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Da solução dos conflitos na interpretação e aplicação das regras de isenção

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30/04/2013 às 10:01
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7. Conclusão

Para a compreensão das regras de isenção é fundamental o correto entendimento da isenção como componente da norma tributária, sendo esta entendida em seu sentido amplo, na medida em que delimita sua abrangência. Esta delimitação tem como função a adequação da norma geral à real capacidade contributiva dos contribuintes.

Logo, a conceituação das regras de isenção como benefício ou privilégio fiscal mostra-se equivocada, pois se assim o fosse estas estariam, inclusive, eivadas de inconstitucionalidade, por desrespeito ao princípio da igualdade.

No que tange à competência, fica claro que, excetuadas as hipóteses previstas na Constituição Federal, o mesmo ente federado competente para tributar, tem legitimidade para isentar.

Em respeito ao princípio da legalidade, a isenção, além de ter de ser concedida pelo ente competente, tem de ser prevista por lei.

Ao mesmo tempo, devem as regras de isenção tratar igualmente pessoas de mesma capacidade contributiva, em respeito ao princípio da igualdade, sendo vedado tratamento tributário diferente para contribuintes de igual capacidade.

Portanto, em alguns casos concretos, observa-se haver conflito entre os princípios da legalidade e igualdade na interpretação e aplicação das regras de isenção, surgindo o questionamento acerca da possibilidade de extensão da isenção a hipóteses não expressamente elencadas na lei que a institui.

Para a correta compreensão e solução deste conflito é fundamental a dissociação entre regras e princípios, sendo ambos espécies do gênero norma, observando suas características em relação à forma como regulam o comportamento do cidadão, sua finalidade e justificação que exigem na interpretação e aplicação.

Observa-se serem os princípios imediatamente finalísticos, primariamente prospectivos e com pretensão de complementariedade e parcialidade, enquanto que as regras são normas imediatamente descritivas, primariamente retrospectivas e com pretensão de decidibilidade e abrangência.

Assim, na maioria das vezes o conflito entre regras se dá no plano ideológico, tendo como solução a invalidade de uma regra em detrimento de outra válida.

Já o conflito entre os princípios ocorre, via de regra, no momento da interpretação e aplicação do direito diante de um caso concreto, havendo a sobreposição de um deles em detrimento do outro, através da ponderação.

Esta ponderação é realizada aplicando-se o princípio da proporcionalidade, com suas três características, que disciplinam e racionalizam o processo, devendo o meio utilizado ser adequado, necessário e proporcional.

Como o conflito entre princípios ocorre mais frequentemente no campo concreto, utilizou-se como exemplo o existente na interpretação e aplicação da isenção disposta no art. 6º, XIV da Lei n.º 7.713/88.

Analisando-se o caso sob o prisma do princípio da proporcionalidade, observa-se que o fim de tributar igualmente iguais capacidades contributivas é o meio mais adequado, necessário e proporcional, atendendo à finalidade da regra de isenção de excluir da incidência do Imposto de Renda pessoas portadoras de patologias graves, cujo tratamento é dispendioso, diminuindo substancialmente sua capacidade contributiva.

Assim, embora os argumentos acerca da impossibilidade de extensão da isenção a contribuintes portadores de enfermidades não contempladas pelo rol existente na regra em exame, no sentido de preponderância do princípio da legalidade sobre o da isonomia neste caso concreto, sejam relevantes, acredita-se ser lícita a extensão.


8. BIBLIOGRAFIA

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VANONI, Ezio. Natureza e Interpretação das Leis Tributárias. Rio de Janeiro: Edições Financeiras S.A.


Notas

[1] Ricardo Lobo Torres. Normas de Interpretação e Integração do Direito Tributário. 4 ed. p. 21.

[2] Geraldo Ataliba. Hipótese de Incidência Tributária. 6 ed. p. 66.

[3] Aurélio Pitanga Seixas Filho. Teoria e Prática das Isenções Tributárias. 2 ed. p. 9.

