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A importância e a possibilidade de alteração do nome civil das pessoas naturais

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Agenda 25/03/2014 às 11:12

Conclusão

O direito ao nome, deve ser reconhecido e respeitado pelo ordenamento jurídico por configurar como um dos maiores direitos da personalidade.

A tutela dos direitos da personalidade está cada vez mais intensa e o ser humano passou a ser o centro do ordenamento jurídico, não pelo ter, mas sim pelo ser. Há um consenso doutrinário em considerá-los como direitos subjetivos inatos, vitalícios, absolutos, relativamente indisponíveis, extrapatrimoniais e intransmissíveis. Tem como objeto, bem ou valor inerente ao titular, que é a sua própria pessoa, considerada nos seus aspectos essenciais, pertinente à sua integridade física, moral e intelectual. Se os direitos da personalidade não existissem, o ser humano não existiria como tal. A personalidade não é um direito, mas dela irradiam-se direitos.

É consabido que os direitos da personalidade são o mínimo imprescindível para o ser humano desenvolver-se dignamente e deve ser encarado como um valor máximo do ordenamento, modelador da autonomia privada.

É, por isso, que a Constituição Federal de 1988 tem como princípio nuclear a dignidade da pessoa humana que, segundo Cristiano Chaves (2007), é a cláusula geral de proteção e desenvolvimento da personalidade do indivíduo que assegura ao mesmo que direcione sua vida íntima de maneira que melhor lhe convir, permitindo-lhe receber respeito do Estado e dos demais. A Constituição garante a cidadania, o direito a ter direitos, de votar e ser votado e não se pode ter cidadania onde há um conflito entre o seu ser e o dever ser social.

O nome é o sinal externo que identifica e individualiza a pessoa na sociedade e na família. Ele nasce com a pessoa e o acompanha durante toda a vida, até pós-morte. Não se extingue com a morte. Pois, permanece vivo na memória daqueles que a conheceram.

Há algum tempo, a inalterabilidade do nome vem sendo relativizada, pois se tem admitido a autonomia jurídica do titular em relação ao nome.

O presente trabalho procurou discorrer acerca da composição do nome e o Registro Público. Segundo a Lei 6.015/73 e as recentes alterações impostas pela Lei nº. 11.924/2009 e pela Lei nº. 12.100/2009, pode-se reconhecer que o nome compõe-se de prenome e sobrenome, sendo requisito obrigatório declarar o nome completo.

A conclusão lógica a que se chega é que, nos casos excepcionais e nas hipóteses legais, e desde que não prejudique a terceiros, é possível a retificação ou a alteração do nome, e também do sobrenome, quando, por exemplo, o prenome expõe o portador ao ridículo, onde pode ser substituído por apelidos públicos notórios.

Os nomes, também, podem ser alterados ou modificados nas seguintes situações: corrigidos quando houver erro gráfico; alterados por decisão judicial que reconheça motivo justificável para a alteração; pela vontade do titular no primeiro ano seguinte ao da maioridade civil; para substituição do prenome de testemunha de crime; adição ao nome do sobrenome do cônjuge e adoção, etc. Assim, somente a análise do caso concreto, baseada na legislação vigente, é que permitirá dizer se esse ou aquele nome pode sofrer retificações ou mudanças.

Recentemente, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça permitiu, em casos excepcionais, o abrandamento da regra do princípio geral da imutabilidade do registro civil e definiu que uma pessoa pode mudar o seu nome, desde que respeite a sua estirpe familiar, mantendo os sobrenomes da mãe e do pai. (STJ - REsp 1256074 (2011/0075808-0) – Publicado no DJE em 28/08/2012). Também a Terceira Turma autorizou a alteração em que havia um pedido de acréscimo de sobrenome em homenagem aos pais de criação, ao entendimento de que a simples incorporação, na forma pretendida, não alterava o nome de família (STJ - REsp 605.708 – Publicado no DJE em 05/08/2008). Em outro julgamento, o mesmo Colegiado entendeu que não é possível alterar ou retificar registro civil em decorrência de adoção da religião judaica. A ministra relatora, Nancy Andrighi, argumentou que, por mais compreensíveis que sejam os fundamentos de ordem religiosa, é preciso considerar que o fato de a família adotar a religião judaica não necessariamente significa que os filhos menores seguirão tais preceitos durante toda a vida. (STJ - REsp 1.189.158 – Publicado no DJE em 11/02/2011).

Já a Corte Especial do STJ não homologou a sentença estrangeira em que um brasileiro naturalizado americano mudou o sobrenome. O ministro relator, João Otávio de Noronha, defendeu que é inviável a alteração de sobrenome quando se tratar de hipótese não prevista na legislação brasileira e baseou-se sua decisão na vedação contida no artigo 56 da Lei de Registros Públicos (STJ - AgRg na SEC 3999 (2009/0130035-1 – Publicado em 18/05/2012).

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A filiação socioafetiva predomina sobre o vínculo biológico e, portanto, não altera  o registro civil, ou seja, a ausência de vínculo biológico entre o pai registral e o filho registrado, por si só, não tem o condão de taxar de nulidade a filiação constante no registro civil, principalmente se existente, entre aqueles, liame de afetividade, assim, com base nesses argumentos, decidiu a Terceira Turma do STJ, para atender ao melhor interesse da criança, que deveria permanecer com o nome do pai afetivo (STJ - REsp 1.259.460 – Publicado em 29/06/2012).

Em relação a alteração de nome do transexual, o Superior Tribunal de Justiça julgou que o transexual que tenha se submetido à cirurgia de mudança de sexo pode trocar nome e gênero em registro sem que conste anotação no documento. Em uma decisão inédita (STJ - REsp 1.008.398), em 15/10/2009, o STJ julgou o caso de um transexual em São Paulo, que realizou a cirurgia de redesignação sexual. Após não ter conseguido a mudança no registro junto à Justiça paulista, ele recorreu ao Tribunal Superior. A decisão da Terceira Turma do STJ é inédita porque garante que nova certidão civil seja feita sem que nela conste anotação sobre a decisão judicial. O registro de que a designação do sexo foi alterada judicialmente poderá figurar apenas nos livros cartorários. A ministra relatora do recurso, Nancy Andrighi, afirmou que a observação sobre alteração na certidão significaria a continuidade da exposição da pessoa a situações constrangedoras e discriminatórias. Anteriormente, em 2007, a Terceira Turma analisou caso semelhante (STJ - REsp 678.933) e concordou com a mudança desde que o registro de alteração de sexo constasse da certidão civil. Após, a recente decisão do STJ, não é mais raro encontrar outras decisões, posteriores, iguais, pois o objetivo principal é a harmonização do sexo biológico com o sexo psicológico e a inserção social e profissional do transexual.

Finalizando, vale registrar que uma nova lei, a Lei n° 12.100/2009, alterou os arts 40, 57 e 110, da Lei dos Registros Públicos (LRP), com a finalidade de permitir que a retificação de assentos de Registro Civil seja feita no Cartório, sem a necessidade de sentença proferida pela autoridade judicial competente. É a retificação extrajudicial.


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Sobre a autora
Aricele Julieta Costa de Araujo

Advogada em Aracaju (SE).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ARAUJO, Aricele Julieta Costa. A importância e a possibilidade de alteração do nome civil das pessoas naturais. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 19, n. 3919, 25 mar. 2014. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/27150. Acesso em: 23 dez. 2024.

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