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As discriminações nos concursos públicos e os princípios constitucionais do Direito Administrativo

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Agenda 16/01/2013 às 13:08

O concurso público objetiva selecionar os melhores para a carreira pública. Eventuais restrições de ingresso com base em tatuagem ou gênero devem observar os princípios da proporcionalidade, igualdade e legalidade.

Resumo: O concurso público objetiva selecionar os melhores para a carreira pública. Todavia, essa seleção está sujeita aos princípios constitucionais. Assim, restrições de ingresso com base em tatuagem ou gênero devem observar os princípios da proporcionalidade, igualdade e legalidade.

Palavras-chave: Concurso Público; Legalidade; Igualdade; Proporcionalidade.

Sumário: 1 – Introdução. 2 – A Evolução Histórico-Constitucional da Exigência dos Concursos Públicos. 3 – Os Agentes Públicos. 4 – Do Ingresso nas Carreiras Públicas. 5 – Dos Princípios Constitucionais do Direito Administrativo. 5.1 – Do Princípio da Legalidade. 5.2 – Do Princípio da Proporcionalidade. 6 – Do Princípio da Igualdade. 7 – Das Discriminações nos Concursos Públicos e os Princípios Constitucionais do Direito Administrativo. 7.1 – Da Vedação de Candidato com Tatuagem e o Princípio da Proporcionalidade. 7.2 – Das Vagas em Razão do Gênero dos Candidatos e Princípio da Igualdade. 8 – Conclusão. 9 – Referências Bibliográficas.


1 – INTRODUÇÃO

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, no artigo 37, inciso II, determina a necessidade de aprovação em concurso público de provas ou de provas e títulos, para que qualquer brasileiro ou estrangeiro que preencha os requisitos previstos em lei possa ser investido em cargo ou emprego público, excetuado os cargos em comissão. Referida forma de contratação é precedida da publicação de Edital contendo as regras e peculiaridades do certame. Eventualmente, um edital pode contemplar restrições aos candidatos, com o objetivo de afunilar a concorrência e mitigar o livre acesso aos cargos públicos, selecionando de maneira arbitrária os concorrentes ao ingresso na carreira pública. Como exemplo, cita-se a vedação de candidatos com tatuagem ou a previsão de menos vagas para mulheres.

O presente artigo tem o objetivo de analisar pragmaticamente os citados exemplos, à luz dos princípios constitucionais do Direito Administrativo, em especial dos princípios da proporcionalidade, legalidade e isonomia. Dessa maneira, espera-se que o presente estudo possa ser útil para a sociedade em geral, pois tem o nítido condão elucidativo a respeito dos concursos públicos, traçando as possibilidades de discriminações previstas nos editais, trazendo também, o posicionamento moderno dos Tribunais Brasileiros sobre o tema.

Por derradeiro, assinala-se que o presente trabalho utilizou material bibliográfico e julgados recentes, com intuito de traçar um paralelo entre os casos analisados pelo Judiciário e as teorias dominantes.


2 - A Evolução Histórico-Constitucional da Exigência dos Concursos Públicos[1]

Analisando as Constituições anteriores, desde o império até a forma republicana dos tempos atuais, nota-se que a exigência de realização de concurso público para provimento de cargo efetivo é matéria que já mostrava indícios, mesmo não havendo ainda sua previsão expressa. Nesse sentido, a Constituição do Império de 25 de março de 1824, prescrevia em seu artigo 179, inciso XIV, que “todo cidadão pode ser admitido aos Cargos Públicos Civis, Políticos, ou Militares, sem outra diferença, que não seja dos seus talentos, e virtudes”.[2] Vale aqui destacar que conforme se verifica no dispositivo legal citado, já se tinha preocupação com o princípio da isonomia e a proclamação da regra de mérito inerente aos certames públicos, uma vez que previa o livre acesso a todo cidadão que demonstrasse talentos e virtudes correspondentes ao cargo almejado.  No mesmo sentido, a Constituição republicana, de 24 de fevereiro de 1891, previa em seu artigo 73, a possibilidade de acesso aos “cargos públicos civis ou militares a todos os brasileiros, observadas as condições de capacidade especial que a lei estatuir, sendo, porém, vedada as cumulações remuneradas”.[3]

