Capa da publicação Disforia de gênero e dignidade humana
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Disforia de gênero e suas repercussões jurídicas

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2. FUNDAMENTOS DOS DIREITOS DOS DISFÓRICOS

2.1 Dignidade da pessoa humana

Ao erigir a dignidade da pessoa humana como núcleo central de todo Ordenamento Jurídico, a Lei Maior elegeu o homem como o interesse primordial o qual a ordem constitucional visa proteger. Não obstante, a ausência de regulamentação da matéria, os direitos dos disfóricos encontram-se assentes na Constituição Federal.

Como é cediço, antes de adentrar na seara de qualquer princípio, é de bom alvitre que se esclareçam as diferenças entre eles e as regras, muito embora não seja este especificamente o escopo do presente trabalho. E, para isso, desde já, se chama a atenção para o fato de que será apenas uma brevíssima explanação, apenas nos tópicos indispensáveis à compreensão básica da questão.

Diante disso, cabe mencionar a importante contribuição dada por Ronald Dworkin e Robert Alexy ao estudo dos princípios. Para eles, os princípios distinguem-se das regras, quanto ao modo de sua aplicação. Elas são aplicadas segundo a máxima do tudo ou nada (all or nothing), diversamente do que acontece com os princípios que possuem uma dimensão de peso. [20]

Dito de outra forma, as regras relacionam-se intrinsecamente com a subsunção, os fatos devem necessariamente subsumir-se as regras, em caso de eventual antinomia, uma delas será aplicada, enquanto a outra será inválida para o caso concreto.

Luiz Alberto David Araújo apresenta um conceito singelo de princípio, contudo bastante elucidativo “princípios jurídicos, sem dúvida, significam os pontos básicos, que servem de ponto de partida ou de elementos vitais do próprio Direito. Indicam o alicerce do Direito”. [21]

Tome-se o seguinte exemplo: Art. 121: “Matar alguém. Pena – reclusão, de 06 (seis) a 20 (vinte) anos (Código Penal)”; Art. 1º: “A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos, [...], inciso III, a dignidade da pessoa humana (Constituição Federal de 1988)”.

No primeiro exemplo, tem-se a regra, porquanto está presente uma prescrição imperativa de conduta, no segundo, o princípio, que pode ser identificado pelo seu maior grau de abstração e generalidade.

Nesta mesma linha de pensamento, Luís Roberto Barroso:

Regras são, normalmente, relatos objetivos, descritivos de determinadas condutas e aplicáveis a um conjunto delimitado de situações. Ocorrendo a hipótese prevista em seu relato, a regra deve incidir, pelo mecanismo tradicional da subsunção: enquadram-se os fatos na previsão abstrata e produz-se uma conclusão. A aplicação de uma regra se opera na modalidade tudo ou nada: ou ela regula a matéria em sua inteireza ou é descumprida. Na hipótese de conflito entre duas regras, só uma será válida e irá prevalecer. [22]

A trilogia tradicionalmente usada para conciliar esse conflito de normas são os conhecidos critérios: cronológico, hierárquico e o da especialização.

De forma sucinta, Norberto Bobbio, ao definir o critério cronológico, afirmou que sua base está em identificar a norma posterior, a qual deverá prevalecer, lex posterior derogat priori. Por isso, o chamou também de lex posterior. No hierárquico, Lex superior, a finalidade é descobrir a regra imediatamente superior, visto que na escala de hierarquia, a norma superior tem o condão de revogar a inferior, lex superior derogati inferiori. O terceiro e último critério é aquele em que irá preponderar a lei especial sobre a geral, Lex especialis derogat generali. [23]

No entanto, cumpre alertar que nem sempre esses critérios se mostrarão suficientes para solucionar a problemática dos conflitos de normas existentes no Ordenamento Jurídico e as razões, por não constituírem o objeto deste trabalho, não serão expostas.

Voltando a distinção entre princípios e regras, sempre que houver a incidência de dois princípios a uma dada situação, deve haver a ponderação de acordo com as circunstâncias do caso concreto, para, a partir daí, se avaliar o de maior peso e, consequentemente, aplicá-lo. Percebe-se que não há com relação aos princípios, um sistema de invalidação, semelhante ao que ocorre com as regras, mas apenas há a sobreposição de um ao outro, isto é, opta-se pela aplicação de um deles, por este possuir maior importância no caso concreto.

Impende destacar que, o jurista alemão, Robert Alexy, aprimorou ainda mais a essência das premissas de Dworkin aduzindo que os princípios são mandamentos de otimização, e o confronto entre eles se observa não no campo da validade, mas no da dimensão de peso. Deve-se sopesar a luz do caso concreto o de maior relevância, afastando apenas a sua incidência, porém sem determinar a invalidação propriamente dita. [24]

Feitas essas brevíssimas considerações, urge retomar o ponto principal deste tópico, a dignidade da pessoa humana.

