3. Inovações da reforma trabalhista
A recentemente Lei nº 13.467/2017 (conhecida como Reforma trabalhista) promoveu sensíveis alterações na CLT estabelecendo em particular a equiparação entre dispensa individual, plúrima e coletiva e fixando a premissa de que não há necessidade de autorização prévia de entidade sindical ou de celebração de convenção coletiva ou acordo coletivo para sua efetivação (art. 477-A, CLT).
3.1. Equiparação das dispensas individuais, plúrimas e coletivas para todos os fins
O art. 477-A, da CLT introduzido pela reforma trabalhista estabelece a equiparação para todos os fins das dispensas individuais, plúrima e coletivas.
Pedro Paulo Teixeira Manus de antemão adverte que o legislador inapropriadamente equipara as dispensas imotivadas individuais, plúrimas e coletivas, como se fossem figuras jurídicas passiveis de equiparação, esquecendo-se que os efeitos da dispensa coletiva geram grande impactos não só na vida empresarial, mas de toda a comunidade. (Manus, 2017).
Em termos práticos, podemos distinguir dispensa coletiva e dispensa individual, pois esta atinge um único empregado, diferentemente daquela que constitui múltiplas demissões de trabalhadores num determinado lapso temporal.
No que se refere à dispensa plúrima, ambas lidam com multiplicidade de desligamentos no decorrer de certo lapso temporal e determinada empresa ou estabelecimento. Porém, o aspecto diferenciado dessas duas modalidades de dispensa está no elemento volitivo de cada instituto.
Ns dispensas plúrimas, tais como nas individuais, a intenção do empregador é dispensar um ou alguns empregados específicos por razões subjetivas. Já na dispensa coletiva o empregador rescinde o vínculo empregatício de vários trabalhadores por razões objetivas, normalmente de ordem econômico-conjuntural.
Outro aspecto, agora doutrinário, é o posicionamento desses institutos nas ramificações do Direito do Trabalho, haja vista que uma está ligada ao Direito individual do Trabalho e a outra catalogada no Direito coletivo do Trabalho, sujeitos a princípios, normas e institutos próprios.
Nessa toada, Enoque Ribeiro dos Santos ensina que a dispensa coletiva deve ser analisada sob o prisma dos “direitos difusos, coletivos e individuais homogêneos, e os direitos mais elevados da dignidade da pessoa humana” (SANTOS, 2017).
Não obstante isso, a novel legislação equipara essas três modalidades de dispensa para todos os fins, sendo este o primeiro impacto da reforma trabalhista na dispensa coletiva.
3.2. Não necessidade de autorização prévia de entidade sindical ou de celebração de convenção coletiva ou acordo coletivo para sua efetivação.
O artigo 477-A da CLT, introduzido pela reforma trabalhista, estabelece que não há necessidade de autorização previa de entidade sindical ou de celebração de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho para sua efetivação.
Mauricio Godinho delgado e Gabriela Neves Delgado compreendem que a inovação legislativa pretende afastar a intervenção do sindicato de trabalhadores no grave e dramático contexto socioeconômico da dispensa coletiva, e acrescentam:
O novo art. 477-A da Consolidação das Leis do Trabalho agrega mais um impactante elemento no rol de medidas tomadas pela Lei da Reforma Trabalhista no sentido de enfraquecer o sindicalismo de trabalhadores no País, afastando-o de suas bases profissionais e dos problemas mais candentes por estas enfrentadas (DELGADO, e NEVES DELGADO, 2017, p. 180).
Os referidos autores são enfático ao dizer ao criticarem o referido dispositivo:
Demonstra também, lamentavelmente, a depreciação do diploma legal ordinário com respeito ao Estado Democrático de Direito constituído no país pela Constituição de 1988, com seus pilares normativos estruturantes de natureza democrática e inclusiva- todos manifestamente negligenciados pelo recém aprovado art. 477-A da Consolidação das Leis do Trabalho (DELGADO, e NEVES DELGADO, 2017, p. 181).
