desde a promulgação da Constituição de 1988, surgindo, pois, uma lacuna legislativa, como adiante veremos.
O art. 40, §4º, III da Constituição da República, na redação conferida pela EC 47/05, estabelece exceções às regras gerais de aposentadoria dos servidores públicos, nos seguintes termos:
“§ 4º É vedada a adoção de requisitos e critérios diferenciados para a concessão de aposentadoria aos abrangidos pelo regime de que trata este artigo,ressalvados, nos termos definidos em leis complementares, os casos de servidores:
I portadores de deficiência;
II que exerçam atividades de risco;
III cujas atividades sejam exercidas sob condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física.”
Ocorre que as leis complementares citadas no referido dispositivo constitucional não foram editadas, situação que vem impedindo a concessão do benefício aos servidores destinatários da norma, em franco descumprimento ao comando do legislador constituinte derivado.
Por esse motivo, o Supremo Tribunal Federal vem determinando a integração da norma, em sede de mandado de injunção, a fim de determinar a aplicação subsidiária das normas do Regime Geral de Previdência Social aos servidores públicos que se enquadrem em uma das situações especificadas no art. 40, §4º da CF.
Neste sentido, destaco o seguinte precedente do Supremo Tribunal Federal:
“E M E N T A: MANDADO DE INJUNÇÃO – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO RECEBIDOS COMO RECURSO DE AGRAVO– APOSENTADORIA ESPECIAL (CF, ART. 40, § 4º) –DECISÃO MONOCRÁTICA QUE CONCEDEU A ORDEM INJUNCIONAL, PARA, RECONHECIDO O ESTADO DEMORA LEGISLATIVA, GARANTIR, À PARTE IMPETRANTE,O DIREITO DE TER O SEU PEDIDO DE APOSENTADORIA ESPECIAL CONCRETAMENTE ANALISADO PELA AUTORIDADE ADMINISTRATIVA COMPETENTE,OBSERVADO, PARA TANTO, O QUE DISPÕE O ART. 57 DA
LEI Nº 8.213/91 – DECISÃO QUE SE AJUSTA, NO PONTO, AOS PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL,EM ESPECIAL O MI 721/DF, REL. MIN. MARCO AURÉLIO,E O MI 2.195 AGR/DF, REL. MIN. CÁRMEN LÚCIA. CONSEQÜENTE INVIABILIDADE DA POSTULAÇÃO RECURSAL – SUBSISTÊNCIA DOS FUNDAMENTOS QUE DÃO SUPORTE À DECISÃO RECORRIDA – RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO.(MI 1194 ED, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Tribunal Pleno, julgado em 12/05/2011, DJe 098 DIVULG 24 05 2011 PUBLIC 25 05 2011 EMENT VOL 02529 01 PP 00023)
Ressalte-se, ademais, que a aplicação subsidiária das normas do RGPS aos servidores públicos federais encontra expressa previsão no §12 do art. 40 da Carta da República:
§ 12 Além do disposto neste artigo, o regime de previdência dos servidores públicos titulares de cargo efetivo observará, no que couber, os requisitos e critérios fixados para o regime geral de previdência social.
Sendo assim, mostra-se aplicável, enquanto não sobrevier norma específica regulando a aposentadoria especial dos servidores públicos, o disposto no art. 57 da Lei 8.213/91, no que couber.
Já o parágrafo 1º do artigo 57 da Lei 8.213/91, dispõe que:
Art. 57 - A aposentadoria especial será devida, uma vez cumprida a carência exigida nesta Lei, ao segurado que tiver trabalhado sujeito a condições especiais que prejudiquem a saúde ou a integridade física, durante 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos, conforme dispuser a lei.
§ 1º - A aposentadoria especial, observado o disposto no art. 33 desta Lei, consistirá numa renda mensal equivalente a 100% (cem por cento) do salário de benefício.
Com efeito, o servidor ocupante de cargo cujas atribuições estejam sujeitas a exposição a agentes nocivos, e uma vez demonstrada tal exposição, faz jus a aposentadoria especial conforme as regras aplicadas aos segurados da Previdência Social, vinculados ao RGPS – Regime Geral de Previdência Social, com aplicação analógica daquela norma.
Ressalte-se, contudo, que não se faz necessária a apresentação do formulário e do laudo técnico previstos no art. 58, §1º da Lei 8.213/91 para fins de comprovação do tempo de trabalho exercido sob condições especiais prejudiciais à saúde ou à integridade física, tendo em vista que estes documentos não são expedidos pelos órgãos públicos, por falta de previsão legal.
Assim, a percepção do adicional de insalubridade ou periculosidade é suficiente para esta comprovação, uma vez que o art. 68 da Lei 8.112/91 estabelece que a vantagem somente é devida aos servidores que trabalhem com habitualidade em locais insalubres ou em contato permanente com substâncias tóxicas, o que atende ao requisito previsto no inciso III do §4º do art. 40 da CF.
Em hipótese análoga à aqui versada, assim se manifestou o TRF da 5ª Região:
“MANDADO DE SEGURANÇA. APOSENTADORIA ESPECIAL. MÉDICO PERITO DO INSS. MANDADO DE INJUNÇÃO IMPETRADO JUNTO AO STF. PEDIDO DE APOSENTADORIA ESPECIAL APRECIADO À LUZ DO ART.