A Constituição de 1934, foi a primeira prescrição expressa da necessidade de realização de concurso público, inclusive com a obrigatoriedade da realização de exame de sanidade, para admissão nos postos das repartições administrativas. Nesse diapasão, o artigo 170, 2º, da referida Carta Magna, ordenava que “a primeira investidura nos postos de carreira das repartições administrativas, e nos demais que a lei determinar, efetuar-se-á depois de exame de sanidade e concurso de provas ou títulos”. A mesma Constituição, ainda trazia em seu artigo 158, a vedação de “dispensa do concurso de títulos e provas no provimento de cargos do magistério oficial, bem como, em qualquer curso, a de provas escolares de habilitação, determinada em lei ou regulamento”. Em seguida, com o advento da Constituição de 1937[4], foi retirada apenas a exigência do exame de sanidade, que voltou na Constituição 1946[5], sob a denominação de inspeção de saúde, englobando alem da verificação psicológica do candidato (sanidade), também as suas condições de saúde física. Posteriormente, a Carta de 1967 cujos traços se vê na Constituição atual a respeito da exigência de concurso público para ingresso nas carreiras da Administração Pública. Com efeito, o artigo 95, previa em seu § 1º, que “A nomeação para cargo público exige aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos”. Em contrapartida, trouxe a desnecessidade da realização de concurso para os cargos em comissão, dispondo o § 2º, do mesmo artigo, que “Prescinde de concurso a nomeação para cargos em comissão, declarados em lei, de livre nomeação e exoneração”. Todavia, com a edição da Emenda Constitucional nº 1/1969, o artigo 95 da Constituição citada, passou a prever a possibilidade de dispensa de concurso público nos casos indicados.[6]

Atualmente, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 prevê em seu artigo 37, incisos I e II, a necessidade de concurso de provas ou provas e títulos, para ingresso nas carreiras públicas, bem como estendeu referida possibilidade aos estrangeiros na forma prevista em lei, in verbis:

Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) I - os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei, assim como aos estrangeiros, na forma da lei; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) II - a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998).


3 – Os Agentes Públicos

Para Maria Sylvia Zanella Di Pietro, “agente público é toda pessoa física que presta serviços ao Estado e às pessoas jurídicas da Administração Indireta”. [7] No mesmo sentido, o Saudoso Doutrinador Hely Lopes Meirelles, explica que os agentes públicos “são todas as pessoas físicas incumbidas, definitiva ou transitoriamente, do exercício de alguma função estatal”.[8] Apenas como esclarecimentos, antes da entrada em vigor da Carta Política atual, não eram incluídos neste rol de agentes, aqueles pertencentes às pessoas jurídicas de direito privado, criadas pelo Poder Público, a saber, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista. Assim, em linhas gerais e de maneira simplificada, agentes públicos são todos aqueles que possuem de alguma forma, vínculo de trabalho com os entes estatais, independentemente do poder em que estejam atrelados.

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Destarte, analisando a Constituição Federal de 1988, após a Emenda Constitucional nº 18/98, temos quatro categorias de agentes públicos. São elas: agentes políticos, servidores públicos, militares e particulares em colaboração com o Poder Público. Insta esclarecer que apesar da grande oscilação a respeito da classificação dos agentes públicos, preferimos utilizar esta, acompanhando a autora Marya Sylvia Zanella Di Pietro, uma vez que após as alterações introduzidas pela Emenda constitucional nº 18/98, os militares deixaram de receber a denominação de “servidores militares”, sendo necessária a adição de uma categoria a eles destinada, muito embora não exista distinção conceitual entre servidores civis e os militares.[9]

Portanto, os servidores públicos constituem uma espécie do gênero agentes públicos. Assim, no presente estudo, abordaremos os servidores públicos titulares de cargos efetivos e os empregados públicos, haja vista que ambos ingressam na Administração Pública por concurso público, conforme se explicitará no tópico seguinte. Enfim, neste trabalho, a denominação “agentes públicos” refere-se aos servidores públicos e aos empregados públicos.