Além de ir de encontro ao posicionamento jurisprudencial pacificado pelo Tribunal Superior do Trabalho, a referida norma colide as normas internacionais da OIT e Países Desenvolvidos, supramencionadas, bem como desrespeita no âmbito interno nada mais nada menos que a própria Constituição Federal de 1988.
Entrementes, Mauricio Godinho Delgado em coautoria com Gabriela Neves Delgado entendem que:
Todas essas várias normas constitucionais (princípios e regras da Constituição de 1988) continuam em plena vigência no País, embora, a partir da vigência da Lei n. 13.467/2017, mostrem-se claramente desrespeitadas pelo afastamento do ser coletivo obreiro da dinâmica das dispensas massivas deflagradas pelo empregador em sua empresa ou em estabelecimentos dela componentes (DELGADO, e NEVES DELGADO, 2017, p. 181).
Desta forma, o segundo impacto da reforma trabalhista na dispensa coletiva é a tentativa de afastar a tutela sindical previa por meio da negociação coletiva para efetivação da dispensa em massa de trabalhadores.
4. Atual Posicionamento dos Tribunais Trabalhistas
Feitas todas essas considerações, é necessário analisar qual posicionamento a justiça do trabalho está apontando após o advento da reforma trabalhista para o despedimento coletivo.
A temática aqui analisada está na pauta de praticamente todos os Tribunais Regionais do Trabalho, como identificado na notícia divulgada pelo TST, ex vi, TRT 1ª (RJ), TRT 2 (SP), TRT 3ª (MG), TRT 4ª (RS), TRT 12ª (SC), TRT 15ª (SP), TRT 17ª (ES) e TRT 19ª (AL).
No entanto, por razões metodológicos e para fins de delimitação da pesquisa o presente estudo analisará, especificamente, os cinco pioneiros e principais casos de demissão coletiva posteriores à reforma trabalhista divulgados para a academia jurídica, a seguir expostos:
4.1. Tribunal Regional do Trabalho da 1ª Região
Dentro do âmbito do Tribunal Regional do Trabalho da 1º região destaca-se o mandado de segurança autuado sob o número 0102348-54.2017.5.01.0000, impetrado pela Sociedade de Ensino Superior Estácio de Sá Ltda.
No referido processo o TRT1º cassou a decisão da 21ª Vara do Trabalho do Rio de Janeiro que proibia a dispensa coletiva de professores intentada pela impetrante.
Para o relator, que aqui representa o Tribunal Trabalhista da 1ª Região, não houve provas da alegada dispensa discriminatória, bem como “é permitida pelo atual regramento justrabalhista a dispensa coletiva”.
Argumentou, ainda, que “Se, nos termos da norma coletiva e da nova redação do art.477-A, da CLT, pela redação da Lei nº 13.467/2017, a impetrante pode dispensar empregados, individualmente ou em grupo, sem prévia negociação com o sindicato da classe, qualquer exigência que impeça, retarde ou diminua o exercício desse direito traduz afronta a direito líquido e certo e decisão administrativa ou judicial que respalde essa exigência constitui arbitrariedade que não pode prevalecer”.
4.2. Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região
O Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) possui entendimento diverso do exarado pelo TRT1ª, supradetalhado, como se verifica no Mandado de segurança nº 0022585-20.2017.5.04.0000 impetrado pela Sociedade de Educação Riter dos Reis Ltda. e Rede Internacional de Universidade Laureate Ltda.
O Tribunal Gaúcho manteve a liminar concedida pelo juízo da 26ª Vara do Trabalho de Porto Alegre e confirmou a proibição da dispensa em massa dos professores sem prévia negociação com o sindicato.
Para o tribunal, o afastamento do art. 477-A da CLT decorre de interpretação sistemática do ordenamento jurídico legal e constitucional vigente. Além disso, ponderou que “há sim um movimento de despedida imotivada de uma coletividade, a ausência de prévia mediação no plano da representação coletiva do Direito do Trabalho encontra óbice na Ordem Constitucional”.
