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Outorga conjugal: é preciso autorização do cônjuge para alienar imóveis?

Agenda 10/01/2017 às 12:58

O Código Civil de 2002 determina a necessidade de outorga conjugal (anuência do cônjuge) para a validade de determinados atos e negócios jurídicos, todavia o tema traz diversas nuances a serem debatidas e compreendidas.

O Código Civil de 2002 determina a necessidade de outorga conjugal (anuência do cônjuge) para a validade de determinados atos e negócios jurídicos, restando como anulável o ato que a outorga faltar e não for suprida judicialmente.

A outorga conjugal existe no ordenamento jurídico com a finalidade de controle patrimonial, isto é, a fim de evitar prejuízo pela disposição imobiliária por um dos cônjuges ao outro que não é titular do bem. Tal preocupação se dá considerando que em eventual dissolução da sociedade conjugal, terá que ser preservada a meação do cônjuge.

Assim, dispõe o artigo 1.647 do Código Civil de 2002:

Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta:

I - alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis;

II - pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos;

III - prestar fiança ou aval;

IV - fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação.

Parágrafo único. São válidas as doações nupciais feitas aos filhos quando casarem ou estabelecerem economia separada.

Da leitura do artigo, podemos notar que a exigência da outorga conjugal se faz em negócios de maior expressão econômica, tais como venda, doação, troca, alienação em geral, oneração ou gravame imobiliário, como usufruto, servidão, superfície, hipoteca ou alienação fiduciária. Tudo isso em vista da importância que o sistema confere ao bem de raiz e à sua proteção.

Com relação a Promessa de Compra e Venda, embora haja divergência nos Tribunais em diversas decisões, nos filiamos ao entendimento do professor Luiz Antônio Scavone Junior, de que nos contratos preliminares de compromisso de compra e venda, ainda que seja exigido ao fim, para a efetiva transferência da propriedade, a escritura pública, a outorga conjugal é necessária ao promitente vendedor.

Da leitura do artigo anterior também é possível notar que a regra não aplica a todos os regimes de bens. Isto é, a outorga conjugal é dispensada nos casos de separação total de bens (convencional ou legal, já que a lei não distingue), e também no regime da participação final nos aquestos, quanto aos bens particulares, desde que haja pacto antenupcial neste sentido (art. 1.656 CC).

Assim, a outorga conjugal será inafastável nos regimes da comunhão universal, comunhão parcial e participação final dos aquestos quando não houver pacto antenupcial dispondo em contrário.

Relativamente aos bens particulares dos cônjuges, embora não estejam, sujeitos à comunicabilidade, seus reflexos patrimoniais implicam no controle exercido mediante a outorga conjugal. Conforme disposto pelo artigo 1.660, incisos IV e V, entram na comunhão as benfeitorias em bens particulares e os frutos dos bens particulares. Assim, todo o ato de disposição deste bem, embora particular, tende a desfalcar, onerar ou reduzir o patrimônio do casal,  ainda que de titularidade exclusiva de apenas um dos consortes, necessitando do consentimento do cônjuge não titular.

Art. 1.660. Entram na comunhão:

IV – as benfeitorias em bens particulares de cada cônjuge;

V – os frutos dos bens comuns, ou dos particulares de cada cônjuge, percebidos na constância do casamento, ou pendentes ao tempo de cessar a comunhão.

Outra dúvida bastante comum relativamente a necessidade ou dispensa de outorga conjugal é no que tange à renúncia de herança ou na cessão de direitos hereditários. Inicialmente vale lembrar que até a partilha, a herança é considerada bem indivisível e imóvel (artigo 80, inciso II do Código Civil).

Assim, temos que na renúncia abdicativa (renúncia propriamente dita), onde o herdeiro não aceita a herança, não há transmissão de patrimônio nem qualquer alienação por parte do renunciante, e, deste modo não há que se falar em outorga conjugal qualquer que seja o regime de bens adotado. Neste caso, o outro cônjuge tem uma mera expectativa de direito, mas tal está condicionada à aceitação do herdeiro.

Diversamente ocorre na renúncia translativa (cessão), pois aqui ocorre a transmissão da herança, sua aceitação pelo herdeiro e posterior determinação de terceiro cessionário. Neste caso, a herança passou a fazer parte do patrimônio do herdeiro e assim deve se avaliar, conforme o regime de bens, a necessidade da outorga conjugal.

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Por fim, necessário se faz abordar as consequências da ausência da outorga quando imprescindível para o ato.

Excetuados os regimes em que é dispensada, a ausência de outorga conjugal implica em nulidade relativa (ou anulabilidade). A anulabilidade pode ser confirmada no prazo de dois anos a contar da dissolução da sociedade conjugal (e não do ato) e pode ser movida pelo cônjuge ou seus herdeiros (artigos 1.649 e 1.650).

Há ainda a possibilidade de suprimento judicial da outorga conjugal, isto é, nos casos que um dos cônjuges se recusa a consentir (por mero capricho) com o negócio ou esteja impossibilitado em razão de doença, por exemplo, a lei coloca à disposição do cônjuge que se sentir prejudicado a possibilidade de suprimento da outorga conjugal pela via judicial.

Ainda com relação ao tema, importante destacar que outorga conjugal trata-se de uma anuência, quando o bem é de propriedade exclusiva de um dos cônjuges. Não confundir com os casos em que o bem pertence a ambos, caso em que o cônjuge não deve anuir e sim manifestar sua própria vontade em vender. Não há suprimento judicial para o proprietário que se recusa a vender (o que pode haver é a ação de extinção de condomínio, fundamentada no artigo 1.322 do Código Civil).

Na anuência o cônjuge pratica o ato por si só, sendo este avalizado pelo cônjuge anuente, mas a carga volitiva (a vontade de praticar o ato) é exclusiva daquele que o faz, cabendo ao outorgante apenas a autorização da prática. Já no caso em que ambos são proprietários, devem figurar como partes.

Sobre a autora
Janine Bertuol Schmitt

Bacharel em Direito pela UNISC (2009), pós-graduada em Direito Imobiliário pela Universidade Estácio de Sá (2017). Atuação em assessoria jurídica e contencioso nas áreas de direito de sucessões (inventários e partilha), societário e direito imobiliário (assessoria jurídica para urbanizadoras, imobiliárias, construtoras, corretores). Membro da Comissão de Direito Imobiliário da OAB Subseção de Santa Cruz do Sul/RS (2020/22). Escritora em portais jurídicos (Jusbrasil, Jus.com.br, Direito Net), em revistas jurídicas (Diário das Leis - Boletim do Direito Imobiliário e Revista Síntese do Direito Imobiliário) e jornais locais (coluna quinzenal no Riovale Jornal 2017/19).

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