Dentre todas as Constituições brasileiras, a primeira que versou sobre o referido princípio, elevando-o a fundamento da República federativa e do Estado Democrático de Direito, foi a de 1988. [25]

Inúmeros autores se debruçaram sobre o tema, mas na realidade não existe um consenso, os debates geralmente giram em torno do seu significado e alcance. Isso se justifica, porque o referido princípio retrata um conceito extremamente fluido, dotado da capacidade de atravessar a barreira do tempo e se manter sempre atual.

O princípio da dignidade da pessoa humana é informador de toda a ordem constitucional e, por isso, espraia-se pelo Ordenamento Jurídico inteiro, de forma expressa no texto da lei: além do art. 1º, inciso III da Constituição Federal, o art. 170 do Título VII, assim como os arts. 226, § 7º e 227, caput, se reportam a este princípio.

Na tentativa de conceituá-lo Ingo Wolfgang Sarlet assevera:

Temos por dignidade da pessoa humana a qualidade intrínseca e distintiva reconhecida em cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos. [26]

Partindo desse postulado, infere-se que o disfórico, tem calcado no princípio da dignidade da pessoa humana, o direito ao livre desenvolvimento de sua personalidade, e aí se inclui o direito ao respeito à identidade sexual.

Mas, para que isso seja possível, entre outras providências, cabe ao Estado viabilizar a inserção social destes indivíduos, pois salta aos olhos de qualquer um, que eles integram a categoria de pessoas excluídas e, por conseguinte, não têm as mesmas oportunidades dentro da sociedade.

Não há como falar em livre desenvolvimento e qualidade de vida saudável, se não há a inserção social. O indivíduo que permanece à margem da sociedade não tem condições de desenvolver de forma satisfatória suas potencialidades.

O direito à retificação do registro civil, daquele que apresenta a inversão e que já passou por todo o processo pré e pós cirúrgico, é apenas uma das vertentes que integram a promoção ao livre desenvolvimento da identidade do ser. Negá-la, é no mínimo fruto de uma mentalidade tacanha e principalmente afronta ao valor maior insculpido na Lei Fundamental.

O fato de uma pessoa possuir a identidade sexual diversa do sexo biológico, não quer dizer que ela seja inferior, nem tampouco menos merecedora da tutela estatal e jurídica.

Corroborando com o exposto:

Estar à margem da lei não significa ser desprovido de direito nem pode impedir a busca do seu reconhecimento na Justiça. Ainda quando o direito se encontra envolto em uma auréola de preconceito, o juiz não deve ter medo de fazer justiça. A função judicial é assegurar direitos, e não bani-los pelo simples fato de determinadas posturas se afastarem do que se convencionou chamar de normal. [27]

Não há como garantir ao disfórico operado uma vida digna enquanto não houver o reconhecimento de seus direitos na seara judicial. Somente para ilustrar a ideia, imagine-se um disfórico operado que busca emprego, mas que ainda não obteve a retificação do seu registro de nascimento, ou ainda, o disfórico operado com 18 anos que tem a obrigação de comparecer para o alistamento militar, o constrangimento a que estariam sujeitos esses indivíduos é incomensurável.

Sílvio de Salvo Venosa andou bem ao perfilhar o entendimento que “comprovada a alteração de sexo, impor a manutenção do nome do outro sexo à pessoa é cruel, sujeitando-a a uma degradação que não é da consentânea com os princípios de justiça social”. [28]

Não custa nada repetir, que a dignidade da pessoa humana abarca todos os seres humanos sem distinção de raça, cor, credo, grau de instrução. Todos merecem o respeito, tanto por parte da comunidade, como do Estado. Frise-se, por oportuno, que a comunidade também tem sua parcela de responsabilidade no desrespeito aos direitos dos que possuem o transtorno da identidade sexual.

O desafio neste aspecto é construir uma política que desenvolva o senso de tolerância com a minoria, com o propósito de que sejam acolhidos pela sociedade e não venham a ter sua dignidade aviltada.

Ingo Wolfgang Sarlet ao afirmar que “todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade, e é a dignidade de cada pessoa que deve ser objeto do respeito e proteção por parte do Estado e da comunidade” 29 corrobora com a mesma linha de raciocínio expendida acima.

O que acontece com os disfóricos é que simplesmente é mais cômodo relegá- los à invisibilidade social, deixando-os “esquecidos” e “abandonados a própria sorte”, que se movimentar e enfrentar a questão para garantir o mínimo necessário ao seu pleno desenvolvimento como pessoa.