Outrossim, considerou a Constituição Federal assegurou ao Sindicato a defesa dos direitos e interesses coletivos ou individuais da categoria, inclusive em questões judiciais ou administrativas (art. 8º, III), sendo, portanto, inviável cogitar dispensa coletiva sem a assistência do sindicato dos trabalhadores.
4.3. Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região
O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (SP) também apreciou a dispensa em massa de professores efetuada pela instituição Sociedade de Ensino Superior Estácio de Sá Ltda.
Diferentemente do TRT1ª, o TRT 15ª manteve a suspensão da dispensa em massa efetuada pela mesma instituição de ensino, especificamente no pedido de tutela cautelar antecedente autuado sob o nº 0005001-94.2018.5.15.0000, nos autos do Agravo Regimental em Mandado de Segurança 0008600-75.2017.5.15.0000, e tutela de urgência concedida nos autos da Ação Civil Pública 0012347-59.2017.5.15.0153.
O Juízo de primeira instancia tinha considerado que o art. 447-A da CLT introduzido pela reforma trabalhista diz ser dispensável a ‘autorização prévia de entidade sindical’ ou a ‘celebração de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho para sua efetivação’, “mas não dispensa a negociação prévia, que pode resultar em autorização, em celebração de instrumento coletivo o em frustração da negociação”.
Desta sorte, compreendeu que o art. 477-A da CLT analisado sem sua literalidade não exclui a necessidade de negociação prévia para fins de dispensa coletiva, apenas diz ser desnecessária a autorização do sindicato e a conclusão das negociações em Convenção Coletiva de Trabalho ou Acordo Coletivo de Trabalho.
4.4. Tribunal Superior do Trabalho (correição Parcial)
No entanto, o Ministro Ives Grandra da Silva Martins Filho, à época Presidente do TST, reformou monocraticamente tais decisões em sede de correição parcial sob a alegação de ocorrência de situação excepcional de abuso consistente no impedimento ao exercício do direito potestativo de dispensa.
No entendimento do referido Ministro, os Tribunais mitigaram o direito potestativo do empregador de dispensa sem custa causa contra expresso texto de lei, “exigiram o que a lei expressamente dispensa, que é a intermediação negocial do sindicato de classe para as demissões ditas em massa”.
Porém, essas decisões aplicavam-se apenas ao caso concreto, não impedindo novas decisões em sentido contrário.
Cita-se, por exemplo, o MS 0008367-78.2017.5.15.0000 no qual o Tribunal Regional do Trabalha da 15ª Região novamente proibiu a dispensa coletiva sem prévia intermediação do sindical de classe.
O Tribunal asseverou que o disposto no novo art. 477-A da CLT estabelece a não necessidade de autorização prévia, no entanto, a nunca foi exigida a autorização do sindicato para o despedimento coletivo. Também dispõe que não é obrigado haver celebração de convenção coletiva ou acordo coletivo de trabalho.
Ressaltou que a própria reforma trabalhista tem como pilar o “fortalecimento da negociação coletiva” razão pela qual não faz sentido a interpretação que afasta a negociação coletiva na dispensa em massa de trabalhadores.
4.5. Tribunal Regional do Trabalho da 2º Região
Em que pese à controvérsia existente nos demais Tribunais Regionais do Trabalho e Tribunal Superior do Trabalho, o TRT2º em um caso especifico conseguiu solucionar a temática aqui tratada de forma consensual.
Especificamente no caso no processo 10011897-48.2017.5.02.0041, cujo reclamante é o Ministério Público do Trabalho e o Reclamado os Hospitais Bandeirantes S.A e Leforte S.A.
Nesse processo houve um acordo entre as partes e manteve-se os vínculos empregatícios, avençou a estabilidade até 31/12/2018 para os trabalhadores reintegrados e manutenção do plano de assistência médica e odontológica pelo prazo de 8 meses aos empregados que não forem reintegrados, dentre outra vantagens.
Essa solução consensual é salutar, pois harmonizou o interesse de todos, em especial da parte mais fraca (empregados).