4 – Do Ingresso nas Carreiras Públicas

O artigo 37, II, da Constituição Federal[10], prevê que:

a investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público de provas ou de provas e títulos, de acordo com a natureza e a complexidade do cargo ou emprego, na forma prevista em lei, ressalvadas as nomeações para cargo em comissão declarado em lei de livre nomeação e exoneração; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998).

Nesse diapasão, para ingresso nos cargos públicos é necessária aprovação em concurso público de provas ou provas e títulos, pois se trata de posto de trabalho no setor público, cuja remuneração é proveniente dos cofres públicos. Igualmente, referido dispositivo constitucional, vem dar efetividade ao Estado Democrático de Direito, possibilitando a igualdade de condições no concurso, para todos aqueles que almejam um lugar nos postos de trabalho da Administração Pública. Nesse sentido, destacam-se os ensinamentos do renomado jurista Hely Lopes Meirelles:

A obrigatoriedade de concurso público, ressalvados os cargos em comissão e empregos com essa natureza, refere-se à investidura em cargo ou emprego público, isto é, ao ingresso em cargo ou emprego isolado ou em cargo ou emprego público inicial da carreira na Administração direta e indireta. [11]

Portanto, o objetivo da Administração Pública é selecionar os candidatos mais capacitados para o exercício do cargo, emprego ou função pública que se encontra vago, ou passível de breve vacância e criação. Ademais, o concurso público é um meio técnico que dispõe a administração para melhorar o serviço público, propiciando de forma igualitária a todos os interessados a oportunidade isonômica de concorreram a vaga aberta, desde que preenchido os requisitos legais determinados pela natureza e complexidade do cargo ou emprego a que se concorre, constante prescrição do artigo 37, II, da CF.

Nesse diapasão, para a autora Odete Medauar, “A exigência de concurso público para ascender a postos de trabalho no setor público atende, principalmente, ao princípio da igualdade e ao princípio da moralidade administrativa”. [12]

Destarte, ainda a respeito do inciso II, do artigo 37 da Constituição Federal, que torna obrigatória a realização de concurso público para as contratações feitas pelo Poder Público quanto a seus trabalhadores, finaliza, com extrema propriedade, o Saudoso Doutrinador Hely Lopes Meirelles. “Pelo concurso afastam-se, pois, os ineptos e os apaniguados que costumam abarrotar as repartições, num espetáculo degradante de protecionismo e falta de escrúpulos de políticos que se alçam e se mantêm no poder leiloando cargos e empregos públicos”.[13]

Contudo, o legislador constituinte previu a possibilidade de ingresso em cargo ou emprego público sem a necessidade de concurso público, para aqueles derivados de lei de livre exoneração e nomeação, intitulados de cargos em comissão. Ocorre que, o inciso V do mesmo artigo, determina que as funções de confiança só podem ser exercidas por servidores ocupantes de cargo efetivo, e, portanto, concursado, deixando os cargos em comissão para os servidores de carreira, que é compreendido em atribuições de direção, chefia e assessoramento.