Ao agir dessa forma, acaba-se olvidando que o fim maior do Estado é a pessoa humana:

Como fundamento do Estado Democrático de Direito, o constituinte, além de ter tomado uma decisão fundamental a respeito do sentido, da finalidade, e da justificação do exercício do poder estatal e do próprio Estado, reconheceu que é o Estado que existe em função da pessoa, e não o contrário. O ser humano constitui finalidade precípua e não meio da atividade estatal. [30]

Partindo da premissa de que o Estado existe em função da pessoa, a atuação do Estado deve estar pautada em garantir o bem estar social, mas é notório o descaso que vem sendo dispensado aos que apresentam o conflito de identidade. O silêncio do legislador obriga àqueles que tem interesse em pleitear seus direitos na esfera judicial a se valerem de métodos interpretativos e analogias, porque não existe direito positivado.

Assim, Luiz Alberto David Araujo:

A dignidade da pessoa humana deverá servir de farol para a busca da efetividade dos direitos constitucionais. Em relação à proteção constitucional do transexual, por exemplo, a dignidade da pessoa humana revestir-se-á de princípio necessário e básico para a sua proteção constitucional. [31]

A inércia legislativa fomenta ainda mais o preconceito, não há óbice algum para que não seja editada lei que assegure concretamente os direitos dos disfóricos, muito pelo contrário, suas bases se sustentam no princípio que ora está em voga.

Felizmente, a jurisprudência vem se modernizando e reconhecendo direitos a essas minorias, o que tem se revelado um grande avanço nessa área.

Porém, em que pese a inclinação da jurisprudência em reconhecer esses direitos, nada substitui a importância da lei, para reger essas relações.

Por isso, entende Luiz Alberto David Araujo que:

No Brasil, como se vê, por falta de uma legislação específica, o Poder Judiciário tem encontrado dificuldades para fundamentar a pretensão do transexual à averbação de seu novo estado junto ao registro civil. As decisões são esparsas e carecem de uma diretriz única. [32]

Por outro lado, deve-se entender que, “a colocação do ser humano como centro da tutela jurídica impede admitir-se seja ele colocado na condição de objeto de quaisquer interesses, quer do Estado ou de outros quaisquer “poderes privados”. [33]

Na expressão “poderes privados” está ínsita a noção, já explicitada alhures, de que é vedada a qualquer pessoa da comunidade causar humilhações, ofensas, perseguições, enfim qualquer forma de violência que venha a agredir a dignidade de qualquer ser pensante.

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A proteção a dignidade da pessoa humana como se vê é algo de tão elevada magnitude que não pode ser afastada nem por vontade do próprio indivíduo que a ostenta, os ensinamentos de Sarlet são essenciais para ratificar o que se disse:

Com efeito, na medida em que a dignidade é algo inerente à essência do ser humano e que o qualifica como tal, sustenta-se que a dignidade da pessoa humana é algo do qual nem este pode livremente dispor, sendo, portanto, irrenunciável, inalienável e intangível. [34]

Outro ponto que merece destaque é a inserção profissional do disfórico, que se relaciona diretamente com a noção de vida digna/dignidade da pessoa humana. O lugar que se deseja chegar com esta afirmação é que as pessoas que são alvo de algum tipo de exclusão social acabam sendo empurradas para a marginalidade.

Com o disfórico não podia ser diferente, verifica-se que enquanto não houver respeito por sua condição sexual, eles não terão meios de exercer livremente uma profissão ou aprender um ofício, porque a todo momento existe alguém que lhe aponta, lhe desvaloriza.

Tereza Rodrigues Vieira arremata: “quem daria um emprego a um homem vestido de mulher?”35]

O acórdão que será analisado a seguir refere-se exatamente a essa indagação, o questionamento feito por Tereza Rodrigues Vieira é totalmente pertinente. A discriminação é algo tão presente na vida dos que tiveram a infelicidade de nascerem invertidos que a próxima pergunta a ser formulada é: onde está o respeito à dignidade humana desses indivíduos?

