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Publicidade comercial em TV paga ao público brasileiro por empresa contratada no exterior

Agenda 02/12/2017 às 15:24

O artigo discute sobre o entendimento jurisprudencial quanto ao espaço de propaganda em TV paga, que foi objeto de julgamento pelo STF.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal, na sessão extraordinária realizada no dia 8 de outubro do corrente ano,  julgou inconstitucional o artigo 25 da Lei 12.485/2011, que dispõe sobre a comunicação audiovisual de acesso condicionado (TVs por assinatura). O dispositivo veda a oferta de canais que veiculem publicidade comercial direcionada ao público brasileiro, contratada no exterior, por agência de publicidade estrangeira.

A decisão foi tomada no julgamento conjunto das Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) 4679, 4747, 4756 e 4923, que questionam vários pontos da Lei 12.485/2011. Por unanimidade, os ministros consideraram improcedentes as ADIs 4747, 4756 e 4923. Em relação à ADI 4679, por maioria, considerou-se parcialmente procedente, somente para declarar a inconstitucionalidade do artigo 25. Nesse ponto, ficou vencido o ministro Edson Fachin, que considerava a ação improcedente.

O julgamento foi retomado com o voto-vista do ministro Dias Toffoli, que acompanhou integralmente o relator, ministro Luiz Fux. A seu ver, o artigo 25 viola os princípios da isonomia e da razoabilidade. “O dispositivo confere tratamento favorecido às agências nacionais de publicidade, criando uma reserva de mercado para tais empresas no âmbito de TV por assinatura”, disse.

Para o ministro Dias Toffoli, não há motivos para um tratamento privilegiado às agências de publicidade nacionais, pois elas estão entre as maiores e mais premiadas do mundo. “Nem sequer houve debate público em torno das razões para a edição desse artigo”, citou. Ele destacou, ainda, que o dispositivo não fixa prazo para o fim da reserva de mercado.

Os revolucionários de 1789 estabeleceram o princípio da igualdade perante a lei.

Há uma distinção entre a igualdade perante a lei e a igualdade na lei. Aquele corresponde à obrigação de aplicar as normas jurídicas gerais aos casos concretos, na conformidade com que elas estabeleceram, mesmo se delas resultar uma discriminação, o que caracteriza a isonomia puramente formal. Enquanto, isso a igualdade na lei exige que, nas normas jurídicas, não haja distinções que não sejam autorizadas pela própria Constituição. A igualdade perante a lei seria uma exigência feita a todos aqueles que aplicam as normas jurídicas gerais aos casos concretos, ao passo que a igualdade não seria uma exigência dirigida a todos àqueles que criam as normas jurídicas gerais como àqueles que as aplicam aos casos concretos.

No Brasil a igualdade perante a lei tem como destinatários tanto o legislador como os aplicadores da lei.

Para Francisco Campos (O princípio constitucional da igualdade perante a lei e o Poder Legislativo), o legislador é o destinatário principal do princípio.

O princípio da igualdade não pode ser entendido e aplicado num sentido individualista.

O princípio da igualdade não se dirige a pessoas integralmente iguais entre si, mas àquelas que são iguais sob os aspectos tomados em consideração pela norma, o que implica que os iguais podem diferir totalmente sob outros aspectos ignorados ou considerados como irrelevantes pelo legislador. Este julga, assim, como “essenciais ou relevantes”, certos aspectos ou características das pessoas, das circunstâncias ou das situações nas quais essas pessoas encontram, e funda sobre esses aspectos ou elementos, as categorias estabelecidas pelas normas jurídicas. Sendo assim, como ainda afirmou José Afonso da Silva (Direito Constitucional Positivo, pág. 192), as pessoas que apresentam os aspectos “essenciais” previstos por essas normas são consideradas encontrar-se em situações idênticas, ainda que possam diferir por outros aspectos ignorados ou julgados irrelevantes pelo legislador.

As pessoas ou situações são iguais ou desiguais de modo relativo, sob certos aspectos.

A desigualdade trazida naquela norma historiada é, sem dúvida, fora da razoabilidade.

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A razoabilidade é vista na seguinte tipologia:

a) Razoabilidade como equidade: exige-se a harmonização da norma geral com o caso individual;

b) Razoabilidade como congruência: exige-se a harmonização das normas com suas condições externas de aplicação;

c) Razoabilidade por equivalência: exige-se uma relação de equivalência entre a medida adotada e o critério que a dimensiona.

Não se pode eleger uma causa inexistente ou insuficiente para a atuação estatal. Os princípios constitucionais do Estado de Direito (artigo 1º) e do devido processo legal (artigo 5º, LIV), da Constituição exigem o confronto com parâmetros externos a elas.

Não se pode conviver com discriminações arbitrárias.