[4] José Souto Maior Borges. Isenções Tributárias. 1 ed. p. 153.

[5] Aliomar Baleeiro. Direito Tributário Brasileiro. 11 ed. p. 118.

[6] Ezio Vanoni. Natureza e Interpretação das Leis Tributárias. P. 336.

[7] José Souto Maior Borges. Isenções Tributárias. 1 ed. p. 251.

[8] José Souto Maior Borges. Isenções Tributárias. 1 ed. p. 257.

[9] Celso Ribeiro Bastos. Curso de Direito Financeiro e de Direito Tributário. 3 ed. p. 130.

[10] Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:

(...)

II – operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ainda que as operações e as prestações se iniciem no exterior;

(...)

§2º. O imposto previsto no inciso II atenderá ao seguinte:

(...)

e) excluir da incidência do imposto, nas exportações para o exterior, serviços e outros produtos além dos mencionados no inciso X, a.

Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:

(...)

III – serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar;

(...)

§3º. Em relação ao imposto previsto no inciso III do caput deste artigo, cabe à lei complementar:

(...)

II – excluir da sua incidência exportações e serviços para o exterior.

[11] Onde o texto diz “norma” deve-se entender “regra” pois as normas não são textos, ou seu conjunto, são construções a partir da interpretação sistemática de textos normativos, contendo regras e/ou princípios.

[12] Celso Ribeiro Bastos. Curso de Direito Financeiro e de Direito Tributário. 3 ed. p. 183.

[13] José Joaquim Gomes Canotilho. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7 ed. p. 1160.

[14] Robert Alexy. Colisão de Direitos Fundamentais e Realização de Direitos Fundamentais no Estado de Direito Democrático. Revista de Direito Administrativo, v. 1. p. 75.

[15] Humberto Ávila. Teoria dos Princípios. 4 ed. p. 44.

[16] Claus – Wilhem Canaris. Pensamento Sistemático e Conceito de Sistema na Ciência do Direito. 3 ed. p. 205.

[17] Helenilson Cunha Pontes. O Princípio da Proporcionalidade e o Direito Tributário. p. 36/37.

[18] Humberto Ávila. Teoria dos Princípios. 4 ed. p. 63.

[19] Humberto Ávila. Teoria dos Princípios. 4 ed. p. 66.

[20] Humberto Ávila. Teoria dos Princípios. 4 ed. p. 69.

[21] Helenilson Cunha Pontes. O Princípio da Proporcionalidade e o Direito Tributário. p. 36.

[22] Aliomar Baleeiro. Direito Tributário Brasileiro. 11 ed. p. 118.

[23] Alberto Xavier. Os princípios da legalidade e da tipicidade da tributação, 1978, p. 74.

[24] José Afonso da Silva. Curso de Direito Constitucional Positivo. 19 ed. p. 423.

[25] Aliomar Baleeiro. Direito Tributário Brasileiro. 11 ed. p. 90.

[26] Embora esteja ciente da distinção entre os princípios da legalidade e o da reserva da lei, no presente trabalho estes serão usados como sinônimos pois a distinção entre os mesmos é mínima, sendo objeto de constante confusão da doutrina, não exercendo nenhuma influência em relação ao campo tributário.

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[27] José Joaquim Gomes Canotilho. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. 7 ed. p. 426.

[28] O autor define postulado normativo aplicativo os “deveres estruturantes da aplicação de outras normas”, não se enquadrando estes no binômio princípio X regra.

[29] Humberto Ávila. Sistema Constitucional Tributário. p. 335.

[30] Helenilson Cunha Pontes. O Princípio da Proporcionalidade e o Direito Tributário. p. 107.

[31] Aurélio Pitanga Seixas Filho. Teoria e Prática das Isenções Tributárias. p. 153.

[32] Aurélio Pitanga Seixas Filho. Teoria e Prática das Isenções Tributárias. p. 206.

[33] Helenilson Cunha Pontes. O Princípio da Proporcionalidade e o Direito Tributário. p. 60.