DANO MORAL. TRABALHADOR QUE ASSUME SUA TRANSEXUALIDADE. DISCRIMINAÇÃO VELADA. TRABALHADOR MANTIDO EM OCIOSIDADE. ASSÉDIOMORALCONFIGURADO.INDENIZAÇÃODEVIDA.A discriminação é a negação do princípio da igualdade, eis que discriminar é fazer distinção. Em matéria trabalhista, discriminação, segundo a Convenção 111 da OIT, é toda distinção, exclusão ou preferência que tenha por fim alterar a igualdade de oportunidade ou tratamento em matéria de emprego ou profissão. Em nosso ordenamento jurídico a proibição da discriminação tem base constitucional, eis que, em seu art. 3º, foi estabelecido como um dos objetivos da República Federativa do Brasil, "promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação", e, em seu art. 5º, foi assegurado que “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo- se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade...". E, para o caso específico da discriminação no ambiente de trabalho aplica-se também o disposto no art. 1º da Lei 9.029/95. Ocorre que a discriminação do trabalhador é externada muitas vezes através de comportamentos que se configuram como assédio moral. No presente caso, a prova oral demonstrou que o trabalhador, após assumir sua transexualidade, foi afastado do trabalho pelo seu superior hierárquico, sem que houvesse justificativa convincente para isso, eis que a própria testemunha patronal admitiu que no setor de ambulâncias não faltava serviços e que existem uma ou duas ambulâncias reservas. Ora, o fato do empregador deixar o empregado na ociosidade, sem qualquer função, marginalizando-o no ambiente de trabalho, constitui inequivocamente assédio moral. E, na hipótese, o assédio moral é decorrente da discriminação de que o autor foi vítima, discriminação essa que sequer foi declarada, mas, sim, velada, que é aquela que é mais difícil de ser comprovada, porque não se caracteriza por comportamento visível a todos. Neste contexto, a conduta do superior hierárquico violou o princípio da dignidade como pessoa humana, adotado como fundamento de nossa república (art. 1º, III e IV, da CF), sendo devida ao obreiro a reparação civil pelo dano moral sofrido mediante a condenação do reclamado ao pagamento de indenização. Recurso ordinário provido. [36]

A jurisprudência do Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região deixou mais do que claro que a atitude discriminatória perpetrada pelo seu superior hierárquico feriu flagrantemente a dignidade da pessoa humana, analisando detidamente a decisão percebe-se que a indenização se deu a título de assédio moral, contudo, o desembargador relator do caso fundamentou sua brilhante decisão, diga-se de passagem, no princípio da igualdade como um dos pilares da dignidade da pessoa humana.

Esse tipo de conduta é exatamente aquela que deve ser coibida, é a típica ofensa à dignidade da pessoa humana por desrespeito ao direito à diferença. O trabalhador, ao assumir publicamente sua condição de “transexual”, foi humilhado, perseguido, maltratado e afastado do cargo que ocupava. Sua capacidade laboral foi menosprezada, e com relação a isso reporta-se ao que foi dito linhas atrás, o indivíduo teve tolhido o livre exercício de profissão.

Assim, acredita-se que o fato de não haver lei disciplinando a matéria não constitui motivo para não reconhecer os direitos aos que possuem a disforia de gênero, pelas razões que foram exprimidas neste tópico. Com efeito, nunca se conseguirá eliminar o preconceito, mas acatando-se a procedência da maior pretensão judicial do disfórico, adequar o estado fático ao estado jurídico, novas perspectivas surgirão, para que seja possível o pleno desenvolvimento de sua personalidade e, por conseguinte, estar-se-á abrindo as portas para a tão almejada integração social.

2.2 Direito à intimidade e privacidade

A Constituição Federal de 1988 assegurou no seu art. 5º, inciso X a inviolabilidade da intimidade, da vida privada, a honra e a imagem das pessoas, sob pena de indenização pelo dano material ou moral decorrente de sua violação.

Com aqueles que apresentam o conflito entre o sexo anatômico e o psicológico não poderia ser diferente, há que ser respeitado o direito ao sigilo do estado anterior.

Comumente empregadas com o mesmo sentido, a intimidade e a vida privada são conceitos com conteúdos distintos e para não incorrer no mesmo equívoco, tentar-se-á defini-los da forma mais didática possível.

Primeiramente, cumpre examinar o sentido etimológico dos conceitos. Para Daniela Braga Paiano:

Intimidade, deriva do latim, intimus, cuja procedência é do advérbio intus. Tem o sentido de interior, íntimo, oculto, do que está nas entranhas. Traz uma ideia de segredo, confiança. Pode-se asseverar, desta forma, que a intimidade tem um sentido subjetivo, pois traz consigo a ideia de confidencial. Já o conceito de privacidade é mais amplo que o de intimidade, englobando tudo que não queremos que seja do conhecimento geral. Do latim, privatus, significa privado, particular, próprio. [37]

Considerando a etimologia da intimidade e da privacidade, pode-se inferir que esta representa um aspecto mais amplo, ao passo que aquela um aspecto muito mais restrito.