As referidas exceções encontram guarida ainda no inciso IX, do referido artigo 37, quando permite a “contratação por tempo determinado para atender a necessidade temporária de excepcional interesse público”, nas nomeações para cargos de Ministros ou Conselheiros dos Tribunais de Contas, com espeque nos artigos 73, §2º, c/c 84, XV, bem como para Ministros do STF conforme artigo 101, STJ artigo 104, e TST artigo 111-A, todos da Carta Magna de 1988. Vale acrescentar a este rol, as nomeações para o quinto constitucional para ocuparem uma das cadeiras de Desembargadores dos Tribunais Regionais Federais, Tribunais Estaduais e do DFT, constante artigo 94, assim como as nomeações temporários para Ministros do TSE e juízes dos TREs, conforme artigos 119 e 120, respectivamente, também da CF.

Sendo assim, não obstante o vasto rol acima, os cargos em comissão são exceção perante a Constituição da República, devendo, inclusive, respeitarem condições e percentuais mínimos previstos em lei. Com efeito, a regra é a realização de concurso público para provimento de cargo efetivo, não sendo dada ao administrador a possibilidade de contratação por via oblíqua, sob pena de nulidade do ato e a punição da autoridade responsável, conforme dispõe o § 2º do artigo 37 da CF.

Assim, pode-se concluir que o concurso público é o meio imperativo e técnico que dispõe a Administração Pública, observando os princípios constitucionais administrativos, para buscar de maneira eficiente e isonômica o aperfeiçoamento do serviço público, por meio da seleção do candidato mais apto a vaga que se encontra aberta ou passível de imediata vacância, excetuado o preenchimento dos cargos de chefia, direção e assessoramento, que são providos mediante livre nomeação e exoneração, nos termos da legislação correspondente.


5 – Dos Princípios Constitucionais do Direito Administrativo

Antes de adentrar na problemática que o presente trabalho visa elucidar, insta mencionar alguns princípios constitucionais do Direito Administrativo necessários para o raciocínio lógico da solução jurídica dos problemas que serão levantados. Vale frisar que o objetivo do presente estudo não é fazer uma análise sistemática e conceitual dos princípios constitucionais do Direito Administrativo, mas fazer um paralelo destes com determinados editais de concursos públicos, no intuito de demonstrar a possibilidade de discriminação quanto aos candidatos, por tatuagem ou gênero, bem como eventuais excessos impugnáveis via ação proposta no Poder Judiciário. Enfim, como não se deve analisar uma questão sem antes compreender a sua origem, se faz necessária a exposição, mesmo que sintética, de alguns princípios constitucionais da Administração Pública, haja vista que toda ciência tem como ponto de partida o estudo lógico de seus princípios.

O Professor Manoel Messias Peixinho, assim explica:

Quando se fala de princípios constitucionais, deve-se entender aqueles princípios que estão presentes explícita e implicitamente e que informam determinada Constituição, estabelecendo diretrizes para interpretação e aplicação de suas normas.[14]

Vale ainda destacar, o brilhante posicionamento da autora Odete Medauar, sobre a relevância dos princípios no direito administrativo, in verbis:

No direito administrativo, os princípios revestem-se de grande importância. Por ser um direito de elaboração recente e não codificado, os princípios auxiliam a compreensão e consolidação de seus institutos. Acrescente-se que, no âmbito administrativo, muitas normas são editadas em vista de circunstâncias de momento, resultando em multiplicidade de textos, sem reunião sistemática. Daí a importância dos princípios, sobretudo para possibilitar a solução de casos não previstos, para permitir melhor compreensão dos textos esparsos e para conferir certa segurança aos cidadãos quanto à extensão dos seus direitos e deveres.[15]

Ainda nessa esteira de raciocínio, a mesma autora traz a importância dos princípios para o Direito Administrativo nos dias de hoje, in verbis:

A relevância dos princípios no direito administrativo vem comprovada na atualidade no chamado “direito administrativo comunitário” europeu: a Corte de Justiça da União Europeia vem se valendo dos princípios do direito administrativo na solução de muitas questões, em especial na tutela dos direitos dos cidadãos ante medidas da Administração de Estados integrantes.[16]

Todavia, não obstante a relevância da matéria, existe grande oscilação no ordenamento jurídico vigente e na doutrina em relação aos princípios do Direito Administrativo. Entretanto, a Constituição de 1988 prescreve explicitamente em seu artigo 37, caput, os seguintes princípios da Administração Pública: legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência. Ocorre que, para o presente estudo, analisa-se apenas o princípio da legalidade acrescido de mais dois princípios que não se encontram no rol legal mencionado: o princípio da igualdade e o princípio da razoabilidade ou proporcionalidade.