[34] Humberto Ávila. Sistema Constitucional Tributário. p. 527.

[35] José Joaquim Gomes Canotilho. Direito Constitucional e Teoria da Constituição. p. 269.

[36] Helenilson Cunha Pontes. O Princípio da Proporcionalidade e o Direito Tributário. p. 68.

[37] Humberto Ávila. A Distinção entre Princípios e Regras e a Redefinição do Dever de Proporcionalidade. Revista de Direito Administrativo, v. 1. p. 171.

[38] DPOC AVANÇADO – Doença pulmonar obstrutiva crônica, conhecida popularmente como enfizema pulmonar, consistente na destruição e dilatação progressiva e irreversível dos alvéolos pulmonares. Geralmente acomete tabagistas com uma relação maior que 20 maços de cigarro por ano. Seus sintomas são maior sentimento de cansaço (dipnéia) progressivo, infecções pulmonares recorrentes, limitação das atividades laborativas. Em seu estágio avançado o paciente tem de fazer uso de oxineoterapia domiciliar por aproximadamente 16 (dezesseis) horas por dia.

[39] MIASTENIA GRAVIS. Doença auto-imune, na qual um anticorpo ataca a placa motora (complexo formado por um neurônio e uma fibra muscular), estrutura responsável pela transferência do estímulo nervoso para o músculo. Tem como sintomas fraqueza progressiva, iniciando-se principalmente na porção proximal dos membros superiores e inferiores, podendo com a evolução do quadro atingir músculos respiratórios como o diafragma. Nesta fase é comum os pacientes terem que viver com suporte ventilatório (ventilação mecânica).

[40] ARTRITE REUMATÓIDE DEFORMANTE. Doença auto-imune, na qual os anticorpos atacam as articulações do corpo. As articulações comumente envolvidas são as das mãos, pés e punhos. Na sua forma mais agressiva, pode causar poliartrite de difícil remissão, sendo necessárias altas doses de corticoesteróides e medicamentos imunomoduladores. A artrite persistente pode cursar com deformação das articulações, que acarretam limitação da amplitude de movimento, rigidez articular e dor intensa. Pode também acometer alguns órgãos, como os pulmões, causando derrames pleurais. Além disso pode acometer a coluna vertebral, principalmente o segmento da coluna cervical, podendo levar a sérias conseqüências.

[41] Ezio Vanoni. Natureza e Interpretação das Leis Tributárias. p. 331.

[42] Celso Ribeiro Bastos. Curso de Direito Tributário e de Direito Financeiro. p. 182.

[43] Amílcar Araújo Falcão. Introdução ao Direito Tributário. p. 83.

[44] Luís Roberto Barroso. “A viagem redonda: hábeas data, direitos constitucionais e as provas ilícitas”. Revista de Direito Administrativo, v.1, p. 162.

[45] Claus – Wilhelm Canaris. Pensamento Sistemático e Conceito de Sistema na Ciência do Direito. p. 226.

[46] Ezio Vanoni. Natureza e Interpretação das Leis Tributárias. p. 331.

[47] REsp n.º 240920/PR. Rel. Min. Garcia Vieira. DJ 27.03.2000. p. 78.

[48] REsp n.º 670723/SC. Rel. Min. Eliana Calmon. DJ 06.03.2006. p. 322.

[49] Claus – Wilhelm Canaris. Pensamento Sistemático e Conceito de Sistema na Ciência do Direito. p. 191.

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Sobre o autor
Raphael Furtado Carminate

Doutorando e Mestre em Direito Privado (PUCMinas). Especialista em Direito Tributário pela PUC Minas. Bacharel em Direito pela UFOP. Professor de Direito Civil da UNIPAC. Advogado em Ouro Preto (MG).

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CARMINATE, Raphael Furtado. Da solução dos conflitos na interpretação e aplicação das regras de isenção. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3590, 30 abr. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24317. Acesso em: 20 abr. 2024.

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