O estado referente à disforia de gênero tanto merece a tutela do direito à intimidade como da privacidade, visto que, se refere a um segredo que o disfórico traz no recôndito de sua alma e que certamente só o contará a alguém de sua confiança. Também diz respeito à privacidade, à medida que é algo particular que ele não deseja que seja do conhecimento de todos.

Nas profícuas lições de Sampaio, “quando falamos em 'relações íntimas' e 'relações privadas', a primeira, traz a idéia de proximidade, de contato físico, de relações de natureza sexual; enquanto 'relações privadas' pode ser traduzida por 'relações entre iguais'”. [38]

Por fim, e já adentrando no âmbito conceitual de fato, o constitucionalista José Afonso da Silva citando René Ariel Dotti aponta que “a intimidade se caracteriza como a esfera secreta da vida do indivíduo na qual este tem o poder legal de evitar os demais”39]

Ainda de acordo com o constitucionalista, a vida privada se caracteriza: “como o conjunto de informações acerca do indivíduo que ele pode decidir manter sob seu exclusivo controle ou comunicar, decidindo a quem, quando, onde e em que condições, sem a isso poder ser legalmente sujeito”. [40]

Indubitavelmente, como direitos fundamentais que são a intimidade e a vida privada do disfórico devem ser preservadas. A questão ganha relevo no concernente à averbação no registro civil depois de realizada a conversão sexual, no campo relativo ao sexo, o que deve constar?

O mais indicado, é que conste o sexo decorrente da redesignação, ou masculino ou feminino, até mesmo porque, não existe outro sexo a não ser os dois que compreendem a dicotomia masculino/feminino.

Ao inserir a expressão “transexual” estar-se-á violando o direito à intimidade e à vida privada desses sujeitos. A uma porque, o estado anterior deve ser esquecido e não deve ser objeto do conhecimento de todos a duas porque, a situação é muito delicada, constituindo um segredo, que diz respeito a sua vida íntima, só podendo ser revelado se e quando aquele que se submeteu a redesignação sexual desejar. Ademais, ao se inserir a expressão retromencionada, é evidente que se exporá o indivíduo a situações constrangedoras.

O acórdão seguinte comprova a postura antiquada que alguns operadores do direito defendiam:

REGISTRO PUBLICO . ALTERACAO DO REGISTRO DE NASCIMENTO. NOME E SEXO TRANSEXUALISMO. SENTENCA ACOLHENDO O PEDIDO DE ALTERACAO DO NOME E DO SEXO, MAS DETERMINANDO SEGREDO DE JUSTICA E VEDANDO NO FORNECIMENTO DE CERTIDOES REFERENCIA A SITUACAO ANTERIOR.

Recurso do Ministério Público se insurgindo contra a mudança de sexo, pretendendo que seja consignado como transexual masculino, e contra a não publicidade do registro. Embora sendo transexual e tendo se submetido a operação para mudança de suas características sexuais, com a extirpação dos órgãos genitais femininos e a implantação de prótese peniana, biológica e somaticamente continua sendo do sexo masculino. Inviabilidade da alteração, sem que seja feita referência a situação anterior, ou para ser consignado como sendo transexual masculino, providência que não encontra embasamento mesmo nas legislações mais evoluídas. Solução alternativa para que, mediante averbação, seja anotado que o requerente modificou o seu prenome e passou a ser considerado como sexo masculino em virtude de sua condição transexual, sem impedir que alguém possa tirar informações a respeito. Publicidade do registro preservada. Apelação provida, em parte. Voto vencido. [41]

A opinião esposada pelo Ministério Público se choca frontalmente com o direito à privacidade e intimidade do que possui a identidade sexual em desconformidade com o sexo biológico, isso sem falar no ultraje a dignidade da pessoa humana.

Pois bem, embora aquele em que foi realizada a cirurgia apenas tenha adaptado o aspecto exterior de sua genitália ao sexo psicológico, isso não constitui motivo suficiente a ensejar a publicização da condição de disfórico, porque, como dito no capítulo 1 do estudo em epígrafe, o sexo vai muito além da aparência da constituição genital, não podendo este preponderar sobre os demais aspectos.

Outro argumento que poderia ser sustentado para não alterar o sexo ou alterar com reservas é a preservação de interesses de terceiros. Entretanto, deve-se partir do pressuposto que todos agem de boa-fé e dessa forma, deixar ao livre arbítrio do que possui a disforia de gênero contar aos eventuais interessados que com ele se envolvam.

Falar em terceiros interessados, inexoravelmente, remete à questão do casamento, e, com relação a isso, o terceiro tem a sua disposição o direito de anular o ato, sob o fundamento de erro essencial quanto a pessoa.

