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A litigância de má-fé como empecilho à razoável duração do processo

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25/02/2011 às 07:42
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CONCLUSÃO

O objetivo desse trabalho, conforme mencionado na introdução, não é esgotar o tema da morosidade processual e da litigância de má-fé, nem se posicionar de forma definitiva sobre as polêmicas que suscita. O objetivo é contribuir, embora de forma tímida, para enriquecer o debate sobre ele. Deveras, a razoável duração do processo tem merecido holofotes entre os operadores jurídicos, notadamente depois da EC nº 45/2004.

Nessa senda, como recomenda a metodologia da pesquisa à um texto que tenha a pretensão de ser minimamente científico, cabe apresentar algumas conclusões sobre a matéria abordada.

A morosidade na tramitação processual vem sendo um dos maiores entraves à realização da Justiça e o Poder Judiciário há muito permanece inerte perante este problema.

Sempre responsabilizou as normas de processo pela demora e nunca se perguntou o que ele próprio poderia fazer para amenizá-la.

A partir da EC nº 45/2004 foi incluído no catálogo de direitos fundamentais da Constituição da República a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade da sua tramitação.

A partir de então a sociedade passou a cobrar o próprio Poder Judiciário por uma solução, proporcionando um debate por busca de uma maior celeridade no trâmite dos processos, de forma a buscar o efetivo exercício da justiça.

Um dos elementos que mais contribui para a morosidade processual (senão o maior) é a própria conduta das partes, seja com intuito de obter vantagens indevidas, seja simplesmente com o objetivo de retardar o reconhecimento do direito da parte adversa, tornando o processo um verdadeiro martírio.

Vencer pelo cansaço é filosofia processual corrente de muitos escritórios de advocacia e os tribunais trabalhistas podem ser considerados cúmplices deste desrespeito com o trabalhador reclamante.

A prática abusiva no processo,

seguramente, não é o único responsável pela demora na prestação jurisdicional e pela efetivação das decisões judiciais, mas é uma das causas da morosidade da Justiça, tão indesejada pela sociedade quanto combatida pela ciência processual, favorecido pelo sistema legal vigorante, marcado por uma burocracia gigantesca, muitas vezes inútil, sob o pretexto de prestigiar a segurança jurídica, como se esta fosse mais importante que a produção de resultados justos, individual e coletivamente, pela atividade jurisdicional (PAROSKI, 2008).

O que se vê no processo do trabalho é a parte que possui a intenção de atrasar a prestação jurisdicional ou a efetivação da decisão judicial alegando, provocando incidentes e recorrendo quantas vezes bem entender, sem qualquer constrangimento ou penalidade. Mesmo sendo derrotado em todas as oportunidades, muitas vezes com versões que colidem com a Constituição e com a verdade, sem um mínimo de razoabilidade e de possibilidade de êxito, nenhuma sanção sofre. Esta impunidade acaba por incentivar a reiteração desta conduta indesejada.

Conforme já mencionado, na seara trabalhista verifica-se um sem-numero de casos de litigância de má-fé de partes e procuradores que, somados a uma ilimitada tolerância por parte dos magistrados, que muitas vezes abdicam do poder de punir em razão da garantia do devido processo constitucional, proporcionam uma demasiada demora na prestação final da jurisdição, impossibilitando a entrega tempestiva do bem da vida àquele possuidor do direito.

O direito a ampla defesa e ao contraditório devem ser interpretados de forma razoável e em consonância com a razoável duração do processo, pois princípios de mesmo patamar constitucional, notadamente quando, para o bem da Justiça, deve-se limitar exageradas oportunidade de intervenção no processo com objetivos ilícitos, imorais ou contrários aos bons costumes e ao exercício da jurisdição.

Além disso, deve ser considerado que na Justiça do Trabalho invariavelmente se busca o pagamento de verbas de natureza alimentar, sonegadas durante o contrato de trabalho. Verbas estas que, impagas, causam prejuízos irreparáveis ao trabalhador e à sua família, que tem tolhido a possibilidade de buscar a melhoria de sua condição social.

Tratando-se de verbas de cunho alimentar, a chicana e a procrastinação do processo praticadas pelos empregadores em sua atuação em juízo, acarretam presumíveis e graves conseqüências ao trabalhador, que se vê privado de recursos para satisfazer suas necessidades mais prementes, adiando sonhos e a realização de objetivos, diminuindo expectativas e pondo em descrédito a própria Justiça do Trabalho e sua capacidade de pacificar, resolvendo tempestiva e adequadamente os litígios (PAROSKI, 2008).

Deve se ter em mente que as atitudes procrastinatórias normalmente são praticadas por meio de meios processuais legais, em uma aparente licitude, e nem por isso há óbice ao seu reconhecimento e a aplicação das penalidades cabíveis. São o exagero e a ilicitude do resultado pretendido que devem ser coibidos com rigor.

