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Joesley Batista. Prisão de um insider trader?

Agenda 21/09/2017 às 15:00

O insider trading subverte o mercado e cria condições desiguais de concorrência. No Brasil, é raro que crimes desse tipo sejam punidos.

A prisão preventiva de Wesley Batista, presidente da JBS, é a primeira realizada no Brasil por insider trading. Nem Eike Batista, preso no início do ano, foi por esse motivo. Xerife do mercado, a Comissão de Valores Mobiliários (CVM) apontou recentemente na sua análise que havia indícios de uso de informação privilegiada pelos controladores da JBS.

Wesley e Joesley são investigados na Tendão de Aquiles em inquérito sobre manipulação do mercado financeiro, referente ao suposto lucro obtido com a venda de dólares às vésperas da divulgação da delação premiada dos executivos da J&F.

Noticia-se que antes do vazamento da delação da família Batista em maio, a JBS realizou uma grande operação no mercado futuro de dólar e investiga-se se os controladores da empresa usaram informação privilegiada para evitar perdas financeiras. Antes da prisão de hoje, a JBS teria contratado estudo para mostrar que, em tais operações, não houve ganho. Ao mercado mais cedo, a JBS informou que ainda não teve acesso à integra da decisão da Justiça.

Segundo o site de Mirian Leitão(O Globo, dia 13.09.2017) a  estimativa do MPF é que os irmãos Batista tenham lucrado US$ 100 milhões operando no câmbio com informação privilegiada. Eles previram a alta da moeda americana quando o acordo de delação fosse divulgado, o que de fato ocorreu. O câmbio avançou 9%. As operações da dupla no mercado futuro movimentaram quase US$ 3 bi.

A Procuradoria lembra que o ganho com a informação privilegiada foi quase o mesmo da multa de US$ 110 mi estipulada aos irmãos no processo criminal. A multa maior, de US$ 10,3 bi, foi aplicada sobre a empresa J&F, controladora das companhias do grupo.

É um caso pioneiro de prisão preventiva para esse crime.

A prisão preventiva, que é um dos exemplos de prisão provisória, antes do trânsito em julgado da sentença, só pode ser decretada "quando  houver prova de existência do crime e indícios suficientes de autoria", como se lê do artigo 312 do Código Penal. Há de se comprovar a materialidade do crime, a existência do corpo de delito, que prova a ocorrência do fato criminoso, seja por laudos de exame de corpo de delito ou ainda por documentos, prova testemunhal.

A isso se soma como requisito a existência de  "indícios suficientes de autoria", que deve ser apurada em via de fumaça de bom direito.

Tal despacho que decretar a prisão preventiva, a teor do artigo 315 do Código de Processo Penal, deve ser fundamentado.

O certo é que a Lei 12.403/11 manteve os requisitos da prisão preventiva: prova da existência de crime (materialidade);  indícios suficientes de autoria (razoáveis indicações da prova colhida); garantia da ordem pública; garantia da ordem econômica; conveniência da instrução criminal; garantia da aplicação da lei penal.

Há os serviços de fiscalização e de regulamentação, bem como o notório interesse da autarquia federal Comissão de Valores Mobiliários(CVM) em estabelecer um mercado de valores mobiliários hígido, saudável, íntegro e eficiente,O insider trading é uma das práticas mais perniciosas do mercado e consiste na negociação de valores mobiliários baseada no conhecimento de informações relevantes que ainda não são de conhecimento público, com o objetivo de auferir lucro ou vantagem de mercado. Desde 2001, tal prática é considerada crime, diante da redação que se dá à Lei 10.303/01, que alterou a Lei 6.385/76.

Se o mercado de valores mobiliários é um instrumento essencial para o crescimento econômico brasileiro e sua eficiência depende além de normas adequadas e de bom funcionamento de instituições, as práticas chamadas de não equitativas devem ser censuradas, pois além de causar danos a investidores, causam impacto suficientemente hábil a afetar a credibilidade e a harmonia do próprio mercado e a economia do pais, que sofre inegáveis prejuízos.

O agente age antes da divulgação da informação privilegiada que é toda aquela que não tornada pública, sendo precisa e dizendo respeito a qualquer emitente ou a valores mobiliários ou outros instrumentos financeiros, seriam idôneas, se lhe fosse dada publicidade, para influenciar de maneira sensível o preço no mercado. A informação privilegiada sobre determinada companhia para negociar com valores mobiliários por ela emitidos é uma situação de manifesta vantagem em relação aos demais investidores não detentores da informação (insider trading). Trata-se do aproveitamento de informações reservadas sobre a sociedade emissora de títulos, em detrimento dos demais acionistas, que as ignoram, como disse Luiz Gastão Paes de Barros Leâes (Mercado de capitais e insider trading, São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais, 1982, pág. 139). O comportamento desleal dos insiders ofende não só os direitos dos demais investidores, que ficam desprotegidos perante os grandes acionistas e demais detentores de informações privilegiadas, como ainda ao mercado, de forma a destruir a confiança e a lisura das relações, que constituem a base do sistema.

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O objetivo fundamental da repressão ao insider trading é possibilitar o desenvolvimento equilibrado do país e o atendimento do interesse da coletividade, fundamentais para o sistema financeiro nacional e ao atendimento aos princípios da ordem econômica, a teor do artigo 170 da Constituição Federal.

O sujeito ativo do crime é operador no mercado de valores mobiliários, hipótese em que se considera um crime próprio.

Podem cometê-lo uma autoridade, que sob dever de sigilo, não pode divulgar fatos sigilosos, como é o caso de ter informações sobre futuras medidas que serão tomadas na intervenção no domínio econômico.

Ainda será o caso do particular que se beneficia de sua posição privilegiada na empresa, com seu poder de voto, para utilizar informações sobre fatos relevantes antes que estes sejam divulgados no mercado.

Trata-se de crime formal, de perigo concreto, permanente,  em que é possível a tentativa se a informação esteja sendo passada por escrito e se extravie.

Esse tipo de conduta subverte o mercado, cria condições desiguais. Nem sempre, porém, as suspeitas são investigadas de maneira profunda. A manipulação provoca comentários, mas são as autoridades que conseguem ter acesso às ordens de compra e venda, que detém o poder de colher os dados para formar um processo. Em outros países, investidores que atuam assim são presos. Aqui no Brasil, é raro que crimes desse tipo sejam punidos. 

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. Joesley Batista. Prisão de um insider trader?. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5195, 21 set. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/60517. Acesso em: 2 nov. 2024.

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