Nesta mesma senda, Maria Berenice Dias indica que a única forma de não atentar contra os direitos e as garantias individuais constitucionalmente previstas é não fazer menção, seja lá em quaisquer documentos forem, sobre a redesignação de sexo. [42]

Um dos maiores anseios do disfórico é exatamente se livrar do estigma que carrega consigo, o qual lhe causa tanta dor e sofrimento. Mencionar expressamente o estado anterior representa um entrave a busca da felicidade e de seu bem-estar.

A jurisprudência pátria tem seguido essa tendência:

APELAÇÃO CÍVEL. REGISTRO CIVIL. ALTERAÇÃO. PRENOME E GÊNERO. TRANSEXUALISMO. PROBIÇÃO DE REFERÊNCIA QUANTO A MUDANÇA. POSSIBILIDADE. Determinada a alteração do registro civil de nascimento em casos de transexualidade, desde que demonstrada a existência da alopatia, é imperiosa a proibição de referência no registro civil quanto à mudança, a fim de preservar a intimidade do apelado. [43]

Percebe-se nitidamente que com relação a não divulgação da condição anterior a jurisprudência evoluiu significativamente, bastando para isso, comparar essa ementa com aquela em que o Parquet pugnava justamente pelo inverso, com supedâneo na proteção de terceiros. O acórdão exposto andou bem ao primar pela salvaguarda do direito da intimidade, impedindo que ela seja devassada, satisfazendo a curiosidade de olhares e ouvidos ávidos.

Brilhante contribuição foi dada por Maria Helena Diniz:

Entendemos que deve haver a adequação do prenome ao novo sexo do transexual operado sem qualquer referência discriminatória na carteira de identidade, de trabalho, no título de eleitor, no CPF etc.ou averbação sigilosa no registro de nascimento, porque isso impediria sua plena integração social e afetiva e obstaria seu direito ao esquecimento do estado anterior, que lhe causou tanto sofrimento. O mandado judicial de retificação deveria, então, ordenar não só a averbação à margem do registro das retificações de prenome e de sexo do requerente, respectivamente para “masculino” ou “feminino” (e não transexual!), mas também o seu arquivamento, como se faz com os mandados judiciais em processo de adoção, guardadas as diferenças entre averbação e registro (art. 47, § 1º, do ECA). Assim sendo, na nova certidão do assento de nascimento fornecida pelo Registro Civil não se deve fazer qualquer menção à natureza das retificações procedidas, consignando- se penas ressalva no sentido de que: a) o mencionado assento foi modificado por sentença judicial em ação de retificação de registro civil, cujo teor se resguarda em segredo de justiça; b) a certidão com inteiro teor do mandado poderia para salvaguarda dos direitos ser fornecida critério da autoridade judiciária (aplicação analógica do § 5º do art. 47 do Estatuto da Criança e do Adolescente, para informações pregressas sobre o adotado). [44]

A proposta de adequação do prenome e do sexo trazida à baila é extremamente perspicaz, ao mesmo tempo que não expõe o disfórico a situações humilhantes e discriminatórias, preservando, destarte, sua intimidade e privacidade, permite que se proteja também os direitos de eventuais terceiros estritamente interessados que terão a oportunidade de tomar conhecimento do que se passou.

Evita-se com isso, que esse indivíduo reviva a todo instante, entenda-se quando for necessário mostrar seus documentos, momentos angustiantes, dos quais ele não deseja lembrar.

Além disso, não se pode olvidar que desse modo, se facilitará o processo de inserção social daquele que passou pela cirurgia de redesignação, assim como efetivamente se estará satisfazendo a pretensão do requerente de ter o direito ao esquecimento/sigilo de tudo que ocorreu antes do supracitado tratamento.

2.3 Direitos da personalidade

Não há como falar em direitos dos disfóricos e não discorrer sobre os direitos da personalidade, este modernamente concebido como cláusula geral de tutela e promoção da pessoa humana, permite que mesmo ante a ausência de normas positivadas, se protejam os valores mais preciosos e imprescindíveis a uma vida digna.

É inegável que a pretensão do disfórico desde o início do tratamento até a etapa final apóia-se também nos direitos da personalidade e, por isso, não se pode descurar de sua análise.

Ademais, percebe-se que há um forte liame entre princípio da dignidade humana e direitos da personalidade, pode-se até afirmar que um é indissociável do outro.