Por fim, os princípios possibilitam a aplicação do direito perante todas as ações ocorridas no cotidiano de uma sociedade, pois mesmo que referida situação não esteja positivada no ordenamento jurídica, é possível garantir uma solução correta, embasando-se nos princípios norteadores de todo o Direito.

5.1 - Do Princípio da Legalidade

Tido por alguns autores como um dos princípios mais importantes de todo o Direito, o princípio da legalidade tem sua essência no parágrafo único do artigo 1º da Constituição Federal de 1988, que “ressalta os aspectos da soberania e da cidadania”.[17]

Este princípio, junto ao da supremacia do interesse público sobre o particular, apesar de não serem específicos do Direito Administrativo, uma vez que servem de supedâneo para todos os ramos do direito público, são os elementos essenciais para a formação de todos os demais princípios. Sua origem está umbilicalmente ligada ao Estado Democrático de Direito, pois com a submissão da Administração Pública à lei, suas ações são provenientes dela, e se a lei deriva dos representantes do povo, não há que se falar em qualquer forma de Estado Absoluto, ou em vontade única das autoridades, configurando, nitidamente, o externamento da vontade popular e a vitória da soberania.

Nesse sentido, Manoel Messias Peixinho citando o autor Charles Debbasch, explica sobre o direito administrativo francês:

Para Charles Debbasch, comentando o direito administrativo francês, a submissão da Administração Pública à Lei constitui-se um princípio fundamental do Estado Liberal. Ao contrario do que ocorre no Estado de Polícia, em que a Administração é totalmente livre de sua ação, o Estado Liberal é um Estado de Direito. Os administrados detêm direito iguais aos da Administração, tendo o direito de exigir que o Estado respeite as regras de direito, principalmente pelo exercício de recursos jurisdicionais. Os particulares, assim, têm a garantia de que ação administrativa será conduzida objetivamente e não com parcialidade.[18]

O princípio da legalidade visa em sua conceituação obrigar a Administração Pública seguir rigorosamente os ditames previstos na legislação vigente, ou seja, só é permitido a ela realizar algum ato ou deixar de praticá-lo, caso haja estrita prescrição legal. Vale aqui frisar que de acordo com o inciso I, do parágrafo único do artigo 2º da Lei 9.784/99[19], a atividade administrativa deve seguir não só a lei, mas também o Direito. Assim, podemos concluir que além do dever de estrita obediência à lei, a Administração Pública deve também observância aos princípios do Direito Administrativo, para que se alcance o real significado da legalidade. Nessa esteira de raciocínio, com o brilhantismo de costume, ensina o saudoso Doutrinador Hely Lopes Meirelles:

A legalidade, como princípio da administração (CF, art. 37, caput), significa que o administrador público está, em toda a sua atividade funcional sujeito aos mandamentos da lei e às exigências do bem comum, e deles não se pode afastar ou desviar, sob pena de praticar ato inválido e expor-se a responsabilidade disciplinar, civil e criminal, conforme o caso.