Outrossim, a condenação do litigante de má-fé, semelhante ao que ocorre com a reparação do dano imaterial, deve observar as três funções idênticas à reparação civil por dano extrapatrimonial: compensatória, pedagógica e repressiva, tornando desinteressante ao infrator a reiteração de condutas desta ordem.

Sublinhe-se que os danos causados a outra parte no processo não precisam ser provados, pois são presumidos pela gravidade da conduta do adversário, especialmente pelo tempo que ele conseguiu ganhar em prejuízo aos direitos daquele que tem razão.

A aplicação da multa e a condenação de reparar os danos do litigante de má-fé não exige requerimento da vítima, pois pode ser imposta ex officio pelo juiz, já que o dano não se limita à esfera da parte adversa, mas atinge a própria confiabilidade, eficiência e credibilidade das instituições judiciárias, militando em desfavor da garantia constitucional da razoável duração do processo, havendo interesse público na punição do agressor.

Mauro Vasni Paroski (2008), na mesma linha de raciocínio, registra em seu trabalho que:

(...) há uma considerável redução da efetividade e da celeridade do processo e da eficiência da prestação jurisdicional, colocando as instituições judiciárias em condição de impotência, diante das atitudes procrastinatórias do litigante, transmitindo à opinião pública a impressão de que o sistema judiciário não funciona a contento, é lento, é ineficiente e é incapaz de resolver seus próprios problemas internos, o que dirá os problemas dos jurisdicionados (PAROSKI, 2008).

Identificada a litigância de má-fé como um dos principais obstáculos à rápida solução dos litígios, a Justiça do Trabalho, especialmente os magistrados, não pode ficar inerte perante esta prática corrente nas reclamatórias trabalhistas, onde as partes mentes, dissimulam e procrastinam, incentivados pela falta de qualquer tipo de sanção.

As penas por litigância de má-fé precisam vir à baila também no processo trabalhista, pois somente quando as partes tiverem efetivo prejuízo ao agir com má-fé passarão a se comportar de forma leal, proporcionando um processo mais célere e compatível com o mais novo direito fundamental da razoável duração do processo.


REFERÊNCIAS

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Notas

  1. Infelizmente o que se vê na prática é os magistrados abandonarem os livros depois de aprovação no concurso público. A maioria dos juízes deixa de se atualizar e acompanhar a evolução da doutrina e da jurisprudência e deixa de acompanhar de perto a tramitação dos processos sob sua responsabilidade. Especialmente na Justiça do Trabalho no Rio Grande do Sul, na rotina de uma secretaria judiciária é o Diretor de Secretaria (muitas vezes sem conhecimento do direito e só pela experiência) que redige os despachos, relegando ao juiz somente a tarefa de estar presente às audiências e assinar as minutas, e isso quando não é o próprio servidor as assina, já que com a implantação da assinatura eletrônica basta que o juiz forneça a senha do cartão para que o Diretor assine digitalmente todos os despachos.
  2. Lacunas ontológicas surgem quando as normas existentes não correspondem aos fatos sociais em razão do desenvolvimento das relações, causando o ancilosamento da norma. Lacunas axiológicas evidenciam-se quando há ausência de norma justa, isto é, existe um preceito que, se aplicado, trará um resultado insatisfatório ou injusto (LEITE, 2009, p. 97). Não se aprofundará mais neste tema, porquanto não é o objetivo deste trabalho dissertar sobre a aplicação subsidiária do processo comum ao processo do trabalho.
  3. "Inviável a aplicação da pena por litigância de má-fé ao autor. Não se verificam as hipóteses previstas nos artigos. 14 e 17 do Código de Processo Civil, mas sim, o exercício do direito de ampla defesa, assegurado no inciso LV do art. 5° da Constituição Federal." (Acórdão - Processo 0115400-67.2006.5.04.0373 (AP). Redator: MARIA DA GRAÇA RIBEIRO CENTENO. Data: 13/04/2010 Origem: 3ª Vara do Trabalho de Sapiranga.

"Litiga de má-fé a parte que, com dolo ou culpa, atua no processo de forma temerária, causando dano processual à parte contrária ou à própria administração da Justiça" (TRT/4. Acórdão do processo 0008500-40.2009.5.04.0281 (ED). Redator: MARIA MADALENA TELESCA. Participam: MARIA INÊS CUNHA DORNELLES, BEATRIZ RENCK. Data: 14/07/2010 Origem: Vara do Trabalho de Esteio

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Sobre o autor
Evandro Luis Urnau

Juiz do Trabalho do TRT da 4 Região.<br>Especialista em Direito Material e Processual do Trabalho - IMED. <br>Especialista em Direito e Processo do Trabalho - LFG.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

URNAU, Evandro Luis. A litigância de má-fé como empecilho à razoável duração do processo. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 16, n. 2795, 25 fev. 2011. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/18560. Acesso em: 26 abr. 2024.

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