Como bem assevera Silvio Romero Beltrão: “o ponto fundamental de destaque para a compreensão dos direitos da personalidade é a proteção da dignidade da pessoa humana”. [45]

Mas, o que se pode considerar como direito da personalidade? Maria Helena Diniz com a precisão que lhe é peculiar descreve:

São direitos subjetivos da pessoa de defender o que lhe é próprio, ou seja, a sua integridade física (vida, alimentos, próprio corpo vivo ou morto, corpo alheio vivo ou morto, partes separadas do corpo vivo ou morto); a sua integridade intelectual (liberdade de pensamento, autoria científica, artística e literária) e sua integridade moral (honra, recato, segredo pessoal, profissional e doméstico, imagem, identidade pessoal, familiar e social)”. [46]

Preleciona o Código Civil de 2002, em seu art. 2º, que a personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida, mas a lei põe a salvo, desde a concepção, os direitos do nascituro. O que se leva a crer que todo direito da personalidade pode ser encarado como algo inerente a todo sujeito nascido com vida, não são direitos concedidos por qualquer ordenamento jurídico, mas apenas reconhecidos.

Partindo-se das considerações feitas por Maria Helena Diniz, incontestavelmente a identidade sexual encontra abrigo nos direitos da personalidade, pois se cuida de qualidade própria pertencente a todo ser que o individualiza e o caracteriza, e por isso, é perfeitamente passível a sua tutela, seja buscando meios para vivê-la em plenitude, seja exigindo respeito pelos demais.

Partidário dessa mesma concepção, Sarlet:

É precipuamente com fundamento no reconhecimento da dignidade da pessoa por nossa Constituição, que se poderá admitir, também entre nós e apesar da omissão do Constituinte neste particular, a consagração – ainda que de modo implícito – de um direito ao livre desenvolvimento da personalidade. [47]

No tocante às características dos direitos da personalidade, pode-se, enumerá-los da seguinte forma: são direitos absolutos, intransmissíveis, indisponíveis, irrenunciáveis, imprescritíveis, impenhoráveis, inexpropriáveis, e ilimitados. [48]

Tradicionalmente a doutrina costuma desdobrar os direitos da personalidade nas seguintes facetas: “nome civil; direito à vida e à integridade física e direito ao corpo; integridade moral e direito à imagem e à intimidade”. [49]

As pretensões daqueles que apresentam a incongruência concernente ao sexo biológico/psicossocial se encaixam em todas essas facetas dos direitos da personalidade. O enfoque que será dado a eles diz respeito à relação disfóricos/direitos da personalidade.

Primeiramente cumpre dizer que o nome civil pode ser sucintamente definido como um traço distintivo, sua importância se revela na necessidade de distinguir as pessoas umas das outras, seja no plano dos direitos ou das obrigações. Nas palavras de Caio Mário da Silva Pereira, nome: É “o elemento designativo do indivíduo e fator de sua identificação na sociedade, o nome integra a personalidade, individualiza a pessoa e indica grosso modo sua procedência familiar”. [50]

Os elementos que integram o nome civil são:

  1. Nome de família - também chamado na linguagem jurídica de patronímico e vulgarmente conhecido como sobrenome, indica a família, a estirpe; ex: Brandão.

  2. Prenome – é o nome de batismo, que pode ser simples ou composto; ex: Rodrigo e Ana Paula.

  3. Partícula ou conjunção - normalmente precedem o nome de família; ex: João Pedro de Melo e Janete Andrada e Silva.

  4. Agnome - geralmente indicativo de nome de parentesco; ex: Thiago Ferreira Júnior e Lucas Henrique Neto. [51]

Em síntese, o nome compreende o prenome mais o sobrenome, não podendo ser outra a interpretação extraída do art. 16 da Lei nº 10.406/2002 (Código Civil).

Esta faceta é o “calcanhar de Aquiles” daqueles que possuem a disforia de gênero e já foram operados, porque o nome deve ser uníssono com o sexo da pessoa que o ostenta. Ter uma aparência feminina, por exemplo, e o nome referente ao sexo masculino é uma discrepância sem tamanho.

O direito do disfórico se relaciona com o viés em comento no momento posterior em que é realizada a cirurgia de redesignação sexual, pois a próxima etapa certamente será ingressar no Judiciário pleiteando a retificação de seu prenome no registro civil.

Na grande maioria dos casos, observa-se que mesmo antes do procedimento cirúrgico o indivíduo já adota um nome que esteja de acordo com sua personalidade, cabendo apenas ao Judiciário o reconhecimento desse direito.

Ora, se o próprio diploma civil salvaguarda a inviolabilidade do nome, é um enorme contracenso permitir que alguém seja vilipendiado justamente por possuir prenome que não condiz com a realidade.

Há muito tempo, a cirurgia de redesignação sexual deixou de ser considerada ilícita, a interpretação que se tem hoje é que o retromencionado tratamento não atrita com o direito à vida, à integridade física, bem como o direito ao corpo, muito pelo contrário, existe entre todos eles uma relação interdisciplinar.