A eficácia de toda atividade administrativa está condicionada ao atendimento da Lei e do Direito. É o que diz o inc. I do parágrafo único do art. 2º da Lei 9.784/99. Com isso, fica evidente que, alem da atuação conforme à lei, a legalidade significa, igualmente, a observância dos princípios administrativos.[20]

Em contrapartida ao princípio da legalidade, está o da autonomia da vontade, onde estão submetidos, mesmo que implicitamente, todos os particulares. Este princípio, garante aos cidadãos o direito de fazer qualquer coisa, desde que não proibida por lei. Portanto, em linhas gerais, o princípio da legalidade torna mais objetiva as ações da Administração Pública, evitando eventual subjetivismo arbitrário dos administradores públicos, porque suas ações devem observar a lei e o Direito, buscando com isso a segurança jurídica do Estado Democrático de Direito, onde os indivíduos não possuem restrições em suas ações, a não ser, aqueles limites para que outros indivíduos possam exercer os mesmos direitos.

5.2 – Do Princípio da Proporcionalidade

Com relação a este princípio, a doutrina diverge sobre sua correspondência com o princípio da razoabilidade. Para uns são dois princípios distintos. Outros doutrinadores defendem que o princípio da proporcionalidade abarca o da razoabilidade. Outros ainda sustentam o contrário, é o princípio da razoabilidade que contem o da proporcionalidade.

Para a Professora Maria Sylvia Zanella Di Pietro, a proporcionalidade é um dos aspectos do princípio da razoabilidade, in verbis:

Embora a Lei nº 9.784/99 faça referência aos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, separadamente, na realidade, o segundo constitui um dos aspectos contidos no primeiro. Isto porque o princípio da razoabilidade, entre outras coisas, exige proporcionalidade entre os meios de que se utiliza a Administração e os fins que ela tem que alcançar. E essa proporcionalidade deve ser media não pelos critérios pessoais do administrador, mas segundo padrões comuns na sociedade em que vive; e não poder media diante dos termos frios da lei, mas diante do caso concreto.[21]

Em outra quadra, Hely Lopes Meirelles trata ambos os princípios de forma igual, mas com efeitos distintos, alegando ainda, que a razoabilidade envolve a proporcionalidade, assim como a proporcionalidade envolve a razoabilidade.[22] Explica o Autor:

A Lei 9.784/99 também prevê os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Assim, determina nos processos administrativos a observância do critério de “adequação entre os meios e fins”, cerne da razoabilidade, e veda “imposição de obrigações, restrições e sanções em medida superior àquelas estritamente necessárias ao atendimento do interesse público”, traduzindo aí o núcleo da noção da proporcionalidade (cf. art. 2º, parágrafo único, VI).[23]

No presente trabalho, adota-se a corrente defendida por Odete Medauar, que prefere englobar o sentido de razoabilidade no princípio da proporcionalidade[24]. Nessa esteira de raciocínio, a Autora conceitua este princípio como sendo o limitador das ações da Administração Pública, para quando esta, obrigar, restringir ou sancionar os indivíduos em geral, não extrapolar o interesse público, seguindo assim, um critério razoável para adequar os meios aos fins.[25]

Assim, pode-se concluir que o princípio da proporcionalidade visa limitar a discricionariedade administrativa na busca dos meios mais econômicos, razoáveis e eficientes para se atingir o verdadeiro interesse público.

Sobre o autor
Antônio Rodrigues Miguel

Advogado integrante do escritório Tayrone de Melo Advogados, pós-graduado em Direito Administrativo e Constitucional pela Puc-GO, pós-graduado em Direito Civil e Processo Civil pela Universidade Cândido Mendes do Rio de Janeiro, pós-graduado em Direito do Consumidor pela Universidade Federal de Goiás. Membro da comissão de Direito Digital e Informática da OAB/GO e da Comissão Direito do Consumidor da OAB/GO, membro do IGDD – Instituto Goiano de Direito Digital.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

MIGUEL, Antônio Rodrigues. As discriminações nos concursos públicos e os princípios constitucionais do Direito Administrativo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3486, 16 jan. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/23465. Acesso em: 15 nov. 2024.

Mais informações

Publicado na revista Prática Jurídica, Editora Consulex, Ano X, nº 116, 30 de novembro de 2011.

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