Há de se considerar uma razoabilidade interna, que se referencia com a existência de uma relação racional e proporcional entre motivos, meios e fins da medida e ainda uma razoabilidade externa, que trata da adequação de meios e fins. No caso em tela há absoluta dissonância entre os motivos, meios e fins da medida, de forma a aduzi-la como fora do razoável.

Afronta-se a livre iniciativa de forma a criar uma “reserva de mercado” no setor.

A valorização do trabalho humano e a livre iniciativa demonstram que a Constituição de 1988 prevê uma sociedade brasileira capitalista moderna, em que haja a conciliação e composição dos titulares de capital e de trabalho como uma necessidade a ser viabilizada pela atuação do Estado.

Por sua vez, André Ramos Tavares (Direito constitucional econômico, 3ª edição, São Paulo, editora Método, pág. 256) acentua que a livre concorrência é um dos fundamentos de qualquer sistema capitalista.

Carlo Barbieri Filho (Disciplina jurídica da concorrência: abuso do poder econômico, São Paulo, Resenha Tributária, 1984, pág. 119) assim define: “Concorrência é disputar, em condições de igualdade, cada espaço com objetivos lícitos e compatíveis com as aspirações nacionais. Consiste, no setor econômico, na disputa entre todas as empresas para conseguir maior e melhor espaço no mercado.”.

Ainda é André Ramos Tavares (obra citada,pág. 256) quem define a livre concorrência como a abertura jurídica concedida aos particulares para competirem entre si, em segmento lícito, objetivando o êxito econômico pelas leis de mercado e a contribuição para o desenvolvimento nacional e a justiça social.

Portanto, a livre concorrência, longe de exigir uma absoluta abstenção do Estado, impõe o que se chama de intervenção normativa e uma fiscalização deste, no sentido de permitir e garantir que, no mercado, permaneça a liberdade geral, que poderia estar sendo tolhida pela atuação de algum agente econômico. Esse princípio embasa o artigo 170, inciso IV, da Constituição.

Luiz Alberto David  Araújo e Vidal Serrano Nunes Júnior (Curso de direito constitucional, 4ª edição, São Paulo, Saraiva, 2001, pág. 375) lembram que, enquanto princípio da ordem econômica e financeira, a livre concorrência tem por objetivo impedir a formação do monopólio do mercado, na medida em que o preceito constitucional abomina formas de dominação do mercado, como cartéis, trustes e monopólios em geral. Conclui-se que há conceitos verdadeiramente antitéticos: monopólio e livre concorrência.

A Constituição Federal a isso atenta, em seu artigo 173, § 4º, determina que o Estado estabeleça em lei punições às práticas que distorcem a situação de livre concorrência, estatuindo, a respeito de condutas da iniciativa privada, que “a lei reprimirá o abuso de poder econômico que vise à dominação dos mercados, à eliminação da concorrência e o aumento arbitrário dos lucros”.

No Brasil, há o sistema brasileiro de defesa da concorrência, formado pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica – Cade e pela Secretaria de Acompanhamento Econômico do Ministério da Fazenda, com atribuições previstas em lei (Lei 12.529/2011).

A concorrência empresarial, em sendo assim, não é um valor-fim, mas um valor-meio, a ser seguida na tutela do direito econômico.

Distinguem-se posição dominante no mercado e poder econômico: Para Sérgio Varella Bruna (O poder econômico, São Paulo, Ed. RT, 2001, pág. 115), posição dominante é aquela que confere a seu detentor quantidade substancial de poder econômico ou de mercado, a ponto de que pode ele exercer influência determinante sobre a concorrência, principalmente, no que se refere ao processo de formação de preços.

O legítimo uso do poder econômico não é censurável. Reprime-se o abuso de poder, que resulta na exclusão de outros agentes econômicos, que ficam sem condições de competir. Comprova-se tal abuso de poder econômico quando ele é usado para impedir a iniciativa dos outros, com a ação no campo econômico ou quando o poder econômico passa a ser o fator concorrente para um aumento arbitrário de lucros do detentor do poder.

É para o caso um verdadeiro abuso de poder econômico por parte das empresas nacionais em relação às empresas estrangeiras.

Não se pode fazer paralelo de uma reserva de conteúdo publicitário com as cotas de conteúdo nacional e independente na TV por assinatura, previstas na Lei 12.485/2011 e no artigo 221, inciso II, da Constituição Federal. As cotas estão lastreadas, sobretudo, na circunstância fática de que produtoras nacionais independentes de conteúdo audiovisual atuam no mercado de TV por assinatura em situação de profunda desvantagem em relação às produções estrangeiras.

Sobre o autor
Rogério Tadeu Romano

Procurador Regional da República aposentado. Professor de Processo Penal e Direito Penal. Advogado.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

ROMANO, Rogério Tadeu. Publicidade comercial em TV paga ao público brasileiro por empresa contratada no exterior. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 22, n. 5267, 2 dez. 2017. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/61776. Acesso em: 22 dez. 2024.

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