A razão de ser da intervenção cirúrgica é corrigir a incongruência entre a mente e o corpo do indivíduo, restabelecendo-se dessa forma, a saúde física e mental do disfórico, haja vista que a disforia de gênero é reconhecidamente catalogada pelo Conselho Federal de Medicina como enfermidade.

O direito à vida deve ser encarado da forma mais ampla possível, pois ele é o sustentáculo de todos os direitos da personalidade, sendo indissociável o direito à vida digna da saúde física e mental. Outrossim, “o direito constitucional à saúde está resguardado pela Constituição Federal no art. 196, uma vez que, sem saúde, não é possível o desenvolvimento da personalidade”. [52]

Por sua vez, o direito à integridade física engloba também o direito ao próprio corpo e suas disposições. O cerne da questão se funda na possibilidade ou impossibilidade de dispor do próprio corpo e de partes dele.

A legislação infraconstitucional de nº 9.434/1997 ficou encarregada de estabelecer os limites que deverão ser obedecidos ao se dispor de partes integrantes do corpo humano, trazendo inserta no seu art. 1º que a disposição de tecidos, órgãos e partes do corpo humano em vida ou post mortem devem se dar obrigatoriamente a título gratuito apenas para fins de transplante e tratamento.

Desta feita, percebe-se que mesmo não havendo expressa determinação legal referindo-se exatamente a operação de adequação sexual, se levarmos em consideração que a Ordem Jurídica deve ser interpretada como um todo uno e indivisível, visto que não existe ramo Jurídico absolutamente autônomo, poder-se-ia chegar a conclusão que estar-se-á diante da tão almejada permissão que legitimaria a realização do procedimento jurídico.

Ademais, reforçando ainda mais o caráter lícito de tal procedimento, tem-se a autorização expressa do CFM (Conselho Federal de Medicina) na resolução de nº 1.652/02, para que seja realizado esse tipo de procedimento em pacientes que apresentem a disforia de gênero.

Não se pode olvidar que o art. 13, Parágrafo Único, do Código Civil, traz a previsão de que salvo por exigência médica, é defeso o ato de disposição do próprio corpo, quando importar diminuição permanente da integridade física, ou contrariar os bons costumes.

A regra trouxe uma relativização da indisponibilidade do corpo humano.

A discussão perde ainda mais consistência com o posicionamento acertado de Flávio Tartuce, cujo entendimento é no sentido de que o laudo médico, atestando a presença da transexualidade, se enquadraria na expressão “exigência médica” contida na primeira parte do artigo em comentário. Seu posicionamento se funda no enunciado nº 6 do Conselho da Justiça Federal, aprovado na I Jornada de Direito Civil, realizada em setembro de 2002, cujo teor segue: "Art. 13: A expressão "exigência médica", contida no art. 13, refere-se tanto ao bem-estar físico quanto ao bem-estar psíquico do disponente". [53]

Dessa forma, não há o que se falar em responsabilização penal do médico, tampouco violação da integridade física do que deseja a conversão sexual. Muito pelo contrário, diante de tudo que foi exposto não há outra conclusão a não ser a que a prática da cirurgia se coaduna com os preceitos estabelecidos na Lei Civil.

Outro aspecto que não se pode deixar de comentar é a integridade moral, direito à imagem e à intimidade, todos se entrelaçam entre si. Essa faceta do direito da personalidade reforça tudo o que foi explanado no tópico anterior acerca do direito à intimidade, e para não tornar a leitura cansativa e repetitiva não se irá expor novamente, mas acrescente-se ao que foi dito anteriormente que a opção de implementar tal tratamento, incluindo aí todas as suas etapas, é decisão que integra a intimidade daquele que vive perturbado com sua situação de conflito interno. Compete somente a ele, na sua esfera de intimidade, decidir livrar-se daquilo que tanto o incomoda.

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Sobre as autoras
Andréa Paula da Cruz

Bacharela em Direito em Caruaru (PE).

Renata de Lima Pereira

Advogada. Mestra em Direito Privado pela UFPE. Professora de Direito Civil e Empresarial da Estácio/Recife e ASCES/Caruaru.

Como citar este texto (NBR 6023:2018 ABNT)

CRUZ, Andréa Paula ; PEREIRA, Renata Lima. Disforia de gênero e suas repercussões jurídicas. Revista Jus Navigandi, ISSN 1518-4862, Teresina, ano 18, n. 3605, 15 mai. 2013. Disponível em: https://jus.com.br/artigos/24437. Acesso em: 28 abr. 2024.

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