57 DA LEI Nº 8.213/91. PRELIMINAR DE INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA REJEITADA. PROVA PRÉ CONSTITUÍDA.ATIVIDADE INSALUBRE.
O mandado de injunção impetrado pelo requerente junto ao STF em face do Presidente da República apenas permitiu que a pretensão de aposentadoria especial do impetrante, à falta de edição da lei complementar, fosse apreciada à luz do artigo 57 da Lei nº 8.213/91, reconhecendo se a mora da iniciativa legislativa quanto à matéria. Preliminar de inadequação da via eleita que se rejeita.
O cargo de médico enquadra-se no elenco de atividades profissionais previstas no anexo do Dec. nº 53.831/64, código 2.1.3, bem como no Dec. nº 83.080/79, código 1.3.4 (anexo I), ficando demonstrado nos autos, com base em ato interno expedido pela própria autarquia (Orientação Interna nº01/INSS/DRH, de 19 de janeiro de 2009, fls. 279) e ante a demonstração de recebimento de adicional de insalubridade nos contracheques colacionados nos autos,que o impetrante continua desempenhando sua atividades profissionais em ambiente insalubre, fazendo jus, portanto, à aposentadoria especial vindicada, eis que conta com mais de 25 anos de tempo de serviço prestado como médico perito junto ao INSS, conforme certidão de tempo de serviço acostada aos autos. Instituída a aposentadoria após a promulgação da EC nº 41/2003, a qual extingui com a regra da paridade ou da integralidade das aposentadorias e pensões de seus dependentes em relação aos servidores da ativa, o referido beneficio deve observar as suas disposições. Apelação do INSS não provida. Remessa oficial parcialmente provida apenas. para que se observe na instituição da aposentadoria a EC nº 41/2003.” (APELREEX 200983000197285; 4ª Turma;Rel. Desembargador Federal Frederico Dantas; DJE Data::19/05/2011);
Destaque-se que a aposentadoria especial do autor deverá ser calculada com base nas regras permanentes do art. 40 da Carta da República, em especial os parágrafos 3º e 17, que preveem o cálculo do benefício pela média das remunerações, devidamente atualizadas, normas que, ademais, reproduzem a disciplina constitucional aplicável aos benefícios do RGPS, cuja aplicação subsidiária ora se postula.
Pois bem, conjugando os dois dispositivos legais invocados, temos que o também o servidor público que trabalhou por 25 anos sob condições insalubres faz jus a aposentadoria especial com proventos integrais, na esteira da dicção do STF.
Confira-se a Ementa do primeiro julgado do STF sobre o thema:
DJe-182 DIVULG 25-09-2008 PUBLIC 26-09-2008
EMENT VOL-02334-01 PP-00037 RDECTRAB v. 15, n. 174, 2009, p. 157-167
MANDADO DE INJUNÇÃO - NATUREZA. Conforme disposto no inciso LXXI do artigo 5º da Constituição Federal, conceder-se-á mandado de injunção quando necessário ao exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Há ação mandamental e não simplesmente declaratória de omissão. A carga de declaração não é objeto da impetração, mas premissa da ordem a ser formalizada. MANDADO DE INJUNÇÃO - DECISÃO - BALIZAS. Tratando-se de processo subjetivo, a decisão possui eficácia considerada a relação jurídica nele revelada. APOSENTADORIA - TRABALHO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS - PREJUÍZO À SAÚDE DO SERVIDOR - INEXISTÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR - ARTIGO 40, § 4º, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. Inexistente a disciplina específica da aposentadoria especial do servidor, impõe-se a adoção, via pronunciamento judicial, daquela própria aos trabalhadores em geral - artigo 57, § 1º, da Lei nº 8.213/91.
Decisão: O Tribunal, por unanimidade e nos termos do voto do relator, deferiu o mandado de injunção. Ausentes, justificadamente, os Senhores Ministros Celso de Mello, Cezar Peluso, Eros Grau e Menezes Direito. Presidiu o julgamento o Senhor Ministro Gilmar Mendes. Plenário, 01.07.2008.
Com a proliferação das impetrações de Mandados de Injunção sobre a mesma questão, sobreveio autorização do Plenário do STF no sentido de que os Ministros relatores decidissem definitiva e monocraticamente os casos idênticos.
Tal fato culminou agora com a Proposta de edição de Sumula Vinculante PSV 45-8/927, com o seguinte teor:
“ Enquanto inexistente a disciplina específica sobre aposentadoria especial do servidor público, nos termos do artigo 40 § 4º da Constituição Federal, com redação da Emenda Constitucional n. 47/2005, impõe-se a adoção daquela própria aos trabalhadores em geral (artigo 57, § 1º da Lei n. 8.213/91)”
Está, portanto, consagrado no Supremo Tribunal Federal que, até que sobrevenha disciplina específica destinada aos servidores públicos, adotam-se para fins de aposentadoria especial os critérios do Regime Geral de Previdência Social – RGPS, em conjunto com as regras próprias dos servidores públicos.